RESUMO
O Indicador de Salubridade Ambiental (ISA) foi criado, em 1999, pelo Conselho Estadual de Saneamento (Conesan) do Estado de São Paulo. Embora tenha sido formado com o objetivo de medir o nível de salubridade ambiental dos municípios paulistas, o ISA tem sido utilizado em diversas Regiões do Brasil. Além disso, ao longo desses 17 anos, o ISA vem sendo alterado em sua formulação original, de acordo com as características do local a ser avaliado, como é sugerido pelo manual que o originou. Diante disso, o objetivo deste artigo foi avaliar o estado da arte da utilização do ISA no Brasil, identificando avanços, lacunas e desafios de seu uso. Para isso, realizou-se amplo levantamento bibliográfico a fim de encontrar estudos disponíveis em meios eletrônicos que utilizaram o ISA. Foram identificados e analisados 60 casos. As Regiões Nordeste e Sul do país são as que possuem a maior quantidade de estudos e a maioria deles (41,6%) é resultado de dissertações de mestrado. Cada estudo utiliza, em média, seis indicadores de primeira ordem e a revisão bibliográfica é método preponderante para escolhê-los e ponderá-los. Por fim, foi mostrado que as diferenças entre os ISA na verdade são um empecilho para a utilização desse indicador. Uma vez que cada estudo possui suas peculiaridades em termos de indicadores, pesos e critérios de cálculo, só é possível fazer comparações dos resultados obtidos entre um mesmo estudo ao longo do tempo, mas essas diferenças impossibilitam a comparação entre os valores obtidos em diferentes estudos.
Palavras-chave:
saneamento ambiental; indicador de salubridade ambiental; variação do indicador de salubridade ambiental
ABSTRACT
The Environmental Health Indicator (Indicador de Salubridade Ambiental - ISA) was established in 1999 by the São Paulo’s State Council of Sanitation (Conesan). Although this indicator was created to measure the level of environmental health of the municipalities in São Paulo state, Brazil, ISA has been applied in several other regions of Brazil. Moreover, throughout these 17 years, the original ISA formulation has been altered according with local characteristics, as suggested by the manual that originated it. Thus, this study aimed to evaluate ISA application state of the art in Brazil, by the identification of the progress, gaps, and challenges of its use. An extensive literature investigation was performed in order to find studies available in electronic media that used ISA. We identified and analyzed 60 cases. The Northeast and South regions are those with the greatest number of studies, and the majority of them (41.6%) are result of master’s dissertations. Each study uses an average of six first order indicators, and the literature review is the predominant method for choosing and evaluating them. Finally, we showed that the differences between the ISAs are actually a drawback for this indicator use. Since each study has peculiarities in terms of indicators, weights, and criteria calculation, it is only possible to compare the results from the same study over time, but these differences preclude the comparison between the values obtained in different studies.
Keywords:
environmental sanitation; environmental health indicator; variation of the environmental health indicator
INTRODUÇÃO
Quando oferecidos de maneira precária, os componentes do saneamento ambiental acarretam prejuízos ao meio ambiente e à população. Com base no conceito da Política Nacional de Saneamento Básico (Lei Federal nº 11.445/2007), fazem parte desses componentes os serviços de abastecimento de água potável, esgotamento sanitário, manejo de resíduos sólidos e drenagem urbana possuindo o objetivo de alcançar a salubridade ambiental de uma determinada região (BRASIL, 2007BRASIL. Lei Federal nº 11.445, de 5 de janeiro de 2007. Estabelece diretrizes nacionais para o saneamento básico. Diário Oficial da União, Brasília, 5 jan. 2007. Disponível em: <Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/lei/l11445.htm
>. Acesso em: 13 set. 2016.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_at...
). A Fundação Nacional de Saúde (Funasa) corrobora o conceito e adiciona mais um componente, o controle de vetores de doenças. Por sua vez, a definição de salubridade ambiental é dada como o estado de higidez em que vive a população humana - urbana e rural - tanto no que se refere a sua capacidade de inibir, prevenir ou impedir a ocorrência de endemias ou epidemias veiculadas pelos agentes do meio ambiente como ao seu potencial de promover o aperfeiçoamento de condições favoráveis ao pleno gozo da saúde e do bem-estar (FUNASA, 2015FUNDAÇÃO NACIONAL DE SAÚDE (FUNASA). (2015) Manual de Saneamento. 4. ed. Brasília: FUNASA.). Dessa forma, a eficiência dos serviços englobados pelo saneamento ambiental é, portanto, um meio de promoção de um ambiente salubre.
