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Uso de cetamina em pacientes críticos: uma revisão narrativa

RESUMO

A cetamina é única entre os anestésicos e analgésicos. A droga é um anestésico geral de ação rápida que produz um estado anestésico caracterizado por analgesia profunda, reflexos faríngeolaríngeos preservados, tônus músculo esquelético normal ou ligeiramente aumentado, estimulação cardiovascular e respiratória e, ocasionalmente, insuficiência respiratória transitória e mínima. Estudos demonstraram a eficácia de seu uso em anestesia, na dor, em cuidados paliativos e em cuidados intensivos. Recentemente, tem sido empregada para dores pós-operatórias e crônicas, como coadjuvante em psicoterapia, como tratamento para depressão e transtorno de estresse pós-traumático, como sedativo para procedimentos cirúrgicos e como tratamento para condições clínicas respiratórias e/ou neurológicas. Apesar de ser um medicamento seguro e amplamente utilizado, muitos médicos, como intensivistas e emergencistas, não estão cientes das aplicações clínicas atuais da cetamina. O objetivo desta revisão bibliográfica narrativa é apresentar aspectos teóricos e práticos das aplicações clínicas da cetamina em ambientes de unidade de terapia intensiva e serviços de emergência.

Descritores:
Ketamina; Anestésicos; Cuidados críticos; Sedação profunda; Analgesia; Anestesia

ABSTRACT

Ketamine is unique among anesthetics and analgesics. The drug is a rapid-acting general anesthetic that produces an anesthetic state characterized by profound analgesia, preserved pharyngeal-laryngeal reflexes, normal or slightly enhanced skeletal muscle tone, cardiovascular and respiratory stimulation, and occasionally a transient and minimal respiratory depression. Research has demonstrated the efficacy of its use on anesthesia, pain, palliative care, and intensive care. Recently, it has been used for postoperative and chronic pain, as an adjunct in psychotherapy, as a treatment for depression and posttraumatic stress disorder, as a procedural sedative, and as a treatment for respiratory and/or neurologic clinical conditions. Despite being a safe and widely used drug, many physicians, such as intensivists and those practicing in emergency care, are not aware of the current clinical applications of ketamine. The objective of this narrative literature review is to present the theoretical and practical aspects of clinical applications of ketamine in intensive care unit and emergency department settings.

Keywords:
Ketamine; Anesthetics; Critical care; Deep sedation; Analgesia; Anesthesia

INTRODUÇÃO

A cetamina foi descrita em 1965 e aprovada pela Food and Drug Administration (FDA) em 1970.(11 White PF, Way WL, Trevor AJ. Ketamine--its pharmacology and therapeutic uses. Anesthesiology. 1982;56(2):119-36.) Trata-se de um anestésico intravenoso (IV) com diversas aplicações, incluindo sedação, catalepsia, analgesia somática, broncodilatação e estimulação simpática do sistema nervoso.(22 Strayer RJ, Nelson LS. Adverse events associated with ketamine for procedural sedation in adults. Am J Emerg Med. 2008;26(9):985-1028.)

O uso de cetamina na prática clínica foi limitado durante um período de tempo devido a seus efeitos colaterais no sistema nervoso central e às características de uma droga de abuso.(33 Green SM, Clark R, Hostetler MA, Cohen M, Carlson D, Rothrock SG. Inadvertent ketamine overdose in children: clinical manifestations and outcome. Ann Emerg Med. 1999;34(4 Pt 1):492-7.) Entretanto, devido ao seu perfil hemodinâmico estável, juntamente de suas propriedades respiratórias benéficas e sua potência analgésica, ela ressurgiu recentemente.(22 Strayer RJ, Nelson LS. Adverse events associated with ketamine for procedural sedation in adults. Am J Emerg Med. 2008;26(9):985-1028.) Assim, a cetamina tem sido utilizada no tratamento de dores pós-operatórias e crônicas, como sedativo em procedimentos, e no tratamento de condições clínicas respiratórias e/ou neurológicas, como asma e estado epiléptico.(44 Cohen SP, Bhatia A, Buvanendran A, Schwenk ES, Wasan AD, Hurley RW, et al. Consensus Guidelines on the Use of Intravenous Ketamine Infusions for Chronic Pain From the American Society of Regional Anesthesia and Pain Medicine, the American Academy of Pain Medicine, and the American Society of Anesthesiologists. Reg Anesth Pain Med. 2018;43(5):521-46.

5 Mankowitz SL, Regenberg P, Kaldan J, Cole JB. Ketamine for rapid sedation of agitated patients in the prehospital and emergency department settings: a systematic review and proportional meta-analysis. J Emerg Med. 2018;55(5):670-81.

6 Heshmati F, Zeinali MB, Noroozinia H, Abbacivash R, Mahoori A. Use of ketamine in severe status asthmaticus in intensive care unit. Iran J Allergy Asthma Immunol. 2003;2(4):175-80.
-77 Alkhachroum A, Der-Nigoghossian CA, Mathews E, Massad N, Letchinger R, Doyle K, et al. Ketamine to treat super-refractory estado epiléptico. Neurology. 2020;95(16):e2286-e94.) O objetivo desta revisão bibliográfica narrativa é apresentar os aspectos teóricos e práticos da aplicação clínica de cetamina, enfatizando seu papel em ambientes de unidade de terapia intensiva (UTI) e de pronto-socorro (PS).

Esta foi uma revisão bibliográfica narrativa sobre as aplicações clínicas da cetamina. Realizou-se uma pesquisa eletrônica da literatura na PubMed®. A seguinte estratégia de busca com palavras-chave e Medical Subject Headings foi utilizada: ((“ketamine”) and (“systematic” or “clinical trial” or “random allocation” or “therapeutic use”)). A presente revisão incluiu estudos publicados na PubMed® até janeiro de 2021.

O título e o resumo de todos os artigos foram rapidamente examinados quanto à relevância, e não foi adotada qualquer restrição quanto à linguagem. A estratégia inicial de busca identificou 5.670 artigos possivelmente relevantes. Destes, 151 artigos relevantes foram selecionados para análise completa. A partir desses artigos, bem como de revisões e metanálises relacionadas, todas as referências foram inspecionadas, e os títulos possivelmente relevantes foram pesquisados manualmente.

FARMACOLOGIA

Farmacêutica

A cetamina é um derivado da fenciclidina hidrossolúvel.(88 Mion G, Villevieille T. Ketamine pharmacology: an update (pharmacodynamics and molecular aspects, recent findings). CNS Neurosci Ther. 2013;19(6):370-80.) A molécula de cetamina contém um átomo de carbono assimétrico com dois enantiômeros: um isômero S(+) e um isômero R(-).(99 Geisslinger G, Hering W, Kamp HD, Vollmers KO. Pharmacokinetics of ketamine enantiomers. Br J Anaesth. 1995;75(4):506-7.) O enantiômero S(+) tem uma atividade anestésica/analgésica mais potente, com menor propensão a reações adversas do que o enantiômero R(-). Contudo, as preparações comerciais de cetamina são misturas racêmicas.(99 Geisslinger G, Hering W, Kamp HD, Vollmers KO. Pharmacokinetics of ketamine enantiomers. Br J Anaesth. 1995;75(4):506-7.) A cetamina pode ser administrada por via oral, subcutânea, IV, intramuscular (IM), intranasal ou intraóssea.(44 Cohen SP, Bhatia A, Buvanendran A, Schwenk ES, Wasan AD, Hurley RW, et al. Consensus Guidelines on the Use of Intravenous Ketamine Infusions for Chronic Pain From the American Society of Regional Anesthesia and Pain Medicine, the American Academy of Pain Medicine, and the American Society of Anesthesiologists. Reg Anesth Pain Med. 2018;43(5):521-46.)

