Intervenções para prevenção de quedas em idosos na Atenção Primária: revisão sistemática

Intervenciones para la prevención de caídas de adultos mayores en la Atención Primaria: revisión sistemática

Resumo

Objetivo

Identificar na literatura, nacional e internacional, intervenções eficazes para prevenção de quedas em idosos desenvolvidas no âmbito da Atenção Primária à Saúde e classificá-las tendo por base o Relatório da Organização Mundial da Saúde sobre Prevenção de quedas.

Métodos

Revisão sistemática realizada entre 2019 e 2020, conduzida a partir do guia PRISMA e registrada na PROSPERO (CRD42020149529). Avaliadores independentes consultaram as bases de dados MEDLINE®/PubMed®, Lilacs, Scopus, Cochrane, Web of Science e Embase. Para a busca nas bases, utilizaram os descritores definidos a partir da estratégia PICO: “elderly”, “elder”, “aged”, “aging”, “care”, “education”, “primary health”, “falls” e “prevention”. Utilizou-se a escala PEDro para avaliar a qualidade metodológica dos estudos selecionados. Os resultados foram apresentados de modo a favorecer a comparabilidade entre os estudos incluídos nesta revisão e serem categorizados quanto ao perfil das produções e classificação das intervenções.

Resultados

Identificaram-se 20 artigos elegíveis, sendo 35% (n=8) classificados como alta qualidade metodológica e 25% (n=5) como excelente qualidade. Das intervenções investigadas, 55% (n=11) consistiam em programas de exercício físico, e 45% (n=9) eram multicomponentes, com tempo de duração entre 3 semanas e 12 meses, realizadas por diferentes categorias profissionais. Tais intervenções influenciaram na redução de quedas e na diminuição do medo de cair nos idosos, bem como contribuíram para o fortalecimento muscular, a capacidade motora e a melhora cognitiva.

Conclusão

As intervenções identificadas mostraram-se eficazes no fortalecimento musculoesquelético, na manutenção da funcionalidade geriátrica, na melhoria do equilíbrio e na avaliação de riscos de quedas para promoção do enfrentamento dos mesmos.

Acidentes por quedas; Idoso; Saúde do idoso; Atenção Primária à Saúde

Resumen

Objetivo

Identificar en la literatura nacional e internacional intervenciones eficaces para la prevención de caídas de adultos mayores desarrolladas en el contexto de la Atención Primaria de Salud y clasificarlas con base en el informe de la Organización Mundial de la Salud sobre prevención de caídas.

Métodos

Revisión sistemática realizada entre 2019 y 2020, a partir de la guía PRISMA y registrada en PROSPERO (CRD42020149529). Evaluadores independientes consultaron las bases de datos MEDLINE®/PubMed®, Lilacs, Scopus, Cochrane, Web of Science y Embase. Para la búsqueda en las bases, se utilizaron los descriptores definidos a partir de la estrategia PICO: “elderly”, “elder”, “aged”, “aging”, “care”, “education”, “primary health”, “falls” y “prevention”. Se utilizó la escala PEDro para evaluar la calidad metodológica de los estudios seleccionados. Los resultados fueron presentados a fin de favorecer la comparabilidad entre los estudios incluidos en esta revisión y para que puedan ser categorizados respecto al perfil de las producciones y clasificación de las intervenciones.

Resultados

Se identificaron 20 artículos elegibles, de los cuales el 35 % (n=8) fueron clasificados de alta calidad metodológica y el 25 % (n=5) de excelente calidad. De las intervenciones investigadas, el 55 % (n=11) consistió en programas de ejercicio físico y el 45 % (n=9) fue de multicomponentes, con un tiempo de duración entre 3 semanas y 12 meses, realizadas por diferentes categorías profesionales. Tales investigaciones influyeron en la reducción de caídas y en la disminución del miedo de caer de los adultos mayores, así como también contribuyeron al fortalecimiento muscular, a la capacidad motora y a la mejora cognitiva.

Conclusión

Las intervenciones identificadas demostraron ser eficaces para el fortalecimiento musculoesquelético, la conservación de la funcionalidad geriátrica, la mejora del equilibrio y la evaluación de riesgo de caída para la promoción del afrontamiento de estos.

Accidentes por caídas; Anciano; Salud del anciano; Atención Primaria de Salud

Abstract

Objective

To identify effective interventions for preventing falls in older adults in the national and international literature, developed in primary health care settings, and categorize them based on the World Health Organization’s Report on Fall Prevention.