Ciente disso, surge a necessidade de se avaliar o estado de salubridade ambiental de um local específico, visando a apontar dentre os serviços do saneamento ambiental qual(is) está(ão) sendo executado(s) de maneira satisfatória, bem como aquele(s) potencialmente apto(s) a acarretar(em) malefícios à qualidade de vida da população e ao meio ambiente. Nesse ponto entra em cena o uso de indicadores ambientais. No Brasil, especificamente, o Indicador de Salubridade Ambiental (ISA) apresenta-se como ferramenta capaz de mensurar a salubridade do meio ambiente urbano de determinada área. Foi criado, em 1999, pela Câmara Técnica de Planejamento do Conselho Estadual de Saneamento (Conesan) do Estado de São Paulo e possui o objetivo de apresentar, por meio de um valor numérico, o nível de salubridade ambiental dos municípios paulistas (CONESAN, 1999CONSELHO ESTADUAL DE SANEAMENTO (CONESAN). (1999) ISA-Indicador de Salubridade Ambiental - Manual Básico. São Paulo: Conesan.).
Indicador de Salubridade Ambiental
Como preâmbulo, assume-se que o ISA é um indicador ambiental e, estando nessa categoria, deve auxiliar gestores públicos nas tomadas de decisões para fins de saneamento, fundamentando as argumentações mediante o fornecimento das informações de um processo. Mas, para tal, é necessário que ele seja claro, abrangente, acessível, comparável e consiga quantificar e simplificar a informação analisada. Ressalta-se que a comparabilidade é característica fundamental de qualquer indicador, conforme preconiza o estudo da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OECD, 2003ORGANIZAÇÃO PARA A COOPERAÇÃO E DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO (OECD). (2003) Environmental Indicators-Development, Measurement and Use-Reference Paper. Paris: OECD.).
Após sua formulação, o indicador passou a ser aplicado em diversas áreas e ocupações urbanas, deixando de lado seu caráter exclusivamente municipal paulista, sendo utilizado para medir o nível de salubridade ambiental de cidades, bairros, comunidades, entre outros. A medição é realizada por meio de análise qualitativa e quantitativa de indicadores socioambientais específicos, sobretudo aqueles relacionados ao saneamento ambiental, de forma que o valor de um ISA varie de 0,0 a 1,0 - quanto mais próximo do valor superior, maior é a salubridade ambiental. Um benefício da aplicação do ISA é sua capacidade de indicar qual serviço de saneamento ambiental encontra-se mais carente de melhoria, bem como aquele que se apresenta mais bem consolidado na região analisada.
O ISA para os municípios do Estado de São Paulo, denominado ISA/SP, é calculado pela média ponderada de indicadores específicos, denominados indicadores de primeira ordem, de acordo com a Quadro 1. Em seu estudo, Dias (2003DIAS, M.C. (2003) Índice de Salubridade Ambiental em Áreas de Ocupação Espontânea: estudo em Salvador, Bahia. 171 f. Dissertação (Mestrado em Engenharia Ambiental Urbana) - Universidade Federal da Bahia, Salvador.) estabeleceu faixas de pontuação do ISA para determinação do nível de salubridade ambiental da área analisada, conforme Quadro 1. Segundo a pesquisa, os critérios técnicos utilizados para tal proposição foram baseados em revisão bibliográfica. Salienta-se que o Manual Básico do ISA, criado pelo Conesan em 1999, não estabelece o nível de salubridade ambiental do local estudado em função da faixa de pontuação do indicador, fato que faz com que a maioria dos autores de trabalhos referentes ao ISA adote a classificação proposta por Dias (2003DIAS, M.C. (2003) Índice de Salubridade Ambiental em Áreas de Ocupação Espontânea: estudo em Salvador, Bahia. 171 f. Dissertação (Mestrado em Engenharia Ambiental Urbana) - Universidade Federal da Bahia, Salvador.). A Quadro 2 apresenta os principais princípios e hipóteses adotados por Conesan (1999CONSELHO ESTADUAL DE SANEAMENTO (CONESAN). (1999) ISA-Indicador de Salubridade Ambiental - Manual Básico. São Paulo: Conesan.) para a estruturação e a composição do ISA/SP.
