RESUMO
O trabalho relata a experiência da I Oficina sobre Educação Permanente em Saúde (EPS) para Técnicos em Saúde Bucal (TSBs) e Auxiliares em Saúde Bucal (ASBs) de Maringá (PR), organizado pela Universidade Estadual de Maringá e pela Prefeitura Municipal Utilizando uma situação problema, foram realizadas discussões a partir de um caso fictício. Do total de 76 participantes, 37% conheciam a EPS, 29% a realizavam e 94% gostariam de saber mais sobre o assunto. Verificou-se que as informações relacionadas à EPS são restritas, que há grande interesse dos TSBs e ASBs sobre o tema e é de fundamental importância a inclusão destes profissionais nas discussões do processo de trabalho para a qualificação da atenção.
PALAVRAS-CHAVE:
Educação em saúde; Auxiliares de odontologia; Higienistas Dentários
ABSTRACT
The paper reports the experience of the First Workshop on Continuing Education in Health (EPS) for Oral Health Technicians (TOH) and Oral Health Auxiliaries (AOH) of Maringá (Paraná, Brazil), organized by Universidade Estadual de Maringá and City Hall. Using a problem situation, discussions took place from a fictitious case, From a total of 76 participants, 37% knew EPS, 29% performed it and 94% would like to know more. It was found that knowledge about EPS is restricted, there is great interest of TOH and AOH on the subject and is of fundamental importance to include these professionals in discussions of the work process for the qualification of attention.
KEYWORDS:
Health education; Dental auxiliaries; Dental Hygienists
Introdução
A Educação Permanente em Saúde (EPS) é uma estratégia elaborada para o fortalecimento do Sistema Único de Saúde (SUS) a qual visa trabalhar, transformar e qualificar as práticas do setor dentro do quadrilátero formado por gestão, academia, serviço e comunidade, possibilitando, ao mesmo tempo, o desenvolvimento pessoal e o das instituições. Além disso, reforça a relação das ações de formação com a gestão do sistema e dos serviços, com o trabalho da atenção à saúde e com o controle social (BRASIL, 2005BRASIL. Ministério da Saúde. A educação permanente entra na roda: pólos de educação permanente em saúde - conceitos e caminhos a percorrer. Brasília: Ministério da Saúde, 2005.), participa na modificação e melhoria do perfil dos profissionais de saúde e conduz as pessoas envolvidas a pensar, discutir, a envolver-se, com o intuito de repensar e melhorar o processo de trabalho que viveneiam. Ela leva o profissional a reflexões a partir das práticas do trabalho e é destinada ao público multiprofissional. Apesar de ser uma política já implantada, muitos profissionais a desconhecem ou utilizam incorretamente sua nomenclatura (ALMEIDA, 1997ALMEIDA, M.J. Educação permanente em saúde: um compromisso inadiável. Olho Mágico, Londrina, v. 5, n. 14, 1997, p. 41 -47.; CECCIM, 2005CECCIM, R.B. Educação permanente em saúde: desafio ambicioso e necessário, interface - Comunicação, Saúde, Educação, Botucatu, v. 9, n. 16, set. 2004/fev. 2005, p, 161-1 77.).
A EPS fornece oportunidade para o desenvolvimento de diálogos e cooperação entre os profissionais, os serviços e gestores e auxilia as equipes de saúde, fornecendo ferramentas para a realização do seu trabalho, bem como levantamentos de necessidades, e apontando soluções nos processos utilizados (BRASIL, 2005BRASIL. Ministério da Saúde. A educação permanente entra na roda: pólos de educação permanente em saúde - conceitos e caminhos a percorrer. Brasília: Ministério da Saúde, 2005.).
Com base nos conceitos acima, é válido ressaltar o papel importante da equipe auxiliar odontológica para a implementação desta política. O técnico em saúde bucal (TSB) e o auxiliar em saúde bucal (ASB) fazem parte dessas categorias e compõem a equipe de saúde bucal juntamente com o cirurgião-dentista. Eles prestam serviços à população, desenvolvendo atividades e tarefas de menor complexidade odontológica sob supervisão direta ou indireta do cirurgião. Algumas dessas tarefas exigem habilidade e domínio de técnicas que demandam capacidade de observação, juízo e decisão, envolvendo questões de responsabilidade com o ser humano e com a população e, sobretudo, ética profissional (PEZZATO, 1999PEZZATO, L.M. A formação para o pessoal auxiliar em odontologia no Brasil: contribuição ao tema. Ação Coletiva, Brasília, v. 2, n. 1, jan./mar. 1999, p, 35-40.).
