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Qualidade de vida de pessoas receptoras de transplante renal no Amazonas

Objetivo:

analisar a qualidade de vida de receptores de transplante renal no Estado do Amazonas.

Método:

estudo transversal, descritivo, realizado com 222 indivíduos pós-transplante renal cadastrados em uma clínica privada e em um ambulatório público de saúde. A coleta de dados deu-se por meio de entrevista estruturada onde a qualidade de vida foi medida pelo Kidney Disease Quality of Life - Short Form. Para a análise dos dados, foi utilizada estatística descritiva.

Resultados:

os escores de qualidade de vida encontrados variaram de 36,5 a 83,1. Os domínios de qualidade de vida específicos da doença renal mostraram-se superiores aos genéricos. Os mais comprometidos foram Situação de trabalho; Sono; Função física e Função emocional, com escores 36,5; 53,7; 52,4; 55,1, respectivamente, e correlacionados moderada e significativamente entre si.

Conclusão:

a maioria (63,2%) dos domínios de qualidade de vida obtiveram escores elevados e o componente específico da doença renal teve pontuações superiores ao componente genérico.

Descritores:
Qualidade de Vida; Insuficiência Renal Crônica; Transplante de Rim; Assistência ao Paciente; Transplantados; Saúde Pública


Abstarct

Objective:

to analyze the quality of life of kidney transplant receivers in the State of Amazonas.

Method:

a cross-sectional, descriptive study, performed with 222 individuals after renal transplantation registered in a private clinic and in a health public ambulatory. Data collection took place through structured interviews where the quality of life was measured by the Kidney Disease Quality of Life - Short Form. Descriptive statistics were used for data analysis.

Results:

the quality of life scores found ranged from 36.5 to 83.1. The quality of life domains, specifics of renal disease, have proved to be superior to generic ones. The most compromised were work situation; sleep; physical function and emotional function, with scores of 36.5; 53.7; 52.4; 55.1, respectively, and correlated moderately and significantly with each other.

Conclusion:

the majority (63.2%) of the quality of life domains obtained high scores and the specific component of renal disease had higher scores than the generic component.

Descriptors:
Quality of Life; Renal Insufficiency, Chronic; Kidney Transplantation; Patient Care; Transplant Recipients; Public Health

Objetivo:

analizar la calidad de vida de las personas receptoras de trasplante renal en el Estado de Amazonas.

Método:

estudio transversal descriptivo, realizado con 222 personas, con posterioridad a la realización de un trasplante renal, inscriptos en una clínica privada y en un hospital público. La recolección de datos se realizó mediante entrevista semiestructurada y se midió la calidad de vida por medio del Kidney Disease Quality of Life - Short Form. En el análisis de datos, se utilizó la estadística descriptiva.

Resultados:

El puntaje de calidad de vida obtenido osciló de 36,5 a 83,1. Los dominios de calidad de vida propios de la enfermedad renal, tuvieron un puntaje superior al genérico. Los más comprometidos fueron: situación laboral, sueño, función física y función emocional, con puntajes de 36,5; 53,7; 52,4; 55,1, respectivamente, y correlacionados moderada y significativamente entre sí.

Conclusión:

la mayoría (63,2%) de los dominios relativos a la calidad de vida obtuvieron puntajes elevados y el componente específico de la enfermedad renal obtuvo un puntaje superior al componente genérico.

Descriptores:
Calidad de Vida; Insuficiencia Renal Crónica; Trasplante de Riñón; Atención al Paciente; Receptores de Trasplantes; Salud Pública


Introdução

A prevalência mundial da doença renal crônica terminal (DRC) tem aumentado consideravelmente nos últimos anos. O avanço tecnológico relacionado às Terapias Renais Substitutivas (TRS) - hemodiálise (HD), diálise peritoneal (DP) e transplante (Tx) renal - tem possibilitado maior sobrevida aos pacientes, ainda que com algumas sequelas e/ou comorbidades(11 Alvares J, Almeida AM, Szuster DAC, Gomes IC, Andrade EIG, Acurcio FA, et al. Factors associated with quality of life in patients in renal replacement therapy in Brazil. Ciênc Saúde Coletiva. [Internet]. 2013 July [cited July 17, 2019];18(7):1903-10. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-81232013000700005&lng=en
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). Neste cenário, o Brasil é destaque na coordenação e na regulamentação de transplantes de órgãos em serviços públicos, ficando em 2º lugar em número absoluto de transplantes no mundo(22 Santos BP, Viegas AC, Paula EA, Lise F, Rodrigues LPV, Fuculo PRB Junior, et al. Perception of people undergoing kidney transplantation about organ donation. ABCS Health Sci. 2018;43(1):30-5. doi: 10.7322/abcshs.v43i1.928
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), porém, desce para 25º lugar quando se considera a proporção de sua população(33 Associação Brasileira de Transplante de Órgãos. Dimensionamento dos transplantes no Brasil e em cada estado (2011-2018). Registro Brasileiro de Transplantes. [Internet]. 2018 [Acesso 9 may 2019];24(4):1-102. Disponível em: http://www.abto.org.br/abtov03/Upload/file/RBT/2018/Lv_RBT-2018.pdf
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).

