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As práticas de enfermagem em um ambulatório na perspectiva da integralidade

Resumos

OBJETIVO: analisar as práticas de enfermagem em um Ambulatório de Especialidades, na perspectiva da integralidade das ações em saúde. MÉTODO: foram realizadas entrevistas com 24 profissionais de enfermagem. Para análise dos dados, utilizou-se a Análise de Conteúdo, chegando aos temas: o dimensionamento e comprometimento com o Serviço de Saúde; atividades e as práticas da equipe de enfermagem. RESULTADOS: em relação ao dimensionamento, foi revelado que a equipe é insuficiente, comprometendo a assistência de qualidade, resultando em sobrecarga e descontentamento dos profissionais, contudo, mostraram-se satisfeitos com as tarefas praticadas no cotidiano, relacionando a integralidade ao cuidado individual, percebida pelos profissionais como essencial e, usualmente, praticada no seu cotidiano. CONCLUSÃO: considera-se que a equipe de enfermagem tem potencialidade e comprometimento para desenvolver sua prática articulada ao princípio da integralidade, atendendo as necessidades de saúde da população com qualidade de assistência.

Prática Profissional; Enfermagem; Assistência Integral à Saúde; Serviços de Saúde


AIM: to analyze nursing care practices at a Specialized Outpatient Care Center from the perspective of an integrative health care activity. METHOD: Interviews with 24 nursing professionals were undertaken. For data analysis, Thematic Content Analysis as proposed by Bardin was applied, resulting in the following themes: the team size and its commitment to health care; professional practices and activity of the nursing team. RESULTS: The size of the nursing team was considered insufficient, which compromises the quality of care and results in work overload and dissatisfaction of the nursing professionals. On the other hand, they were satisfied with the tasks performed day-to-day and related integrality to individual care, considered it essential and usually practiced it daily. CONCLUSION: It is considered that the nursing team has the potential and commitment to develop their care practice combined with the integrative perspective, and therefore providing quality health care to the population.

Professional Practice; Nursing; Comprehensive Health Care; Health Services


OBJETIVO: analizar las prácticas de Enfermería en un ambulatorio de especialidades, en la perspectiva de la integralidad de las acciones en salud. MÉTODO: Fueron realizadas entrevistas con 24 profesionales de enfermería. Para análisis de los datos se utilizó el análisis de contenido, llegando a los temas: el dimensionamiento y comprometimiento con el servicio de salud; actividades y las prácticas del equipo de enfermería. RESULTADOS: Con relación a lo dimensionamiento, fue revelado que el equipo es insuficiente, comprometiendo la asistencia de calidad, resultando en sobrecarga y descontentamiento de los profesionales. Sin embargo, las personas se mostraran satisfechas con las tareas practicadas en el cotidiano, relacionando la integralidad al cuidado individual, percibido por los profesionales como esencial y, comúnmente, practicado en su cotidiano. CONCLUSIÓN: se considera que el equipo de enfermería tiene potencialidad y comprometimiento para desarrollar su práctica articulada con el principio de la integralidad, atendiendo las necesidades de salud de la población con calidad de la asistencia.

Práctica Profesional; Enfermería; Atención Integral de Salud; Servicios de Salud


ARTIGO ORIGINAL

As práticas de enfermagem em um ambulatório na perspectiva da integralidade

IPhD, Professor Associado, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, Brasil

IIMestrandas, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, Brasil

IIIAluna do curso de graduação em enfermagem, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, Brasil. Bolsista de Iniciação Científica, CNPq, Processo nº 139367/2010-1

IVEnfermeira, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, Brasil

VPhD, Professor Doutor, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil

Endereço para correspondência

RESUMO

OBJETIVO: analisar as práticas de enfermagem em um Ambulatório de Especialidades, na perspectiva da integralidade das ações em saúde.

MÉTODO: foram realizadas entrevistas com 24 profissionais de enfermagem. Para análise dos dados, utilizou-se a Análise de Conteúdo, chegando aos temas: o dimensionamento e comprometimento com o Serviço de Saúde; atividades e as práticas da equipe de enfermagem.

RESULTADOS: em relação ao dimensionamento, foi revelado que a equipe é insuficiente, comprometendo a assistência de qualidade, resultando em sobrecarga e descontentamento dos profissionais, contudo, mostraram-se satisfeitos com as tarefas praticadas no cotidiano, relacionando a integralidade ao cuidado individual, percebida pelos profissionais como essencial e, usualmente, praticada no seu cotidiano.