Estruturação do Indicador de Salubridade Ambiental de São Paulo e nível de salubridade ambiental.
As fórmulas utilizadas para o cálculo dos indicadores de primeira e segunda ordens constituintes do ISA/SP, bem como as variáveis necessárias para realizá-los, com os critérios de pontuações dos indicadores, estão expostas no Manual Básico do ISA, podendo ser consultadas em Conesan (1999CONSELHO ESTADUAL DE SANEAMENTO (CONESAN). (1999) ISA-Indicador de Salubridade Ambiental - Manual Básico. São Paulo: Conesan.). Destacam-se como principais fornecedores dos dados para os cálculos as companhias de saneamento, as secretarias municipais, os planos municipais de saneamento básico, os censos demográficos decenais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e o Sistema Nacional de Informações Sobre Saneamento (SNIS).
Desde que foi proposto, a aplicação do indicador se espalhou pelo Brasil, sendo formulados ISAs com diversas estruturações para se avaliar diferentes regiões ou ocupações urbanas. À vista disso, este trabalho objetivou analisar o estado da arte dos estudos de ISA existentes no Brasil, avaliando avanços, lacunas e desafios da aplicação dessa ferramenta. Para tal, realizou-se um levantamento bibliográfico visando a constatar casos de aplicação do ISA no país disponíveis, principalmente, em meios eletrônicos.
METODOLOGIA
O presente estudo voltou-se à aplicação do ISA no Brasil realizado por meio de uma revisão bibliográfica que buscou ser exaustiva, pretendendo avaliar todos os casos de aplicação do indicador a partir de sua criação. Para isso, realizou-se visita a páginas eletrônicas de periódicos científicos de cunho ambiental (total de 60 periódicos/revistas consultados), bases científicas Scientific Electronic Library Online (SciELO), Periódicos Capes e Web of Science, além de ter sido feito levantamento simples em sites de busca on-line. Ao acessar às páginas eletrônicas, realizava-se vistoria para verificar a existência de alguma publicação relativa ao ISA, para isso eram digitados no campo de “busca” os seguintes termos: “indicator”, “index”, “salubrity”, “urban health”, “indicador”, “salubridade”, “indicador de salubridade” e “ISA”.
Durante o levantamento bibliográfico verificou-se a existência de estudos sobre ISA com os títulos citados em anais e programações de eventos (simpósios, seminários, congressos, encontros etc.), mas que não estavam disponíveis para download. Nesses casos, identificou-se o nome do autor do respectivo trabalho e, por meio da Plataforma s, realizou-se contato por e-mail solicitando o envio do estudo elaborado. A mesma plataforma informa o histórico acadêmico dos autores, permitindo, assim, conhecer as instituições nas quais se formaram. De posse dessa informação, acessava-se - quando existia - às páginas de repositório dessas instituições à procura de monografias, dissertações e teses.
A etapa seguinte consistiu em compará-los quanto à origem, ao local e ao ano de aplicação, ao número de indicadores de primeira ordem utilizados, à situação de salubridade ambiental, aos métodos de escolha e ponderação dos indicadores, entre outros, elaborando-se tabelas no software Microsoft Excel® para facilitar a análise. A pesquisa foi realizada de março de 2015 a setembro de 2016.
RESULTADOS
Aplicação da metodologia descrita identificou 60 casos de aplicação do ISA no Brasil. As peculiaridades de cada estudo estão abordadas nos próximos tópicos.