É importante ressaltar que o Tx renal já foi caracterizado como a melhor alternativa, financeira e clínica, nos casos de DRC em estágio terminal, gerando uma significativa economia aos cofres do Estado(44 Silva SB, Caulliraux HM, Araújo CAS, Rocha E. Cost comparison of kidney transplant versus dialysis in Brazil. Cad Saúde Pública. [Internet]. 2016 [cited July 17, 2019];32(6):1-13. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-311X2016000605005&lng=en
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). Apesar disso, o Brasil permanece com a taxa de Tx renais inalterada nos últimos seis anos: 28,5 pmp e menos de 50% da necessidade estimada de Tx renais realmente foi efetivada no último ano. Evidencia-se, também, uma queda (32,9%) na taxa de transplantes com doador vivo em contrapartida ao pequeno aumento (10,3%) da taxa com doador falecido(33 Associação Brasileira de Transplante de Órgãos. Dimensionamento dos transplantes no Brasil e em cada estado (2011-2018). Registro Brasileiro de Transplantes. [Internet]. 2018 [Acesso 9 may 2019];24(4):1-102. Disponível em: http://www.abto.org.br/abtov03/Upload/file/RBT/2018/Lv_RBT-2018.pdf
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).

Embora a insuficiência renal tenha adquirido importância no rol das doenças crônicas, existe um número reduzido de artigos relacionados à temática. Entre eles, predominam os referentes a usuários em hemodiálise, evidenciando as dimensões de saúde relacionadas à DRC e como as mesmas influenciam a sua qualidade de vida (QV)(55 Weykamp JM, Nunes MHB, Cecagno D, Siqueira HCH. Quality of life and chronic renal failure. Rev Pesqui. [Internet]. 2017 Oct[cited July 17, 2019];9(4): 1113-20. Available from: http://www.seer.unirio.br/index.php/cuidadofundamental/article/view/5897
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).

Para avaliar a eficácia e até mesmo auxiliar na escolha dentre as modalidades de tratamento disponíveis, a qualidade de vida vem sendo frequentemente utilizada como parâmetro ao redor do mundo(66 Beber GC, Fontela PC, Herr GEG, Winkelmann ER. Life quality of kidney transplant patients after a long transplant period. Saude Pesqui. 2017;10(1):163-70. doi: 10.177651/1983-1870.2017v10n1p163-170
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). Para tanto, estudos vêm apresentando instrumentos formulados no intuito de mensurar a QV de forma genérica e, também, de forma específica em grupos de indivíduos com características diferenciadas da população em geral, a exemplo dos portadores de DRC.

Um dos instrumentos genéricos de QV mais famosos e utilizados atualmente é o Inquérito de Saúde SF-36, publicado em 1993, traduzido e validado no Brasil, em 1997. Dele, derivou-se o Kidney Disease Quality of Life - Short Form (KDQOL-SF), publicado em 1997 e específico para a mensuração da QV em pacientes renais crônicos em tratamento dialítico. Em 2003, o KDQOL-SF foi traduzido e validado para o Brasil e hoje é um dos instrumentos mais completos de QV disponíveis para a população renal(77 Duarte PS, Miyazaki MCOS, Ciconelli RM, Sesso R. Translation and cultural adaptation of the quality of life assessment instrument for chronic renal patients (KDQOL-SFTM). Rev Assoc Med Bras. [Internet]. 2003 [cited July 17, 2019];49(4):375-81. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-42302003000400027&lng=en
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).

Já em 2006, um estudo realizado em Budapeste/Hungria demonstrou que o KDQOL-SF é também confiável e válido para pacientes pós-Tx renal, podendo, inclusive, ser utilizado para comparar diferentes populações com doença renal terminal(88 Barotfi S, Molnar MZ, Almasi C, Kovacs AZ, Remport A, Szeifert L, et al. Validation of the Kidney Disease Quality of Life-Short Form questionnaire in kidney transplant patients. J Psychosom Res. 2006;60(5):495-504. doi: 10.1016/j.jpsychores.2005.09.009
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). No entanto, poucos são os estudos publicados que analisam a qualidade de vida dos receptores de transplante renal por meio do KDQOL e apenas um deles é brasileiro(66 Beber GC, Fontela PC, Herr GEG, Winkelmann ER. Life quality of kidney transplant patients after a long transplant period. Saude Pesqui. 2017;10(1):163-70. doi: 10.177651/1983-1870.2017v10n1p163-170
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).

Este único estudo nacional foi realizado na Região Sul do país que, por sua vez, tem diferenças discrepantes em relação à Região Norte no que se refere à população, geografia, cultura, desenvolvimento, economia, acesso a bens e serviços de saúde, além das diferenças quanto ao serviço de transplantes que colocam as duas em extremos opostos no que se refere à taxa de transplantes renais, ficando a Região Sul em 1o lugar, com uma taxa 11,16 vezes maior do que a da Região Norte, último lugar do país(33 Associação Brasileira de Transplante de Órgãos. Dimensionamento dos transplantes no Brasil e em cada estado (2011-2018). Registro Brasileiro de Transplantes. [Internet]. 2018 [Acesso 9 may 2019];24(4):1-102. Disponível em: http://www.abto.org.br/abtov03/Upload/file/RBT/2018/Lv_RBT-2018.pdf
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).