Methods

A systematic review registered in PROSPERO (CRD42020149529), conducted between 2019 and 2020, according to the PRISMA guidelines. Independent reviewers consulted MEDLINE®/PubMed®, Lilacs, Scopus, Cochrane, Web of Science, and Embase databases. The descriptors “elderly”, “elder”, “aged”, “aging”, “care”, “education”, “primary health”, “falls” and “prevention” were used for the database search, and were defined from the PICO strategy. The PEDro scale was used to evaluate the methodological quality of the selected studies. The results are presented in order to favor comparability among the studies included in this review and categorization regarding the profile of the publications and classification of the intervntions.

Results

Twenty eligible articles were identified, with 35% (n=8) classified as high methodological quality and 25% (n=5) as excellent quality. Among the investigated interventions, 55% (n=11) consisted of physical exercise programs, and 45% (n=9) were multicomponent, with a duration time between 3 weeks and 12 months, implemented by professionals from different disciplines. Such interventions had an impact on reducing falls and decreasing the fear of falling in older adults, as well as contributing to muscle strengthening, motor skills, and cognitive improvement.

Conclusion

The interventions identified proved to be effective in strengthening the musculoskeletal system, maintaining geriatric functionality, improving balance, and assessing the risk of falls to promote better management of these events.

Accidental falls; Aged; Health of the elderly; Primary Health Care

Introdução

Quedas na velhice constituem um problema de saúde pública sério e crescente no contexto mundial. Aproximadamente 30% dos idosos com 65 anos ou mais caem anualmente, resultando em lesões graves, diminuição da mobilidade e perda de independência nas atividades de vida diária.(¹) Nos Estados Unidos, estima-se que, a cada hora, três idosos morrem como resultado de uma queda, e, em 2030, esse número deverá aumentar para sete.(²)

Em outros países, como Canadá, a prevalência de quedas em idosos atinge até 20%. Na Inglaterra, 28,4% dos anciãos relataram ter caído nos últimos 2 anos e, na Irlanda, 19,4% da população mais velha referiram ao menos um episódio de queda em um ano.(³) Já no cenário nacional, a ocorrência de quedas nessa população pode variar de 10% a 35 %, o que expressa índices superiores quando comparados aos dos países desenvolvidos.(¹)

Tal problemática acarreta para as pessoas idosas fraturas, medo de cair novamente e lesões de tecido mole, que podem intensificar o declínio da capacidade funcional, interferindo na qualidade de vida do sujeito.(⁴) Já para os familiares, podem ser necessárias certas mudanças na rotina familiar, uma vez que se requer adaptação das atividades do cotidiano doméstico e da renda familiar, a fim de melhor cuidar do idoso que caiu.(⁵)

Os episódios de quedas repercutem negativamente na administração dos recursos em saúde quando resultam na hospitalização do idoso, tendo em vista que, geralmente, são estas hospitalizações mais prolongadas, com maior quantidade de intervenções terapêuticas, adoção de tratamentos mais complexos e exames mais sofisticados.(⁶)

Acredita-se que a Atenção Primária à Saúde configura-se como a principal porta de entrada para os serviços de saúde, atendendo pessoas também saudáveis, numa perspectiva de integralidade da atenção. Isso implica no compromisso e na responsabilidade dos profissionais em zelar pela manutenção da saúde das pessoas de uma comunidade.(⁷)

Outrossim, a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) e a Organização Mundial da Saúde (OMS) decretaram a Década do Envelhecimento Saudável (2020-2030) e lançaram um manual de orientações sobre a avaliação centrada na pessoa, além de roteiros para o cuidado gerontológico na Atenção Primária.(⁸,⁹) Esse manual encoraja e orienta profissionais da Atenção Primária à Saúde a realizarem ações de promoção da capacidade funcional, manutenção da autonomia e independência e identificação precoce de riscos à saúde da pessoa idosa.

Ainda, percebeu-se uma lacuna de conhecimento relacionada a estudos que apontem intervenções consideradas eficazes para prevenção de quedas em idosos no âmbito da Atenção Primária à Saúde, visto que as produções tendem, geralmente, a analisar os fatores associados desse agravo, e não apontam ações preventivas.(¹,³,⁹) Nessa perspectiva, esta revisão contribui para a disponibilização de evidências científicas, de modo a auxiliar gestores e profissionais de saúde na adoção de estratégias preventivas e na elaboração de políticas públicas mais adequadas e assertivas, que minimizem situações de saúde tão complexas acarretadas por quedas em idosos.

Este estudo objetivou identificar na literatura, nacional e internacional, intervenções eficazes para prevenção de quedas em idosos desenvolvidas no âmbito da Atenção Primária à Saúde e classificá-las tendo por base o Relatório da Organização Mundial da Saúde sobre prevenção de quedas.

Métodos

Trata-se de revisão sistemática da literatura realizada conforme as diretrizes do protocolo Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses (PRISMA) e registrada na International Prospective Register of Systematic Reviews (PROSPERO), sob número CRD42020149529.