Mecanismo de ação e farmacocinética

A cetamina tem várias ações devido a sua versatilidade de interação com diferentes receptores corporais.(1010 Peltoniemi MA, Hagelberg NM, Olkkola KT, Saari TI. Ketamine: a review of clinical pharmacokinetics and pharmacodynamics in anesthesia and pain therapy. Clin Pharmacokinet. 2016;55(9):1059-77.) É um anestésico geral de ação rápida que produz um estado anestésico caracterizado por analgesia profunda, reflexos faríngeo-laríngeos preservados, tônus músculo esquelético normal ou ligeiramente aumentado, efeitos antidepressivos e, ocasionalmente, insuficiência respiratória transitória e mínima.(1010 Peltoniemi MA, Hagelberg NM, Olkkola KT, Saari TI. Ketamine: a review of clinical pharmacokinetics and pharmacodynamics in anesthesia and pain therapy. Clin Pharmacokinet. 2016;55(9):1059-77.) Seu mecanismo de ação é principalmente por antagonismo não competitivo do receptor do ácido N-metil D-aspartato (NMDA).(1111 Anis NA, Berry SC, Burton NR, Lodge D. The dissociative anaesthetics, ketamine and phencyclidine, selectively reduce excitation of central mammalian neurones by N-methyl-aspartate. Br J Pharmacol. 1983;79(2):565-75.) Entretanto, a analgesia também pode ser mediada pela ativação da serotonina e da norepinefrina.(1212 Cai YC, Ma L, Fan GH, Zhao J, Jiang LZ, Pei G. Activation of N-methylD-aspartate receptor attenuates acute responsiveness of delta-opioid receptors. Mol Pharmacol. 1997;51(4):583-7.) Ela também interage com receptores opioides, com efeito direto no receptor opioide delta e ações para aumentar a função do receptor opioide mu.(1212 Cai YC, Ma L, Fan GH, Zhao J, Jiang LZ, Pei G. Activation of N-methylD-aspartate receptor attenuates acute responsiveness of delta-opioid receptors. Mol Pharmacol. 1997;51(4):583-7.)

A cetamina estimula o sistema cardiovascular, aumentando a frequência cardíaca, a pressão arterial e o débito cardíaco, mediada principalmente pela ativação simpática do sistema nervoso, o que a torna uma opção atraente comparada a anestésicos hipotensores.(1313 Lippmann M, Appel PL, Mok MS, Shoemaker WC. Sequential cardiorespiratory patterns of anesthetic induction with ketamine in critically ill patients. Crit Care Med. 1983;11(9):730-4.) A cetamina também tem uma interação antagônica com receptores monoaminérgicos, muscarínicos e nicotínicos, produzindo sintomas anticolinérgicos, como broncodilatação, salivação e aumento do tônus muscular das vias aéreas.(1414 Goyal S, Agrawal A. Ketamine in status asthmaticus: a review. Indian J Crit Care Med. 2013;17(3):154-61.) Ela induz efeitos anestésicos catalépticos, amnésicos e analgesia profunda, além de ações anestésicas dose-resposta.(1010 Peltoniemi MA, Hagelberg NM, Olkkola KT, Saari TI. Ketamine: a review of clinical pharmacokinetics and pharmacodynamics in anesthesia and pain therapy. Clin Pharmacokinet. 2016;55(9):1059-77.) O estado cataléptico é um estado acinético com perda de reflexos ortostáticos, mas sem comprometimento da consciência.(1010 Peltoniemi MA, Hagelberg NM, Olkkola KT, Saari TI. Ketamine: a review of clinical pharmacokinetics and pharmacodynamics in anesthesia and pain therapy. Clin Pharmacokinet. 2016;55(9):1059-77.)

A cetamina atravessa facilmente a barreira hematoencefálica, tem início médio menor que 5 minutos e duração média de 30 minutos.(1515 Benítez-Rosario MA, Salinas-Martín A, González-Guillermo T, Feria M. A strategy for conversion from subcutaneous to oral ketamine in cancer pain patients: effect of a 1:1 ratio. J Pain Symptom Manage. 2011;41(6):1098-105.) É metabolizada pelo fígado por meio da N-desmetilação pelo sistema enzimático citocromo P450 para formar a norcetamina.(88 Mion G, Villevieille T. Ketamine pharmacology: an update (pharmacodynamics and molecular aspects, recent findings). CNS Neurosci Ther. 2013;19(6):370-80.) Esse metabólito ativo é subsequentemente hidroxilado e excretado na urina e nas fezes como norcetamina e derivados hidroxilados.(88 Mion G, Villevieille T. Ketamine pharmacology: an update (pharmacodynamics and molecular aspects, recent findings). CNS Neurosci Ther. 2013;19(6):370-80.)

EFEITOS ADVERSOS

A cetamina é uma droga segura e amplamente utilizada, com poucos efeitos adversos severos relatados.(44 Cohen SP, Bhatia A, Buvanendran A, Schwenk ES, Wasan AD, Hurley RW, et al. Consensus Guidelines on the Use of Intravenous Ketamine Infusions for Chronic Pain From the American Society of Regional Anesthesia and Pain Medicine, the American Academy of Pain Medicine, and the American Society of Anesthesiologists. Reg Anesth Pain Med. 2018;43(5):521-46.) Está bem definido que todos os agentes farmacológicos usados para sedação podem apresentar alguns efeitos adversos.(1616 Sacchetti A, Senula G, Strickland J, Dubin R. Procedural sedation in the community emergency department: initial results of the ProSCED registry. Acad Emerg Med. 2007;14(1):41-6.) Entre os agentes farmacológicos usados rotineiramente para sedação, a cetamina e o propofol foram relatados como tendo a menor incidência de eventos adversos.(1616 Sacchetti A, Senula G, Strickland J, Dubin R. Procedural sedation in the community emergency department: initial results of the ProSCED registry. Acad Emerg Med. 2007;14(1):41-6.)

Os efeitos adversos relatados com a cetamina estão comumente relacionados à liberação de catecolaminas, ao aumento do ritmo cardíaco e da pressão arterial sistêmica e à dissociação funcional e eletrofisiológica entre os sistemas límbicos e tálamo-neocortical, levando principalmente a disforia, alucinações, desorientação, sonhos vívidos, ilusões sensoriais e/ou perceptivas.(22 Strayer RJ, Nelson LS. Adverse events associated with ketamine for procedural sedation in adults. Am J Emerg Med. 2008;26(9):985-1028.) Entretanto, em pacientes adultos, foi demonstrado que as ilusões sensoriais ou perceptivas poderiam ser atenuadas ou prevenidas pela administração de agentes benzodiazepínicos antes da infusão de cetamina.(1717 Wathen JE, Roback MG, Mackenzie T, Bothner JP. Does midazolam alter the clinical effects of intravenous ketamine sedation in children? A doubleblind, randomized, controlled, emergency department trial. Ann Emerg Med. 2000;36(6):579-88.) O midazolam é o agente benzodiazepínico preferencial devido a seu tempo de recuperação mais curto e aos efeitos adversos leves, quando prescrito em baixas doses e administrado como terapia adjuvante.(1818 Sener S, Eken C, Schultz CH, Serinken M, Ozsarac M. Ketamine with and without midazolam for emergency department sedation in adults: a randomized controlled trial. Ann Emerg Med. 2011;57(2):109-14.e2.)