Isso deve-se também ao fato de que três dos sete Estados que compõem a Região Norte não realizaram transplantes renais no último ano (Amapá, Roraima e Tocantins) e o Estado do Amazonas realizou apenas um Tx renal(33 Associação Brasileira de Transplante de Órgãos. Dimensionamento dos transplantes no Brasil e em cada estado (2011-2018). Registro Brasileiro de Transplantes. [Internet]. 2018 [Acesso 9 may 2019];24(4):1-102. Disponível em: http://www.abto.org.br/abtov03/Upload/file/RBT/2018/Lv_RBT-2018.pdf
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). Essas considerações reforçam as diferenças existentes entre as regiões do Brasil e a necessidade de um estudo sobre a temática no Norte e em outras regiões do país.

Objetivou-se, considerando o exposto por este estudo, analisar a qualidade de vida de receptores de transplante renal no Estado do Amazonas.

Método

Estudo descritivo, transversal, de abordagem quantitativa, realizado nas duas únicas instituições que acompanham pacientes renais pós-transplante no Estado do Amazonas, uma pública e outra particular, ambas localizadas na capital Manaus.

Previamente ao início da coleta, as instituições forneceram carta de anuência para a realização da pesquisa e uma lista com os pacientes pós-Tx cadastrados em cada uma delas: 194 usuários no ambulatório público e 74 na clínica particular, totalizando 268 transplantados que correspondem à população do estudo.

Para a seleção dos participantes, utilizaram-se os seguintes critérios de inclusão: ser maior de idade (≥18 anos); residir no Estado do Amazonas; encontrar-se disponível em Manaus/AM no período da coleta; ter realizado o transplante há, pelo menos, três meses; estar com o enxerto renal funcionante e/ou não estar realizando terapia dialítica e ter condições cognitivas de responder aos instrumentos. Além disso, quatro transplantados foram excluídos por autodeclararem-se indígenas, visto não haver tempo viável para a obtenção de anuência dos órgãos especificamente responsáveis pela realização de pesquisas com essa população. Com isso, 222 (82,8%) transplantados renais compuseram a amostra final.

A coleta de dados ocorreu de junho de 2018 a fevereiro de 2019. Neste período, foi realizada uma busca ativa de todos os transplantados integrantes das duas listas fornecidas por meio de telefonemas, associações de usuários, redes sociais virtuais, além de serem convidados de forma presencial no momento em que compareciam para a consulta de acompanhamento nas próprias instituições. Foram considerados “não localizados” aqueles que não puderam ser abordados ou não compareceram às consultas de retorno pós-Tx e/ou não puderam ser contatados após três ou mais tentativas telefônicas.

Durante a coleta de dados, foram realizadas entrevistas individualizadas, em local reservado, previamente acordado com cada usuário, geralmente no próprio ambulatório ou clínica. Cada transplantado respondeu a um formulário de caracterização da população e ao KDQOL-SF. O KDQOL-SF é composto por 21 subescalas de QV subdivididas em 80 itens dentre os quais está incluso o Medical Outcomes Survey - 36 Item Short-Form Health Survey (SF-36) como medida genérica, além dos itens específicos às particularidades do paciente renal crônico(77 Duarte PS, Miyazaki MCOS, Ciconelli RM, Sesso R. Translation and cultural adaptation of the quality of life assessment instrument for chronic renal patients (KDQOL-SFTM). Rev Assoc Med Bras. [Internet]. 2003 [cited July 17, 2019];49(4):375-81. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-42302003000400027&lng=en
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). O KDQOL-SF é de domínio público, disponibilizado no site da desenvolvedora Research and Development Corporation (RAND)(99 RAND Health Care. Kidney Disease Quality of Life Instrument (KDQOL). [Internet]. [cited Nov 11, 2019]. Available from: https://www.rand.org/health-care/surveys_tools/kdqol.html
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) e composto por 19 dimensões de QV, sendo oito oriundas do SF-36: Funcionamento físico; Função física; Função emocional; Função social; Bem-estar emocional; Dor, Energia/Fadiga; Saúde geral e um item sobre Saúde atual computado à parte. Por sua vez, onze são da parte específica do KDQOL-SF: Sintomas/problemas; Efeitos da doença renal; Sobrecarga da doença renal; Situação de trabalho; Função cognitiva; Qualidade das interações sociais; Função sexual; Sono; Suporte social; Estímulo da equipe de diálise; Satisfação do paciente e um item de Saúde geral computado à parte(77 Duarte PS, Miyazaki MCOS, Ciconelli RM, Sesso R. Translation and cultural adaptation of the quality of life assessment instrument for chronic renal patients (KDQOL-SFTM). Rev Assoc Med Bras. [Internet]. 2003 [cited July 17, 2019];49(4):375-81. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-42302003000400027&lng=en
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). Neste estudo, foram excluídos cinco itens que correspondem a duas dimensões da parte específica do instrumento por serem voltados a pacientes em diálise.

