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Práticas fisioterapêuticas para a produção do cuidado na atenção primária à saúde

Resumo

Introdução:

A fisioterapia foi inserida no contexto da atenção primária à saúde (APS) como forma de ampliar o acesso da população e proporcionar a integralidade do atendimento à saúde das pessoas.

Objetivo:

Compreender a rotina e as ferramentas utilizadas por fisioterapeutas na atenção primária à saúde e analisar seus determinantes para a produção do cuidado em um município que possui fisioterapeutas em todas as unidades básicas de saúde.

Métodos:

Realizou-se pesquisa qualitativa em uma cidade do sul do Brasil, com 19 fisioterapeutas, através de entrevista semiestruturada e referencial metodológico de análise do discurso.

Resultados:

As principais ferramentas utilizadas na rotina do serviço de fisioterapia no contexto estudado são: atendimentos individuais, visitas domiciliares e trabalho em grupos. As práticas fisioterapêuticas são influenciadas por políticas públicas de saúde, gestão municipal e da unidade de serviço, perfil dos fisioterapeutas e características do território e da população assistida. Realizar ações de promoção em saúde e implementar tecnologias relacionais são desafios para o fisioterapeuta, mas muitos profissionais já reconhecem essas práticas para promover o cuidado integral.

Conclusão:

As ações fisioterapêuticas realizadas e ferramentas utilizadas estão em consonância com o modelo de atuação do Núcleo Ampliado de Saúde da Família e Atenção Básica preconizado pelas políticas públicas e têm sido resolutivas para muitas condições de saúde. Conhecer a rotina de serviços de fisioterapia na APS pode subsidiar discussões no âmbito da formação profissional e de gestão de serviços, com vistas à produção do cuidado fisioterapêutico pautado no princípio da integralidade e a consolidar a atuação do fisioterapeuta neste nível de atenção.

Palavras-chave:
Assistência integral à saúde; Fisioterapia; Atenção primária à saúde; Prática profissional; Políticas públicas de saúde

Abstract

Introduction:

Physiotherapy was included in primary health care (PHC) in order to expand access and provide comprehensive care to the population.

Objective:

To understand the routine and tools used by physiotherapists in primary health care and analyze the determining factors in providing care in a municipality where every basic health unit (BHU) has a physiotherapist.

Methods:

This is a qualitative study of nineteen physiotherapists conducted in a city of Southern Brazil, using a semistructured interview and a methodological framework for discourse analysis.

Results:

The main tools routinely used in the physiotherapy service are individual appointments, home visits and group work. Physiotherapy practices are influenced by public health, municipal management and BHU policies, physiotherapy profile in addition to the characteristics of the coverage area and the population being treated. Introducing health promotion measures and implementing relational technologies are the main challenges for physiotherapists, and many of these professionals already recognize their importance in promoting comprehensive care.

Conclusion:

Physio-therapy practices and the tools used are in line with the Primary Care Family Health Support Center (NASF-AB) model of action recommended by public policies and have been effective for many health conditions. Knowing the routine of PHC physiotherapy services may help professional training and service management, with a view to producing physiotherapy care aimed at the principle of comprehensiveness and consolidating the role of physiotherapists at this level of care.

Keywords:
Comprehensive health care; Physiotherapy; Primary health care; Professional practice; Public health policies

Introducão

A atenção primária à saúde (APS) é o nível preferencial de entrada em um sistema de saúde e fornece atenção à saúde das pessoas. Caracterizada pela longitudinalidade e integralidade das ações em saúde, e orientada de acordo com os principais problemas sanitários da comunidade, forma a base e determina o trabalho dos outros níveis de atenção, variando nos diversos países.11 Starfield B. Atenção Primária - Equilíbrio entre necessidades de saúde, serviços e tecnologia. Brasília: UNESCO; 2002. 726 p.

A Organização Mundial da Saúde recomenda que a APS contemple justiça social, suporte equitativo, participação comunitária, integralidade da assistência, colaboração intersetorial, equipe interprofissional e promoção da saúde.2 No Brasil, o Sistema Único de Saúde (SUS), público e universal, considera a Estratégia Saúde da Família (ESF), de responsabilidade do Ministério da Saúde, como reorientadora do modelo de atenção em saúde e porta de entrada na APS, também denominada no país de atenção básica.33 Brasil. Política Nacional de Atenção Básica. Departamento de Atenção Básica. Brasília: Ministério da Saúde; 2012. Full text link
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Com o objetivo de ampliação das ações da APS no Brasil, foi criado em 2008 o Núcleo de Apoio à Saúde da Família (NASF), sendo a primeira política pública de saúde que regulamentou a inserção da fisioterapia no contexto da APS. Reformulado em 2017, passou a ser chamado de Núcleo Ampliado de Saúde da Família e Atenção Básica (NASF-AB).44 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Cadernos de Atenção Básica - Diretrizes do NASF. Brasília: Ministério da Saúde; 2009. 160 p. Full text link
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Implantado como forma de ampliar o escopo da APS e atender ao princípio de integralidade da atenção em saúde, o NASF contempla o desenvolvimento de habilidades relacionadas ao paradigma da saúde da família e deve estar comprometido com as atuações intersetoriais e interdisciplinares, promoção, prevenção, reabilitação da saúde e cura, além da humanização dos serviços, educação permanente, promoção da integralidade e da organização territorial dos serviços de saúde.44 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Cadernos de Atenção Básica - Diretrizes do NASF. Brasília: Ministério da Saúde; 2009. 160 p. Full text link
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Documentos do Ministério da Saúde apresentam algumas diretrizes e ferramentas tecnológicas para a organização e o desenvolvimento do processo de trabalho do NASF: apoio matricial (principal ferramenta tecnológica), clínica ampliada, projeto terapêutico singular (PTS), projeto de saúde no território (PST), trabalho em grupo, genograma, ecomapa, atendimento domiciliar compartilhado, atendimento individual compartilhado e atendimento individual específico.4,5