Podem ocorrer efeitos adversos como sialorreia e broncorreia.(1414 Goyal S, Agrawal A. Ketamine in status asthmaticus: a review. Indian J Crit Care Med. 2013;17(3):154-61.) Laringoespasmo e apneia são efeitos adversos raros atribuídos a altas doses ou administração rápida de cetamina.(1414 Goyal S, Agrawal A. Ketamine in status asthmaticus: a review. Indian J Crit Care Med. 2013;17(3):154-61.) Podem ser fatais e, portanto, devem ser monitorados e tratados rapidamente.(1414 Goyal S, Agrawal A. Ketamine in status asthmaticus: a review. Indian J Crit Care Med. 2013;17(3):154-61.) Devido ao bloqueio da recaptação da catecolamina, a cetamina deve ser usada com cautela em pacientes com doença arterial coronariana e hipertensão arterial preexistente.(44 Cohen SP, Bhatia A, Buvanendran A, Schwenk ES, Wasan AD, Hurley RW, et al. Consensus Guidelines on the Use of Intravenous Ketamine Infusions for Chronic Pain From the American Society of Regional Anesthesia and Pain Medicine, the American Academy of Pain Medicine, and the American Society of Anesthesiologists. Reg Anesth Pain Med. 2018;43(5):521-46.)

USO CLÍNICO GERAL

Os usos mais comuns da cetamina são facilitação da intubação orotraqueal,(1919 Merelman AH, Perlmutter MC, Strayer RJ. Alternatives to rapid sequence intubation: contemporary airway management with ketamine. West J Emerg Med. 2019;20(3):466-71.) manejo da dor aguda e crônica,(44 Cohen SP, Bhatia A, Buvanendran A, Schwenk ES, Wasan AD, Hurley RW, et al. Consensus Guidelines on the Use of Intravenous Ketamine Infusions for Chronic Pain From the American Society of Regional Anesthesia and Pain Medicine, the American Academy of Pain Medicine, and the American Society of Anesthesiologists. Reg Anesth Pain Med. 2018;43(5):521-46.) manejo da agitação e do delirium,(2020 Barr J, Fraser GL, Puntillo K, Ely EW, Gélinas C, Dasta JF, Davidson JE, Devlin JW, Kress JP, Joffe AM, Coursin DB, Herr DL, Tung A, Robinson BR, Fontaine DK, Ramsay MA, Riker RR, Sessler CN, Pun B, Skrobik Y, Jaeschke R; American College of Critical Care Medicine. Clinical practice guidelines for the management of pain, agitation, and delirium in adult patients in the intensive care unit. Crit Care Med. 2013;41(1):263-306.) sedação para procedimentos,(55 Mankowitz SL, Regenberg P, Kaldan J, Cole JB. Ketamine for rapid sedation of agitated patients in the prehospital and emergency department settings: a systematic review and proportional meta-analysis. J Emerg Med. 2018;55(5):670-81.) estado epiléptico refratário,(2121 Gaspard N, Foreman B, Judd LM, Brenton JN, Nathan BR, McCoy BM, et al. Intravenous ketamine for the treatment of refractory estado epiléptico: a retrospective multicenter study. Epilepsia. 2013;54(8):1498-503.) abstinência alcoólica,(2222 Pizon AF, Lynch MJ, Benedict NJ, Yanta JH, Frisch A, Menke NB, et al. Adjunct ketamine use in the management of severe ethanol withdrawal. Crit Care Med. 2018;46(8):e768-e71.) asma e broncoespasmo grave,(66 Heshmati F, Zeinali MB, Noroozinia H, Abbacivash R, Mahoori A. Use of ketamine in severe status asthmaticus in intensive care unit. Iran J Allergy Asthma Immunol. 2003;2(4):175-80.,1414 Goyal S, Agrawal A. Ketamine in status asthmaticus: a review. Indian J Crit Care Med. 2013;17(3):154-61.) lesão encefálica traumática e hipertensão intracraniana.(2323 Cohen L, Athaide V, Wickham ME, Doyle-Waters MM, Rose NG, Hohl CM. The effect of ketamine on intracranial and cerebral perfusion pressure and health outcomes: a systematic review. Ann Emerg Med. 2015;65(1):43-51.e2.) A tabela 1 resume os usos clínicos mais comuns da cetamina.

Tabela 1
Usos mais comuns da cetamina

INTUBAÇÃO OROTRAQUEAL

A intubação traqueal durante o manejo de emergência das vias aéreas é geralmente realizada em pacientes com insuficiência respiratória, incapacidade de proteger as vias aéreas e alta demanda metabólica.(2424 Weingart SD, Levitan RM. Preoxygenation and prevention of desaturation during emergency airway management. Ann Emerg Med. 2012;59(3):165-75.e1.) A sequência rápida de intubação (SRI) envolve a administração simultânea de um sedativo, um analgésico e um agente bloqueador neuromuscular, deixando o paciente inconsciente, sem dor e paralisado para garantir condições ideais para a intubação endotraqueal.(1919 Merelman AH, Perlmutter MC, Strayer RJ. Alternatives to rapid sequence intubation: contemporary airway management with ketamine. West J Emerg Med. 2019;20(3):466-71.) Para prevenir a hipoxemia durante o período apneico da SRI, é fundamental fornecer ao paciente pré-oxigenação adequada.(2424 Weingart SD, Levitan RM. Preoxygenation and prevention of desaturation during emergency airway management. Ann Emerg Med. 2012;59(3):165-75.e1.) Os pacientes que não cooperam devido ao delirium, intoxicação ou trauma encefálico podem ser difíceis de pré-oxigenar, pois podem não estar em conformidade com a aplicação de uma máscara facial, tentativas de fornecer ventilação não invasiva com pressão positiva ou com outros procedimentos.(2424 Weingart SD, Levitan RM. Preoxygenation and prevention of desaturation during emergency airway management. Ann Emerg Med. 2012;59(3):165-75.e1.)