As respostas do KDQOL-SF originam escores de zero a 100, onde valores maiores sempre representam melhores estados de qualidade de vida. Cada dimensão de QV corresponde à média aritmética dos itens que a compõem. O manual com as instruções de codificação e interpretação é disponibilizado no site da RAND(99 RAND Health Care. Kidney Disease Quality of Life Instrument (KDQOL). [Internet]. [cited Nov 11, 2019]. Available from: https://www.rand.org/health-care/surveys_tools/kdqol.html
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).

Para a análise dos dados, foi utilizada estatística descritiva: frequências absoluta e relativa para as questões referentes à caracterização da população de estudo e médias e desvios-padrão para os escores das dimensões de qualidade de vida. Posteriormente, foi utilizado teste de correlação de Pearson entre escores das dimensões de QV mais comprometidas, onde valores de r entre 0,1 e 0,29 foram considerados como um efeito pequeno; entre 0,3 e 0,49, efeito médio, e maior ou igual a 0,5, um efeito grande. Para avaliar a confiabilidade e a consistência interna das respostas ao instrumento, foi calculado o coeficiente alfa (α) de Cronbach, onde valores maiores que 0,7 são considerados confiáveis. Os dados coletados foram armazenados, codificados, analisados e interpretados por meio da ferramenta Statistical Package for Social Sciences SPSS ® para Windows®, versão 21.0.

Foram atendidas as recomendações éticas nacionais sobre pesquisas com seres humanos, preconizadas pelo Conselho Nacional de Saúde, e o estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Amazonas sob o parecer n.º 2.724.945 e CAAE 88684218.7.0000.5020.

Resultados

A amostra final do estudo foi composta por 222 transplantados renais entre os quais predominaram homens (60,4%), casados (45,5%), com idade média de 45,8 (±12,8) anos, pardos (74,3%), com 11,3 (±4,6) anos de estudo. Quanto ao município de residência atual, 194 (87,4%) moravam em Manaus (capital). O serviço público foi responsável por acompanhar 77% dos transplantados. Já em relação ao tipo de doador do órgão, 110 receberam de doadores familiares, 35 de doadores vivos não parentes e 77 (34,7%) de falecidos. A maioria (72,1%) negou trabalho atual, porém, a renda pessoal variou de 0,0 a 30,1 salários mínimos, com mediana de 1,3 [1,0;3,3].

Os resultados relativos à QV relacionada à saúde do grupo em estudo são exibidos na Tabela 1 e divididos entre os escores dos domínios genéricos de saúde e específicos da DRC. O coeficiente α de Cronbach foi igual a 0,95, indicando uma forte consistência interna e confiabilidade das respostas encontradas.

Tabela 1
Análise descritiva dos escores de qualidade de vida (KDQOL-SF* * KDQOL-SF = Kidney Disease Quality of Life; ) em receptores de transplante renal em cada um dos seus domínios. Manaus, AM, Brasil, 2018-2019 (n=222)

Observa-se na Tabela 1 que o Sono (53,7) e a Situação de trabalho (36,5) tiveram as menores médias dentre as dimensões específicas da doença renal, sendo a Situação de trabalho (ou Papel profissional) a média mais baixa (36,5) entre elas. Já no que se refere às dimensões genéricas de saúde, nenhuma apresentou valor tão baixo. Porém, dentre elas, as menores médias foram na Função física (52,4) e na Função emocional (55,1).

Ao analisar a relação entre as dimensões mais comprometidas dos componentes específico (Sono e Trabalho) e genérico (Função emocional e Função física) do KDQOL, pelo teste de correlação de Pearson, encontram-se correlações moderadas entre Sono e Função emocional (r=0,32) e entre Trabalho e Função física (r=0,42), ambas significativas no nível 0,01.

Discussão

Trata-se do primeiro estudo a analisar a qualidade de vida de receptores de transplante renal no Estado do Amazonas, sendo também o segundo brasileiro a utilizar um instrumento específico de QV para portadores de doença renal crônica nesse tipo de indivíduos.

Observou-se uma população semelhante à encontrada em outros estudos nacionais(66 Beber GC, Fontela PC, Herr GEG, Winkelmann ER. Life quality of kidney transplant patients after a long transplant period. Saude Pesqui. 2017;10(1):163-70. doi: 10.177651/1983-1870.2017v10n1p163-170
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,1010 Leite RF, Silva ACM, Oliveira PC, Silva LMG, Pestana JMA, Schirmer J, et al. Measurement of adherence to immunosuppressive drugs in renal transplant recipients. Acta Paul Enferm. [Internet]. 2018 [cited July 17, 2019];31(5):489-96. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-21002018000500489&lng=en
http://www.scielo.br/scielo.php?script=s...
-1111 Ribeiro DF, Ribeiro RCHM, Baptista MASF, Cesarino CB, Rodrigues CC, Landim WP. Demographic and clinical factors associated with health-related quality of life of kidney-transplanted patients. Rev Enferm UFPE on line. [Internet]. 2015 Jul 16 [cited July 17, 2019];10(1): 57-64. Available from: https://periodicos.ufpe.br/revistas/revistaenfermagem/article/view/10921
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) e internacionais(88 Barotfi S, Molnar MZ, Almasi C, Kovacs AZ, Remport A, Szeifert L, et al. Validation of the Kidney Disease Quality of Life-Short Form questionnaire in kidney transplant patients. J Psychosom Res. 2006;60(5):495-504. doi: 10.1016/j.jpsychores.2005.09.009
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,1212 Abaci SH, Alagoz S, Salihoglu A, Yalin SF, Gulcicek S, Altiparmak MR, et al. Assessment of anemia and quality of life in patients with renal transplantation. Transplant Proc. [Internet]. 2015 Dec [cited July 17, 2019];47(10):2875-80. Available from: https://www-sciencedirect.ez2.periodicos.capes.gov.br/science/article/pii/S004113451501043X
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) no que se refere a sexo, idade, situação conjugal, local de residência (capital/interior), trabalho e anos de estudo completos.