O uso de ferramentas contribui de forma compartilhada com o trabalho das equipes de ESF apoiadas, articulando-se e integrando-se com as redes comunitárias e de atenção à saúde.66 Silva ES, Jucá AL, Amado CF, Rocha LP, Vasconcelos TF, Quirino TRL. Processos de trabalho e ferramentas tecnológicas de atuação do NASF. In: Quirino TRL et al. (Orgs.). O NASF e o trabalho na Atenção Básica à saúde: apontamentos práticos e experimentações. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2019. p. 55-84. É imprescindível que o profissional se apodere de instrumentos que permitam maior vínculo com os usuários e demais profissionais para que o trabalho seja pautado na escuta e na confiança, permitindo acessar a singularidade, o conjunto e o universo cultural, que enriquece e amplia o raciocínio clínico do profissional.77 Merhy EE, Feuerwerker LCM. Novo olhar sobre as tecnologias de saúde: uma necessidade contemporânea. In: Mandarino ACS, Gomberg E (Orgs.). Leituras de novas tecnologias e saúde. Salvador: EDUFBA; 2009. p. 29-56.

Com sua gênese pautada no modelo biomédico curativista, fisioterapeutas inseridos na APS buscam ressignificações em suas práticas profissionais, considerando os usuários em seu contexto biopsicossocial para promover a integralidade do cuidado com foco na funcionalidade humana.88 Miranda FAC. Fisioterapia na atenção primária à saúde - propostas para a prática. Curitiba: Appris; 2019. 103 p. Várias possibilidades de atuação e estratégias de reorientação do fazer fisioterapêutico vêm sendo construídas na APS não apenas no Brasil, mas em diversos países.99 Bornhöft L, Larsson ME, Nordeman L, Eggertsen R, Thorn J. Health effects of direct triaging to physiotherapists in primary care for patients with musculoskeletal disorders: a pragmatic randomized controlled trial. Ther Adv Musculoskelet Dis. 2019;11:1759720X1982750. DOI
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10 Braghini CC, Ferretti F, Ferraz L. The role of physical therapists in the context of family health support centers. Fisioter Mov. 2017;30(4):703-13. DOI
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11 Dufour SP, Lucy SD, Brown JB. Understanding physiotherapists’ roles in Ontario Primary Health Care teams. Physiother Can. 2014;66(3):234-42. DOI
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-1212 French HP, Galvin R. Musculoskeletal services in primary care in the Republic of Ireland: an insight into the perspective of physiotherapists. Physiotheraphy. 2017;103(2):214-21. DOI
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A predominância e multicausalidade das condições crônicas de saúde e suas repercussões na capacidade funcional dos indivíduos reforçam a importância da inserção e do trabalho do fisioterapeuta nas políticas de APS.22 Lopes JM. Modelos de atenção primária à saúde e assistência fisioterapêutica. In: Lopes JM, Guedes MBOG, editores. Fisioterapia na Atenção Primária: manual de prática profissional baseado em evidência. Rio de Janeiro: Atheneu; 2019. p. 55-66. Com a reorganização da APS para superar a atenção fragmentada à saúde, profissionais tiveram que repensar seu processo de trabalho, onde o fisioterapeuta se viu diante do desafio de formação de corpus teórico e epistemológico sobre as colaborações do saber específico da profissão para as políticas de saúde, comprometido com as transformações sociais necessárias à promoção de condições de saúde adequadas a fim de contribuir para a integralidade do cuidado.1313 Souza MC, Bomfim AS, Souza JN, Vilela ABA, Franco TB. Fisioterapia e Núcleo de Apoio à Saúde da Família: um estudo sob a ótica dos gestores, profissionais e usuários de saúde da família. Rev APS. 2014;17(2):189-94. Full text link
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,1414 Bispo Jr JP, Moreira DC. Educação permanente e apoio matricial: formação, vivências e práticas dos profissionais dos Núcleos de Apoio à Saúde da Família e das equipes apoiadas. Cad Saude Publica. 2017;33(9): e00108116. DOI
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Outro desafio posto é a sensibilização de gestores municipais sobre a importância de incluir esse profissional na equipe de saúde da APS, por meio da identificação das necessidades de atendimento fisioterapêutico.15

Desta forma, partindo da questão "quais são as ações realizadas e as ferramentas utilizadas por fisioterapeutas na APS?", o presente estudo teve como objetivo conhecer as práticas fisioterapêuticas e analisar seus determinantes para a produção do cuidado integral aos usuários do SUS em um município de grande porte.

Métodos

Desenho

Desenvolveu-se uma pesquisa qualitativa, com referencial metodológico de análise do discurso. A pesquisa qualitativa é capaz de incorporar a questão do significado e da intencionalidade como inerentes aos atos, às relações e às estruturas sociais, sendo a mais apropriada para o conhecimento e a avaliação de problemas e políticas do setor da saúde.16 A análise do discurso adotada, proposta por Martins e Bicudo,17 é composta por dois momentos: análise individual ou ideográfica, onde são identificadas as unidades de significado, que são palavras ou frases que apresentam sentido na perspectiva do tema central; e análise geral ou nomotética, onde ocorre a compreensão e articulação dos casos individuais e leva à construção de categorias que configuram a estrutura do fenômeno estudado.