Para formulação da pergunta norteadora, utilizou-se a estratégia PICO, composta pelos seguintes elementos: P (População: Idosos); I (Intervenção: intervenções realizadas no âmbito da Atenção Primária à Saúde) e O (Outcomes: prevenção de quedas). Não foi realizada Comparação (C) entre intervenção padrão e as demais. Desse modo, formulou-se a seguinte pergunta norteadora: Quais intervenções realizadas no âmbito da Atenção Primária à Saúde são eficazes para prevenção de quedas em idosos?

Foram incluídos artigos que tratassem de intervenção realizada no âmbito da Atenção Primária à Saúde para prevenção de quedas em indivíduos com idade a partir de 60 anos e que consistissem em estudos dos tipos ensaios clínicos randomizados e quase-experimentais, sem restrição das publicações quanto ao período ou idioma. Consideraram-se intervenções eficazes aquelas que obtiveram resultados significativos na prevenção de quedas em idosos, seja como desfecho primário ou secundário. Foram excluídas cartas ao editor, artigos duplicados e pesquisas que não obtiveram resultado significativo na prevenção de quedas em idosos.

A busca foi realizada durante os meses de julho a outubro de 2020, nas seguintes bases de dados: National Library of Medicine (MEDLINE®/PubMed®), Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (Lilacs), Scopus, Cochrane, Web of Science e Embase. Todas foram consultadas por meio do Portal Periódicos Capes.

Para definir os termos de busca, inicialmente, identificaram-se descritores para cada componente da estratégia PICO, a partir da leitura exploratória de estudos que abordavam a temática. Os descritores utilizados nas bases PubMed®, Scopus, Web of Science e Cochrane foram identificados por meio do Medical Subject Headings (MESH). Para busca na Embase, foram utilizados os termos Emtree, e, na Lilacs, foram identificados por meio da ferramenta Descritores em Ciências da Saúde (Decs).

Assim, para a população estudada, listaram-se termos relacionados à palavra “idoso”. Para a intervenção, foram selecionados termos relacionados à “intervenção para prevenção de quedas na Atenção Primária”. O desfecho retomou os termos relacionados à “prevenção de quedas”, já contemplados no item referente à intervenção. Com a utilização das aspas, os descritores sinônimos foram cruzados, utilizando o operador booleano “OR” e, entre os componentes da estratégia PICO, utilizando o operador booleano “AND” (Apêndice 1).

Foi realizada a leitura dos títulos e dos resumos dos artigos recuperados em cada base de dados, para identificar os estudos que atendessem aos critérios de elegibilidade. Em seguida, analisaram-se os textos completos, com a finalidade de identificar as produções que realmente atendiam à questão da pesquisa. Para garantir maior rigor e confiabilidade ao processo, essas etapas foram realizadas por dois pesquisadores, de forma pareada, que se reuniram para consensuar os artigos elegíveis, e, diante de alguma discordância na seleção dos estudos, um terceiro revisor foi consultado para auxiliar na decisão final.

Um instrumento autoelaborado foi utilizado para coleta de dados relacionados à caracterização dos estudos (autoria, ano e país de publicação; tipo de estudo e amostra) e da intervenção (tempo de duração; tipo e caracterização da intervenção; profissionais envolvidos; população escolhida; variáveis avaliadas e desfechos obtidos).

A qualidade metodológica dos artigos elegíveis desta revisão foi avaliada de acordo com o Physiotherapy Evidence Database (PEDro Scale), para avaliação de ensaios clínicos.(¹⁰)

A escala PEDro consiste em auxiliar e identificar, por meio de 11 critérios de avaliação, quais dos estudos controlados aleatorizados podem ter validade interna (critérios 2 a 9) e conter informação estatística suficiente para que seus resultados possam ser interpretados (critérios 10 e 11). Após aplicação da escala, os estudos são classificados a partir dos escores obtidos da seguinte forma: aqueles com escores entre zero e quatro são considerados de baixa qualidade; de quatro e cinco, são considerados de moderada qualidade; de seis a oito, são considerados de alta qualidade; e se entre nove e dez, são considerados de excelente qualidade metodológica.(¹⁰) Esse instrumento também foi utilizado para a mesma finalidade em outras revisões sistemáticas recentes.(¹¹,¹²)