Já em relação à cor/raça autorrelatadas, poucos estudos sobre a temática divulgaram esta característica da população e, dentre eles, predominou a cor/raça branca(1111 Ribeiro DF, Ribeiro RCHM, Baptista MASF, Cesarino CB, Rodrigues CC, Landim WP. Demographic and clinical factors associated with health-related quality of life of kidney-transplanted patients. Rev Enferm UFPE on line. [Internet]. 2015 Jul 16 [cited July 17, 2019];10(1): 57-64. Available from: https://periodicos.ufpe.br/revistas/revistaenfermagem/article/view/10921
https://periodicos.ufpe.br/revistas/revi...
,1313 Andrade SV, Sesso R, Diniz DHMP. Hopelessness, suicide ideation, and depression in chronic kidney disease patients on hemodialysis or transplant recipients. J Bras Nefrol. [Internet]. 2015 Mar [cited July 17, 2019];37(1):55-63. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-28002015000100055&lng=en
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), contrapondo a grande maioria parda encontrada nesta pesquisa. Essas observações condizem com o cenário brasileiro onde a maioria da população se autodeclara branca, principalmente nas regiões Sul (78,5%) e Sudeste (55,2%) (de onde se origina o maior número de publicações científicas), contrapondo-se às demais regiões, como a Norte, onde a maioria dos habitantes se autodeclara parda (66,9%)(1414 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Censo Demográfico 2010: características da população e dos domicílios: Resultados do Universo. [Internet]. 2010 [acesso 25 mai 2019]. Disponível em: https://sidra.ibge.gov.br/pesquisa/censo-demografico/demografico-2010/universo-caracteristicas-da-populacao-e-dos-domicilios
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).

Já no que tange ao tipo de doador, o maior número de doadores vivos encontrado na pesquisa opõe-se ao cenário nacional, onde o número de transplantes por doador falecido sempre foi maior. No ano de 2018, apenas 17,18% dos Tx renais no país foram oriundos de doadores vivos(33 Associação Brasileira de Transplante de Órgãos. Dimensionamento dos transplantes no Brasil e em cada estado (2011-2018). Registro Brasileiro de Transplantes. [Internet]. 2018 [Acesso 9 may 2019];24(4):1-102. Disponível em: http://www.abto.org.br/abtov03/Upload/file/RBT/2018/Lv_RBT-2018.pdf
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). Estudo semelhante realizado em um município na Região Sul do país também encontrou prevalência de Tx-renais oriundos de doadores vivos (75%)(66 Beber GC, Fontela PC, Herr GEG, Winkelmann ER. Life quality of kidney transplant patients after a long transplant period. Saude Pesqui. 2017;10(1):163-70. doi: 10.177651/1983-1870.2017v10n1p163-170
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). O tipo de doador mais frequente no Amazonas é reflexo também da taxa de doadores efetivos de órgãos: 3 pmp, bem inferior à taxa nacional de 17 pmp(33 Associação Brasileira de Transplante de Órgãos. Dimensionamento dos transplantes no Brasil e em cada estado (2011-2018). Registro Brasileiro de Transplantes. [Internet]. 2018 [Acesso 9 may 2019];24(4):1-102. Disponível em: http://www.abto.org.br/abtov03/Upload/file/RBT/2018/Lv_RBT-2018.pdf
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).

Ressalta-se, aqui, que o transplante por doador falecido só passou a ser realizado no Amazonas no ano de 2011. Ainda assim, a logística de transporte para o Estado dificulta o recebimento de órgãos de outras regiões em tempo hábil para a cirurgia. No caso do rim, esse precisa ser enxertado em até 24 horas para garantir a possibilidade de sucesso do transplante.

Salienta-se a necessidade de atenção e aprimoramento na captação de doadores vivos (potenciais e efetivos), problema esse que não se restringe à localidade ou ao país, mas, sim, aos programas de transplante ao redor do mundo.