Caracterização do município e rede de atenção à saúde

Londrina é um município brasileiro de grande porte, localizado no norte e interior do estado do Paraná, e considerada a quarta cidade mais populosa da região Sul do Brasil.

Em agosto de 2017, Londrina possuía uma população estimada de 563.943 habitantes, contava com 84 equipes de ESF e 10 equipes NASF distribuídas em 54 unidades básicas de saúde (UBS). Quarenta e dois fisioterapeutas atuavam na gestão municipal, sendo 33 inseridos em UBS; destes, quatro atuavam em UBS rural, como apoio à equipe ESF, e 29 estavam vinculados a equipes de NASF-AB. Com carga horária semanal de 30 horas, os fisioterapeutas atuavam cinco dias da semana em unidades de grande porte, três e dois dias em unidades de médio e pequeno porte, respectivamente.

Participantes

Todos os fisioterapeutas (n = 33) que atuavam em UBS do município de Londrina foram contactados e responderam a um questionário de caracterização. Após identificação do perfil, procedeu-se a seleção dos participantes que iriam contribuir com as entrevistas. Para buscar a heterogeneidade da amostra foram considerados os seguintes aspectos: tempo de formação, titulação, tempo de atuação na APS, tipo de UBS de atuação (urbana ou rural), vínculo com a UBS. Dos 33 profissionais, 19 participaram das entrevistas.

Coleta de dados

As entrevistas foram previamente agendadas e realizadas no local de trabalho dos participantes, entre os meses de agosto e outubro de 2017. Utilizou-se um roteiro semiestruturado para as entrevistas, que nessa modalidade facilita a abordagem e assegura que seus pressupostos serão cobertos na conversa. O roteiro contemplava questões sobre inserção do profissional na APS, rotina de trabalho (ações realizadas e ferramentas utilizadas na UBS para produção do cuidado), papel do fisioterapeuta na APS, conhecimento de legislações pertinentes e promoção da saúde (conceito e práticas, facilidades e dificuldades na execução das ações). As entrevistas foram gravadas e posteriormente transcritas pelos pesquisadores.

Análise de dados

Foram realizadas dezenove entrevistas, que variaram entre 25 e 82 minutos (média de 41 minutos), e totalizaram aproximadamente 14 horas de áudio. Na transcrição buscou-se preservar todas as características possíveis. No processo de transcrição foram atribuídos códigos nas falas dos entrevistados para a garantia do sigilo, com a letra F e um número, na ordem dos entrevistados.

Aspectos éticos

Esta pesquisa, apreciada e aprovada pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Estadual de Londrina (CAAE 67961917.0.0000.5231), atendeu aos aspectos éticos de diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos, e foi conduzida somente após esclarecimento dos objetivos da pesquisa e consentimento dos participantes, mediante assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Resultados

Ações fisioterapêuticas na APS

A rotina de trabalho padrão dos fisioterapeutas envolve principalmente atendimento individual específico, trabalho em grupo e visitas domiciliares; rotina mesmo tem o dia certo da visita, os dias dos grupos que são os meus, da fisioterapia, e os atendimentos individuais de agenda (F11). As demais atividades que surgem dentro da rotina de trabalho são diversas e variam muito em relação ao perfil do profissional, relação com a coordenação da unidade de saúde e equipes ESF e NASF, e características da população assistida.

O atendimento individual específico é a prática mais realizada pelos fisioterapeutas do município estudado devido à demanda espontânea. Nessa abordagem, em geral são realizadas avaliações que contemplam o estabelecimento de objetivos e a elaboração do plano de tratamento. O estímulo ao autocuidado e à corresponsabilização no tratamento são práticas incentivadas (F11). Após a consulta, na rotina do serviço, o usuário pode ter retorno com o fisioterapeuta, ser encaminhado para os grupos de atividades cinético-funcionais existentes na UBS ou para o atendimento nas clínicas conveniadas em nível de média complexidade.

Devido à alta demanda por atendimentos individuais para os fisioterapeutas da APS, as ações ficam mais voltadas para assistência e reabilitação do que para promoção e prevenção em saúde: Todo lugar eu faço mais assistência (F2); Ai, eu acho uns 80% é tratamento... (F9); Acho que metade (F13); Ah... ainda, vamos colocar 70% de reabilitação, promoção... 30% (F19).

Contudo, alguns profissionais utilizam o momento da consulta para realizar também educação em saúde: Como a maioria das pessoas passaram por mim em uma avaliação individual, essas orientações já foram dadas individualmente (F10).

Grupos são outra prática fisioterapêutica na APS, e os mais frequentes são os grupos de dor e de alongamento (F16), para atender a demanda frequente na UBS. Os demais grupos variam de uma unidade para outra nas temáticas, sendo alguns deles interprofissionais: tabagismo, obesidade, ombro, coluna, gestantes, fortalecimento, isostretching, dança terapia e auriculoterapia. Alguns grupos são semanais e outros são ofertados em módulos, como é o caso do grupo de tabagismo (F18). A maioria dos grupos acontece nos espaços de igrejas próximas às UBS, por meio de parcerias intersetoriais. Usuários que frequentam os grupos apresentam menos crises dolorosas agudas: A experiência do grupo tem sido muito boa. As pessoas não querem voltar para as clínicas, e não querem sair do grupo (F12).