Uma técnica que permita o preparo adequado de pacientes delirantes ou combativos para a intubação pode diminuir o risco de hipoxemia e reduzir a morbidade e a mortalidade peri-intubatória.(2424 Weingart SD, Levitan RM. Preoxygenation and prevention of desaturation during emergency airway management. Ann Emerg Med. 2012;59(3):165-75.e1.) A intubação em sequência atrasada (ISA) pode ser realizada em pacientes cuja condição médica ou estado mental não permita uma a pré-oxigenação ideal.(3636 Weingart SD, Trueger NS, Wong N, Scofi J, Singh N, Rudolph SS. Delayed sequence intubation: a prospective observational study. Ann Emerg Med. 2015;65(4):349-55.) A cetamina é um agente de indução extremamente adequado para realizar a ISA, pois permite a respiração espontânea contínua e a manutenção dos reflexos das vias aéreas.(3636 Weingart SD, Trueger NS, Wong N, Scofi J, Singh N, Rudolph SS. Delayed sequence intubation: a prospective observational study. Ann Emerg Med. 2015;65(4):349-55.) A dosagem recomendada de cetamina é de 1mg/kg, seguida por dose adicional de 0,5mg/kg, se necessário, até que o paciente apresente sinais de dissociação.(3636 Weingart SD, Trueger NS, Wong N, Scofi J, Singh N, Rudolph SS. Delayed sequence intubation: a prospective observational study. Ann Emerg Med. 2015;65(4):349-55.) A dose IV média de cetamina para facilitar a pré-oxigenação durante a ISA é de 1,4mg/kg.(3636 Weingart SD, Trueger NS, Wong N, Scofi J, Singh N, Rudolph SS. Delayed sequence intubation: a prospective observational study. Ann Emerg Med. 2015;65(4):349-55.) A maioria dos pacientes submetidos a ISA experimentou melhora significativa na saturação de oxigênio antes da intubação.(3636 Weingart SD, Trueger NS, Wong N, Scofi J, Singh N, Rudolph SS. Delayed sequence intubation: a prospective observational study. Ann Emerg Med. 2015;65(4):349-55.) Não foram observadas complicações (apneia, êmese, parada cardíaca ou morte).(3636 Weingart SD, Trueger NS, Wong N, Scofi J, Singh N, Rudolph SS. Delayed sequence intubation: a prospective observational study. Ann Emerg Med. 2015;65(4):349-55.) A dissociação induzida pela cetamina leva à manutenção dos reflexos das vias aéreas e da respiração espontânea, em contraste com outros sedativos, tornando-se a escolha mais sábia para a ISA.(3636 Weingart SD, Trueger NS, Wong N, Scofi J, Singh N, Rudolph SS. Delayed sequence intubation: a prospective observational study. Ann Emerg Med. 2015;65(4):349-55.)

A intubação orotraqueal apenas com cetamina é o uso dela em dose dissociativa para facilitar a intubação endotraqueal em pacientes com respiração espontânea, com ou sem adição de anestesia tópica.(1919 Merelman AH, Perlmutter MC, Strayer RJ. Alternatives to rapid sequence intubation: contemporary airway management with ketamine. West J Emerg Med. 2019;20(3):466-71.) A intubação respiratória apenas com cetamina permite que a intubação endotraqueal seja realizada enquanto o paciente continua respirando e é útil principalmente no manejo de vias aéreas que são conhecidas ou previstas como anatomicamente difíceis.(1919 Merelman AH, Perlmutter MC, Strayer RJ. Alternatives to rapid sequence intubation: contemporary airway management with ketamine. West J Emerg Med. 2019;20(3):466-71.) Esses pacientes são normalmente manejados em ambientes de anestesia eletiva usando anestesia local e broncoscopia fibrosa, mas essa técnica requer tempo e cooperação do paciente, assim como habilidades e equipamentos que podem não estar disponíveis em ambientes de PS ou UTI.(1919 Merelman AH, Perlmutter MC, Strayer RJ. Alternatives to rapid sequence intubation: contemporary airway management with ketamine. West J Emerg Med. 2019;20(3):466-71.) Um estudo realizado em 2009 comparou 469 pacientes com necessidade de sedação para intubação de emergência que receberam 0,3mg/kg de etomidato ou 2mg/kg de cetamina para intubação.(2525 Jabre P, Combes X, Lapostolle F, Dhaouadi M, Ricard-Hibon A, Vivien B, Bertrand L, Beltramini A, Gamand P, Albizzati S, Perdrizet D, Lebail G, CholletXemard C, Maxime V, Brun-Buisson C, Lefrant JY, Bollaert PE, Megarbane B, Ricard JD, Anguel N, Vicaut E, Adnet F; KETASED Collaborative Study Group. Etomidate versus ketamine for rapid sequence intubation in acutely ill patients: a multicentre randomised controlled trial. Lancet. 2009;374(9686):293-300.) A proporção de pacientes com insuficiência adrenal foi significativamente maior no grupo do etomidato do que no grupo da cetamina. Todos os pacientes receberam succinilcolina IV (1mg/kg) imediatamente após a medicação experimental e sedação contínua com midazolam (0,1mg/kg/hora). Não foram observadas diferenças significativas entre os grupos no escore Sequential Organ Failure Assessment (SOFA) durante os primeiros 3 dias na UTI (o desfecho primário), condições de intubação, várias medidas de uso de catecolaminas ou mortalidade em 28 dias. Portanto, os autores concluíram que “a cetamina é uma alternativa segura e valiosa ao etomidato para a intubação em pacientes críticos, especialmente em pacientes sépticos”.(2525 Jabre P, Combes X, Lapostolle F, Dhaouadi M, Ricard-Hibon A, Vivien B, Bertrand L, Beltramini A, Gamand P, Albizzati S, Perdrizet D, Lebail G, CholletXemard C, Maxime V, Brun-Buisson C, Lefrant JY, Bollaert PE, Megarbane B, Ricard JD, Anguel N, Vicaut E, Adnet F; KETASED Collaborative Study Group. Etomidate versus ketamine for rapid sequence intubation in acutely ill patients: a multicentre randomised controlled trial. Lancet. 2009;374(9686):293-300.)

Um estudo prospectivo, randomizado mais recente comparou a cetamina (1 a 2mg/kg) ao etomidato (0,2 a 0,3mg/kg) para intubação endotraqueal de emergência e descobriu que o desfecho primário de sobrevida no sétimo dia foi maior em pacientes randomizados para a cetamina, enquanto não houve diferença significativa na sobrevida no 28º dia.(3737 Matchett G, Gasanova I, Riccio CA, Nasir D, Sunna MC, Bravenec BJ, Azizad O, Farrell B, Minhajuddin A, Stewart JW, Liang LW, Moon TS, Fox PE, Ebeling CG, Smith MN, Trousdale D, Ogunnaike BO; EvK Clinical Trial Collaborators. Etomidate versus ketamine for emergency endotracheal intubation: a randomized clinical trial. Intensive Care Med. 2022;48(1):78-91.)

ANALGESIA

A cetamina tem sido administrada como coanalgésico em pacientes sob cuidados paliativos, além de opioides e drogas coadjuvantes.(2626 Bell RF, Eccleston C, Kalso EA. Ketamine as an adjuvant to opioids for cancer pain. Cochrane Database Syst Rev. 2012;11:CD003351) A cetamina é hoje considerada um analgésico adjuvante essencial para a dor oncológica refratária e está na lista de medicamentos essenciais da Organização Mundial da Saúde (OMS) para pacientes que não respondem mais a altas doses de opioides ou que têm dor de início previsível.(2626 Bell RF, Eccleston C, Kalso EA. Ketamine as an adjuvant to opioids for cancer pain. Cochrane Database Syst Rev. 2012;11:CD003351)

Para analgesia, as doses de cetamina são de 0,25 a 0,5mg/ kg por bólus IV, podendo ser repetida se necessário, a uma dose máxima de 2mg/kg em um período de 30 minutos, e 0,05 a 0,4mg/kg/hora em infusão contínua.(2727 Himmelseher S, Durieux ME. Ketamine for perioperative pain management. Anesthesiology. 2005;102(1):211-20.) Além disso, a cetamina como coadjuvante da morfina pode melhorar a eficácia desta na dor oncológica.(2626 Bell RF, Eccleston C, Kalso EA. Ketamine as an adjuvant to opioids for cancer pain. Cochrane Database Syst Rev. 2012;11:CD003351) A cetamina pode ser eficaz no tratamento da neuralgia crônica periférica e central, dor de membros fantasma e isquêmica, fibromialgia, síndrome da dor regional crônica, dor visceral e enxaqueca.(44 Cohen SP, Bhatia A, Buvanendran A, Schwenk ES, Wasan AD, Hurley RW, et al. Consensus Guidelines on the Use of Intravenous Ketamine Infusions for Chronic Pain From the American Society of Regional Anesthesia and Pain Medicine, the American Academy of Pain Medicine, and the American Society of Anesthesiologists. Reg Anesth Pain Med. 2018;43(5):521-46.)