Cita-se um estudo realizado em Andaluzia, região autônoma da Espanha, onde 45% dos receptores de rim de doador vivo declararam necessitar de mais informações sobre esse tipo de Tx. Acrescenta-se, ainda, nesse estudo, que apenas 7,5% desses receptores receberam informações sobre Tx de doador vivo por meio de uma enfermeira. Com relação aos doadores, nenhum referiu ser informado sobre o tema por este profissional(1515 Calvo-Calvo MA, Morgado Almenara I, Gentil Govantes MA, Moreno Rodríguez AM, Puertas Cruz TP, García Álvarez T, et al. Socio-sanitary profile and information for living kidney donors and recipients in three Andalusian hospitals. Nefrologia. [Internet]. 2018 Feb [cited Dec 16, 2019];38(3):304-14. Available from: https://www.revistanefrologia.com/en-pdf-S2013251418300154
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), evidenciando a importância da difusão mais ampla de informações sobre o processo de doação de rins e maior sensibilização das pessoas a fim de oportunizar uma maior captação de potenciais doadores vivos.

De forma geral, ao observar os resultados da Tabela 1, percebe-se que os escores dos domínios específicos do instrumento foram melhores do que os dos domínios genéricos. Ainda assim, foi também na parte específica que se encontraram as duas dimensões com piores escores do KDQOL, demonstrando a importância do uso de instrumentos que levam em consideração especificidades de um grupo com características diferenciadas como os portadores de DRC.

Ao comparar os resultados de QV de outros estudos com os aqui apresentados, verificou-se que, no Amazonas, a QV do paciente pós-Tx renal é inferior, na maioria das dimensões, à dos receptores do Rio Grande do Sul(66 Beber GC, Fontela PC, Herr GEG, Winkelmann ER. Life quality of kidney transplant patients after a long transplant period. Saude Pesqui. 2017;10(1):163-70. doi: 10.177651/1983-1870.2017v10n1p163-170
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), integrante da Região Sul do país, que, por sua vez, é mais desenvolvida e com taxas e avaliações muito melhores do que as da região Norte no que se refere ao sistema nacional de transplantes.

Já em relação aos outros países ao redor do mundo, os transplantados deste estudo tiveram escores superiores aos da maior parte dos países que publicaram resultados do KDQOL-SF neste tipo de população, como a Noruega, Hungria, Polônia, Estados Unidos da América (EUA), entre outros(88 Barotfi S, Molnar MZ, Almasi C, Kovacs AZ, Remport A, Szeifert L, et al. Validation of the Kidney Disease Quality of Life-Short Form questionnaire in kidney transplant patients. J Psychosom Res. 2006;60(5):495-504. doi: 10.1016/j.jpsychores.2005.09.009
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,1616 von der Lippe N, Waldum-Grevbo B, Varberg Reisæter A, Os I. Is HRQOL in dialysis associated with patient survival or graft function after kidney transplantation? BMC Nephrol. [Internet]. 2016 Jul [cited July 17, 2019];17:94. Available from: https://bmcnephrol.biomedcentral.com/track/pdf/10.1186/s12882-016-0316-5
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17 Czyzewski L, Frelik P, Wyzgal J, Szarpak L. Evaluation of quality of life and severity of depression, anxiety, and stress in patients after kidney transplantation. Transplant Proc. [Internet]. 2018 Jul-Aug [cited July 17, 2019];50(6):1733-7. Available from: https://reader.elsevier.com/reader/sd/pii/S0041134518305967?token=0CBE8A21A180DA0359A7DAF14C33B59580DA6D660345B3DF614767ECB585BD4ED9FD154561E2E3ABCE4027CCACAC7BE9
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-1818 Madariaga MLL, Spencer PJ, Shanmugarajah K, Crisalli KA, Chang DC, Markmann JF, et al. Effect of tolerance versus chronic immunosuppression protocols on the quality of life of kidney transplant recipients. JCI Insight. [Internet]. 2016 Jun [cited July 17, 2019];1(8):1-7. Available from: https://insight.jci.org/articles/view/87019
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), o que talvez seja reflexo do Sistema Único de Saúde (SUS) brasileiro, baseado em uma concepção abrangente de universalidade, que prevê cobertura e atenção integral à saúde para toda a população, não se excluindo, é claro, outros possíveis fatores relacionados(1919 Giovanella L, Mendoza-Ruiz A, Pilar ACA, Rosa MC, Martins GB, Santos IS, et al. Universal health system and universal health coverage: assumptions and strategies. Ciênc Saúde Coletiva. 2018 Mar;23(6):1763-76. doi: 10.1590/1413-81232018236.05562018
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).

Com relação à situação laboral, a maioria dos transplantados (72,1%) afirmou não estar trabalhando, porém, a mediana da renda pessoal foi de 1,3. Esse contraponto deve-se ao fato de grande parte deles afirmar receber auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez. Além disso, alguns relataram meio informal de composição de renda, realidade essa condizente com a literatura, pois os vínculos informais são mais facilmente adaptáveis, podendo os transplantados renais escolherem a melhor atividade que se adeque às suas capacidades, estado geral, horários e períodos mais flexíveis(2020 Pereira NCS, Gléria JSC. Patient return chronic kidney to production activities after kidney transplantation. Rev Ter Ocup Univ São Paulo. [Internet]. 2017 May-Aug. [cited December 16, 2019];28(2):221-9. Available from: http://www.revistas.usp.br/rto/article/view/122708/134993
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).