As visitas domiciliares, que em sua maioria são voltadas para casos agudos e/ou acamados, têm o intuito de prestar orientações sobre a nova condição do paciente assistido (F12) e geralmente o fisioterapeuta vai acompanhado por um ACS (F15). Quando identificada a necessidade de atendimento em nível secundário, são encaminhados para clínicas conveniadas. Alguns usuários e cuidadores acreditavam que teriam o atendimento fisioterapêutico no domicílio, mas essa não é a proposta da política de saúde vigente, e reflete a falta de entendimento por parte da população sobre o papel do fisioterapeuta na APS (F12).

No domicílio, nem sempre as visitas são compartilhadas em equipe. A visita domiciliar, de acordo com os entrevistados, é resolutiva quando a família ou cuidador são participativos, mas nem sempre isso acontece (F15).

Foram relatadas pelos fisioterapeutas algumas práticas profissionais, às vezes pontuais, que não fazem parte da vivência de todos. Destacam-se: matriciamento, reunião mensal entre os fisioterapeutas para educação permanente, construção do mapa do território, encaminhamento de pacientes para o serviço de órtese e prótese e para terapia aquática.

O uso de ferramentas tecnológicas do NASF faz parte das ações fisioterapêuticas, onde o apoio matricial e o PTS foram os mais comentados, entretanto, algumas ferramentas preconizadas para o trabalho na APS ainda não eram rotina no serviço do município estudado. Agora o nosso matriciamento está sendo só de educação em saúde. Por exemplo, na última vez eu falei sobre transferências e prevenção de quedas, né, daí a gente faz com a equipe, com os ACS, com os auxiliares, uma educação em saúde. Não está tendo aquela discussão de caso e tal (F9).

Fisioterapeutas relataram ter dificuldades em mensurar e registrar a eficácia de suas ações, em termos de avaliação e acompanhamento da evolução dos pacientes, o que compromete a valorização e a construção científica do fazer fisioterapêutico na APS. Na prática diária, você não prioriza, então a gente não consegue dar indicador de nada (F19).

Outra dificuldade relatada pelos entrevistados foi o uso das tecnologias de relações ou tecnologias leves, como produção de vínculo, acolhimento e gestão do processo de trabalho, assunto ainda pouco discutido e utilizado na prática dos serviços de fisioterapia brasileiros.

O acesso à média complexidade e a qualidade dos serviços prestados pelas clínicas terceirizadas também foram apontados como fragilidade da rede, o que influencia na prática do fisioterapeuta. Nós temos um grande problema com as clínicas credenciadas SUS. Falta de qualidade, isso é muito triste falar. O SUS paga pouco, as clínicas fazem de conta que atendem, o paciente faz de conta que é atendido (F12). Nas clínicas, muitas vezes o paciente só é tratado com eletroterapia, e para os fisioterapeutas do município fazer 20 minutos de choquinho e ser dispensado não é fisioterapia (F15).

Práticas de promoção da saúde na APS

Em relação à prática da promoção da saúde na rotina de trabalho, as respostas foram divergentes. Os relatos mostram profissionais que reconhecem não realizar promoção, aqueles que tentam realizar e aqueles que consideram que, dentro das limitações, conseguem promover saúde de maneira satisfatória: Muito pouco, muito pouco... porque a equipe não valoriza (F2); Ah, eu acho que bastante... Todo mundo trabalhando junto, eu acho que a gente está indo nesse caminho de promoção da saúde (F3); Eu tento... o tempo inteiro a gente trabalha para evitar que os riscos piorem nesses grupos (F13).

Um grande propulsor das ações de promoção da saúde são as datas comemorativas, como o Outubro Rosa, que aborda a prevenção de câncer de mama, e o Novembro Azul, que estimula os cuidados na saúde do homem. Nessas ações, você vai conseguir fazer uma orientação, tentar multiplicar uma informação, mesmo que seja com um paciente que você está tratando por um outro motivo (F11).

É nos grupos que a maioria dos fisioterapeutas vê espaço para a realização de ações de promoção da saúde, em razão do vínculo construído nos grupos entre terapeuta e paciente. Alguns fisioterapeutas percebem como ação de promoção a educação em saúde, e utilizam esses espaços de grupo para educação em saúde, nas nossas datas comemorativas que a gente tem na UBS (F9).

O perfil do profissional é um balizador para a proposição das ações de promoção em saúde, pois alguns se mostram motivados em propor novas ações em sua rotina: Eu acho que não é toda UBS que é tão aberta assim quanto a nossa... a gente propõe uma atividade e a coordenação fala: façam e depois verificamos se dá resultado (F3). Algumas práticas diferenciadas foram relatadas, como arteterapia (F3), trabalho com sonhos de adolescentes (F13), dança-terapia (F18) e auriculoterapia (F2, F10).

O interesse da população também influencia as práticas de promoção. A gente tenta. Mas assim, a gente ainda vê muita resistência por parte do paciente (F14). Às vezes ocorre desinteresse dos participantes nas ações, por não vislumbrarem na promoção da saúde uma estratégia para o cuidado. Em contrapartida, alguns usuários já reconhecem a importância das ações: com a consolidação do NASF, a população hoje, eles estão aderindo mais aos grupos (F19).

A maneira como o serviço do município está organizada reflete nas práticas realizadas. Alguns fisioterapeutas não vislumbravam oportunidades para realizar promoção de saúde: na verdade a gente é o avaliador, né? Mas o ideal seria conseguir promover saúde (F14). Um dos entrevistados considera que o município já tem os profissionais, mas que é preciso reorganizar a estrutura do NASF, porque hoje o que o NASF faz não é NASF, se é 70% de reabilitação e 30% de promoção não é NASF; daí a função do fisioterapeuta está mais de clínico do que NASF mesmo, de promotor de saúde (F19).

