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A transmissão radiofônica de jogos de futebol: a incoerente gratuidade de um espetáculo esportivo?

The radio broadcast of soccer matches: the gratuitous incoherent sporting spectacle

La transmisión de partidos de fútbol por la radio: la incoherente gratuidad de un espectáculo deportivo

Resumo

A mídia passou a integrar o futebol em suas mais diversas vertentes e passou a usufruir do retorno financeiro, proporcionado pela preferência nacional desse esporte. Problematizamos este artigo baseados na seguinte questão: sendo a transmissão dos jogos de futebol um produto das emissoras de rádio, deveriam os clubes receber uma contrapartida financeira pelos direitos de transmissão? O procedimento metodológico consistiu em uma revisão bibliográfica, análise documental e notícias midiáticas referentes à tentativa de cobrança pela transmissão radiofônica pretendida pelo Clube Atlético Paranaense, em 2008. As considerações apontam para questões acerca do tema com vistas a pensar sobre a coerente ou incoerente gratuidade da transmissão radiofônica integral dos jogos de futebol no Brasil, tendo em vista um evento transmitido e mundialmente assistido como a Copa do Mundo de Futebol realizada no país em 2014.

PALAVRAS-CHAVE
Futebol; Transmissão radiofônica; Legislação brasileira; Clube Atlético Paranaense

Abstract

The media are part of soccer in several respects and is enjoying the returns offered by the preference of the national sport. Problematize this paper based on the following question: the transmission of soccer matches is a product of radio stations, so the clubs should receive financial transmission rights? The methodological approach consisted of a literature review, document analysis and news media regarding the attempt to charge for radio transmission intended by Atletico Paranaense in 2008. Considerations point to the inconsistency in free radio broadcast of football games and in contradiction to the sovereignty of the FIFA statutes before the law Pele.

KEYWORDS
Soccer; Radio broadcast; Brazilian law; Atletico Paranaense

Resumen

Los medios de comunicación son parte del fútbol en diversos aspectos y ha llegado a disfrutar de los beneficios obtenidos por la preferencia nacional hacia este deporte. Este artículo se basa en la siguiente pregunta: Si la transmisión de los partidos de fútbol es un producto de las emisoras de radio, ¿deberían los clubes recibir una contrapartida financiera por los derechos de transmisión? El enfoque metodológico consiste en una revisión de la bibliografía, un análisis de los documentos y las noticias de los medios de comunicación en relación con el intento de cobrar por la transmisión radiofónica que en 2008 exigía el Clube Atlético Paranaense. Las consideraciones apuntan a la incoherencia en la emisión radiofónica libre de los partidos de fútbol y en contradicción con la soberanía de los estatutos de la FIFA antes de la ley Pelé.

PALABRAS CLAVE
Fútbol; Programa de radio; Legislación brasileña; Clube Atlético Paranaense

Introdução

“Abrem-se as cortinas do espetáculo”

Fiori Gigliotti

A transição do amadorismo para o profissionalismo no futebol contribuiu, de maneira bastante significativa, para que houvesse a espetacularização desse esporte. De acordo com Capraro (2006)Capraro AM. Do football ao futebol. Revista Nossa História, São Paulo, Editora Vera Cruz, n. 32, junho 2006., o futebol se impôs com valores aristocráticos relacionados ao ócio, ao adestramento militar e ao sportmanship (cavalheirismo, imparcialidade e lealdade). Ainda segundo o autor:

as camadas menos abastadas da população já tentavam se aproximar dele, um processo que se acentuaria cada vez mais ao longo do tempo. Porém, não era ainda do interesse dos fidalgos que praticavam o football a presença de representantes das classes mais pobres nas suas refinadas atividades de lazer (Capraro, 2006Capraro AM. Do football ao futebol. Revista Nossa História, São Paulo, Editora Vera Cruz, n. 32, junho 2006. p. 53).

Com o decorrer dos anos e as mudanças sociais, características de um período cada vez mais globalizado e voltado para o mercado consumidor (Reis, 2006Reis HHB. Futebol e violência. Campinas: Armazén do Ipê (Autores Associados); 2006.), o futebol passou a ingressar no ramo de espetáculo, tornou-se uma das ferramentas mais rentáveis da indústria do lazer. De acordo com Ribeiro (2007)Ribeiro L. A crise da autonomia no futebol globalizado: a experiência europeia. In: Ribeiro L. (Org). Futebol e Globalização. Jundiaí: Fontoura, 2007., no início dos anos 1990, por exemplo, o futebol inglês passou a ser organizado em moldes completamente empresariais, aprofundou bastante a relação do esporte com a televisão. Ainda de acordo com o pesquisador, “a espetacularização do futebol é a expressão do papel que a mídia – em especial a televisiva – assumiu nos últimos anos, mundializando o espetáculo esportivo” (Ribeiro, 2007Ribeiro L. A crise da autonomia no futebol globalizado: a experiência europeia. In: Ribeiro L. (Org). Futebol e Globalização. Jundiaí: Fontoura, 2007. p. 53).

Não há dúvidas sobre a importância do papel da mídia enquanto propulsora da espetacularização do futebol, tendo em vista principalmente que ela observou a rentabilidade do esporte, que esse passou a movimentar bilhões de dólares com a organização de competições, venda de jogadores, bem como com o aumento significativo de patrocinadores e investimentos.