As diferentes formulações para cálculo do Indicador de Salubridade Ambiental no Brasil
A estruturação do ISA/SP buscou englobar todos os componentes do saneamento ambiental que possuem dados considerados de fácil análise e acesso. No entanto, essa formulação proposta pelo Conesan não é inflexível, isto é, da forma com que foi concebido, o ISA permite a incorporação de novos indicadores, variáveis, pesos e forma de pontuação à medida que são adquiridas novas informações ou obtidos novos patamares nos componentes socioambientais analisados à luz do indicador (CONESAN, 1999CONSELHO ESTADUAL DE SANEAMENTO (CONESAN). (1999) ISA-Indicador de Salubridade Ambiental - Manual Básico. São Paulo: Conesan.). Tal possibilidade permite que seja construído um ISA específico para cada área a ser estudada, tendo em vista que cada uma possui suas peculiaridades amplamente relevantes para a determinação da salubridade ambiental local. Essa flexibilidade é benéfica tanto no que se refere à criação de ISA quanto no momento de sua atualização, fazendo com o que o ISA nunca se torne um índice engessado. No entanto, não se deve perder de vista que a comparabilidade é critério fundamental de um indicador. A alteração da estrutura de um ISA elimina parcialmente essa característica, restringindo-a àqueles que possuem formulações idênticas e, em outra situação, entre um mesmo ISA ao longo do tempo.
Um fator relevante para a aplicação eficiente de um ISA refere-se à maneira com que a região analisada conforme o indicador é dividida. Isto é, deve-se dividir a região estudada em microrregiões, de modo que o valor final do ISA seja a média aritmética dos ISAs de cada uma dessas microrregiões. Para realizar essa divisão pode-se adotar a delimitação dos setores censitários, dos bairros, de sedes urbanas, entre outros, podendo até mesmo ser calculado um ISA por domicílio. Essa segmentação auxilia na avaliação da salubridade ambiental local em uma escala reduzida, apontando potencialidades e fragilidades das diversas microáreas.
A Quadro 3 - organizada cronologicamente - expõe os pesos que os estudos avaliados adotaram para cada indicador de primeira ordem, sendo incluídos mais dois: o Indicador de Drenagem Urbana (Idu) e o Indicador de Condição de Moradia (Icm). A opção por incluí-los se baseou na alta frequência (51,7 e 23,3%, respectivamente) de sua utilização nos estudos avaliados. A coluna intitulada “Indicadores comuns ao Conesan (1999CONSELHO ESTADUAL DE SANEAMENTO (CONESAN). (1999) ISA-Indicador de Salubridade Ambiental - Manual Básico. São Paulo: Conesan.)” faz referência à originalidade do ISA estudado em relação ao do modelo da Conesan, o ISA/SP. Nela, o resultado “Todos” significa que, daqueles indicadores de primeira ordem utilizados no ISA avaliado que também estão presentes no modelo ISA/SP, todos possuem os mesmos indicadores de segunda ordem, são calculados da mesma maneira e possuem o mesmo critério de pontuação. O resultado “Nenhum” informa que, daqueles indicadores de primeira ordem utilizados no ISA avaliado que também estão presentes no modelo ISA/SP, nenhum possui igualdade com o ISA/SP, isto é, nos indicadores de segunda ordem ou nos critérios de cálculos ou nos critérios de pontuação existe diferença. Por fim, quando aparece o resultado apresentado por alguns indicadores de primeira ordem (Iab, Ies, Irs, Icv, Irh ou Ise), significa que somente aquele(s) indicador(es) de primeira ordem possui(em) indicadores de segunda ordem, método de cálculo e critério de pontuação idênticos ao modelo ISA/SP.
Compilando-se os dados integrantes da Quadro 3 originou-se o diagrama de caixas apresentado pela Figura 1. O gráfico expõe os pesos máximo e mínimo encontrados para cada indicador de primeira ordem, a quantidade de estudos que o utilizou, o valor da média aritmética e da mediana de seus pesos, bem como os valores outliers. Observou-se a seguinte ordem de importância, em termos de valores de mediana: Iab=Ies>Irs>Idu=Icm>Icv=Irh=Ise. Já para a quantidade de utilização dos indicadores a ordem foi: Ies>Iab=Irs>Icv>Ise>Idu>Irh>Icm. Destaca-se a dispersão dos pesos atribuídos ao Idu, possivelmente pela forma qualitativa como esse indicador foi concebido. Além disso, os outliers demonstram, principalmente, que certos ISAs diminuíram ou aumentaram substancialmente os pesos atribuídos ao Iab e ao Ies, evidenciando a variação da proposição de pesos em função das especificidades locais.