O manejo da analgesia perioperatória pode ser complexo e influenciado por inúmeros fatores. Recente revisão de ensaios clínicos aleatórios duplo-cegos de cetamina IV adicionada a opioides para analgesia da dor pós-operatória constatou que uma combinação de cetamina e opioides reduziu significativamente os escores de dor, o consumo cumulativo de morfina e a dessaturação pós-operatória em pacientes submetidos à cirurgia torácica.(3838 Berti M, Baciarello M, Troglio R, Fanelli G. Clinical uses of low-dose ketamine in patients undergoing surgery. Curr Drug Targets. 2009;10(8):707-15.)

Lee et al. realizaram revisão sistemática e metanálise para avaliar se a baixa dosagem de cetamina no PS proporciona melhor analgesia com menos efeitos adversos que os opioides. Seus resultados corroboram o uso rotineiro da cetamina para o tratamento da dor severa no PS como tratamento preliminar, uma vez que houve equivalência à morfina ou ao fentanil em todos os ensaios estudados.(2828 Lee EN, Lee JH. The effects of low-dose ketamine on acute pain in an emergency setting: a systematic review and meta-analysis. PLoS One. 2016;11(10):e0165461.) Finalmente, são escassas as evidências quanto ao controle da dor com o uso da cetamina em pacientes não cirúrgicos na UTI.(44 Cohen SP, Bhatia A, Buvanendran A, Schwenk ES, Wasan AD, Hurley RW, et al. Consensus Guidelines on the Use of Intravenous Ketamine Infusions for Chronic Pain From the American Society of Regional Anesthesia and Pain Medicine, the American Academy of Pain Medicine, and the American Society of Anesthesiologists. Reg Anesth Pain Med. 2018;43(5):521-46.) A cetamina é uma opção tradicional e bem estabelecida para analgesia em trocas de curativos de queimaduras, durante a excisão e o enxerto e para sedação.(3939 Gundüz M, Sakalli S, Gunes Y, Kesiktas E, Ozcengiz D, Isik G. Comparison of effects of ketamine, ketamine-dexmedetomidine and ketamine-midazolam on dressing changes of burn patients. J Anaesthesiol Clin Pharmacol. 2011;27(2):220-4.) Além disso, em pacientes com dificuldade de encontrar uma veia adequada, como no caso de pacientes queimados, a cetamina pode ser usada para administração IM.(44 Cohen SP, Bhatia A, Buvanendran A, Schwenk ES, Wasan AD, Hurley RW, et al. Consensus Guidelines on the Use of Intravenous Ketamine Infusions for Chronic Pain From the American Society of Regional Anesthesia and Pain Medicine, the American Academy of Pain Medicine, and the American Society of Anesthesiologists. Reg Anesth Pain Med. 2018;43(5):521-46.)

AGITAÇÃO E DELIRIUM

As diretrizes para o manejo da dor, da agitação e do delirium na UTI recomendam o uso de sedativos não benzodiazepínicos em pacientes críticos.(4040 Devlin JW, Skrobik Y, Gélinas C, Needham DM, Slooter AJ, Pandharipande PP, et al. Clinical Practice Guidelines for the Prevention and Management of Pain, Agitation/Sedation, Delirium, Immobility, and Sleep Disruption in Adult Patients in the ICU. Crit Care Med. 2018;46(9):e825-e73.) O último manual sobre analgesia, sedação e delirium não recomenda rotineiramente o uso de cetamina para o tratamento específico do delirium.(4040 Devlin JW, Skrobik Y, Gélinas C, Needham DM, Slooter AJ, Pandharipande PP, et al. Clinical Practice Guidelines for the Prevention and Management of Pain, Agitation/Sedation, Delirium, Immobility, and Sleep Disruption in Adult Patients in the ICU. Crit Care Med. 2018;46(9):e825-e73.) Entretanto, recente revisão sobre o uso de cetamina em pacientes críticos sugere um possível papel dessa medicação no manejo de pacientes agitados, porém com baixo grau de evidências.(2929 Hurth KP, Jaworski A, Thomas KB, Kirsch WB, Rudoni MA, Wohlfarth KM. The reemergence of ketamine for treatment in critically ill adults. Crit Care Med. 2020;48(6):899-911.) A cetamina tem algumas vantagens de sedação profunda que foram ressaltadas: preserva favoravelmente a motilidade gastrintestinal e a função respiratória, reduz a necessidade de terapia vasopressora, incluindo casos de trauma encefálico, e diminui a disfunção cognitiva pós-operatória.(2020 Barr J, Fraser GL, Puntillo K, Ely EW, Gélinas C, Dasta JF, Davidson JE, Devlin JW, Kress JP, Joffe AM, Coursin DB, Herr DL, Tung A, Robinson BR, Fontaine DK, Ramsay MA, Riker RR, Sessler CN, Pun B, Skrobik Y, Jaeschke R; American College of Critical Care Medicine. Clinical practice guidelines for the management of pain, agitation, and delirium in adult patients in the intensive care unit. Crit Care Med. 2013;41(1):263-306.) As complicações podem incluir sialorreia, despertar agitado, laringoespasmo e vômito.(2929 Hurth KP, Jaworski A, Thomas KB, Kirsch WB, Rudoni MA, Wohlfarth KM. The reemergence of ketamine for treatment in critically ill adults. Crit Care Med. 2020;48(6):899-911.)

Estudos recentes demonstraram a eficácia da cetamina para sedação no ambiente pré-hospitalar e como medicação de resgate no PS.(55 Mankowitz SL, Regenberg P, Kaldan J, Cole JB. Ketamine for rapid sedation of agitated patients in the prehospital and emergency department settings: a systematic review and proportional meta-analysis. J Emerg Med. 2018;55(5):670-81.,4141 Cole JB, Moore JC, Nystrom PC, Orozco BS, Stellpflug SJ, Kornas RL, et al. A prospective study of ketamine versus haloperidol for severe prehospital agitation. Clin Toxicol (Phila). 2016;54(7):556-62.) Metanálise que incluía 18 estudos, representando 650 pacientes, mostrou que uma dose média de cetamina de 315mg IM fornece sedação adequada no tempo médio de 7 minutos, enquanto os antipsicóticos tradicionais e os benzodiazepínicos têm início de ação dentro de 15 a 30 minutos.(55 Mankowitz SL, Regenberg P, Kaldan J, Cole JB. Ketamine for rapid sedation of agitated patients in the prehospital and emergency department settings: a systematic review and proportional meta-analysis. J Emerg Med. 2018;55(5):670-81.) A cetamina parece ser mais rápida no controle da agitação do que os medicamentos padrão do PS para delirium e agitação.(55 Mankowitz SL, Regenberg P, Kaldan J, Cole JB. Ketamine for rapid sedation of agitated patients in the prehospital and emergency department settings: a systematic review and proportional meta-analysis. J Emerg Med. 2018;55(5):670-81.)