Aderindo a essa lógica empresarial, os clubes passaram a agir como empresas dispostas a negociar jogadores, direitos de transmissão, marca etc. Os clubes movimentam cifras que interferem significativamente na economia nacional e internacional. De acordo com Proni e Zaia:

(...) se a gestão profissional do esporte-espetáculo já vinha exigindo uma revisão de mentalidade dos dirigentes, agora o que se impunha era a conversão do time de futebol em empresa capitalista inserida em um mercado regulado, mas bastante competitivo (Proni e Zaia, 2007Proni MW, Zaia FH. Gestão empresarial do futebol num mundo globalizado. In: Ribeiro L. (Org). Futebol e Globalização. Jundiaí: Fontoura, 2007. p. 22).

Em se tratando de atualidades e relações empresariais, os benefícios têm um sinônimo: acúmulo de capital financeiro. Ao transportar essa lógica empresarial para o artigo aqui descrito, essa relação está presente entre os clubes de futebol e a mídia, haja vista que, mesmo diante da expansão de veículos midiáticos (televisão e internet), a transmissão dos jogos de futebol ainda continua bastante usada pela mídia radiofônica. A inserção do esporte como um complexo “econômico-cultural-esportivo-midiático” auxiliou na mercantilização dos clubes de futebol, que, por exemplo, passaram a receber memoráveis quantias pela transmissão de seus jogos. Segundo dados do balanço financeiro do Corinthians – time com maior receita do Brasil desde 2009 –, o clube teve um faturamento de 184 milhões e 39 mil reais, em 2011, sem contar a transferência de atletas. Desse total faturado, 62% – pouco mais de 112 milhões de reais – vieram da cessão dos direitos de transmissão televisiva (Brittos e Santos, 2012Brittos VC, Santos AD. O que seria do futebol sem a televisão? Jornal Observatório da Imprensa, 24 julho 2012. Disponível em: <http://www.observatoriodaimprensa.com.br/news/view/ed704_o_que_seria_do_futebol_sem_a_televisao>. Acesso em 24 setembro 2012.
http://www.observatoriodaimprensa.com.br...
).

Partindo do pressuposto de que tanto a televisão quanto o rádio transmitem partidas de futebol, embora as agremiações sejam pagas apenas por direitos televisivos, problematizamos o artigo a partir da seguinte questão: sendo a difusão dos jogos um produto também das emissoras de rádio, deveriam os clubes receber uma contrapartida financeira pelos direitos de transmissão?

Para responder essa questão, usamos o procedimento de revisão bibliográfica, análise documental de leis vigentes no esporte brasileiro e do estatuto da Fifa (Fédération Internationale de Football Association, entidade diretora do futebol mundial), bem como a análise das notícias divulgadas no jornal paranaense Gazeta do Povo, referentes à tentativa de cobrança pela transmissão radiofônica de jogos de futebol, pretendida pelo Clube Atlético Paranaense em 2008 (Gazeta do Povo, 2008Gazeta do Povo. 11 julho 2008. Disponível em: <http://www.gazetadopovo.com.br/esportes/conteudo.phtml?id=755463>. Acesso em: 05 julho 2012.
http://www.gazetadopovo.com.br/esportes/...
). O caso em questão foi tratado de maneira especial no decorrer do texto, tendo em vista ser pioneira a tentativa do clube paranaense de cobrar das rádios uma taxa pela transmissão de seus jogos.

O jornal Gazeta do Povo foi escolhido por representar uma grande fonte de informações referentes ao assunto em questão; além disso, o periódico tem bastante representatividade em relação ao povo paranaense.

A mídia radiofônica

A trajetória do rádio acompanhou o país em praticamente todo o século XX. Da mesma maneira que o Brasil começava a se estruturar no início do século, o rádio também apresentava seus primeiros indícios de organização. Quando se iniciou a radiodifusão no país, por meio da Rádio Sociedade do Rio de Janeiro e seus fundadores – Roquette Pinto e Henry Morize –, a ideia inicial era que a emissora tivesse um cunho somente educativo, de “levar a cada canto um pouco de educação, de ensino e de alegria” (Ortriwano, 1985Ortriwano GS. A Informação no rádio: os grupos de poder e a determinação dos conteúdos. São Paulo: Summus Editorial, 1985., p. 14). Mas a autora revela que o rádio nasceu em um meio de elite, e não de massa, devido ao fato de que se dirigia a quem tivesse poder aquisitivo para mandar buscar no exterior os caros aparelhos receptores. Edileuza Soares (1994)Soares E. A bola no ar - o rádio esportivo em São Paulo. São Paulo: Summus; 1994. corrobora a posição de Ortriwano quando relata que até o início da década de 1930 o rádio era sustentado por pessoas que tinham condições de se associar às emissoras, por isso diz-se que o rádio também era um meio, em seu início, vinculado à elite. Porém, quando Getúlio Vargas assumiu a presidência em 1930, permitiu o uso de publicidade, o que traçou novos rumos para a radiodifusão brasileira (Haussen, 2004Haussen DF. Rádio brasileiro: uma história de cultura, política e integração. In: Barbosa Filho; Piovesan; Beneton (Org.). Rádio-sintonia do futuro. São Paulo, Paulinas, 2004. p. 51-62.). A autora relata, ainda, que as alterações na legislação agiram no padrão do rádio dos anos 1930, que se caracterizava por programações musicais e eruditas; e que a chegada das agências de publicidade incrementou a programação das emissoras, tornou o rádio um veículo de comunicação comercial. E foi nesse momento de transição do meio elitista para o popular que o futebol foi inserido com produto radiofônico (Capello, 2011Capello GH. Um encontro (histórico) entre o rádio e futebol naconstituição cultural brasileira. In: ENCONTRO NACIONAL DA HISTÓRIA DA MÍDIA, 8., 2011. Guarapuava. Anais... Guarapuava: Unicentro, 2011.).