CONCLUSÃO: considera-se que a equipe de enfermagem tem potencialidade e comprometimento para desenvolver sua prática articulada ao princípio da integralidade, atendendo as necessidades de saúde da população com qualidade de assistência.

Descritores: Prática Profissional; Enfermagem; Assistência Integral à Saúde; Serviços de Saúde.

Introdução

A Constituição Brasileira, de 1988, pode ser apontada como grande divisor no que tange à noção de saúde no Brasil, pois, a partir dela, concretizou-se a institucionalização do Sistema Único de Saúde (SUS), firmando, assim, os princípios ético-doutrinários e organizacional-operativos como universalidade, equidade, integralidade, descentralização, regionalização, hierarquização e participação social.

A semântica mostra a integralidade como um termo polissêmico, com diferentes sentidos e formas de uso. A definição legal diz que "integralidade é a integração de atos preventivos, curativos, individuais e coletivos em cada caso e respectivos graus de complexidade". Já, pela perspectiva dos usuários, a ação integral tem sido frequentemente associada ao tratamento digno, respeitoso, com qualidade, acolhimento e vínculo. Esses sentidos aproximam-se da ideia de integralidade que se defende: um termo plural, ético e democrático(1).

A integralidade apresenta-se como a segunda diretriz fundamental do SUS(2). A construção e implementação dessa, como atributo, levará à transformação do modelo assistencial, sendo, talvez, na atualidade, o maior desafio do setor saúde no Brasil(3).

Sabe-se que uma equipe, cujo atendimento tem como perspectiva a integralidade, deve ser capaz de identificar a doença que causa o sofrimento manifestado, dar resposta imediata à dor e reconhecer a necessidade de outras intervenções, relacionadas à promoção de saúde e à prevenção das doenças, ou seja, o que caracteriza a integralidade é, obviamente, a apreensão aplicada às necessidades do usuário(4). Os serviços de saúde, orientados e organizados pela integralidade, tendem a ser mais efetivos em resposta às necessidades dos usuários, suas famílias e comunidades.

A integralidade possui, pelo menos, três conjuntos de sentido: 1) a característica de políticas de saúde ou de respostas governamentais a certos problemas de saúde; 2) o conjunto de sentido, relativo aos aspectos da organização do serviço de saúde e 3) os atributos da prática em saúde(4).

A enfermagem, nessa construção interdisciplinar da saúde coletiva, deve assumir seu núcleo de competência e responsabilidade: o cuidado. Esse cuidado necessariamente tem como meta atravessar subjetividades individuais e coletivas. Mediante isso, a área da enfermagem manifesta potência para transitar em diferentes campos de conhecimento, ou melhor, o profissional tem como foco a pessoa a ser cuidada, podendo, assim, estabelecer, mais intensivamente, canais de interlocução junto a outros agentes, com a intenção de buscar tecnologias necessárias à assistência, mantendo relações com a equipe e, também, com a família, inclusive atuar no processo de transformação da realidade(5).

O pressuposto deste estudo é, principalmente, a orientação mediante o terceiro sentido da integralidade, sob olhar direcionado às práticas de enfermagem, diante das necessidades da população, cuja perspectiva é o da integralidade das ações de saúde.

Objetivo

Analisar as práticas de enfermagem no Ambulatório de Especialidades de uma Unidade Distrital de Saúde, do município de Ribeirão Preto, SP, sob a perspectiva da integralidade das ações em saúde.

Método

Trata-se de estudo descritivo, com análise de dados qualitativa, dados provenientes de falas obtidas por meio de entrevistas semiestruturadas, gravadas e transcritas, com a equipe de enfermagem do Ambulatório de Especialidades, em 2011. Para as entrevistas, houve a participação de vinte e quatro (24) profissionais de enfermagem, envolvidos na assistência daquele setor, que, prontamente, concordaram em responder os questionamentos feitos. Na análise dos dados, foi adotada a técnica da Análise de Conteúdo, modalidade temática(6), com a utilização das três etapas: organização dos dados, exploração e classificação com agregação dos dados, em diferentes temas. Tais temas se alocaram no contexto do SUS, com enfoque nas ações de enfermagem e no princípio da integralidade da atenção à saúde, na dimensão individual e coletiva. O projeto foi enviado e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do próprio serviço do estudo, sob Protocolo n°287. Para garantir o sigilo sobre a identidade dos entrevistados e preservar o anonimato, os sujeitos envolvidos foram identificados por letras e números referentes à entrevista, sendo: A para auxiliar de enfermagem, T para técnico de enfermagem e E para enfermeiros.