Um estudo recente randomizou pacientes para receber 2mg/kg/hora de cetamina ou placebo, e analisou o impacto da infusão de cetamina no uso de opiáceos em pacientes internados em UTI com ventilação mecânica.(4242 Perbet S, Verdonk F, Godet T, Jabaudon M, Chartier C, Cayot S, et al. Low doses of ketamine reduce delirium but not opiate consumption in mechanically ventilated and sedated ICU patients: a randomised doubleblind control trial. Anaesth Crit Care Pain Med. 2018;37(6):589-95.) A adição de baixas doses de cetamina não diminuiu o consumo de opiáceos, mas reduziu a incidência e a duração do delirium sem afetar a taxa de mortalidade e o tempo de internação.(4242 Perbet S, Verdonk F, Godet T, Jabaudon M, Chartier C, Cayot S, et al. Low doses of ketamine reduce delirium but not opiate consumption in mechanically ventilated and sedated ICU patients: a randomised doubleblind control trial. Anaesth Crit Care Pain Med. 2018;37(6):589-95.) Além disso, estudos reduzidos demonstraram que doses baixas de cetamina como estratégia adjuvante para pacientes cirúrgicos ou trauma intubados podem reduzir significativamente o uso de opioides e de propofol, respectivamente.(4040 Devlin JW, Skrobik Y, Gélinas C, Needham DM, Slooter AJ, Pandharipande PP, et al. Clinical Practice Guidelines for the Prevention and Management of Pain, Agitation/Sedation, Delirium, Immobility, and Sleep Disruption in Adult Patients in the ICU. Crit Care Med. 2018;46(9):e825-e73.,4343 Pruskowski KA, Harbourt K, Pajoumand M, Chui SJ, Reynolds HN. Impact of ketamine use on adjunctive analgesic and sedative medications in critically ill trauma patients. Pharmacotherapy. 2017;37(12):1537-44.)

SEDAÇÃO PARA PROCEDIMENTOS

Recentemente, a cetamina utilizada individualmente ou em combinação com outros sedativos surgiu como alternativa para procedimentos de sedação em pacientes adultos em PS e UTI.(4444 Green SM, Andolfatto G, Krauss BS. Ketofol for procedural sedation revisited: pro and con. Ann Emerg Med. 2015;65(5):489-91.) A cetamina atenua com sucesso a hipotensão induzida pelo propofol, portanto pode ser vantajosa para idosos ou em casos de trauma com hipovolemia ou sepse.(4444 Green SM, Andolfatto G, Krauss BS. Ketofol for procedural sedation revisited: pro and con. Ann Emerg Med. 2015;65(5):489-91.)

Em uma revisão sistemática e metanálise sobre diferentes estratégias de sedação para procedimentos, a incidência de agitação e vômito foi maior com cetamina do que com propofol, midazolam ou etomidato. Entretanto, a incidência de vômitos foi drasticamente reduzida com o esquema de cetamina e propofol.(3030 Bellolio MF, Gilani WI, Barrionuevo P, Murad MH, Erwin PJ, Anderson JR, et al. Incidence of adverse events in adults undergoing procedural sedation in the emergency department: a systematic review and meta-analysis. Acad Emerg Med. 2016;23(2):119-34.) A apneia foi mais frequente com o midazolam, e a hipóxia foi menos frequente em pacientes que receberam cetamina e propofol em comparação com outras combinações.(3030 Bellolio MF, Gilani WI, Barrionuevo P, Murad MH, Erwin PJ, Anderson JR, et al. Incidence of adverse events in adults undergoing procedural sedation in the emergency department: a systematic review and meta-analysis. Acad Emerg Med. 2016;23(2):119-34.) Além disso, um estudo multicêntrico, randomizado e duplo-cego, no qual pacientes adultos receberam cetamina, ou cetamina e propofol, como sedativos para procedimentos de emergência, encontrou redução significativa na incidência de reações ao despertar, como confusão, ansiedade ou alucinações, no grupo da cetamina e propofol, bem como a frequência de êmeses entre pacientes adultos.(3131 Lemoel F, Contenti J, Giolito D, Boiffier M, Rapp J, Istria J, et al. Adverse events with ketamine versus ketofol for procedural sedation on adults: a double-blind, randomized controlled trial. Acad Emerg Med. 2017;24(12):1441-9.)

ESTADO EPILÉPTICO REFRATÁRIO

O estado epiléptico refratário é definido como o estado epiléptico que não responde à terapia apropriada com drogas antiepilépticas típicas, agonistas do sistema do ácido gamaaminobutírico (GABA), que têm efeito inibidor neuronal.(77 Alkhachroum A, Der-Nigoghossian CA, Mathews E, Massad N, Letchinger R, Doyle K, et al. Ketamine to treat super-refractory estado epiléptico. Neurology. 2020;95(16):e2286-e94.) Após um prolongado estado convulsivo, os receptores de GABA são rapidamente internalizados, levando a uma redução na inibição sináptica mediada pelo GABA.(77 Alkhachroum A, Der-Nigoghossian CA, Mathews E, Massad N, Letchinger R, Doyle K, et al. Ketamine to treat super-refractory estado epiléptico. Neurology. 2020;95(16):e2286-e94.) Assim, a potência dos agentes GABAérgicos diminui conforme aumenta a duração da convulsão, exigindo doses mais altas que podem produzir efeitos adversos graves, especialmente a hipotensão.(2121 Gaspard N, Foreman B, Judd LM, Brenton JN, Nathan BR, McCoy BM, et al. Intravenous ketamine for the treatment of refractory estado epiléptico: a retrospective multicenter study. Epilepsia. 2013;54(8):1498-503.)

Com base na fisiopatologia da doença, a cetamina ganhou importância por ser um antagonista não competitivo dos receptores NMDA.(77 Alkhachroum A, Der-Nigoghossian CA, Mathews E, Massad N, Letchinger R, Doyle K, et al. Ketamine to treat super-refractory estado epiléptico. Neurology. 2020;95(16):e2286-e94.) Estudos demonstraram sua eficácia e segurança no tratamento da epilepsia resistente a medicamentos, especialmente se houver instabilidade hemodinâmica, porém eles são baseados em séries de casos, estudos retrospectivos e modelagem.(77 Alkhachroum A, Der-Nigoghossian CA, Mathews E, Massad N, Letchinger R, Doyle K, et al. Ketamine to treat super-refractory estado epiléptico. Neurology. 2020;95(16):e2286-e94.,2121 Gaspard N, Foreman B, Judd LM, Brenton JN, Nathan BR, McCoy BM, et al. Intravenous ketamine for the treatment of refractory estado epiléptico: a retrospective multicenter study. Epilepsia. 2013;54(8):1498-503.) São necessários ensaios randomizados prospectivos maiores para testar a segurança, a eficácia e a dosagem, bem como para determinar o possível uso da cetamina, isoladamente ou em combinação.(77 Alkhachroum A, Der-Nigoghossian CA, Mathews E, Massad N, Letchinger R, Doyle K, et al. Ketamine to treat super-refractory estado epiléptico. Neurology. 2020;95(16):e2286-e94.,2121 Gaspard N, Foreman B, Judd LM, Brenton JN, Nathan BR, McCoy BM, et al. Intravenous ketamine for the treatment of refractory estado epiléptico: a retrospective multicenter study. Epilepsia. 2013;54(8):1498-503.) Atualmente, a posologia mais aceita na literatura sobre cetamina é um bólus IV de 2mg/kg, seguido por infusão IV contínua de 1,5 a 5mg/kg/hora.(2121 Gaspard N, Foreman B, Judd LM, Brenton JN, Nathan BR, McCoy BM, et al. Intravenous ketamine for the treatment of refractory estado epiléptico: a retrospective multicenter study. Epilepsia. 2013;54(8):1498-503.)