Os fisioterapeutas do munícipio compreendem que alguns aspectos da organização do serviço precisam ser revistos para aprimoramento da atenção ofertada aos usuários. Entre as expectativas estão a ampliação de espaço na agenda para executar ações de promoção da saúde: Melhorar a nossa disponibilidade para fazer mais ações de NASF mesmo... eu acho que falta um pouquinho de organização nesse planejamento de ações (F17).

Discussão

O trabalho do fisioterapeuta na APS, dentro da política do NASF-AB, tem sido debatido com mais ênfase nos últimos anos, mas ainda existem lacunas em sua compreensão. As diretrizes do NASF-AB recomendam que a organização do trabalho das equipes deve sempre ter como foco o território sob sua responsabilidade, sempre sob encaminhamento das equipes de saúde da família, e a organização do serviço deve ser estruturada priorizando o atendimento compartilhado e interprofissional, com troca de saberes, capacitação e responsabilidades mútuas.44 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Cadernos de Atenção Básica - Diretrizes do NASF. Brasília: Ministério da Saúde; 2009. 160 p. Full text link
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A partir da nova Política Nacional de Atenção Básica (PNAB), publicada em 2017, as equipes NASF-AB passaram a assistir também as equipes tradicionais das UBS,1818 Brasil. Portaria n° 2.436 de 21 de setembro de 2017. Aprova a Política Nacional de Atenção Básica, estabelecendo a revisão de diretrizes para a organização da Atenção Básica, no Âmbito do Sistema único de Saúde (SUS). Brasília: Diário Oficial da União; 22 set 2017. Full text link
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contudo essa publicação surgiu no momento de coleta de dados, não sendo possível considerá-la para as discussões. Ressalta-se, no entanto, que as equipes foram colocadas em risco, uma vez que houve mudanças no modelo de financiamento das mesmas, comprometendo sua manutenção e ampliação. O NASF-AB pode contribuir para o esforço de produzir cuidado integral no SUS e, nesse sentido, apresenta alguns caminhos, mas outros tantos podem ser criados no encontro entre as equipes e entre estas e seus territórios.55 Brasil. Cadernos de Atenção Básica - Núcleo de Apoio à Saúde da Família - Volume 1: Ferramentas para a gestão e para o trabalho cotidiano. Brasília: Ministério da Saúde; 2014. 116 p. Full text link
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A avaliação realizada no atendimento individual é uma das atividades que compõem o processo de trabalho do fisioterapeuta, e esse deve estar apto a realizar triagem clínica de primeiro contato na APS.22 Lopes JM. Modelos de atenção primária à saúde e assistência fisioterapêutica. In: Lopes JM, Guedes MBOG, editores. Fisioterapia na Atenção Primária: manual de prática profissional baseado em evidência. Rio de Janeiro: Atheneu; 2019. p. 55-66. Considerando que os comprometimentos musculo-esqueléticos são frequentes na população geral e podem ser considerados como um dos maiores problemas de saúde pública em todo mundo,1919 Wendt AS, Chaves AO, Urtado CB, Macedo AR, Reis FJJ, Nogueira LAC. Funcionalidade e incapacidade em pacientes comprometimento musculoesquelético. R Bras Ci e Mov. 2017;25(4):15-22. Full text link
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entende-se que a alta demanda por avaliações musculoesqueléticas seja queixa frequente na APS. Em contrapartida, para melhorar a saúde da população é preciso atuar na prevenção, promoção, educação e tratamento de doenças, incorporando o conceito ampliado de saúde e de autonomia na população. O tempo dedicado a essas ações, porém, ainda é incipiente quando comparado ao destinado à demanda espontânea, gerando expressivo número de consultas individuais.2020 Brito GEG, Mendes ACG, Santos Neto PM. O trabalho na Estratégia Saúde da Família e a persistência das práticas curativistas. Trab Educ Saude. 2018;16(3):975-95. DOI
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No presente estudo, a demanda espontânea por atendimento individuais chega a ocupar, na maior parte das UBS, mais da metade da agenda dos fisioterapeutas. Assim, pode-se considerar que profissionais de saúde se encontram em situação de vulnerabilidade, com grande demanda por atendimento individual, o que dificulta aos profissionais do NASF ampliarem suas possibilidades de atuação.2121 Souza MO, Santos KOB. Physical therapists role in Family Health Support Center. Fisioter Mov. 2017;30(2):237-46. DOI
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Nesse sentido, seria necessário repensar a organização do serviço no município estudado para que o cuidado fisioterapêutico possa ampliar suas possibilidades de atuação.

As práticas em grupo constituem importante recurso de cuidado na APS, podendo ser realizadas em diferentes modalidades. Independente da sua organização, o cuidado compartilhado vai além de uma consulta dirigida com o objetivo de atender a necessidades biológicas. Na verdade, ultrapassa esse limite para lidar com os aspectos educacionais, psicológicos e sociais de um grupo de pessoas.2222 Mendes R, Fernandez JCA, Sacardo DP. Promoção da saúde e participação: abordagens e indagações. Saude Debate. 2016;40(108):190-203. DOI
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Os grupos, quando baseados no vínculo, na escuta e no apoio, constituem um espaço coletivo de reflexão, aprendizado e tomada de decisão, gerando oportunidades de promoção à saúde, fortalecendo os sujeitos e prevenindo o adoecimento.6 Conforme Fernandes et al.,2323 Fernandes ETP, Souza MNL, Rodrigues SM. Práticas de grupo do Núcleo de Apoio à Saúde da Família: perspectiva do usuário. Physis. 2019;29(1): e290115. DOI
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os usuários possuem uma percepção positiva em relação às práticas de grupo oferecidas pelo NASF, destacando resultados terapêuticos satisfatórios e criação de vínculos afetivos, que proporcionam o fortalecimento das relações interpessoais, bem-estar e melhoria na qualidade de vida.