Resultados e Discussão

Em relação à distribuição por sexo, 91,6% dos participantes eram do sexo feminino. A média entre as idades foi de 35 anos, variando entre 28 e 56 anos. No que diz respeito à escolaridade, 15 (62,5%) possuíam ensino médio completo, 3 (12,5%) ensino superior incompleto e 6 (25%) ensino superior completo, desses últimos 3 (12,5%) tinham especialização concluída na área da enfermagem. O estudo contou com a participação de 24 profissionais da equipe de enfermagem, 5 (20,83%) sujeitos trabalhando como enfermeiros, 9 (37,5%) auxiliares de enfermagem, sendo 3 com o título de técnico de enfermagem e 10 (41,66%) trabalhando como técnico de enfermagem; desses, 2 cursavam enfermagem e 1 com graduação concluída, mas atuando nesse serviço como técnico em enfermagem.

Quanto ao tempo de serviço no Ambulatório de Especialidades, 5 (20,83%) atuavam de 1 a 3 anos no serviço, 3 (12,5%) de 4 a 10 anos e 16 (66,6%) trabalhavam há mais de 10 anos nessa Unidade de Saúde. Quanto às jornadas de trabalho 1 (4,16%) trabalhava 30h/semanais, 1 (4,16%) 36h/semanais e 22 (91,66%) 40h/semanais. Apenas 3 (12,5%) profissionais trabalhavam em outro serviço na área da enfermagem. Quanto ao processo de contratação, 12 (50%) eram efetivos por meio de concurso público e 12 (50%) por processo seletivo. Em se tratando de vínculo empregatício, tem-se que 70,83% eram funcionários de universidade, 3 (12,5%) de fundação, 2 (8,33%) de prefeitura e 2 (8,33%) do Estado.

Os entrevistados foram questionados sobre a escala que exercem, dos quais 17 (70,83%) relataram possuir escala fixa, ou seja, trabalhavam em um só setor do Ambulatório de Especialidades e 7 (29,16%) em mais de um setor, conforme a necessidade do serviço. Quanto à remuneração, todos relataram o salário do último mês (sem o décimo terceiro salário), sendo a média, para enfermeiros, de 5,8 salários-mínimos, variando de 3,3 a 7,8; para técnicos de enfermagem, a média era de 4,2 salários-mínimos, variando de 2,3 a 5,1 e para os auxiliares de enfermagem, a média foi de 3,1 salários-mínimos, com variação de 3,3 a 5,5, no mês do estudo.

Após a análise dos dados, chegou-se aos três temas que caracterizam os resultados propriamente ditos, a saber: 1) o dimensionamento sob a ótica da equipe de enfermagem e seu comprometimento com o Serviço de Saúde; 2) atividades da equipe de enfermagem no Ambulatório de Especialidades e 3) a prática de enfermagem: potencialidades e dificuldades para o alcance da integralidade.

Nesses contextos temáticos, tem-se que a enfermagem, enquanto uma das disciplinas que compõe o trabalho em saúde, constitui-se, também, como uma daquelas que constrói a saúde coletiva. O projeto de intervenção da enfermagem caminha na direção da produção de uma ação social, a qual pode ser de manutenção ou de transformação da realidade. No processo assistencial de enfermagem e, em particular, de Enfermagem em Saúde Coletiva, o trabalhador lança mão tanto de uma série de tecnologias, incluindo os equipamentos e o instrumental necessários ao desenvolvimento do trabalho, como, também, de tecnologias que envolvem as relações entre os sujeitos no processo de assistência, que dizem respeito à escuta, ao atendimento humanizado e ao vínculo(5).

O atendimento humanizado, possivelmente, depende, dentre outros fatores, da escuta, da formação de vínculo profissional/usuário e de cuidado integral, com os quais é possível perceber a essência da necessidade do usuário que busca atenção de qualidade, dos profissionais envolvidos.