A categoria de profissionais auxiliares, TSBs e ASBs, que integram a equipe responsável pela atenção em saúde bucal, tanto na rede pública quanto na privada, é efetivamente pouco reconhecida e valorizada« Na busca por este assunto na literatura, constata-se que o mesmo ainda pouco é estudado.
Portanto, este trabalho tem como objetivo relatar a experiência da I Oficina sobre Educação Permanente em Saúde para TSBs e ASBs realizada no município de Maringá (PR).
Metodologia
A I Oficina sobre Educação Permanente em Saúde para TSBs e ASBs do município de Maringá foi realizada no dia 23 de outubro de 2007, organizada pela Universidade Estadual de Maringá (UEM), em parceria com a Secretaria Municipal de Saúde de Maringá, como uma das ações do Projeto Pró-Saúde, do Curso de Odontologia da UEM. Esta atividade foi desenvolvida durante a Semana de Saúde Bucal, evento realizado anualmente, com organização da Secretaria de Saúde desde 1997, em atendimento à Lei Municipal n° 4.438/1997 que instituiu o evento na última semana de outubro, abrangendo o Dia do Dentista (25 de outubro). O encontro envolve a realização de palestras, conferências e campanhas educativas com os objetivos de promover a saúde bucal e prevenir a incidência de moléstias frequentes entre a população, entre outros. A meta geral da oficina foi sensibilizar a classe odontológica em geral, gestores, TSBs e ASBs sobre a importância da EPS e da utilização desta ferramenta para a resolução de problemas do dia-a-dia, assim como para a interação e integração da equipe de trabalho.
Participaram do evento 75 TSBs e ASBs e l cirurgião-dentista. Como facilitadores das discussões estiveram docentes, discentes, uma assistente social, uma TSB e uma cirurgiã-dentista do município de Maringá, Todos os TSBs e ASBs do município foram convidados para o evento por meio de folders, divulgação na mídia e comunicação interna.
A oficina foi iniciada com uma breve apresentação dos objetivos do evento e das atividades a serem realizadas. Logo após, os participantes foram divididos em grupos de oito a dez pessoas. Cada um trabalhou, a partir de um caso fictício intitulado 'Jardim das Flores', extraído da página 23 do manual do Curso de Formação de Facilitadores de Educação Permanente em Saúde (BRASIL, 2005BRASIL. Ministério da Saúde. A educação permanente entra na roda: pólos de educação permanente em saúde - conceitos e caminhos a percorrer. Brasília: Ministério da Saúde, 2005.), a necessidade da resolução de problemas de uma Unidade Básica de Saúde. Os integrantes dos grupos foram estimulados a pensar, relatar, escutar seus colegas, discutir e apresentar propostas para a solução dos problemas apresentados, buscando valorizar a troca de experiências e a vivência de cada participante. As atividades foram realizadas utilizando uma situação problema baseada na metodologia da problematização, já que se trata de uma metodologia de ensino, estudo e trabalho que pode ser utilizada em situações nas quais os temas estejam relacionados à vida em sociedade (BERBEL, 1998BERBEL, N.A.N. A problematização e a aprendizagem baseada em problemas: diferentes termos ou diferentes caminhos? Interface - Comunicação, Saúde, Educação, Botucatu, v. 2, n. 2, fev. 1998, p. 139-154.). Nesta metodologia são seguidas etapas como: observação da realidade social, concreta, a partir de um tema ou unidade de estudo, com o intuito de identificar dificuldades, carências e discrepâncias de várias ordens que serão transformadas em problemas; refletir sobre as possíveis causas da existência do problema em estudo, etapa dos pontos-chave que leva os participantes a perceber que os problemas de ordem social são complexos, buscando medidas para solucioná-los da melhor maneira possível; organizar as informações para a solução do problema, a teorização, no caso da oficina, e a organização das ideias estabelecidas pelo grupo; criar hipóteses de solução para o problema, como o que é necessário para solucioná-lo e o que realmente precisa ser realizado; e aplicar à realidade, na qual as decisões tomadas deverão ser executadas ou encaminhadas — neste momento, o componente social e político está mais presente.