A fim de favorecer a comparabilidade entre os estudos selecionados, optou-se por extrair informações para caracterização do perfil das pesquisas e das intervenções para prevenção de quedas em idosos na Atenção Primária à Saúde. Essas foram classificadas em programas de exercício físico e em intervenção multicomponentes, tendo por base o relatório da OMS sobre prevenção de quedas de 2007,(¹³) o qual discute a magnitude dessa problemática para o gerencimento dos serviços de saúde e para a pessoa idosa. Então, nesta revisão, as seguintes definições para a classificação da intervenção sobre prevenção de quedas em idosos na Atenção Primária à Saúde foram adotadas: programa de exercício físico consistiu em intervenções que abordassem práticas relacionadas a atividades físicas, sejam elas artes marciais, fortalecimento musculoesquelético, equilíbrio, coordenação ou força, desenvolvidas de maneira sistemática e contínua, com uma padronização do tempo da realização de cada sessão;(¹⁴) já intervenção de multicomponentes esteve relacionada a uma abordagem de múltiplos fatores que podiam desencadear a ocorrência de quedas. Tal categoria englobou as seguintes ações: treino de equilíbrio e de marcha com o uso apropriado de artefatos de apoio; avaliação dos riscos ambientais e sua modificação; revisão dos medicamentos e modificação do que fosse necessário alterar; tratamento dos problemas de visão; oferta de educação e treinamento; tratamento de problemas dos pés e de calçados e tratamento da hipotensão ortostática e de outros problemas cardiovasculares.(¹³)

Resultados

Os estudos identificados nas bases de dados totalizaram 3.885, dos quais 2.857 foram excluídos após leitura de títulos e resumos. Em seguida, foi realizada a leitura na íntegra dos artigos, na qual os pesquisadores excluíram 398 estudos por não apresentarem intervenções com desfechos significativos para prevenção de quedas, e 12 foram eliminados por estarem duplicados nas bases de dados, resultando em uma amostra final de 20 produções (Figura 1).

Figura 1
Fluxograma de identificação e seleção dos artigos para revisão sistemática

Na avaliação da qualidade metodológica, 40% (n=8) das produções foram consideradas de baixa qualidade, obtendo quatro pontos; 35% (n=7) eram de alta qualidade, obtendo oito pontos, e, das produções consideradas de excelente qualidade metodológica, 5% (n=1) obtiveram nove pontos e 20% (n=4) obtiveram dez pontos, conforme apresentado no quadro 1.

Quadro 1
Caracterização das produções científicas incluídas

Autores	País	Tipo de estudo	Amostra	Profissionais envolvidos na intervenção	Tempo de duração da intervenção (meses)	Qualidade metodológica, escala PEDro (pontos)
Serra-Prat et al.(15)	Espanha	ECR	GC: 92 GI: 80	Enfermeiro e educador físico	12	10
Bustamante-Troncoso et al.(16)	Chile	ECR	GI: 70 GC: 70	Enfermeiro	5	8
Kuhirunyaratn et al.(17)	Tailândia	Quase-Experimental	GI: 108 GC: 108	Médicos e fisioterapeutas	6	4
Shumway-Cook et al.(18)	Estados Unidos	ECR	476	Enfermeiro, fisioterapeuta e educação em saúde	12	8
Boongird et al.(19)	Tailândia	ECR	GI: 219 GC: 220	Médico e enfermeiro	12	8
Elley et al.(20)	Nova Zelândia	ECR	GI: 155 GC: 157	Enfermeiro e médico	12	8
Saudi et al.(21)	Egito	Quase experimental, do tipo antes e depois	100	Enfermeiro, médico e fisioterapeuta	12	4
Duckham et al.(22)	Inglaterra	ECR	319	Médico, fisioterapeuta, educador físico e enfermeiro	6	10
Spice et al.(23)	Inglaterra	ECR por cluster	GI: 354 GC: 162	Enfermeiro, médico, educador físico terapeuta ocupacional	12	9
Siegrist et al.(24)	Alemanha	ECR	GI: 222 GC: 156	Fisioterapeuta, médico e educador físico	4	4
Li et al.(25)	China	ECR	669	Medicina e profissional de educação física	6	4
Cristopoliski et al.(26)	Brasil	ECR	5	Educadores físicos	3	8
Silva et al.(27)	Brasil	EC	61	Educador físico e fisioterapeuta	3	8
Gschwind et al.(28)	Nova Zelândia	ECR	153	Educador físico e neurocientistas	6	10
Liu-Ambrose et al.(29)	Canadá	ECR	GI: 143 GC: 172	Fisioterapeutas	12	10
Li et al.(30)	China	ECR	Grupo Tai Chi Chuan: 224 Grupo de intervenção multimodal:223 Grupo de cuidados usuais: 223	Fisioterapeutas e educadores físicos	6	8
Van Ooijen et al.(31)	Alemanha	ECR	GI: 48 GC: 24	Fisioterapeuta e educador físico	12	4
Freiberger et al.(32)	Alemanha	ECR	GI: 222 GC: 150	Educadores físicos	12	4
Nguyen et al.(33)	Vietnã	ECR	GI: 56 GC: 56	Educador físico	6	4
Moura et al.(34)	Brasil	ECR	GI: 18 GC: 18	Fisioterapeuta	4	4