O processo de humanização das práticas pressupõe que os profissionais desenvolvam postura ética de cuidado, que se solidarize com as necessidades de saúde da pessoa e que esse fator esteja presente no processo de trabalho dos profissionais. Para isso, é importante que esses também se sintam motivados pelas instituições e pelas políticas de saúde. O SUS vem apresentando políticas que enfatizam e contextualizam o movimento de humanização das práticas em saúde, observadas, claramente, na Política Nacional de Humanização(7).

É importante e urgente que sejam instituídas as práticas que cultivem, nos profissionais de enfermagem, não só o envolvimento com a política de humanização e com a integralidade das práticas, mas, também, a educação permanente no serviço, que pode ser uma aliada na construção de cuidado integral. Entende-se que seja fundamental, primeiramente, a realização de dimensionamento de pessoal adequado.

Esse tema vem sendo abordado pelas instituições, a fim de adequarem seus custos a uma nova realidade, sob recursos mais escassos, sempre atentas às melhorias do serviço prestado e à inovação dos métodos de assistência(8).

Outro aspecto considerado de suma importância no dimensionamento de pessoal, no âmbito da equipe de enfermagem, é o índice para a cobertura das ausências dos trabalhadores ao serviço, conhecido pelos termos absenteísmo e ausentismo, os quais designam as faltas dos empregados ao trabalho e os percentuais para a cobertura dessas faltas(9).

O dimensionamento na ótica da equipe de enfermagem e seu comprometimento com o Serviço de Saúde

De acordo com as falas dos profissionais do estudo, a estrutura de recursos humanos do serviço é insuficiente para a assistência de qualidade, prestada pela equipe de saúde. Essa conclusão é evidenciada no trecho, a seguir. Na realidade, não é que nós temos poucos dias é que são poucas pessoas para muitos pacientes (A 5).

Em estudo realizado através do Observatório de Recursos Humanos do Ministério da Saúde, no ano 2002, com a presença de gestores, Secretário Municipal de Saúde e trabalhadores, foi analisada a necessidade de se trabalhar com os gestores na construção de um serviço de qualidade e de se atingir a satisfação do usuário, considerando que os recursos humanos representam a chave fundamental para o alcance de boa gestão em saúde e, também, que a avaliação do desempenho dos servidores é instrumento para elevar a produtividade e a qualidade dos serviços(10-11).

Na organização do serviço de enfermagem, portanto, além de se considerar as políticas de recursos humanos institucionais, há necessidade de se trazer, também, a percepção desses profissionais, pois isso possibilitará a participação dos mesmos na identificação dos problemas relativos ao dimensionamento de pessoal e da estrutura do serviço de enfermagem.

No que se refere ao atendimento humanizado, as falas dos participantes trazem a dificuldade do atual dimensionamento do quadro de profissionais, diante da excessiva demanda do Serviço de Saúde. Muitos funcionários demonstram apreciar o seu trabalho, mesmo não estando satisfeitos com o baixo número de trabalhadores no local, sendo que uma pessoa pode trabalhar por três e, muitas vezes, o rendimento chega a decair, de acordo com a fala: (...) acho que está faltando muito funcionário então a gente tá trabalhando muito assim, atender logo pra dispensar logo porque tem outro para ser atendido, até tem qualidade, tem informação, oferece curso, mas você não tem tempo para poder prestar o serviço... Eu tô satisfeita com o meu trabalho, mas não tô satisfeita com a falta de funcionário, estou trabalhando por três, gosto do que eu faço, mas não nas condições que estou tendo que fazer (T 11).

Em estudo realizado em 11 Unidades de Saúde da Família, no município de São Carlos, SP, onde 17 auxiliares de enfermagem responderam a entrevistas semiestruturadas, encontrou-se o mesmo resultado. Foi constatada a sobrecarga nas tarefas cotidianas, criada pela grande demanda, atendidas nas Unidades de Saúde da Família(12).

Em estudo realizado com alunos de enfermagem, futuros profissionais, constatou-se que, quando o aluno se depara com o sofrimento da pessoa doente, a fragilidade dessa desperta nele a sua própria dimensão humana, o que o sensibiliza para o cuidar, sob atendimento humanizado. No entanto, para atendimento humanizado, o profissional precisa trabalhar com qualidade na atenção prestada, ou seja, é necessário um quadro de profissionais que atenda as reais necessidades dos usuários, dentro de uma política de recursos humanos para a enfermagem, possibilitando, assim, atender os princípios do SUS(13).