Após a discussão e apresentação das respostas do caso trabalhado, foi realizada uma palestra com o tema 'Conceito e objetivos da educação permanente cm saúde'. Em seguida, em grande grupo, foram levantadas as estratégias para a melhoria dos serviços de saúde bucal do município de Maringá.
Ao final da oficina foi realizada uma rápida avaliação sobre o seu aproveitamento e o conhecimento e interesse pela EPS dos participantes.
Resultados
Inicialmente, os participantes relataram que são poucos os momentos de encontro e discussão do processo de trabalho dos TSBs e ASBs, e que percebem necessidade de mais reuniões com a equipe de trabalho. Os que gostaram do caso escolhido, opinaram e apontaram várias soluções. Percebcu-se que eles estavam bem à vontade para contribuir e conversar. Após cada grupo responder separadamente as questões referentes ao caso, todos foram convidados para sugerir propostas para a melhoria do serviço.
As estratégias apontadas foram:
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promover a capacitação e o entrosamento entre todos os profissionais da Unidade Básica de Saúde (UBS), incluindo o cirurgião-dentista;
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conscientizar os diretores das UBSs sobre a importância da realização de capacitação dos profissionais, a fim de que possam incentivar a participação;
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utilizar as metodologias ativas nas capacitações, tais como as oficinas e discussões de casos mais relevantes ou complexos com a equipe multiprofissional;
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humanizar o tratamento aos pacientes e o processo de trabalho dos profissionais;
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ampliar o diálogo entre serviço e instituição de ensino superior.
Como resultados da avaliação das atividades, verificou-se que 37% dos participantes conheciam a EPS. Em relação à sua realização na UBS de cada participante, 29% responderam que realizavam, 67% não realizavam e 4% não responderam. Quanto à importância do assunto discutido na oficina, 100% acreditavam ser importante. Quando foram questionados se gostariam de conhecer mais sobre EPS, 94% disseram que sim, 2% que não e 4% não responderam.
Os integrantes da oficina portaram-se de forma ativa e participativa, haja vista as respostas das questões, os relatos nas discussões e a necessidade de expor opiniões. De modo geral, o objetivo da atividade quanto à sensibilização da importância da educação permanente como ferramenta de discussão e melhorias nos processos de trabalho foi alcançado.
Discussão
A EPS, instituída desde 2004, pode ser compreendida como um processo de aprendizagem que se dá no espaço profissional. Ela incorpora ao cotidiano das organizações e ao trabalho o aprender e o ensinar. É proposto que a capacitação dos trabalhadores da saúde tome como referência as necessidades das pessoas, das populações, da gestão setorial e do controle social em saúde, tenha como objetivos a transformação das práticas profissionais e da própria organização do trabalho e seja estruturada a partir da problematização do processo de trabalho ( BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Gestão doTrabalho e da Educação na Saúde. Departamento de Gestão da Educação na Saúde. Política de educação e desenvolvimento para o SUS: caminhos para a educação permanente em saúde - pólos de educação permanente em saúde. Brasília: Ministério da Saúde, 2004.).
As soluções para os problemas locais na definição da EPS são resultados das reflexões e ações coletivas que visam beneficiar tanto os profissionais quanto a população por eles atendidos e pressupõem a transformação das práticas em saúde, além de potencializar o desenvolvimento humano, a capacidade técnica e a busca de transformações pessoais por meio das relações com outros sujeitos (PASCHOAL; MANTOVANI; MÉIER, 2007PASCHOAL, A.S.; MANTOVANI, M.F.; MÉIER, M.J. Percepção da educação permanente, continuada e em serviçopara enfermeiros de um hospital de ensino. Revisa da Escola de Enfermagem da USP, São Paulo, v. 41, n. 3, set. 2007, p. 478-484.).