A visita domiciliar se caracteriza como o desloca-mento do profissional até o domicílio do usuário, com a finalidade de atenção à saúde, aprendizagem ou investigação.2424 Medeiros PA, Pivetta HMF, Mayer MS. Contribuições da visita domiciliar na formação em fisioterapia. Trab Educ Saude. 2012;10(3):407-26. DOI
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A visita domiciliar é uma ferramenta de trabalho para o cuidado das pessoas e aparece como uma atividade imprescindível para o fisioterapeuta que atua na APS, como meio de promover acesso aos usuários e de desenvolver os encaminhamentos e orientações pertinentes a cada caso.88 Miranda FAC. Fisioterapia na atenção primária à saúde - propostas para a prática. Curitiba: Appris; 2019. 103 p.,1010 Braghini CC, Ferretti F, Ferraz L. The role of physical therapists in the context of family health support centers. Fisioter Mov. 2017;30(4):703-13. DOI
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,2424 Medeiros PA, Pivetta HMF, Mayer MS. Contribuições da visita domiciliar na formação em fisioterapia. Trab Educ Saude. 2012;10(3):407-26. DOI
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Fisioterapeutas que atuam além da rotina padrão estabelecida no município são considerados trabalhadores com potencial criativo, que produzem o trabalho vivo, fecundo de novas práticas que vão além de normas e protocolos.25 Tendo em vista que em nível municipal seguem uma proposta única do município, e que em cada UBS há uma coordenação diferente, na análise das falas sobre as ações fisioterapêuticas ficou evidente o potencial de cada trabalhador na oferta de ações no território sob sua responsabilidade.

As ferramentas tecnológicas do NASF são inovadoras e fundamentadas em uma relação de horizontalidade entre os profissionais e esses novos arranjos. Ferra-mentas de trabalho demandam uma nova compreensão do trabalho em saúde e um processo formativo que possibilite aos profissionais as habilidades para atuar conjuntamente frente aos desafios encontrados.1414 Bispo Jr JP, Moreira DC. Educação permanente e apoio matricial: formação, vivências e práticas dos profissionais dos Núcleos de Apoio à Saúde da Família e das equipes apoiadas. Cad Saude Publica. 2017;33(9): e00108116. DOI
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O apoio matricial, elemento central da proposta do NASF, conta com duas dimensões de apoio: assistencial (ação clínica direta aos usuários) e ação técnico-pedagógica, que fornece suporte educacional à equipe para o compartilhamento do conhecimento na busca de solução das necessidades de saúde da população.55 Brasil. Cadernos de Atenção Básica - Núcleo de Apoio à Saúde da Família - Volume 1: Ferramentas para a gestão e para o trabalho cotidiano. Brasília: Ministério da Saúde; 2014. 116 p. Full text link
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A dimensão técnico-pedagógica é apontada como a mais frágil em relação ao papel do fisioterapeuta no NASF, evidenciando a necessidade de desenvolver uma educação permanente nos serviços de saúde para efetivação das ações recomendadas como próprias dos fisioterapeutas, onde o apoio matricial se pauta na interprofissionalidade e compartilhamento de saberes, trabalho em redes, atuação em território definido, deliberação conjunta e cogestão.1010 Braghini CC, Ferretti F, Ferraz L. The role of physical therapists in the context of family health support centers. Fisioter Mov. 2017;30(4):703-13. DOI
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,1414 Bispo Jr JP, Moreira DC. Educação permanente e apoio matricial: formação, vivências e práticas dos profissionais dos Núcleos de Apoio à Saúde da Família e das equipes apoiadas. Cad Saude Publica. 2017;33(9): e00108116. DOI
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As ferramentas tecnológicas propostas pelas diretrizes do NASF, como matriciamento, clínica ampliada e projeto terapêutico singular, ainda são pouco utilizadas no mundo do trabalho, seja por questões internas ou externas às equipes, e para alcance de resolutividade no trabalho do NASF precisam estar presentes na prática diária dos profissionais.2626 Nascimento, AG, Cordeiro, JC. Núcleo Ampliado de Saúde da Família e Atenção Básica: análise do processo de trabalho. Trab Educ Saude. 2019;17(2):e0019424. DOI
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O PTS, por exemplo, ainda não está presente de maneira constante nas ações desenvolvidas pelo NASF em Londrina e em outros municípios brasileiros devido ao dispêndio de tempo necessário para sua proposição e dificuldade de organização de agenda dos diversos atores envolvidos.66 Silva ES, Jucá AL, Amado CF, Rocha LP, Vasconcelos TF, Quirino TRL. Processos de trabalho e ferramentas tecnológicas de atuação do NASF. In: Quirino TRL et al. (Orgs.). O NASF e o trabalho na Atenção Básica à saúde: apontamentos práticos e experimentações. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2019. p. 55-84.,2626 Nascimento, AG, Cordeiro, JC. Núcleo Ampliado de Saúde da Família e Atenção Básica: análise do processo de trabalho. Trab Educ Saude. 2019;17(2):e0019424. DOI
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Essa ferramenta, entretanto, foi contemplada nas práticas de alguns profissionais do município estudado. A utilização do genograma e ecomapa, que permitem visualizar a relação do usuário com a família e com o ambiente e comunidade, não foi citada pelos entrevistados.