Diagrama de caixas com dados da utilização de cada um dos indicadores de primeira ordem pelos Indicadores de Salubridade Ambiental.
Os diferentes métodos de escolha dos indicadores e os pesos dos Indicadores de Salubridade Ambiental no Brasil
Um desafio à criação de um ISA associa-se aos métodos de escolha dos indicadores de primeira ordem que o comporão, bem como seus respectivos pesos. No que diz respeito ao
ISA/SP, Almeida (1999ALMEIDA, M.A.P. (1999) Indicadores de Salubridade Ambiental em favelas urbanizadas: o caso de favelas em áreas de proteção ambiental. 243 f. Tese (Doutorado em Engenharia de Construção Civil e Urbana) - Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, São Paulo.) afirma que a questão da pontuação referente a cada indicador foi alvo de várias discussões realizadas nas reuniões da Câmara Técnica de Planejamento do Conesan. Em uma primeira decisão, os membros da Câmara decidiram que a água era prioridade em qualquer situação, atribuindo peso de 40% ao Iab. Posteriormente, após a realização de uma simulação do ISA/SP, perceberam que, além dos problemas relacionados ao abastecimento de água, existiam aqueles ligados à coleta de esgoto e resíduos sólidos. Sendo assim, foi atribuído o mesmo peso, 25%, a cada um desses indicadores. Em continuidade, os pesos de 10% para Icv e Irh e de 5% para Ise também foram estipulados em consenso pelos 30 membros da Câmara sem clara evidência de motivos.
Na construção do ISA para a cidade de Belo Horizonte, Minas Gerais (ISA/BH), os indicadores de primeira ordem constituintes foram escolhidos de forma arbitrária e utilizou-se o Método de Análise Hierárquica (AHP) para determinar cada um de seus pesos (PREFEITURA DE BELO HORIZONTE, 2014PREFEITURA DE BELO HORIZONTE. (2014) Plano Municipal de Saneamento de Belo Horizonte - 2012/2015 - Atualização 2014. Belo Horizonte: Prefeitura.). No estudo de Costa (2010COSTA, R.V.F. (2010) Desenvolvimento do Índice de Salubridade Ambiental (ISA) para comunidades rurais e sua aplicação e análise nas comunidades de Ouro Branco - MG. 185 f. Dissertação (Mestrado em Engenharia Ambiental) - Universidade Federal de Ouro Preto, Ouro Preto.), a técnica utilizada para escolher os indicadores e ponderá-los foi o Método Delphi. Silva (2006SILVA, N.V.S. (2006) As condições de salubridade ambiental das comunidades periurbanas da Bacia do Baixo Gramame: Diagnóstico e Proposição de Benefícios. 150 f. Dissertação (Mestrado em Engenharia Urbana) - Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa.) e Oliveira (2014OLIVEIRA, G.S. (2014) O modelo ISA utilizado no Diagnóstico da Salubridade Ambiental nos Bairros do Município de Juiz de Fora - MG. 114 f. Monografia (Curso de Engenharia Sanitária e Ambiental) - Universidade Federal de Juiz de Fora, Juiz de Fora.) utilizaram o mesmo método em seus trabalhos, porém a aplicação destinou-se apenas a ponderar os indicadores, uma vez que eles foram escolhidos de maneira aleatória. A Quadro 4 apresenta o documento de origem do ISA, os métodos de escolha dos indicadores e pesos, a quantidade de indicadores de primeira ordem que cada ISA utilizou, seu valor final, nível de salubridade ambiental e se o estudo foi publicado. A qualificação qualis Capes usada refere-se à área de concentração “Engenharias I”, de 2014.