A partir do momento em que se autorizava a publicidade no rádio, tornou-se necessária a reformulação da programação das emissoras e a criação de gêneros que atingissem a massa. Passado o momento de inserção do futebol na classe trabalhadora e sua crescente apreciação pelo referido grupo social, o esporte passou a ser usado como ferramenta para atrair maiores níveis de audiência, contribuiu para que o radiojornalismo fosse um dos primeiros gêneros a se firmar no rádio (Bezerra, 2008Bezerra PRM. O Futebol Midiático: Uma reflexão crítica sobre o jornalismo esportivo nos meios eletrônicos. 2008. 118f. Dissertação(Mestrado)-Curso de Comunicação. Faculdade Cásper Líbero, São Paulo, 2009.).

A primeira transmissão radiofônica de um jogo de futebol no Brasil gerou controvérsias. Para Soares (1994)Soares E. A bola no ar - o rádio esportivo em São Paulo. São Paulo: Summus; 1994., ocorreu em 1931, no confronto entre as seleções paulista e carioca, com locução de Nicolau Tuma. Em contrapartida, segundo a historiadora Lia Calabre o primeiro jogo ocorreu em 1927, também numa disputa entre as seleções paulista e carioca (Bezerra, 2008Bezerra PRM. O Futebol Midiático: Uma reflexão crítica sobre o jornalismo esportivo nos meios eletrônicos. 2008. 118f. Dissertação(Mestrado)-Curso de Comunicação. Faculdade Cásper Líbero, São Paulo, 2009.).

Independentemente da precisão cronológica, a primeira transmissão radiofônica de um jogo de futebol brasileiro gerou pelo menos uma grande consequência: o sucesso da parceria rádio-futebol. Ainda segundo Bezerra (2008)Bezerra PRM. O Futebol Midiático: Uma reflexão crítica sobre o jornalismo esportivo nos meios eletrônicos. 2008. 118f. Dissertação(Mestrado)-Curso de Comunicação. Faculdade Cásper Líbero, São Paulo, 2009., de um lado tinha-se o rádio, que precisava se transformar em veículo de massa para conseguir anúncios de empresas; e do outro, o futebol que, para sustentar os novos gastos oriundos da profissionalização, necessitava de jogos com grandes públicos pagantes.

Durante muitos anos o rádio foi o meio de comunicação mais próximo que o brasileiro tinha das narrações esportivas. Porém, a partir de 1950 houve o processo de inserção da televisão, como veículo de transmissão midiática, destinada a grupos empresariais detentores de capital suficiente para investir em um meio inovador e de pouco acesso. Porém, como todos os meios de comunicação, suas adaptações foram progressivas e, ao pensarmos na transmissão dos jogos de futebol, de acordo com Madrigal (2009)Madrigal DE. Futebol Narrado no Rádio e na Televisão: as vozes da paixão brasileira. 2009. 81f. Dissertação (Mestrado)-Curso de Comunicação. Universidade Anhembi Morumbi, São Paulo, 2009, a dificuldade de transmitir os jogos ao vivo pela televisão foi um dos principais fatores que causaram a hegemonia da transmissão radiofônica. Além disso, em uma época em que 60% do Brasil não dispunham de redes de eletrificação, a dispensa de fios e tomadas por parte dos rádios conferiu uma enorme vantagem competitiva em relação à televisão (Zucoloto, 2004Zucoloto VRM. As transformações da noticia de rádio pós-televisão. Estudos em Jornalismo e Mídia, Florianópolis 2004;1(1):34-45.).

A autora Lia Calebre (2004)Calebre L. A Era do Rádio. 2 ed Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor; 2004., em seu livro A Era do Rádio, relata que ao longo da década de 1950 o rádio tornou-se um objeto acessível à grande maioria da população e, nessa mesma época, tinha início o processo de lançamento e valorização da televisão no Brasil. Nesse período, os programas que fizeram sucesso no rádio transferiram-se para a televisão, o que culminou com a mudança da programação radiofônica.

Há de se destacar que programas contemporâneos à narração esportiva – como radioteatro, radionovela e grandes musicais, por exemplo –, foram extintos, ao passo que a narração esportiva perdura do início da década de 1930 até os dias atuais.

Entretanto, a partir de alguns fatores, como a popularização da televisão e o desenvolvimento de novas tecnologias, o rádio começou a perder sua hegemonia na transmissão dos espetáculos esportivos. As narrações televisivas, ao vivo, contribuíram ainda mais para a popularização do futebol e para o crescimento da narração esportiva. Esse foi um fato negativo para o rádio, pois grande parte dos anunciantes passou a investir na televisão e, junto com eles, migraram os principais profissionais das transmissões radiofônicas (Monteiro, 2007Monteiro GF. A singularidade da comunicação pública. In: DUARTE, J. (Org.). Comunicação pública-estado, mercado, sociedade e interesse pública. São Paulo: Atlas, 2007. p. 34-46.).