Neste contexto, é necessário conhecer os motivos pelos quais ainda existe um conhecimento restrito sobre EPS entre os participantes da oficina, e também a dificuldade de adesão aos movimentos de mudança e adoção de novas práticas de trabalho. Percebe-se a necessidade de levar estes profissionais ao seu conhecimento, visando a melhoria do processo de trabalho, visto que a EPS lida com ferramentas e conceitos atuais, como a problematização e aprendizagem significativa. A primeira consiste em refletir sobre determinadas situações, questionando fatos, fenômenos e ideias, de forma a compreender os processos e propor soluções, favorecendo o desenvolvimento de escutas, práticas cuidadoras, nas quais o sujeito é o centro e visto de forma integral. Já a aprendizagem significativa visa promover e produzir sentidos e propõe que a transformação das práticas dos profissionais tenha como alicerce a reflexão crítica sobre o trabalho exercido (BRASIL, 2005BRASIL. Ministério da Saúde. A educação permanente entra na roda: pólos de educação permanente em saúde - conceitos e caminhos a percorrer. Brasília: Ministério da Saúde, 2005.; CECCIM, 2005a).
A EPS, de uma maneira simples e de fácil acesso, leva o profissional a um constante aprendizado aplicável na sua prática diária, Com a I Oficina sobre Educação Permanente em Saúde para a equipe de saúde bucal em Maringá, foi possível sensibilizar atores importantes envolvidos no processo de trabalho da saúde bucal, particularmente os TSBs e ASBs. Além disso, ressaltou-se o papel destes profissionais como produtores de saúde, visto que são considerados por muitos os grandes detentores da produção do cuidado e, muitas vezes, limitados à resolução de problemas e doença (BRASIL, 2005BRASIL. Ministério da Saúde. A educação permanente entra na roda: pólos de educação permanente em saúde - conceitos e caminhos a percorrer. Brasília: Ministério da Saúde, 2005.). Outro ponto positivo que surgiu desta oficina foi a demanda dos profissionais em relação à necessidade e importância das capacitações para os profissionais das UBSs de Maringá.
Outra característica da EPS é que só pode ser desenvolvida em espaços coletivos e equipes de maneira articulada entre as pessoas envolvidas. Desta forma, os diferentes atores podem colocar sobre a mesa suas explicações relacionadas a determinado problema, e o confronto de opiniões possibilita que as suas percepções se transformem, sendo possível estabelecer negociações e construir novos pactos e acordos orientados a objetivos comuns (DESTRO, 1995DESTRO, M.R.P. Educação continuada: visão histórica e tentativa de contextualização. Cadernos Cedes Educação Continuada, Campinas, v. 1, n. 36, 1995, p. 21-27.). Neste aspecto, aos TSBs e ASBs participantes deste estudo levantaram a necessidade dos cirurgiões-dentistas estarem presentes nas discussões dos problemas cotidianos, o que, a partir dos relatos, não foi um fato comumente observado, Além disso, a equipe multiprofissional deveria ser envolvida nesta dinâmica, entretanto, os relatos feitos pelos participantes denunciam o isolamento do cirurgião dos demais membros da equipe- Pode-se também incluir a dificuldade de se trabalhar a gestão participativa, na qual os gestores não têm possibilitado nem apoiado momentos de resolução de problemas e construção coletiva.
Com relação à importância da EPS, todos os entrevistados responderam que é um assunto de grande valia, e a maioria (61%) relatou que, após ter entrado em contato e conhecido esta política, teve uma visão diferente do serviço no local em que trabalha, Para a EPS, não existe a educação de uma pessoa que sabe para uma que não sabe; o que existe, como em qualquer educação crítica e transformadora, são a troca e o intercâmbio, mas deve haver também o 'estranhamento' de saberes e a 'desacomodação' com os saberes e as práticas que estejam vigentes em cada lugar (CECCIM, 2005CECCIM, R.B. Educação permanente em saúde: desafio ambicioso e necessário, interface - Comunicação, Saúde, Educação, Botucatu, v. 9, n. 16, set. 2004/fev. 2005, p, 161-1 77.). Isto não quer dizer que aquilo que já se sabe ou já é feito está errado, mas que para haver ensino-aprendizagem deve-se entrar em um estado ativo de 'perguntação', constituindo uma espécie de tensão entre o que já se sabe e o que há por saber, No decorrer do evento, observou-se que todos os TSBs e ASBs presentes puderam participar, executando e contribuindo ativamente nos discursos, Isso foi conseguido pois se desenvolveu a atividade na forma de oficina, em que cada participante teve seu momento de explanar opiniões e fatos do seu trabalho que julgava importante e ter um produto final construído coletivamente.