Ferramentas para o trabalho do NASF ainda são pouco representadas de modo instrumental, talvez pela resistência dos profissionais em aderir a mais um impresso na rotina, além do desconhecimento e perfil de formação de alguns profissionais.66 Silva ES, Jucá AL, Amado CF, Rocha LP, Vasconcelos TF, Quirino TRL. Processos de trabalho e ferramentas tecnológicas de atuação do NASF. In: Quirino TRL et al. (Orgs.). O NASF e o trabalho na Atenção Básica à saúde: apontamentos práticos e experimentações. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2019. p. 55-84. Os fisioterapeutas precisam considerar na sua prática de trabalho os determinantes sociais no processo saúde-doença dos usuários, onde a abordagem familiar e social compõe a nova perspectiva de atenção à saúde das pessoas,2727 Quirino TRL, Marques FMAB, Oliveira VB, Silva ES. O NASF e o trabalho na Atenção Básica à Saúde: apontamentos práticos e experimentações. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2019. 157 p. e o uso das ferramentas tecnológicas auxiliam nessa nova abordagem.2525 Baduy RS, Melchior R, Bertussi DC, Stoicov RR, Martins VL. O trabalho em saúde. In: Andrade SM et al. (Orgs.). Bases da Saúde Coletiva. Londrina: Eduel; 2017. p. 247-96.

O fisioterapeuta também deve enfatizar em sua prática profissional as tecnologias leves, relacionais, que possibilitam o exercício do acolhimento e a percepção dos afetos presentes na relação trabalhador/usuário, para tornar seu trabalho mais resolutivo enquanto promotor de saúde.1313 Souza MC, Bomfim AS, Souza JN, Vilela ABA, Franco TB. Fisioterapia e Núcleo de Apoio à Saúde da Família: um estudo sob a ótica dos gestores, profissionais e usuários de saúde da família. Rev APS. 2014;17(2):189-94. Full text link
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As falas sobre o uso dessas tecnologias foram incipientes neste estudo. A mudança do modelo assistencial se viabiliza a partir da reorganização do processo de trabalho de todos os profissionais de saúde, onde o trabalho passa a ser determinado pelo uso das tecnologias leves, com potência para a produção do cuidado.77 Merhy EE, Feuerwerker LCM. Novo olhar sobre as tecnologias de saúde: uma necessidade contemporânea. In: Mandarino ACS, Gomberg E (Orgs.). Leituras de novas tecnologias e saúde. Salvador: EDUFBA; 2009. p. 29-56.,2828 Yamaguchi MAV. Apoio matricial na atenção primária à saúde na perspectiva dos profissionais da Estratégia Saúde da Família [dissertação]. Londrina: Universidade Estadual de Londrina; 2014. 103 p.

A fragilidade nos registros e na execução do planejamento sistematizado, principalmente no monitoramento e avaliação das ações, compromete a organização e resolutividade das ações.2929 Silva ICB, Silva LAB, Araújo e Lima RS, Rodrigues JA, Valença AMG, Sampaio J. Processo de trabalho entre a Equipe de Atenção Básica e o Núcleo de Apoio à Saúde da Família. Rev Bras Med Fam Comunidade. 2017;12(39):1-10. DOI
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O registro das ações é uma rotina nos serviços e uma atividade obrigatória ao fisioterapeuta, mas em geral são registradas nos sistemas de informação como atendimento realizado, sem descrições mais detalhadas das ações ou avaliações sistematizadas por instrumentos específicos. Além disso, os problemas de saúde necessitam ser investigados na comunidade tanto em seus condicionantes biológicos quanto sociais, sendo importante o monitoramento contínuo da situação de saúde para avaliar a sua evolução.22 Lopes JM. Modelos de atenção primária à saúde e assistência fisioterapêutica. In: Lopes JM, Guedes MBOG, editores. Fisioterapia na Atenção Primária: manual de prática profissional baseado em evidência. Rio de Janeiro: Atheneu; 2019. p. 55-66. Um estudo realizado para analisar o trabalho do NASF no território brasileiro, no período de 2013 e 2014, considerou que em 45,5% das equipes NASF o monitoramento e análise de indicadores, além da formação inicial e a educação permanente, são fatores que ainda carecem de maior desenvolvimento na APS.3030 Brocardo D, Andrade CLT, Fausto MCR, Lima SML. Núcleo de Apoio à Saúde da Família (NASF): panorama nacional a partir de dados do PMAQ. Saude Debate. 2018;42(n. spe 1):130-44. DOI
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Alguns profissionais da rede municipal de saúde ainda não valorizam ou não enfatizam as ações de promoção da saúde na prática diária por entenderem que a demanda pelos atendimentos individuais deva ser prioridade. Outros já vislumbram que o profissional deveria promover ações intersetoriais para a realização de atividades de promoção, pois nesse sentido existe a possibilidade de se trabalhar com pessoas que ainda não adoeceram. No município estudado ocorrem ações de promoção da saúde de maneira isolada, realizadas de maneira pontual em algumas UBS, por alguns profissionais.

A Política Nacional de Promoção da Saúde, vigente desde 2006 e revisada em 2010,3131 Brasil. Política Nacional de Promoção da Saúde/Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde. 3 ed. Brasília: Ministério da Saúde; 2010. Full text link
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aponta como áreas específicas para a atuação dos profissionais a divulgação e implementação da política, alimentação saudável, prática corporal/atividade física, prevenção e controle do tabagismo, redução da morbimortalidade em decorrência do uso abusivo de álcool e outras drogas, redução da morbimortalidade por acidentes de trânsito, prevenção da violência e estímulo à cultura de paz, e promoção do desenvolvimento sustentável. Pode-se identificar, a partir dos relatos dos fisioterapeutas, que muitas ações contemplam as áreas temáticas propostas pela política, como ações de práticas corporais e prevenção e controle do tabagismo, reforçando sua importância como indutora da prática profissional.