Haussen (2004)Haussen DF. Rádio brasileiro: uma história de cultura, política e integração. In: Barbosa Filho; Piovesan; Beneton (Org.). Rádio-sintonia do futuro. São Paulo, Paulinas, 2004. p. 51-62. afirma que, além de agregar novos serviços a sua programação, o rádio procurou acentuar sua proximidade com a comunidade regional. Ainda segundo a autora, se a globalização e a tecnologia trouxeram cada vez mais informações em escala mundial, coube justamente ao rádio, devido a suas características inerentes, promover as informações locais.

Após exposta a importância e inovação da transmissão radiofônica para a manutenção do espetáculo esportivo, buscamos na legislação brasileira tópicos que legalizam ou não a cobrança da referida transmissão.

A legislação na transmissão radiofônica no futebol: Lei Pelé x Estatuto da Fifa

Dentre as diversas intervenções estatais no futebol, destacamos a Lei 9.615/98 (Lei Pelé), que regulamenta o esporte brasileiro e faz alusão ao tema aqui exposto – o direito de negociação da transmissão dos eventos esportivos. A referida lei instituiu as normas gerais do desporto e, em seu artigo 42, expõe que:

Art. 42. Às entidades de prática desportiva pertence o direito de negociar, autorizar e proibir a fixação, a transmissão ou retransmissão de imagem de espetáculo ou eventos desportivos de que participem.

§ 1.°. Salvo convenção em contrário, vinte por cento do preço total da autorização, como mínimo, será distribuído, em partes iguais, aos atletas profissionais participantes do espetáculo ou evento.

§ 2.°. O disposto neste artigo não se aplica a flagrantes de espetáculo ou evento desportivo para fins, exclusivamente, jornalísticos ou educativos, cuja duração, no conjunto, não exceda de três por cento do total do tempo previsto para o espetáculo.

§ 3.°. O espectador pagante, por qualquer meio, de espetáculo ou evento desportivo equipara-se, para todos os efeitos legais, ao consumidor, nos termos do art. 2.° da Lei n.° 8.078, de 11 de setembro de 1990 (Brasil, 24 de março de 1998Brasil. Lei 9.615, de 24 de março de 1998. Institui normas gerais sobre desporto e dá outras providências. Brasília, 1998. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9615consol.htm>. Acesso em 24 setembro 2012.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Lei...
, artigo 42, parágrafo 3.° da Lei 9.615/98).

A lei aponta que às entidades de práticas desportivas pertence o direito de negociar a transmissão dos jogos de futebol. Entretanto, o texto contempla a imagem do espetáculo esportivo sem fazer referência às questões de áudio e voz. O inciso XXVIII do artigo 5° da Constituição Federal (Brasil, 1988Brasil. Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em 5 de outubro de 1988. Emendas constitucionais de revisão. Brasília, 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil03/Constituicao/Constituicao.htm>. Acesso em 24 setembro 2012.
http://www.planalto.gov.br/ccivil03/Cons...
) menciona “a proteção às participações individuais em obras coletivas e à reprodução da imagem e voz humanas, inclusive em atividades desportivas”. No entanto, essa garantia é fornecida aos jogadores de futebol que, segundo o texto original do artigo 42 da Lei Pelé, têm direito a 20% do valor recebido pela transmissão do espetáculo esportivo. Ou seja, por qualquer um dos meios o jogador de futebol está resguardado, pela legislação, em relação ao seu pagamento devido ao uso de sua imagem e/ou voz.

A Lei Pelé surgiu como uma lei inovadora em alguns parâmetros, como, por exemplo, a criação do clube-empresa. Entretanto, com a realização da Copa do Mundo de 2014 e das Olimpíadas de 2016, alguns pontos – dentre eles o embate entre Fifa e entidades de práticas desportivas –, quanto ao pagamento pela transmissão radiofônica dos jogos de futebol, não estavam definitivamente contemplados na legislação brasileira, de maneira a amparar igualmente os envolvidos. Sendo assim, a Câmara dos Deputados aprovou, em 22 de fevereiro de 2011, a medida provisória 502/2010, que altera a Lei Pelé. Essa medida culminou na Lei 12.395/2011, publicada em 16 de fevereiro, que modificou a Lei Pelé; alterou a Lei 10.891/2004 (Bolsa-Atleta); criou os programas Atleta Pódio e Cidade Esportiva; e revogou a Lei 6.354/76 (Atleta Profissional de Futebol).