Este aspecto refletiu diretamente na dimensão “Situação de trabalho” que acabou apresentando o menor escore (36,5±40) entre os transplantados. Essa dimensão também foi uma das mais comprometidas em estudos similares com pacientes pós-Tx renal no Brasil(66 Beber GC, Fontela PC, Herr GEG, Winkelmann ER. Life quality of kidney transplant patients after a long transplant period. Saude Pesqui. 2017;10(1):163-70. doi: 10.177651/1983-1870.2017v10n1p163-170
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) e em outros países(1616 von der Lippe N, Waldum-Grevbo B, Varberg Reisæter A, Os I. Is HRQOL in dialysis associated with patient survival or graft function after kidney transplantation? BMC Nephrol. [Internet]. 2016 Jul [cited July 17, 2019];17:94. Available from: https://bmcnephrol.biomedcentral.com/track/pdf/10.1186/s12882-016-0316-5
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-1717 Czyzewski L, Frelik P, Wyzgal J, Szarpak L. Evaluation of quality of life and severity of depression, anxiety, and stress in patients after kidney transplantation. Transplant Proc. [Internet]. 2018 Jul-Aug [cited July 17, 2019];50(6):1733-7. Available from: https://reader.elsevier.com/reader/sd/pii/S0041134518305967?token=0CBE8A21A180DA0359A7DAF14C33B59580DA6D660345B3DF614767ECB585BD4ED9FD154561E2E3ABCE4027CCACAC7BE9
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,2020 Pereira NCS, Gléria JSC. Patient return chronic kidney to production activities after kidney transplantation. Rev Ter Ocup Univ São Paulo. [Internet]. 2017 May-Aug. [cited December 16, 2019];28(2):221-9. Available from: http://www.revistas.usp.br/rto/article/view/122708/134993
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).

Outro domínio específico do KDQOL-SF bastante comprometido foi o Sono (53,7±17,3), com escore bem inferior ao de estudo similar realizado na região Sul do Brasil, com média igual a 77,4 (±19,5)(66 Beber GC, Fontela PC, Herr GEG, Winkelmann ER. Life quality of kidney transplant patients after a long transplant period. Saude Pesqui. 2017;10(1):163-70. doi: 10.177651/1983-1870.2017v10n1p163-170
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). Nos estudos internacionais que utilizaram o mesmo instrumento após transplante renal, o menor escore encontrado no domínio Sono foi em Boston/Massachusetts nos EUA, em 2016(1818 Madariaga MLL, Spencer PJ, Shanmugarajah K, Crisalli KA, Chang DC, Markmann JF, et al. Effect of tolerance versus chronic immunosuppression protocols on the quality of life of kidney transplant recipients. JCI Insight. [Internet]. 2016 Jun [cited July 17, 2019];1(8):1-7. Available from: https://insight.jci.org/articles/view/87019
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), com 64,1(±16,7) de média no domínio.

Quanto à parte genérica do instrumento, derivada do SF-36, as dimensões mais comprometidas foram a Função física (52,4) e a Função emocional (55,1), que se referem ao ponto em que as questões físicas e emocionais interferiram nas atividades ou funções diárias do indivíduo e se ele precisou reduzir essas atividades devido a essas questões. Em outro estudo brasileiro, realizado em uma cidade no Sul do país, a Função física e a Função emocional obtiveram escores 11,1% e 15,7% maiores do que os do Amazonas(66 Beber GC, Fontela PC, Herr GEG, Winkelmann ER. Life quality of kidney transplant patients after a long transplant period. Saude Pesqui. 2017;10(1):163-70. doi: 10.177651/1983-1870.2017v10n1p163-170
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). Nenhuma outra dimensão genérica de QV do estudo lá realizado teve escore tão baixo quanto os aqui encontrados.

Já entre os estudos internacionais similares, alguns também tiveram a dimensão Função física dentre aquelas com escores mais baixos(88 Barotfi S, Molnar MZ, Almasi C, Kovacs AZ, Remport A, Szeifert L, et al. Validation of the Kidney Disease Quality of Life-Short Form questionnaire in kidney transplant patients. J Psychosom Res. 2006;60(5):495-504. doi: 10.1016/j.jpsychores.2005.09.009
https://doi.org/10.1016/j.jpsychores.200...
,1717 Czyzewski L, Frelik P, Wyzgal J, Szarpak L. Evaluation of quality of life and severity of depression, anxiety, and stress in patients after kidney transplantation. Transplant Proc. [Internet]. 2018 Jul-Aug [cited July 17, 2019];50(6):1733-7. Available from: https://reader.elsevier.com/reader/sd/pii/S0041134518305967?token=0CBE8A21A180DA0359A7DAF14C33B59580DA6D660345B3DF614767ECB585BD4ED9FD154561E2E3ABCE4027CCACAC7BE9
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,2121 Kostro JZ, Hellmann A, Kobiela J, Skóra I, Lichodziejewska-Niemierko M, Debska-Slizienski Z. Quality of life after kidney transplantation: a prospective study. Transplant Proc. [Internet]. 2016 Jan-Feb [cited July 17, 2019];48(1):50-4. Available from: https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S004113451501194X?via%3Dihub
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), porém, a Função emocional teve bons escores nesses estudos. Apenas dois estudos, um realizado em Warsaw/Polônia e outro em Daka/Bangladesh, tiveram a Função emocional tão comprometida, inferior à do estudo aqui apresentado, com escores de 37,33 (±43,6) e 46 (±44), respectivamente(1717 Czyzewski L, Frelik P, Wyzgal J, Szarpak L. Evaluation of quality of life and severity of depression, anxiety, and stress in patients after kidney transplantation. Transplant Proc. [Internet]. 2018 Jul-Aug [cited July 17, 2019];50(6):1733-7. Available from: https://reader.elsevier.com/reader/sd/pii/S0041134518305967?token=0CBE8A21A180DA0359A7DAF14C33B59580DA6D660345B3DF614767ECB585BD4ED9FD154561E2E3ABCE4027CCACAC7BE9
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,2222 Hossain RM, Iqbal MM, Alam MR, Islam SF, Faroque MO, Selim SI. Quality of life in renal transplant recipient and donor. Transplantation Proc. [Internet]. 2015 May [cited July 17, 2019];47(4):1128-30. Available from: https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S0041134515002213?via%3Dihub
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).