Durante o desenvolvimento, foi possível também observar que quando dada a devida importância aos relatos de experiência de cada grupo, notou-se que os TSBs e ASBs sentiam-se valorizados em suas opiniões sobre os assuntos abordados e participavam de forma ativa. Isso leva a acreditar que quando é fornecida a oportunidade de expressar a experiência vivida de forma participativa, o indivíduo sente-se importante e capaz de buscar transformações nas práticas do trabalho. Os TSBs e ASBs muitas vezes não são ouvidos na construção do processo de trabalho, implicando no não alcance do potencial destes profissionais em desenvolver de forma comprometida suas atividades, as quais poderiam ser potencializadas para um cuidado integral, humanizado e resolutivo, com aumento da eficácia e da eficiência da atenção odontológica, contribuindo para o aumento da produtividade, das práticas preventivas e diminuição de tratamentos curativos (ORENHA; ELEUTÉRIO; SALIBA, 1998ORENHA, E.S.; ELEUTÉRIO, D.; SALIBA, NA Organização do atendimento odontológico no serviço público: trabalho auxiliado, produtividade e ambiente físico. Revista de Odontologia da UNESP, São Paulo, v. 27, n. 1, jan./jun. 1998, p. 215-224.; KOVALESKI; BOTNG; FREITAS, 2005KOVALESKI, D.F.; BOING, A.F.; FREITAS, S.F.T. Recursos humanos auxiliares em saúde bucal: retomando a temática. Revista de Odontologia da UNESP, Araraquara, v, 34, n. 4, out./dez. 2005, p. 161-165.).
O exercício dos TSBs no Brasil é supervisionado pelo cirurgião-dentista e sustenta-se no Código de Ética Odontológico, Estes profissionais desenvolvem seu trabalho compondo a equipe de saúde bucal, realizam atividades necessárias à prestação de cuidados no âmbito da promoção, prevenção e recuperação da saúde bucal, amando em serviços públicos e privados. Apesar do Parecer n° 460 do Conselho Federal de Educação, que criou e disciplinou os cursos de Técnico em Saúde Bucal e Auxiliar em Saúde Bucal, ter sido publicado em 1975, esta profissão foi regulamentada somente após 33 anos pela Lei n° 11,889, sancionada em 24 de dezembro de 2008 (BRASIL, 2008BRASIL. Ministério da Saúde. Lei n° 11.889 de 24 de dezembro de 2008. Regulamenta o exercício das profissões de Técnico em Saúde Bucal - TSB e Auxiliar em Saúde Bucal - ASB. Brasília: Ministério da Saúde, 2008.). A regulamentação representa, no que diz respeito ao processo de trabalho em saúde, conquista relevante destes trabalhadores e, também, contribuição significativa para avançar na ampliação do acesso aos serviços odontológicos (ERAZAO; NARVAI, 2011).
Um ponto importante a ser considerado, em relação não só a esses profissionais, mas também a todas as pessoas envolvidas de alguma maneira com o trabalho em saúde, é que a criação do SUS tem provocado muitas mudanças nas práticas do setor. E para que essas alterações sejam realizadas, se fazem necessárias profundas transformações na formação e desenvolvimento dos profissionais da área, o que será possível apenas se forem mudados a forma de educar, cuidar, tratar e acompanhar a saúde dos brasileiros e também os modos de ensinar e aprender (OLIVEIRA, 2007OLIVEIRA, M.A.N. Educação a distância como estratégia para a educação permanente em saúde: possibilidades e desafios. Revista Brasileira de Enfermagem, Brasília, v. 60, n. 5, set./out. 2007, p. 585-589.). Desta maneira, a EPS deve ser compreendida como aprendizagem-trabalho, ou seja, acontece no cotidiano das pessoas e das organizações. Precisa ser realizada a partir dos problemas enfrentados na realidade e levar em consideração os conhecimentos e as experiências que as pessoas trazem em suas vidas. Muito tem sido feito para melhorar a formação dos profissionais de saúde e fortalecer o SUS, Embora a maior parte dessas ações seja realizada de forma isolada e desarticulada, ainda assim provocam alterações na formação e no cuidado em saúde.