Apesar de ter sido aprovada em plenário, em 15 de dezembro de 2010 a Lei retornou à Câmara dos Deputados por ter recebido uma emenda do relator e senador Álvaro Dias (PSDB-PR). Destacamos a medida, que se refere à manutenção do direito dos profissionais credenciados pelas associações de cronistas esportivos de acesso às praças, estádios e ginásios desportivos em todo o território nacional. Segundo o próprio senador:

A emenda que apresentei, e que foi acatada pelo governo federal ao sancionar o projeto, confere aos cronistas esportivos a possibilidade de frequentar todas as praças esportivas do País, além do direito de terem um local adequado pra o exercício da sua atividade profissional. Acredito que a aprovação da Lei com esta emenda representou uma conquista para os cronistas desportivos do Brasil. Sob alegação de que no mundo todo cobra-se das emissoras de rádio direito de arena para transmissão dos espetáculos esportivos, principalmente os jogos de futebol, houve forte pressão no Congresso, na época da votação da Lei Pelé, para que fosse aprovado aqui no Brasil o mesmo tipo de cobrança. Se a lei fosse promulgada como se queria, as emissoras de rádio seriam obrigadas a pagar pela transmissão de campeonatos estaduais, Brasileirão, entre outros. A partir da aprovação da minha emenda, foi suprimido da Lei Pelé este dispositivo. Acredito que esta foi uma justa homenagem prestada ao rádio brasileiro, que é o principal promotor dos eventos esportivos no País (Dias apudSenador Álvaro Dias, 17 de março de 2011Senador Álvaro Dias. Lei Pelé com emendas de Alvaro Dias é sancionada por Dilma Rousseff. 17 março 2011. Disponível em:<http://www.senadoralvarodias.com/noticias/visualizar/3119>. Acesso em 24 setembro 2012.
http://www.senadoralvarodias.com/noticia...
).

Quanto às transmissões dos espetáculos esportivos, a Lei 12.395/2011, no seu artigo 42 dispõe que:

Pertence às entidades de prática desportiva o direito de arena, consistente na prerrogativa exclusiva de negociar, autorizar ou proibir a captação, a fixação, a emissão, a transmissão, a retransmissão ou a reprodução de imagens, por qualquer meio ou processo, de espetáculo desportivo de que participem.

§ 1° Salvo convenção coletiva de trabalho em contrário, 5% (cinco por cento) da receita proveniente da exploração de direitos desportivos audiovisuais serão repassados aos sindicatos de atletas profissionais, e estes distribuirão, em partes iguais, aos atletas profissionais participantes do espetáculo, como parcela de natureza civil.

§ 2° O disposto neste artigo não se aplica à exibição de flagrantes de espetáculo ou evento desportivo para fins exclusivamente jornalísticos, desportivos ou educativos, respeitadas as seguintes condições:

I - a captação das imagens para a exibição de flagrante de espetáculo ou evento desportivo dar-se-á em locais reservados, nos estádios e ginásios, para não detentores de direitos ou, caso não disponíveis, mediante o fornecimento das imagens pelo detentor de direitos locais para a respectiva mídia;

II - a duração de todas as imagens do flagrante do espetáculo ou evento desportivo exibidas não poderá exceder 3% (três por cento) do total do tempo de espetáculo ou evento;

III - é proibida a associação das imagens exibidas com base neste artigo a qualquer forma de patrocínio, propaganda ou promoção comercial (Brasil, 16 de março de 2011Brasil. Lei 12.395, de 16 de março de 2011. Institui normas gerais sobre desporto e dá outras providências. Brasília, 2011. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil03/Ato2011-2014/2011/Lei/L12395.htm>. Acesso em 24 setembro 2012.
http://www.planalto.gov.br/ccivil03/Ato2...
, artigo 42, parágrafo 3°. Lei 12.395/2011).

Podemos perceber que, apesar das modificações, não foi inserido termo que concedesse às entidades esportivas o direito de cobrar pelas transmissões radiofônicas dos jogos de futebol. Essa decisão foi comemorada pela Associação Brasileira de Rádios e Televisão e, segundo o então presidente da Abert, Emanuel Carneiro, em reportagem publicada no site da associação, “A aprovação da medida foi importante porque garante um direito fundamental das emissoras de rádio e, por consequência, a ampla divulgação dos eventos esportivos” (Carneiro apudAbert, 2010Abert. Câmara aprova projeto que mantém gratuidade de transmissão esportiva pelas rádios. 2010. Disponível em: <http://www.abert.org.br/site/index.php?/noticias/todas--noticias/direito-de-arena-garantido.html>. Acesso em 05 julho2011.
http://www.abert.org.br/site/index.php?/...
).

Entretanto, a gratuidade da transmissão radiofônica dos jogos de futebol não é adotada em muitas organizações externas ao esporte brasileiro. A Fifa tem no seu estatuto um artigo que lhe confere o direito de exclusividade de radiodifusão e transmissão dos eventos sob sua jurisdição. O artigo 49, contemplado no capítulo VII do Estatuto da instituição, relata que:

A Fifa, seus membros associados, as confederações e os clubes detêm os direitos exclusivos de radiodifusão e transmissão dos eventos sujeitos à sua respectiva jurisdição através de qualquer método audiovisual e sonoro de transmissão – seja ao vivo, em videotape ou compacto. O Comitê Executivo decidirá sobre o uso dos direitos de acordo com os estatutos e regulamentos das respectivas confederações. As disposições para a implantação desse artigo estão contidas nos regulamentos especiais redigidos pelo Comitê Executivo, que deve, em particular, decidir sobre os direitos e as obrigações resultantes do uso internacional e transmissão de imagens de televisão entre os donos dos direitos e outras associações nacionais (França, 8 de junho de 1998França. Estatuto Fifa, de 08 de junho de 1998. Paris, 1998. Disponível em: <http://itabi.infonet.com.br/fsf/images/legislacao/estatuto_fifa.pdf>. Acesso em: 07 julho 2011.
http://itabi.infonet.com.br/fsf/images/l...
, artigo 49, Estatuto da Fifa).