Quando se analisa o comprometimento do profissional, muitos estão insatisfeitos com o tipo de serviço que desempenham. Eles dizem gostar do que fazem, mas não sob pressão, condição essa na qual sempre realizam, atualmente, o trabalho, conforme a fala: Eu gosto de trabalhar aqui, a gente às vezes fala que não está satisfeita, mas é porque ninguém merece trabalhar sob pressão. Eu tenho que ficar às vezes colhendo sangue de 80, 90 pacientes sozinha, que é desumano... Acho a estrutura física até boa, já teve divisões que parece que funcionou diferente o serviço conforme foi separado. Mas precisa aumentar, porque o serviço vem aumentando conforme o tempo tá passando e o prédio mantém o mesmo, a equipe mantém a mesma (E 17).

No dimensionamento de pessoal de enfermagem, devem ser utilizados critérios e metodologias que permitam adequação dos recursos humanos às reais necessidades de assistência, de modo que o paciente receba cuidado de qualidade que lhe proporcione segurança(8).

O dimensionamento fixa e estabelece parâmetros para quantificar o quadro de profissionais de enfermagem das unidades assistenciais, nas Instituições de Saúde e assemelhados. Quando feito inadequadamente, traz implicações para o resultado da qualidade da assistência prestada à clientela, em virtude de os aspectos quantitativos e qualitativos de pessoal estarem diretamente ligados ao produto final do seu trabalho, que é a qualidade da assistência, prestada ao paciente(14).

Atividades da equipe de enfermagem no Ambulatório de Especialidades

O referido tema consiste em um processo de análise dos conteúdos das falas que, dentro de uma lógica assistencial, refletem atividade cansativa, com múltiplas funções no serviço. Um estudo detectou que os enfermeiros realizam diversas atividades em seu cotidiano, como a passagem de plantão, anotações, evolução de enfermagem, a leitura do prontuário e relatório de enfermagem, além da troca de informações com a equipe de saúde(15).

As condições de trabalho da enfermagem implicam longas jornadas com turnos desgastantes (vespertinos e noturnos, domingos e feriados). Nos rodízios, há multiplicidade de funções, levando os profissionais à ansiedade com a repetitividade e ritmo excessivo de trabalho, controle das chefias, esforços físicos, posições incômodas devido à separação dos trabalhos intelectual e manual, desencadeando, assim, acidentes e doenças(16).

Nas falas dos profissionais, as atividades, desenvolvidas no ambulatório, estão relacionadas ao acolhimento; recepção, triagem, aferição de sinais vitais e medidas antropométricas; orientações; imunização, coleta de exames e registro dos dados, em geral. Ao apresentarem as atividades desenvolvidas, incluem os aspectos da integralidade na dimensão do cuidado individual. (...) do tipo de atendimento que é acolhimento isso leva tempo, como eu penso que a gente tem que ver o paciente como um todo, não é só chegar e falar oi... eu acho que é insuficiente pra dar esse tipo de atendimento... eles querem ser enxergados como gente, penso eu assim (A 2).

Alguns dos funcionários da equipe creem que o indivíduo deve ser visto como um todo. Os participantes manifestaram que a integralidade deve ser prioridade na assistência à saúde dos usuários, e isso se articula ao que já foi relatado: "as pessoas reconhecem o ser humano biopsicossocial e espiritual como sujeito do cuidado"(17), corroborando, dessa forma, .os achados desta investigação, na qual os profissionais de enfermagem do Ambulatório de Especialidades reforçam a atenção integral na sua dimensão individual.

Cabe destacar que, na prática de enfermagem, as necessidades de saúde estão voltadas não somente para os aspectos individuais dos usuários, mas, também, para o coletivo, considerando-se que a enfermagem tem competência e responsabilidade para buscar tecnologias, a fim de atuar com a equipe de saúde, a família e com a população.

Uma das atividades da equipe de enfermagem está relacionada à referência para serviços externos e internos do Ambulatório de Especialidades. Quando o usuário necessita de serviço social, atendimento clínico especializado, psicológico, ou outros, a enfermagem o encaminha para os serviços referentes às reais necessidades dele. (...) nós temos um ambulatório de especialidade e nós temos nosso serviço de apoio que é o serviço social, o serviço de psicologia, fisioterapia, odonto, então nós temos sim equipamentos sociais que a gente pode encaminhar (E 19).