• ECR - Ensaio Clínico Randomizado; GC - Grupo Controle; GI - Grupo Intervenção; PEDro - Physiotherapy Evidence Database

Trata-se de estudos recentes. Os últimos 5 anos, entre 2016 e 2020, compreendem 55% (n=11) das produções. Já entre o período de 2010 a 2015, têm-se apenas 10% (n=2). Quando se verifica o quantitativo de artigos produzidos com a temática durante a primeira década do século 21, identificou-se que 35% das produções datavam desse período. No tocante ao país da realização dos estudos, observou-se predominância de artigos produzidos na Europa, sendo 15% (n=3) na Alemanha, 10% (n=2) na Espanha e 10% (n=2) na Inglaterra, seguidos daqueles da Ásia, dos quais 10% (n=2) são advindos da China, 10% (n=2) da Tailândia e 5% (n=1) do Vietnã, além dos artigos produzidos na América, com 15% (n=3) no Brasil, 5% (n=5) no Chile e 5%(n=1) no Canadá. Os continentes da Oceania e da África tiveram apenas uma publicação cada um, sendo, respectivamente, da Nova Zelândia e do Egito. Quanto às categorias profissionais que realizaram as intervenções, os educadores físicos estiveram presentes em 60% (n=12) dos estudos, fisioterapeutas em 50% (n=10), médicos em 45% (n=9), enfermeiros em 40% (n=8) e terapeuta ocupacional em apenas 5% (n=1) das pesquisas. Em relação ao tempo de duração das intervenções, 40% (n=8) foram realizadas durante 12 meses, 30% (n=6) durante 6 meses, e o restante teve duração que variou entre 3 semanas e 5 meses. As intervenções para prevenção de queda em idosos e suas descrições quanto ao tipo e à eficácia estão demonstradas no quadro 2.

Quadro 2
Síntese dos estudos quanto às intervenções para prevenção de quedas em idosos na Atenção Primária à Saúde, considerando seu tipo e eficácia