BRONCOESPASMO E ASMA

A exacerbação da asma apresenta respostas variáveis ao tratamento, e o broncoespasmo pode variar desde a resolução espontânea até o estado refratário, exigindo ventilação mecânica rápida e invasiva.(4545 Leatherman J. Mechanical ventilation for severe asthma. Chest. 2015;147(6):1671-80.) Quase 4% dos pacientes que apresentam exacerbação aguda da asma que precisam ser hospitalizados necessitarão de ventilação mecânica invasiva.(4545 Leatherman J. Mechanical ventilation for severe asthma. Chest. 2015;147(6):1671-80.)

A cetamina tem sido utilizada empiricamente em estado grave de asma resistente à terapia convencional.(66 Heshmati F, Zeinali MB, Noroozinia H, Abbacivash R, Mahoori A. Use of ketamine in severe status asthmaticus in intensive care unit. Iran J Allergy Asthma Immunol. 2003;2(4):175-80.,3232 Esmailian M, Koushkian Esfahani M, Heydari F. The effect of low-dose ketamine in treating acute asthma attack; a randomized clinical trial. Emerg (Tehran). 2018;6(1):e21.) O papel da cetamina em pacientes com espasmo brônquico ou exacerbação da asma é promissor, porém controverso.(3232 Esmailian M, Koushkian Esfahani M, Heydari F. The effect of low-dose ketamine in treating acute asthma attack; a randomized clinical trial. Emerg (Tehran). 2018;6(1):e21.) A cetamina foi associada à redução da resistência das vias aéreas e ao relaxamento do músculo liso das vias aéreas, redução do pico médio de pressão nas vias aéreas, diminuição da pressão parcial de dióxido de carbono no sangue arterial (PaCO2), aumento da pressão parcial de oxigênio no sangue arterial (PaO2) e aumento da complacência pulmonar em pacientes com asma e espasmo brônquico.(66 Heshmati F, Zeinali MB, Noroozinia H, Abbacivash R, Mahoori A. Use of ketamine in severe status asthmaticus in intensive care unit. Iran J Allergy Asthma Immunol. 2003;2(4):175-80.)

Entretanto, até o momento, há poucos estudos prospectivos de controle que validem o uso clínico da cetamina em pacientes com broncoespasmo grave e/ou exacerbação da asma, e não há consenso sobre a posologia ideal e a duração da infusão de cetamina.(66 Heshmati F, Zeinali MB, Noroozinia H, Abbacivash R, Mahoori A. Use of ketamine in severe status asthmaticus in intensive care unit. Iran J Allergy Asthma Immunol. 2003;2(4):175-80.,3232 Esmailian M, Koushkian Esfahani M, Heydari F. The effect of low-dose ketamine in treating acute asthma attack; a randomized clinical trial. Emerg (Tehran). 2018;6(1):e21.,4646 Petrillo TM, Fortenberry JD, Linzer JF, Simon HK. Emergency department use of ketamine in pediatric status asthmaticus. J Asthma. 2001;38(8):657-64.) A posologia de cetamina em bólus geralmente varia de 0,1mg/kg a 2mg/kg, e a infusão contínua varia de 0,15mg/kg/h a 2,5mg/kg/h.(1414 Goyal S, Agrawal A. Ketamine in status asthmaticus: a review. Indian J Crit Care Med. 2013;17(3):154-61.)

TRAUMATISMO CRANIOENCEFÁLICO E HIPERTENSÃO INTRACRANIANA

A traumatismo cranioencefálico (TCE) representa uma das principais causas de morte e incapacidade.(4747 Cole TB. Global road safety crisis remedy sought: 1.2 million killed, 50 million injured annually. JAMA. 2004;291(21):2531-2.) Os pilares do tratamento de pacientes com TCE consistem em evitar lesões cerebrais secundárias e permitir condições ótimas para a recuperação natural do cérebro.(4848 McHugh GS, Engel DC, Butcher I, Steyerberg EW, Lu J, Mushkudiani N, et al. Prognostic value of secondary insults in traumatic brain injury: results from the IMPACT study. J Neurotrauma. 2007;24(2):287-93.)

As drogas sedativas são frequentemente adotadas para tratar pacientes gravemente doentes com TCE.(3333 Bourgoin A, Albanèse J, Wereszczynski N, Charbit M, Vialet R, Martin C. Safety of sedation with ketamine in severe head injury patients: comparison with sufentanil. Crit Care Med. 2003;31(3):711-7.,3434 Roberts DJ, Hall RI, Kramer AH, Robertson HL, Gallagher CN, Zygun DA. Sedation for critically ill adults with severe traumatic brain injury: a systematic review of randomized controlled trials. Crit Care Med. 2011;39(12):2743-51.) Entretanto, os agentes sedativos devem ser usados com parcimônia, pois podem causar eventos adversos, incluindo hipotensão, que podem contribuir para lesões cerebrais secundárias.(3333 Bourgoin A, Albanèse J, Wereszczynski N, Charbit M, Vialet R, Martin C. Safety of sedation with ketamine in severe head injury patients: comparison with sufentanil. Crit Care Med. 2003;31(3):711-7.,3434 Roberts DJ, Hall RI, Kramer AH, Robertson HL, Gallagher CN, Zygun DA. Sedation for critically ill adults with severe traumatic brain injury: a systematic review of randomized controlled trials. Crit Care Med. 2011;39(12):2743-51.) Até o momento, não há evidências de que um agente sedativo seja mais eficaz do que outro para melhorar os desfechos em pacientes com TCE.(3434 Roberts DJ, Hall RI, Kramer AH, Robertson HL, Gallagher CN, Zygun DA. Sedation for critically ill adults with severe traumatic brain injury: a systematic review of randomized controlled trials. Crit Care Med. 2011;39(12):2743-51.)