Ao trazer a dimensão da integração entre os níveis de atenção à saúde, a equipe de enfermagem precisa conhecer a complexidade e a densidade tecnológica de cada um, a fim de atender as demandas dos usuários.

Assim, esses profissionais, nesta pesquisa, entendem a potência da integração no desenvolvimento das práticas de enfermagem entre os serviços, para atender as necessidades apontadas pelos usuários, à medida que trazem, em suas falas, serviços internos e externos à Unidade.

Quando o trabalho é em rede, torna-se indispensável pensar na natureza da estrutura organizacional, voltada para a produção de serviços, bem como para a dinâmica de atores em permanente renegociação de seus papéis, favorecendo, assim, novas soluções para velhos problemas, em um contexto de mudanças e compromissos mútuos(18).

A prática de enfermagem: potencialidades e dificuldades para o alcance da integralidade

Há que se reconhecer as manifestações das práticas de enfermagem no escopo dos atributos da prática em saúde(4), refletindo sobre as potencias dificuldades em suas experiências nos serviços de Ambulatório de Especialidade, com o propósito de poder transformar as práticas na direção da integralidade.

Em falas, descritas abaixo, a integralidade é vista como algo crucial nas ações da equipe de enfermagem, e essa reconhece que tal princípio possui grande peso sobre o trabalho que a equipe realiza. (...) integralidade tem a ver com disponibilidade... olha. É muito amplo... disponibilidade de ações de saúde... Vê o paciente como um todo, não focar na queixa do paciente, quer dizer, não restringir seu atendimento naquela queixa pontual, fazer uma avaliação geral do paciente, disponibilizar as assistências de uma forma integralizada, fazer uma avaliação de uma forma geral, é difícil de explicar isso, a gente sabe, mas não consegue explicar (...) (E 7).

Identifica-se que os entrevistados compreendem o significado da palavra integralidade no sentido da não fragmentação do usuário e sua relação com as práticas de enfermagem. A integralidade busca a totalidade do sujeito, evitando a fragmentação e o reducionismo(19). Significa uma integração de todos os serviços que atende o paciente, não dividir ele e cada um vê uma parte do corpo. Integralidade significa todos os serviços interligados a respeito do mesmo paciente que estão atendendo (E 17).

Ressalta-se que um dos entrevistados mencionou a integralidade relacionada também ao respeito mútuo, entre funcionários e usuários, o que, muitas vezes, não acontece, como evidencia a fala: Integralidade, integração, respeito do meu lado e do lado dele também, porém, aqui no serviço a gente recebe muita grosseria dos pacientes, não são todos, mas eles acabam generalizando os funcionários, eles confundem PA (pronto atendimento) com ambulatório, eu raramente tenho problema com paciente, algumas vezes os pacientes querem desabafar por conta de outros problemas, eu vejo o paciente como um todo, às vezes o paciente de idade quer conversar, tem que dar muita atenção e muitas vezes não dá tempo por conta do serviço (T 23).

A equipe de enfermagem, muitas vezes, fica com grande sobrecarga de trabalho e isso reflete no atendimento integral.

"O trabalho da enfermagem tende a recair em organogramas verticalizados e na fragmentação das ações de trabalho. Ao enfermeiro, cabem as ações mais relacionadas ao planejamento, organização e supervisão da assistência. Aos técnicos e auxiliares de enfermagem, a execução dessas ações"(20).

Embora a equipe de enfermagem possua inúmeras atividades e essa profissão não se mostre leve, a fala descrita abaixo aponta que se pode realizar um planejamento para não haver sobrecarga física e psicológica. É importante haver esse planejamento, cujo objetivo é equilibrar o profissional, fazer com que o mesmo realize atendimento integral ao usuário. A enfermagem, em si, quando você realmente envolve com todas as variáveis dessa profissão, ela não é leve, porque envolve a questão psicológica, envolve a questão física, mas eu acho que você pode se deixar sobrecarregar, acho que se você souber planejar você não se sobrecarrega tanto (E 19).

Uma das potencialidades para as práticas de enfermagem, mencionada pelos sujeitos desta investigação, está ligada aos aspectos das atividades de capacitação e educação permanente.