A educação em saúde é uma potente ferramenta usada em cuidados primários com vistas a ampliar a resolutividade dos serviços de saúde e incentivar o usuário na corresponsabilização da atenção à saúde.22 Lopes JM. Modelos de atenção primária à saúde e assistência fisioterapêutica. In: Lopes JM, Guedes MBOG, editores. Fisioterapia na Atenção Primária: manual de prática profissional baseado em evidência. Rio de Janeiro: Atheneu; 2019. p. 55-66. Tal prática foi a mais citada nas entrevistas como promoção da saúde. Os fisioterapeutas relataram realizar isso em quase todas as ações, como em consultas individuais, nos grupos, nas visitas domiciliares e nas ações da escola. Práticas de promoção da saúde podem ser ativadoras de potência de ação para construir medidas que resultem em fortalecimento dos sujeitos e das coletividades, na ampliação da autonomia e no fomento da participação e das redes.2222 Mendes R, Fernandez JCA, Sacardo DP. Promoção da saúde e participação: abordagens e indagações. Saude Debate. 2016;40(108):190-203. DOI
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Os profissionais que relataram realizar ações de promoção da saúde com maior frequência foram profissionais com até 10 anos de formação, com tempo médio de atuação na APS entre 5 e 10 anos e com formação em nível de pós-graduação na área de saúde pública. Além desses fatores, acrescenta-se que características pessoais como satisfação com o trabalho, proatividade e vínculo com a população também são aspectos que contribuem para os modos de construir a promoção da saúde.2020 Brito GEG, Mendes ACG, Santos Neto PM. O trabalho na Estratégia Saúde da Família e a persistência das práticas curativistas. Trab Educ Saude. 2018;16(3):975-95. DOI
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O modo como os serviços de fisioterapia estão estruturados difere nos distintos municípios brasileiros, considerando os contextos sociodemográficos, organi-zacionais e o perfil dos profissionais, porém achados da literatura evidenciam que a demanda espontânea norteia boa parte das ações.88 Miranda FAC. Fisioterapia na atenção primária à saúde - propostas para a prática. Curitiba: Appris; 2019. 103 p.,1313 Souza MC, Bomfim AS, Souza JN, Vilela ABA, Franco TB. Fisioterapia e Núcleo de Apoio à Saúde da Família: um estudo sob a ótica dos gestores, profissionais e usuários de saúde da família. Rev APS. 2014;17(2):189-94. Full text link
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,2020 Brito GEG, Mendes ACG, Santos Neto PM. O trabalho na Estratégia Saúde da Família e a persistência das práticas curativistas. Trab Educ Saude. 2018;16(3):975-95. DOI
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Acolhimento, atuação por ciclo vital, participação social, grupos operativos, territorialização, ações de educação em saúde, atuação por condição de saúde, atuação em equipe interdisciplinar, visita domiciliar e atuações na prevenção e promoção da saúde são ações descritas na literatura como parte da rotina dos fisioterapeutas na APS.8 Contudo existem contradições entre a produção do cuidado em saúde pelo NASF e os modelos de atenção nos quais se insere, gerando tensionamento entre os atores envolvidos - gestores, profissionais e usuários. Uma das estratégias para o fortalecimento do NASF-AB é a incorporação da avaliação e monitoramento na rotina das equipes, e que as informações possam ser compreendidas e utilizadas como estratégias de gestão no cotidiano dos serviços e auxiliar no enfrentamento das adversidades para a organização e funcionamento dos serviços de APS.2727 Quirino TRL, Marques FMAB, Oliveira VB, Silva ES. O NASF e o trabalho na Atenção Básica à Saúde: apontamentos práticos e experimentações. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2019. 157 p.

O fisioterapeuta tem como objeto de trabalho a saúde funcional das pessoas em âmbito biopsicossocial e deve atuar na atenção primária à saúde incorporando ferramentas tecnológicas e tecnologias relacionais, visando a integralidade do cuidado e consolidação de sua prática nesse nível de atenção.

Conclusão

A presente pesquisa buscou compreender as ações fisioterapêuticas e ferramentas utilizadas por fisioterapeutas e analisar seus determinantes em um município que possui fisioterapeutas em todas as UBS. As práticas fisioterapêuticas na APS no município estudado são influenciadas por políticas públicas de saúde, gestão municipal, perfil dos profissionais e características do território e da população assistida.

Conhecer a rotina de serviços de fisioterapia na APS pode subsidiar discussões no âmbito da formação profissional e de gestão de serviços, com vistas a consolidar a atuação do fisioterapeuta neste nível de atenção. A análise da fala dos fisioterapeutas revelou que ações realizadas e ferramentas utilizadas estão em consonância com o modelo de atuação do NASF, preconizado pelas políticas públicas, e que têm sido resolutivas para muitas condições de saúde. Entretanto existem algumas práticas que devem ser aprimoradas na organização do serviço no município estudado, em busca do cuidado pautado no princípio da integralidade.

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Editado por

Editora associada:

Angelica Vieira Cavalcanti de Sousa

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    28 Maio 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    04 Jul 2020
  • Revisado
    23 Dez 2020
  • Aceito
    16 Mar 2021
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