Diferentemente do que ocorre na Lei Pelé, o estatuto da Fifa adiciona a radiodifusão como um dos direitos exclusivos da entidade. O tema foi abordado no 37° Congresso da Associação Brasileira de Cronistas Esportivos, no painel “Emissoras de Rádio e a Copa de 2014”; e o palestrante Claudio Carneiro, vice-presidente da Rádio Itatiaia (MG), alertou para a necessidade de conhecer as regras impostas pela FIFA e apontou para uma ação conjunta entre as rádios, no sentido de estabelecer um maior poder de negociação junto à entidade.

Como visto anteriormente, a cobrança pelos direitos de transmissão radiofônica dos jogos de futebol é um tema que vem sendo discutido entre as partes interessadas desde que foi sancionada a Lei Pelé.

A seguir, apresentamos o caso do Clube Atlético Paranaense como forma de exemplificar a relação entre clube de futebol, rádio e legislação. Em 2008, o clube tentou cobrar uma contrapartida financeira pela cessão dos direitos de transmissão radiofônica do campeonato brasileiro do mesmo ano e gerou um intenso debate entre cronistas esportivos, juristas e gestores.

O caso do Clube Atlético Paranaense x rádios locais

Em 10 de abril de 2008, a diretoria do Clube Atlético Paranaense publicou em seu site uma nota e informou que, a partir de 10 de maio do mesmo ano – início do Campeonato Brasileiro –, as emissoras de rádio interessadas em transmitir os jogos do clube deveriam pagar uma contrapartida financeira. Segundo a nota, todas as partidas disputadas pelo Atlético, fosse na condição de mandante ou visitante, deveriam ser compradas pelas equipes de rádio. Os valores cobrados, em qualquer estádio brasileiro, seriam de R$ 15.000 por jogo ou R$ 456.000 pelo pacote com as 38 partidas do campeonato.

Conforme a nota, a cobrança pela cessão dos direitos não se aplicava aos flagrantes do evento, mas à transmissão integral. Com isso, o clube não estaria em discordância com o acesso à informação e à liberdade de imprensa. Segundo Luciana Pombo, então diretora de comunicação do clube, em reportagem do jornal Gazeta do Povo, a medida não passava de uma tendência e já teria sido abordada em uma reunião do Clube dos 13,1 1 Clube dos 13 é o nome dado à associação dos clubes mais populares e tradicionais do país. Ele surgiu em 1987 devido a uma crise na CBF (Confederação Brasileira de Futebol) que decidiu não fazer o Campeonato Brasileiro daquele ano. Por iniciativa de Carlos Miguel Aidar – presidente do São Paulo Futebol Clube –, os 13 clubes mais populares e tradicionais daquela época decidiram se unir e fazer o campeonato. Foram eles: São Paulo, Corinthians, Palmeiras, Santos, Flamengo, Vasco da Gama, Botafogo, Fluminense, Atlético Mineiro, Cruzeiro, Internacional, Grêmio e Bahia. Com o passar dos anos mais clubes entraram para a Associação: Atlético Paranaense, Coritiba, Goiás, Guarani, Portuguesa, Sport e Vitória. Atualmente são 20 os clubes pertencentes à Associação. em que a possibilidade teria sido aventada.

Ainda de acordo com a reportagem do jornal, a medida não seria inédita. No início de 2008, a Associação de Clubes de Futebol Profissional de Santa Catarina tentou exigir das rádios locais a cessão de espaço comercial em troca do uso das cabines de rádio. Uma maneira disfarçada de cobrar pelos direitos de transmissão. Entretanto, a medida foi barrada e a juíza Marivoni Koncikoski Abreu, da 1ª Vara Cível de Florianópolis, concedeu liminar favorável à Associação Catarinense de Emissoras de Rádio e Televisão (Acert) e garantiu a transmissão dos jogos pelas rádios locais.

No caso do Clube Atlético Paranaense, o grande debate em torno da cobrança pela cessão dos direitos de transmissão radiofônica dos jogos centrava-se na interpretação da lei específica vigente (Lei Pelé), sobretudo no que diz respeito ao termo “imagem”. O artigo 42 da lei prevê que: “Às entidades de prática desportiva pertence o direito de negociar, autorizar e proibir a fixação, a transmissão ou retransmissão de imagem de espetáculo ou eventos esportivos de que participem” (Brasil, 24 de março de 1998Brasil. Lei 9.615, de 24 de março de 1998. Institui normas gerais sobre desporto e dá outras providências. Brasília, 1998. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9615consol.htm>. Acesso em 24 setembro 2012.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Lei...
, artigo 42, Lei 9.615/98).

Para os diretores do Atlético, a imagem seria um conceito além da percepção visual. Segundo Luciana Pombo, “o Atlético entende que a marca é a imagem” e, sendo assim, o clube teria direito de fazer tal cobrança. Porém, essa visão não foi compartilhada de forma unânime. Segundo Rodrigo Xavier Leonardo, então professor de direito civil da Universidade Federal do Paraná, em reportagem do jornal Gazeta do Povo, “não se capta a imagem, o locutor – com a atividade pessoal dele – vê um espetáculo e relata o que está vendo. O que transmite não é o jogo, mas o relato do locutor. O objetivo da transmissão é a leitura do locutor sobre a realidade”.