Tipo de Intervenção	Autores	Característica da intervenção	Variáveis mensuradas	Eficácia da intervenção
Intervenção multicomponentes	Serra-Prat et al.(15)	Recomendações nutricionais e um programa de atividade física (atividades aeróbicas, de fortalecimento e de equilíbrio e coordenação) e acompanhamento telefônico	Prevalência de fragilidade	Eficaz na prevenção de fragilidade em idosos pré-frágeis que residem na comunidade, sendo que o GC obteve um maior número de idosos (15,3%) que evoluíram para fragilidade, quando comparado ao GI (4,9%)
	Bustamante-Troncoso et al.(16)	Visita domiciliar, educação em saúde, desenvolvimento de um plano de gerenciamento dos fatores de risco de quedas e acompanhamento telefônico	Autopercepção de risco de quedas, presença de fatores de risco para quedas e ocorrência de quedas	Eficaz na redução da frequência de quedas (GI com apenas 7,9% caíram versus GC, com 27,7%) e no gerenciamento de fatores de risco extrínsecos (24% sapatos; 21% deambulação e 36% presença de objetos móveis)
	Kuhirunyaratn et al.(17)	Programa que abrangia troca de aprendizados e experiências entre os participantes, exercícios em casa e diálogo grupal	Presença de fatores de risco de quedas	Eficaz no equilíbrio (GI com 52,9% versus GC com 60,8%), além de diminuir o uso de medicamentos entre os idosos
	Shumway-Cook et al.(18)	Programa de exercício físico e um grupo de educação em saúde para idosos da comunidade	Ocorrência de quedas em idosos	Eficaz na melhoria do equilíbrio (GI com 75% apresentaram bom equilíbrio versus GC com 50%), mobilidade e força física e enfrentamento dos fatores de risco de quedas
	Boongird et al.(19)	Programa de exercício físico e acompanhamento telefônico	Ocorrência de quedas durante o período da pesquisa	Eficaz na redução no medo de cair (GI com taxa de 24,7; GC com taxa de 27) e uma melhora na adesão ao exercício. O GI apresentou taxa de 0,3 queda/pessoa, já no GC essa taxa subiu para 0,4
	Elley et al.(20)	Avaliação dos fatores de risco de quedas, educação em saúde, revisão dos medicamentos utilizados, prescrição de vitamina D e acompanhamento especializado, se necessário	Ocorrência de quedas durante o período do estudo	Eficaz na redução dos fatores de risco de quedas e no autogerenciamento do idoso.Verificou-se também discreta diferença na frequência de quedas ao comparar o GI (67%) com o GC (70%)
	Saudi et al.(21)	Avaliação dos fatores de risco de quedas intrínsecos e extrínsecos e avaliação da capacidade óssea do idoso	Ocorrência de quedas durante o período do estudo e a funcionalidade do idoso	Eficaz na diminuição da ocorrência de quedas quando comparado o pré-teste (63,4) e o pós-teste (49,5), bem como diminuição da recorrência desse evento (pré: 40,8% versus pós: 25,8%)
	Duckham et al.(22)	Programa de exercício de força e equilíbrio, visitas domiciliares e acompanhamento telefônico	Densidade mineral óssea dos participantes, principalmente do fêmur	Eficaz na redução do risco de quedas e fraturas na medida que favoreceu o fortalecimento muscular e a funcionalidade dos idosos, porém não melhorou a densidade óssea dos participantes
	Spice et al.(23)	Avaliação dos fatores de risco de quedas	Redução do número de quedas e de lesões causadas por quedas	Eficaz na redução dos fatores de risco de quedas, (GI: 75% dos idosos caíram e, no GC, 84%).
Programas de exercícios físicos	Siegrist et al.(24)	Programa de exercício físico supervisionado e avaliação dos fatores de risco de quedas	Redução da ocorrência de quedas e das lesões decorrentes desses eventos	Eficaz na diminuição da ocorrência de quedas (GI: 291 quedas; GC: 367 quedas) e uma redução das lesões causadas por esses eventos
	Li et al.(25)	Treinamento de Tai Chi Chuan como exercício físico	Foram analisados o desempenho físico, a funcionalidade o medo de cair	Eficaz para diminuir fatores de risco de quedas, melhora do equilíbrio, fortalecimento muscular e redução da ocorrência de quedas (GI: 28% caíram; GC: 46%)
	Cristopoliski et al.(26)	Programa de exercícios de alongamento e promoção da flexibilidade	Melhora na marcha e na flexibilidade	Eficaz na melhora do padrão da marcha e na capacidade motora de movimentação dos pés e do ângulo de articulação do quadril em 3,9°
	Silva et al.(27)	Programa de exercícios de alongamento e movimento aeróbicos	Equilíbrio, coordenação e agilidade	Eficaz na melhora da média do desempenho funcional e motor de idosos (GI: 11,33; GC: 10,81)
	Gschwind et al.(28)	Programas de exercício físico direcionados para o fortalecimento muscular	Fatores de risco de quedas, autocuidado, mobilidade e dor	Eficaz na redução dos fatores de risco de quedas (GI: apenas 6 idosos caíram; GC: 16) e da oscilação postural, na reação ao pisar e na função cognitiva
	Liu-Ambrose et al.(29)	Programas de exercício físico direcionados para o fortalecimento muscular	Redução na ocorrência de quedas durante o tempo do estudo	Eficaz na redução da ocorrência de quedas (GI: 236 quedas versus GC: 366 quedas), bem como diminuição de lesões causadas por tais injúrias
	Li et al.(30)	Um grupo utilizou um programa de treinamento de Tai Chi Chuan e o outro utilizou um programa de exercícios multimodais	A ocorrência de quedas nos idosos dos grupos	O Tai Chi Chuan mostrou-se mais eficaz na redução da ocorrência de quedas (GI: 152 quedas versus GC: 218 quedas) do que os exercícios multimodais, na medida em que favoreceu o equilíbrio e a flexibilidade dos participantes
	Van Ooijen et al.(31)	Programa de exercícios físicos	Mobilidade e força muscular	Eficaz na melhora da mobilidade física, bem como uma redução do risco e da ocorrência de quedas (GI: apresentou taxa de 0,59 queda/pessoa versus GC: 0,63 queda/pessoa)
	Freiberger et al.(32)	Programa de exercícios físicos direcionados para o fortalecimento muscular e autoconhecimento corporal	Ocorrência de quedas durante o período do estudo	Eficaz na redução da ocorrência de quedas em idosos residentes na comunidade (GI: 291 quedas e o GC: 397 quedas)
	Nguyen et al.(33)	Treinamento de Tai Chi Chuan como exercício físico	Qualidade do sono e risco de quedas	Eficaz na melhora do equilíbrio, na qualidade do sono e no desempenho cognitivo dos idosos. Na escala de avaliação de risco de quedas foi identificada uma média de 8.06 no GI e 9.48 no GC
	Moura et al.(34)	Programa de exercícios físicos direcionados para o fortalecimento muscular e funcionalidade	Capacidade funcional	A pesquisa verificou uma melhora no teste de mobilidade funcional (GC: média de 26,38 e no GI: média de 24,57) e no teste de caminhada (GI: 4,41 versus GC: 4,22)

• GC - Grupo Controle; GI - Grupo Intervenção

Identificou-se que, dentre as intervenções realizadas para prevenção de quedas em idosos no âmbito da Atenção Primária à Saúde, 55% (n=11) consistiam em programa de exercício físico, e 45% (n=9) tratavam de intervenções multicomponentes.