Porém, mesmo reconhecendo que a EPS pode ser um grande instrumento para melhorias na área da saúde, se fazem necessários mais esforços por parte dos gestores na implementação desta estratégia por meio das instituições de ensino, serviço e comunidade, uma vez que essa política tem caráter abrangente na busca da qualidade dos serviços de saúde e, consequentemente, na consolidação do SUS.
Na literatura existem poucos trabalhos relacionados à EPS na Odontologia, em especial com TSBs e ASBs, o que demonstra a necessidade de mais disseminação, até mesmo no meio acadêmico, para que surjam outras pesquisas com este tema.
Diante das afirmações, e tendo percebido por meio da oficina o interesse e a participação dos TSBs e ASBs nos assuntos debatidos no evento, sugere-se que a EPS é uma estratégia necessária para promover a integração da equipe multiprofissional e a humanização do atendimento e do processo de trabalho, bem como para fornecer crescimento dos atores envolvidos, levá-los a indagar e pensar em ações para melhorias no modelo que exerce e solucionar problemas que possam surgir no decorrer da sua jornada de trabalho e também os decorrentes da própria comunidade de cada componente da equipe. Quando se tem um trabalho em equipe, ele deve promover o protagonismo de todos os seus integrantes, incluindo o sujeito que recebe os cuidados (CECCIM, 2005CECCIM, R.B. Educação permanente em saúde: desafio ambicioso e necessário, interface - Comunicação, Saúde, Educação, Botucatu, v. 9, n. 16, set. 2004/fev. 2005, p, 161-1 77.). E esta é uma das estratégias promotoras de qualidade nos serviços de saúde. Dentro das melhorias que o trabalho em equipe proporciona, podemos citar: planejamento nos serviços, estabelecimento de prioridades, redução da duplicação dos serviços, geração de intervenções mais criativas, redução de intervenções desnecessárias pela falta de comunicação entre os profissionais e redução da rotatividade, resultando na diminuição dos custos, com a possibilidade de aplicação e investimentos em outros processos (PINHO, 2006PINHO, M.C.G. Trabalho em equipe de saúde: limites e possibilidades de atuação eficaz Ciências e Cognição, v. 8, ago. 2006, p. 68-87.). Entretanto, ainda é um grande desafio colocar em prática o trabalho em equipe, já que muitas vezes é entendido como divisão de trabalho, pela fragmentação do cuidado em diferentes facetas das profissões e áreas. A atuação em grupo ainda não é verificada como uma construção coletiva de saberes, um trabalho em sinergia, ultrapassando os muros dos preconceitos e dos conflitos interpessoais, operacionalizando a transdisciplinaridade com vistas à integralidade da atenção.
Neste contexto, o Curso de Odontologia da UEM tem colocado em prática a EPS na implementação da Clínica Ampliada, que atende os pressupostos da Política Nacional de Humanização, As atividades da Clínica Ampliada iniciaram em 2009 e, desde então, são realizadas reuniões semanais da equipe que compõe a Comissão Permanente de Avaliação da Clínica Ampliada (COPACA) para a avaliação e reorientação do processo de trabalho. Em todos os encontros são levantadas questões de relevância, e buscadas soluções coletivas para os problemas. A COPACA tem gerado respostas para muitas necessidades de mudança e, consequentemente, melhorado a formação do acadêmico e a atenção prestada à comunidade. Apesar dos avanços conseguidos a partir da EPS, é importante ressaltar que o processo lento de construção coletiva depende da maturidade e do comprometimento da equipe de trabalho e requer muita persistência, visão ampliada e entendimento filosófico dos princípios do SUS.
Conclusão
A I Oficina sobre Educação Permanente em Saúde para TSB e ASB no município de Maringá foi um momento importante que verificou pouco conhecimento sobre a EPS por parte dos participantes do evento. Porém, durante o encontro observou-se o grande interesse sobre o assunto e a importância da inclusão dos TSBs e ASBs nas discussões do processo de trabalho para a qualificação da atenção. Conseguiu-se realizar a divulgação da, política de EPS, enfatizando a necessidade e importância de sua implementação, além de iniciar um diálogo entre os atores envolvidos no processo de trabalho, contribuindo para mudanças e melhorias nas práticas do cuidado cm saúde.
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Suporte financeiro: Não houve
Referências
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
18 Ago 2023 -
Data do Fascículo
Apr-Jun 2012
Histórico
-
Recebido
Ago 2011 -
Aceito
Jul 2012