A medida atleticana logo foi criticada pela Associação de Cronistas Esportivos do Paraná (Acep). Para Isaías Bessa, então presidente da Acep, em reportagem do jornal Gazeta do Povo, “isto é um absurdo completo. Estamos indignados e já provocou descontentamento em todo o país. Porém, é uma questão que a Abrace (Associação Brasileira de Cronistas Esportivos) vai avaliar através de seu departamento jurídico”.

Dias depois da divulgação da nota de cobrança, a Abrace emitiu um comunicado oficial em seu site e repudiou a decisão tomada pela diretoria atleticana. No comunicado, o então presidente da Associação, Anderson Maia Nogueira, lamentou a atitude do CAP:

Esperamos que o bom senso prevaleça, a diretoria do Clube Atlético Paranaense reconsidere a sua decisão contida em sua informação e reconheça que o rádio esportivo brasileiro teve e tem significativa importância em toda a vida do Clube Atlético Paranaense e não merece ser penalizado por ter ajudado a fazer a história deste grande clube brasileiro (Nogueira apudFuracão.com, 11 de abril de 2008Furacão.Com. Abrace repudia cobrança pela transmissão radiofônica. 11 abril 2008. Disponível em: <http://www.furacao.com/materia.php?cod=25419>. Acesso em: 05 julho 2011.
http://www.furacao.com/materia.php?cod=2...
).

Apesar das críticas, alguns órgãos representativos de crônica esportiva se mostraram favoráveis à cobrança pelos direitos de transmissão radiofônica. A Aceesp (Associação de Cronistas Esportivos do Estado de São Paulo) publicou, em 16 de abril, um comunicado oficial em que se colocou a favor da cobrança atleticana. Segundo o então presidente, Ricardo Capriotti, a proposta de cobrança não era ilegal, era feita em outros países. Entretanto, em contrapartida, o clube deveria dispor de condições favoráveis para o cumprimento das funções dos profissionais da imprensa.

A diretoria do Atlético procurou se defender e em 15 de abril de 2008 esclareceu algumas questões sobre o assunto em uma entrevista coletiva. O então presidente do conselho deliberativo do clube, Mario Celso Petraglia, explicou que a fundamentação jurídica estava baseada na Constituição, que as cobranças seriam feitas pelo produto na íntegra sem prejuízos ao acesso à informação e que os valores cobrados tinham sido baseados em uma pesquisa de mercado. Segundo Petraglia:

Nós fizemos um estudo de mercado com os quatro segmentos: TV, rádios, jornais e internet. A TV pagava R$ 10 milhões em 1996. Hoje, paga R$ 320 milhões entre aberta e fechada para o Brasileirão. Ano passado, dos R$ 40 bilhões de faturamento em mídia, a TV ficou com 50%, ou seja, R$ 20 bilhões. As rádios faturaram de 3% a 4% do todo e em torno de 6% a 7% do que a TV faturou (…) A valorização virá na sequência. As rádios cobram dos anunciantes, os custos repassam para os produtos. Hoje, os clubes absorvem sozinhos os custos e dão esse produto gratuitamente. No momento que isso passa a ser cobrado, a valorização virá na sequência, foi assim na TV (Petraglia apudGlobo Esporte.com, 15 de abril de 2008Globo Esporte.Com. Clube justifica cobrança das rádios. 15 abril 2008. Disponível em: <http://globoesporte.globo.com/ESP/Noticia/Futebol/AtleticoParanaense/0,MUL402693-4407,00.html>. Acesso em: 05 julho 2012.
http://globoesporte.globo.com/ESP/Notici...
).

Nessa competição entre rádios e clube, o Atlético perdeu a primeira disputa em 18 de abril de 2008. A juíza Nilce Regina, da 5a Vara Cível de Curitiba, concedeu decisão favorável à Rádio Transamérica e eximiu a emissora do pagamento pelos chamados “direitos de arena”. Assim, o clube não poderia cobrar da Rádio Transamérica os R$ 15.000 por jogo, tampouco os R$ 456.000 pelo pacote completo, fosse na condição de mandante ou visitante. Caso o clube desconsiderasse a decisão da justiça, seria punido em R$ 150.000 por partida.

Apesar da decisão desfavorável, o Atlético teve uma pequena vitória dois dias depois. As emissoras de rádio de Curitiba firmaram um boicote ao Clube Atlético Paranaense, em que não seriam transmitidos na íntegra os jogos do clube. Seria apenas informado o placar e seriam feitas algumas entrevistas. Entretanto, a Rádio Mais se recusou a aderir ao boicote e informou que transmitiria o jogo de 20 de abril de 2008, o que acabou incentivando outras emissoras a fazerem o mesmo. Por fim, nenhuma emissora deixou de fazer a transmissão completa.

Apesar da breve vitória, a decisão que culminaria com o fim do embate veio alguns dias depois. Em 30 de abril de 2008, apenas 20 dias depois do primeiro comunicado do clube, a Associação Brasileira de Emissoras de Radiodifusão (Abert) e a Associação das Emissoras de Radiodifusão do Paraná (Aerp) conseguiram uma liminar que liberava todas as suas afiliadas da cobrança do Atlético, para transmitir as partidas do clube no Campeonato Brasileiro de 2008. A liminar beneficiou mais de 275 emissoras só no Paraná.