Discussão

Consideram-se como estratégias eficazes de prevenção de quedas aquelas que modificam ou eliminam os fatores passíveis de atuação, sejam eles intrínsecos ao indivíduo ou extrínsecos, tendo em vista que a ocorrência de quedas se trata de um agravo potencialmente evitável por estar relacionada a multifatores.

Os estudos, nesta revisão, em sua maioria, foram originados de países desenvolvidos e publicados na última década, o que revela que apenas recentemente esse problema está sendo discutido no campo da gerontologia. Acredita-se que um dos marcos precursores dessas discussões seja a elaboração do relatório mundial de prevenção de quedas na velhice em 2007, pela OMS, que apresenta fatores relacionados à ocorrência de quedas na terceira idade e define as melhores estratégias de prevenção, bem como incentiva os serviços de saúde à tomada de decisões voltadas para o enfrentamento dessa problemática.(¹³)

Para que sejam desenvolvidas intervenções que tenham comprovada eficácia, é necessário considerar os fatores preditores de quedas na população geriátrica. Segundo os estudos identificados, tais fatores estão relacionados a: qualidade do sono ruim,(¹⁵,¹⁸,²⁵,³⁰) depressão,(¹⁵-¹⁸,²⁵,³⁰) dependência funcional,(¹⁵-³⁴) fragilidade,(¹⁵-³⁴) perda da autonomia,(¹⁵-¹⁸,³¹-³⁴) mobilidade prejudicada(¹⁵-³⁴) e história pregressa de quedas.(¹⁵-²⁵,²⁹-³⁴)

Os autores que utilizaram exercício físico como intervenção versaram entre a aplicação de um programa de treinamento e a prática de artes marciais. Esses programas adotados em algumas pesquisas(²⁴,²⁶-²⁹,³¹,³²) objetivavam principalmente o fortalecimento muscular, a melhora do equilíbrio e da coordenação motora e a potencialização da marcha. Já aqueles que utilizaram artes marciais(²⁵,³⁰,³³) tinham como finalidade potencializar o equilíbrio, a flexibilidade e a capacidade funcional desses idosos. Os benefícios destas intervenções assemelham-se a um ensaio clínico realizado na Nova Zelândia com 72 idosos de idade média de 78 anos, em tratamento para Alzheimer, que participaram de um programa de exercício físico multimodal e obtiveram redução no risco de queda e melhora na marcha, equilíbrio e densidade mineral ósseo a curto e médio prazo.(³⁵,³⁶)

Nas intervenções de multicomponentes, verificaram-se diferentes tipos de abordagens, porém com semelhança entre elas. A atividade física foi usada na maioria dos estudos,(¹⁵,¹⁷-²⁰) seguida pela monitorização por intervenção telefônica(¹⁵,¹⁶,¹⁸,¹⁹) e avaliação de riscos intrínsecos e/ou extrínsecos para ocorrência de quedas.(¹⁶,¹⁹,²⁰,²⁶)

Tais intervenções multicomponentes são consideradas de baixo custo, o que está recomendado por evidências internacionais recentes que sugerem melhor projetar e implementar intervenções multifatoriais com baixo custo e alta eficácia, adequadas para cada país.(³⁷) No entanto, pesquisadores tem investido, recentemente, no desenvolvimento de tecnologias de ponta para detecção de quedas, isso demonstra a preocupação com essa questão de saúde pública e implica na inovação do cuidado, porém, o acesso a esses recursos constitui uma realidade distante em países em desenvolvimento, apesar da parcela considerável de idosos vulneráveis nesses lugares.(³⁸)

Quando comparados os estudos que apresentaram intervenção de multicomponentes com os que trataram de exercícios físicos, encontram-se peculiaridades nos resultados. Enquanto uma intervenção de multicomponentes realizada por 12 meses obteve diminuição de 67% da probabilidade de ocorrer uma queda em idosos,(²⁰) um programa de exercício físico com a mesma duração obteve taxa de diminuição equivalente a 59%,(³¹) o que pode estar atrelado à maior adesão dos idosos à terapêutica adotada na abordagem de multicomponentes e por configurar uma prática clínica ampliada.(²⁰,³²)

Além disso, aqueles estudos que utilizaram intervenção telefônica para monitorização do programa de exercício(¹⁵,¹⁶,¹⁸,¹⁹) encontraram, em seus resultados, o potencial que esse tipo de intervenção tem, na medida que a ligação telefônica permite ao profissional de saúde orientar sobre pontos importantes na realização das atividades, favorece o esclarecimento de dúvidas e possibilita um melhor acompanhamento das particularidades de cada indivíduo.