Assim, em relação aos cursos oferecidos, muitos dos funcionários acreditam que o serviço disponibiliza alguns cursos e palestras, mas discursam que a escala de trabalho é grande e, inúmeras vezes, não há como ir aos cursos e, outras, nem ficam sabendo sobre a realização dos mesmos. Os funcionários sugerem cursos sobre reciclagem, programa de saúde da família e educação permanente. A equipe relata que faltam microfones e cadeiras, os quais são acessórios que poderiam mudar o ambiente. No entanto, grande parte dos funcionários se queixa da falta de pessoas para trabalhar no serviço, já que a demanda é grande ante o número de trabalhadores.

O processo de qualificação profissional tem como um de seus principais objetivos a atualização e o aprimoramento, em razão das constantes mudanças nos campos científico e tecnológico, visando o atendimento das necessidades que os profissionais apresentam em seus processos de trabalho(21).

Em um estudo, encontrou-se que os cursos são oferecidos esporadicamente e, muitas vezes, os temas não condizem com aquilo que o profissional tem real necessidade(14). Nas frases abaixo, encontram-se algumas falas semelhantes. (...) os cursos, palestras oferecidos pelo município, ultimamente têm sido quase nada, faz mais de anos, eu sempre procuro me informar e como eu trabalho 40 horas semanais eu não tenho como sair da unidade para realizar cursos, mas muitas dúvidas eu procuro em sites seguros, o tempo que eu tenho (...) (E 7).

A satisfação no trabalho como categoria de análise, remete, obrigatoriamente, a dois elementos essenciais que compõem esse universo: a organização e o indivíduo, que, no caso em estudo, são a instituição de saúde e os profissionais que compõem a equipe de enfermagem(22).

Assim, nesta investigação, os entrevistados também trazem questões relativas à organização da instituição de saúde e a percepção de aspectos que facilitam e dificultam o seu trabalho, tanto no cotidiano em saúde quanto na enfermagem.

Considerações finais

A proposta deste estudo foi analisar as práticas de enfermagem no Ambulatório de Especialidades de uma Unidade Distrital de Saúde, do município de Ribeirão Preto, SP, na perspectiva da integralidade das ações em saúde, com o intuito de que os achados podem contribuir para a construção de novos conhecimentos, bem como estruturar novos modelos de atenção, resultando, assim, em prática de enfermagem nos moldes da integralidade.

No dimensionamento da equipe de enfermagem, a estrutura de recursos humanos do serviço é insuficiente para a assistência de qualidade prestada pela equipe de saúde, o que resulta em sobrecarga da equipe e descontentamento.

Identificam-se, como atividades desenvolvidas no ambulatório: acolhimento; recepção, triagem, aferição de sinais vitais e medidas antropométricas; orientações; imunização, coleta de exames e registro dos dados, em geral.

A integralidade estava relacionada à sua dimensão no cuidado individual, sem definição exata, porém, interligada e percebida, pelos próprios profissionais, como essencial e, usualmente, praticada no Serviço de Saúde, em questão.

Acredita-se que a mudança necessária para a melhoria das condições de serviço foi vista a partir da adequação dos espaços físicos, da organização da Unidade como um todo, bem como à maior proximidade dos supervisores, a fim de identificar e solucionar questões assistenciais e, principalmente, a adequação do dimensionamento de pessoal.

De modo geral, a equipe de enfermagem do Ambulatório apresentou-se satisfeita com as tarefas praticadas no cotidiano, porém, propondo adequações nos cursos futuros, tendo em vista que, muitas vezes, por experiência própria, os cursos não condizem com as reais necessidades da prática. A proposta dos profissionais foi o levantamento periódico dos temas a serem abordados com a própria equipe e a confecção de cronograma de reuniões educativas flexíveis à rotina dos setores, no sentido de valorizar essa prática como essencial à melhoria da assistência prestada, aumentando a comunicação e diminuindo a distância entre os elementos da equipe.

Considera-se que a equipe de enfermagem tem potencialidades para desenvolver sua prática articulada com o princípio da integralidade, atendendo as necessidades de saúde da população, com qualidade de assistência.

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    Ione Carvalho PintoI; Carla Santa Maria MarcilianoII; Fabiana Costa Machado ZachariasII; Ana Paula Neroni StinaIII; Ivana Astolphi Gandra PasseriIV; Alexandre Favero BulgarelliV
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      20 Nov 2012
    • Data do Fascículo
      Out 2012

    Histórico

    • Recebido
      20 Dez 2011
    • Aceito
      04 Set 2012
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