O Atlético impôs recurso contra a primeira decisão da juíza Nilce Regina Lima, em favor da Rádio Transamérica. Entretanto, em 2 de maio o desembargador Guilherme Gomes indeferiu o requerimento do Clube Atlético Paranaense e manteve a liminar que liberava a Rádio Transamérica da contrapartida financeira pelas transmissões radiofônicas. Do mesmo modo, o recurso contra a liminar concedida a Abert e Aerp foi indeferido. Assim, todas as emissoras de rádio vinculadas mantiveram o direito de transmissão gratuita respaldado juridicamente.

Considerações finais

O processo de espetacularização pelo qual passou o futebol brasileiro foi estimulado e posteriormente usado pela mídia para sua rentabilidade financeira. Rádio e televisão observaram no futebol um produto financeiramente rentável, passaram a usá-lo de maneira intensa em suas programações, por meio da venda de cotas publicitárias.

As transmissões de jogos de futebol integram atualmente uma grade extensa de emissoras de televisão e, principalmente, de emissoras de rádio, que compartilham do futebol com seus telespectadores e ouvintes, respectivamente. Entretanto, observamos que somente a mídia televisiva tem a obrigação de pagar pelos direitos de transmissão. O rádio é isento de tal cobrança pelo fato de que a legislação brasileira, pautada na Lei Pelé, faz alusão apenas à cobrança integral do evento devido à imagem nesse meio projetada.

A Lei Pelé aborda apenas a questão da imagem na transmissão dos jogos de futebol, negligencia o áudio e a voz. Ela garante que parte das receitas adquiridas pelo clube com áudio e visual (art. 42) deverão ser distribuídas entre os jogadores, o que está de acordo com o art. 5° da Constituição, ou seja, o direito é dado ao jogador, mas não ao clube. Em uma última mudança da Lei Pelé (MP 502/2010, que culminou na Lei 12.395/11), estava prevista a inserção do áudio como um produto passível de ser negociado pelos clubes, porém, uma emenda proposta pelo senador Álvaro Dias fez com que a adição fosse retirada.

Em 2008, o Clube Atlético Paranaense tentou cobrar o direito de transmissão das rádios e alegou que as emissoras usam a marca do clube para desenvolver o seu produto, as transmissões. Entretanto, o clube perdeu a causa, porque o Poder Judiciário entendeu que a marca (no caso, a imagem) não contempla o áudio. Após a investida da agremiação, uma grande parcela dos cronistas esportivos posicionou-se contrária à atitude do Clube Atlético Paranaense, por considerar que a transmissão radiofônica é um direito adquirido pelas rádios há muitos anos e que ele garante o funcionamento de muitas emissoras. Além disso, a transmissão é defendida como uma forma de divulgação gratuita do futebol.

Com relação a essa gratuidade na divulgação do futebol, defendida pelos cronistas, podemos perceber que, com os novos meios de comunicação, os grandes clubes do futebol brasileiro têm outras opções para divulgar a sua marca, como a televisão (que paga pelos direitos de transmissão dos jogos) e a internet (em que cada clube tem o seu site oficial). Assim, podemos supor que na atualidade o rádio depende mais do futebol do que o futebol do rádio.

Exposto todo esse cenário e entendendo este artigo como propulsor de novas questões e estímulo acadêmico para pensá-las, norteamos em nossas considerações finais e início de novos apontamentos: a Lei Pelé garante o direito ao acesso gratuito à informação esportiva para fins jornalísticos e educativos? As emissoras de rádio usam o futebol para muito além da cobertura jornalística e educativa, transformam o esporte em um produto extremamente rentável? A televisão é obrigada a pagar pelos direitos de transmissão, isso se aplica às rádios? Sendo assim, propomos, ao término deste artigo, um estímulo ao estudo das questões aqui apresentadas não no intuito de finalizar a discussão, mas sim na tentativa de propiciar mais discussões acadêmicas em torno do assunto, principalmente no que se refere à coerente ou incoerente gratuidade da transmissão radiofônica integral dos jogos de futebol no Brasil.

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    Clube dos 13 é o nome dado à associação dos clubes mais populares e tradicionais do país. Ele surgiu em 1987 devido a uma crise na CBF (Confederação Brasileira de Futebol) que decidiu não fazer o Campeonato Brasileiro daquele ano. Por iniciativa de Carlos Miguel Aidar – presidente do São Paulo Futebol Clube –, os 13 clubes mais populares e tradicionais daquela época decidiram se unir e fazer o campeonato. Foram eles: São Paulo, Corinthians, Palmeiras, Santos, Flamengo, Vasco da Gama, Botafogo, Fluminense, Atlético Mineiro, Cruzeiro, Internacional, Grêmio e Bahia. Com o passar dos anos mais clubes entraram para a Associação: Atlético Paranaense, Coritiba, Goiás, Guarani, Portuguesa, Sport e Vitória. Atualmente são 20 os clubes pertencentes à Associação.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Apr-Jun 2016

Histórico

  • Recebido
    11 Jul 2012
  • Aceito
    6 Fev 2013
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