Como apresentado, a cetamina tem sido amplamente utilizada em muitas situações clínicas, sendo pouco utilizada em pacientes com TCE.(3333 Bourgoin A, Albanèse J, Wereszczynski N, Charbit M, Vialet R, Martin C. Safety of sedation with ketamine in severe head injury patients: comparison with sufentanil. Crit Care Med. 2003;31(3):711-7.) A principal razão para evitar a cetamina em TCE são os resultados obtidos de um pequeno estudo não controlado, sugerindo que a cetamina poderia aumentar a pressão intracraniana (PIC), bem como o consumo de oxigênio metabólico cerebral.(4949 Takeshita H, Okuda Y, Sari A. The effects of ketamine on cerebral circulation and metabolism in man. Anesthesiology. 1972;36(1):69-75.) Entretanto, esses achados não foram confirmados em estudos mais recentes.(3333 Bourgoin A, Albanèse J, Wereszczynski N, Charbit M, Vialet R, Martin C. Safety of sedation with ketamine in severe head injury patients: comparison with sufentanil. Crit Care Med. 2003;31(3):711-7.,3434 Roberts DJ, Hall RI, Kramer AH, Robertson HL, Gallagher CN, Zygun DA. Sedation for critically ill adults with severe traumatic brain injury: a systematic review of randomized controlled trials. Crit Care Med. 2011;39(12):2743-51.,5050 Bar-Joseph G, Guilburd Y, Tamir A, Guilburd JN. Effectiveness of ketamine in decreasing intracranial pressure in children with intracranial hypertension. J Neurosurg Pediatr. 2009;4(1):40-6.) Em pacientes com TCE grave, a combinação de cetamina com midazolam não foi associada ao aumento da PIC e nem à diminuição da circulação cerebrovascular.(3333 Bourgoin A, Albanèse J, Wereszczynski N, Charbit M, Vialet R, Martin C. Safety of sedation with ketamine in severe head injury patients: comparison with sufentanil. Crit Care Med. 2003;31(3):711-7.) Além disso, em outro estudo com pacientes com PIC elevada submetidos à ventilação mecânica, a cetamina reduziu com sucesso a PIC e evitou elevações desfavoráveis dela durante intervenções, sem baixar a pressão arterial e a circulação cerebrovascular.(5050 Bar-Joseph G, Guilburd Y, Tamir A, Guilburd JN. Effectiveness of ketamine in decreasing intracranial pressure in children with intracranial hypertension. J Neurosurg Pediatr. 2009;4(1):40-6.) Finalmente, como a condutância de cálcio do receptor NMDA poderia ser um mediador para uma cascata deletéria, terminando em excitotoxicidade a partir do aumento do glutamato extracelular,(88 Mion G, Villevieille T. Ketamine pharmacology: an update (pharmacodynamics and molecular aspects, recent findings). CNS Neurosci Ther. 2013;19(6):370-80.) a cetamina, ao antagonizar os receptores NMDA e inibir a transmissão glutamatérgica, pode oferecer proteção contra mecanismos celulares de morte neuronal.(3333 Bourgoin A, Albanèse J, Wereszczynski N, Charbit M, Vialet R, Martin C. Safety of sedation with ketamine in severe head injury patients: comparison with sufentanil. Crit Care Med. 2003;31(3):711-7.)

ABSTINÊNCIA ALCOÓLICA

O tratamento da abstinência de álcool baseia-se na administração de antagonistas do GABA, como barbitúricos e benzodiazepínicos.(2222 Pizon AF, Lynch MJ, Benedict NJ, Yanta JH, Frisch A, Menke NB, et al. Adjunct ketamine use in the management of severe ethanol withdrawal. Crit Care Med. 2018;46(8):e768-e71.) Os pacientes com sintomas de abstinência leve a moderada apresentam bons resultados com esses agentes. Entretanto, o subgrupo de pacientes que desenvolvem sintomas graves de abstinência, ou seja, delirium tremens, normalmente demanda cuidados a nível de UTI, altas doses de agonistas de GABA, hospitalização prolongada e ventilação mecânica.(2222 Pizon AF, Lynch MJ, Benedict NJ, Yanta JH, Frisch A, Menke NB, et al. Adjunct ketamine use in the management of severe ethanol withdrawal. Crit Care Med. 2018;46(8):e768-e71.) Esses casos graves estão associados a altas taxas de morbidade e custos hospitalares, sedação prolongada e delirium relacionado ao uso de altas doses de agonistas GABAérgicos de ação prolongada.(2222 Pizon AF, Lynch MJ, Benedict NJ, Yanta JH, Frisch A, Menke NB, et al. Adjunct ketamine use in the management of severe ethanol withdrawal. Crit Care Med. 2018;46(8):e768-e71.)

A cetamina oferece um mecanismo farmacológico possivelmente favorável em pacientes com síndrome de abstinência alcoólica, porque não resulta em sedação prolongada que requeira ventilação mecânica ou delirium, que são efeitos comuns com o uso de benzodiazepínicos.(2222 Pizon AF, Lynch MJ, Benedict NJ, Yanta JH, Frisch A, Menke NB, et al. Adjunct ketamine use in the management of severe ethanol withdrawal. Crit Care Med. 2018;46(8):e768-e71.,3535 Wong A, Benedict NJ, Armahizer MJ, Kane-Gill SL. Evaluation of adjunctive ketamine to benzodiazepines for management of alcohol withdrawal syndrome. Ann Pharmacother. 2015;49(1):14-9.) Um estudo de coorte retrospectivo mostrou que a infusão de cetamina está associada ao uso reduzido de agonistas GABAérgicos (benzodiazepínicos e fenobarbital), menor tempo de internação na UTI e menos intubações.(2222 Pizon AF, Lynch MJ, Benedict NJ, Yanta JH, Frisch A, Menke NB, et al. Adjunct ketamine use in the management of severe ethanol withdrawal. Crit Care Med. 2018;46(8):e768-e71.)

A dose recomendada de cetamina IV é de 0,15 a 0,3mg/kg/hora em infusão contínua até a resolução do delirium. Com base na gravidade da abstinência e no grau de agitação, um bólus de cetamina de 0,3mg/kg pode ser administrado antes da infusão contínua em alguns pacientes.(2222 Pizon AF, Lynch MJ, Benedict NJ, Yanta JH, Frisch A, Menke NB, et al. Adjunct ketamine use in the management of severe ethanol withdrawal. Crit Care Med. 2018;46(8):e768-e71.)

CONCLUSÃO

O principal mecanismo de ação da cetamina, o antagonismo mediado pelo ácido N-metil D-aspartato, é único entre os anestésicos e analgésicos. A cetamina é útil como adjuvante no manejo multimodal da dor perioperatória aguda, para melhorar a terapia da dor, e reduz as exigências pós-operatórias e os efeitos colaterais dos opioides. A cetamina pode cessar o estado epiléptico prolongado e tem ação antidepressiva de ação rápida. Assim, está surgindo uma série de novas indicações. Nos cuidados de emergência, a cetamina pode ser usada como um agente importante para a intubação orotraqueal. Na neurologia, ela ajuda a controlar a pressão intracraniana e, na psiquiatria, ela é usada no manejo da agitação, do delirium e da abstinência de álcool. O uso da cetamina se estende agora além do campo da anestesia da dor, para cuidados paliativos, terapia intensiva e sedação em procedimentos. Portanto, é de suma importância que os médicos de unidades de terapia intensiva e serviço de emergência tenham conhecimento sobre os mecanismos de ação, a farmacocinética, as principais aplicações clínicas e os potenciais efeitos deletérios da cetamina.

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Editado por

Editor responsável: Viviane Cordeiro Veiga

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Ago 2022
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2022

Histórico

  • Recebido
    16 Fev 2022
  • Aceito
    08 Maio 2022
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