Outra questão observada na intervenção de multicomponentes diz respeito à revisão de medicamentos utilizados pelo público geriátrico. Algumas classes de fármacos ensejam mais atenção dos profissionais de saúde, principalmente os psicofármacos, que estão associados a prejuízos cognitivos e funcionais nesses indivíduos, como os benzodiazepínicos, que podem influenciar na diminuição perda da funcionalidade da pessoa idosa, assim acomo na deambulação e na capacidade psicomotora.(³⁵)

Alguns estudos apresentaram também a visita domiciliar como potente tecnologia do cuidado com a pessoa idosa, utilizada como estratégia de cuidado pelos profissionais da Atenção Primária.(¹⁵,¹⁷,²⁶) A visita domiciliar permite a identificação dos fatores de riscos que podem estar relacionados à ocorrência de quedas na população idosa, para que, assim, sejam ofertadas orientações e esclarecimentos que propiciem ao idoso o empoderamento necessário para agir diante dos riscos e prevenir episódio de quedas.(¹⁵)

Assim, a Atenção Primária configura-se como um espaço preferencial para desenvolvimento de intervenções para prevenção de quedas em idosos e redução dos fatores de riscos intrínsecos e extrínsecos associados a esse agravo. Isso pode ser justificado ao se considerar o papel atribuído ao nível primário da atenção no desenvolvimento de ações de promoção e proteção à saúde, prevenção de agravos, diagnóstico, tratamento, reabilitação e manutenção da saúde e funcionalidade na velhice.(³⁹)

Para efetivação de medidas preventivas, faz-se necessário o envolvimento da equipe multiprofissional que atua na Atenção Primária à Saúde na realização de uma assistência integral à pessoa idosa, a fim de proporcionar melhora na qualidade de vida desses indivíduos. Nesta revisão, as categorias profissionais que mais se destacaram na realização das intervenções foram fisioterapeutas, enfermeiros, educadores físicos e médicos.

Os estudos selecionados evidenciaram a contribuição singular da enfermagem na abordagem multifatorial para prevenção de quedas, por meio da realização de educações em saúde(¹⁷-¹⁹) e acompanhamento telefônico(¹⁵,¹⁶,¹⁹,²¹,³⁴) dos participantes. É inerente ao enfermeiro o desenvolvimento de habilidades educadoras ao realizar o cuidado, pois esse profissional colabora na construção do conhecimento, na mudança de atitudes e na adoção de práticas saudáveis do indivíduo, da família e da comunidade, favorecendo a adesão terapêutica do idoso.(¹¹)

Desse modo, para adoção de uma assistência eficaz na prevenção de quedas, é necessário um maior investimento em recursos humanos e em saúde, o que evidencia a importância da análise de custo-efetividade dessas intervenções, avaliando os benefícios monetários de, por meio de ações preventivas, diminuir-se a hospitalização de idosos devido à ocorrência de quedas, além de poder fortalecer essa dimensão na realização do cuidado primário, tendo em vista os altos índices de idosos hospitalizados após episódios de quedas.

O presente estudo apresenta como limitações as diferenças metodológicas utilizadas pelos estudos primários, dentre elas o tamanho das amostras, o tempo de duração das intervenções, o tipo de intervenção, o tratamento estatístico e a heterogeneidade, impedindo uma combinação/adequada dos principais resultados e a realização de uma metanálise que evidenciasse a intervenção de melhor eficácia.

Conclusão

Intervenções eficazes para prevenção de quedas em idosos abrangem programas de exercícios físicos e intervenções multicomponentes, ambos com vistas ao fortalecimento musculoesquelético, à manutenção da funcionalidade geriátrica, à melhoria do equilíbrio, à coordenação motora e à avaliação de riscos de quedas. O desenvolvimento de tais intervenções impacta diretamente na redução dos fatores de riscos para ocorrência de quedas, tanto os intrínsecos como os extrínsecos, o que influencia na promoção da qualidade de vida à população geriátrica, com a preservação da autonomia e da independência dessas pessoas na realização das atividades de vida diária. Encoraja-se, ainda, a realização de novas revisões sistemáticas, com a utilização da metanálise, com o intuito de dar maior robustez à comparabilidade entre estudos, bem como novos estudos abordando intervenções de enfermagem para prevenção de quedas em idosos.

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Editado por

Editor Associado (Avaliação pelos pares): Paula Hino (https://orcid.org/0000-0002-1408-196X) Escola Paulista de Enfermagem, Universidade Federal de São Paulo, SP, Brasil

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  29 Ago 2022
• Data do Fascículo
  2022

Histórico

• Recebido
  5 Ago 2021
• Aceito
  19 Jan 2022