Como citado anteriormente, houve correlação moderada e significativa entre as dimensões Sono eFunção emocional e entre Situação de trabalhoeFunção física. Esta correlação talvez tenha sido reforçada pelo serviço de acompanhamento pós-Tx precário na época da coleta, priorizando-se a avaliação médica especializada em detrimento de um acompanhamento multidisciplinar, evidente na rede particular, mas também comprometido na rede pública.

Os resultados aqui encontrados apontam para a necessidade de educação em saúde sobre os cuidados e estilo de vida pós-Tx renal, incluindo orientações e promoção de atividades voltadas à prática de exercícios físicos permitidos para este público específico. Nesse quesito, a Enfermagem pode ser um ponto-chave para intervenções, já que é o profissional que ainda tem contato mais frequente e prolongado com os clientes em tratamento ambulatorial pós-Tx.

Além disso, sugere-se atenção especial dos profissionais de saúde envolvidos quanto à qualidade do sono dos transplantados, seus fatores relacionados e mecanismos ou estratégias de regularização do sono. Também faz-se necessária a conscientização da população sobre transplante e campanhas de promoção à doação de órgãos, tornando públicos estudos que mostram a melhora na QV, tanto do receptor quando do doador(2222 Hossain RM, Iqbal MM, Alam MR, Islam SF, Faroque MO, Selim SI. Quality of life in renal transplant recipient and donor. Transplantation Proc. [Internet]. 2015 May [cited July 17, 2019];47(4):1128-30. Available from: https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S0041134515002213?via%3Dihub
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), assim como investimentos no serviço de captação de órgãos local e na realização dos transplantes.

Uma limitação encontrada neste estudo diz respeito ao recorte transversal, que prejudica a determinação de relações causa-efeito entre as varáveis estudadas. Além disso, o método quantitativo não abarca a totalidade e a profundidade da temática multifatorial e complexa que é a qualidade de vida em saúde.

Por isso, sugere-se o desenvolvimento de estudos futuros com abordagens diferenciadas que possam abarcar a complexidade e multifatoriedade que é qualidade de vida em saúde, dentre eles: longitudinais, que possam demonstrar a evolução e modificações da QV ao longo dos anos pós-Tx; que investiguem o comprometimento psicológico/psiquiátrico dessa clientela; que busquem analisar a áreas apontadas aqui como comprometidas (física, emocional/mental e laboral) e qualitativos, que permitam o aprofundamento na captação dos sentimentos e percepções do indivíduo que convive com a DRC ao longo de anos, incluindo aqueles que alcançaram a melhor alternativa terapêutica nos casos de insuficiência renal crônica terminal.(IRCT); abordando suas expectativas, medos, perdas, vitórias e perspectivas atuais e futuras.

Conclusão

A QV em saúde autorrelatada por meio do Kidney Disease Quality of Life - Short Form teve médias melhores no componente específico do instrumento, que se mostrou consistente e confiável para os transplantados renais do estudo. As dimensões de QV mais comprometidas, segundo o KDQOL-SF, foram “Situação de trabalho”, “Função física”, “Sono” e “Função emocional”, que foram correlacionadas de forma moderada e significativa entre si.

Os receptores de transplante renal da Região Norte do Brasil têm uma qualidade de vida inferior àqueles da Região Sul do país que, por sua vez, é mais desenvolvida e com melhores taxas e avaliações no que se refere ao sistema nacional de transplantes. Já em comparação aos demais países que publicaram estudos semelhantes, predominantemente no continente europeu, os escores de QV dos transplantados renais brasileiros foram maiores, o que talvez seja reflexo do Sistema Único de Saúde existente no país, gratuito e disponível a todos os cidadãos brasileiros, não se excluindo, é claro, outros possíveis fatores relacionados.

References

Editado por

Editora Associada: Andrea Bernardes

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Jun 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    18 Jul 2019
  • Aceito
    12 Mar 2020
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