O uso do Indicador de Salubridade Ambiental no Brasil
A Quadro 5 compila todas as informações das Quadros 3 e 4 apresentando qualitativamente dados da utilização do ISA no Brasil. Os números de aplicação do ISA nas Regiões e nos Estados brasileiros apresentados pela Quadro 5 podem ocultar a real quantidade da utilização do índice nesses locais. Exemplo disso é o estudo de Lima (2014LIMA, A.S.C. (2014) Diagnóstico das condições de saneamento básico dos municípios do estado de Goiás operados pelas prefeituras. 106 f. Dissertação (Mestrado em Engenharia do Meio Ambiente) - Universidade Federal de Goiás, Goiânia.), no qual foi desenvolvida apenas uma fórmula para cálculo da salubridade ambiental de 21 municípios do Estado de Goiás. Os casos de número 4, 10, 11, 12, 14, 19, 20, 34, 35, 55 e 56 da Quadro 4 também avaliaram mais de um local, como pode ser observado em seu rodapé. Ou seja, a quantidade de aplicação de ISA em um Estado não condiz exatamente com a real quantidade de áreas - município, cidade, bairro - avaliadas à luz do indicador. Prosseguindo, chama-se a atenção para a pouca aplicação do ISA em zonas rurais, sendo encontrados apenas 3 (5,0%) estudos nessas áreas - casos de número 19, 34 e 35 da Quadro 4 - que, por sinal, possuem origem no mesmo trabalho, o de Costa (2010COSTA, R.V.F. (2010) Desenvolvimento do Índice de Salubridade Ambiental (ISA) para comunidades rurais e sua aplicação e análise nas comunidades de Ouro Branco - MG. 185 f. Dissertação (Mestrado em Engenharia Ambiental) - Universidade Federal de Ouro Preto, Ouro Preto.). O restante, 57 (95,0%) casos, foi desenvolvido para ser aplicado estritamente a áreas urbanas.
Os números que demonstram a origem do ISA apontam que a criação de fórmulas de ISA está relacionada a atividades acadêmicas, especialmente dissertações de mestrado, não existindo clara evidência de que o desenvolvimento do indicador seja iniciativa do poder público, sobretudo na esfera municipal. Algumas equações para cálculo do ISA, no entanto, tiveram origem em planos municipais de saneamento, como os casos de número 18, 21, 22, 25, 29, 30, 31, 40, 47 e 48 da Quadro 4. Salienta-se que todos esses estudos foram elaborados a partir do ano de 2010, Figura 2, o que pode ser justificado pela publicação em 2007 da Política Nacional de Saneamento Básico, na qual está estipulada em seu Art. 9º, inciso I, a necessidade de se “elaborar de planos de saneamento básico” que deverão conter, segundo Art. 52, §1º e inciso I, ações para a “melhoria da salubridade ambiental” (BRASIL, 2007BRASIL. Lei Federal nº 11.445, de 5 de janeiro de 2007. Estabelece diretrizes nacionais para o saneamento básico. Diário Oficial da União, Brasília, 5 jan. 2007. Disponível em: <Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/lei/l11445.htm
>. Acesso em: 13 set. 2016.
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). Ou seja, os municípios utilizaram o ISA nos planos municipais de saneamento como um instrumento de diagnóstico do saneamento ambiental visando a fundamentar as referidas ações.
Evolução da quantidade de estudos sobre Indicador de Salubridade Ambiental ao longo dos anos.
A Figura 2 evidencia a variação da quantidade de elaboração de trabalhos sobre ISA a partir do ano de sua criação, apresentando a origem dos estudos e demonstrando uma tendência crescente de sua aplicação no Brasil. Os poucos casos encontrados para os anos de 2015 e 2016 justificam-se pela contemporaneidade desta pesquisa, sendo que para esses anos é provável que existam estudos elaborados, mas que ainda não foram publicados.
Em continuidade, diagnosticou-se uma particularidade em alguns estudos: ausência da apresentação do valor final do ISA para a área estudada, impossibilitando seu enquadramento nos níveis de salubridade ambiental, conforme Quadro 1. No estudo de Levati (2009LEVATI, M. (2009) Aplicação do Indicador de Salubridade Ambiental (ISA) para áreas urbanas. Estudo de Caso: Município de Criciúma, SC. 157 f. Monografia (Curso de Engenharia Ambiental) - Universidade do Extremo Sul Catarinense, Criciúma.), por exemplo, a cidade de Criciúma, Santa Catarina, foi dividida em cinco microbacias e para cada uma delas foi calculado o valor do ISA, porém não foi determinado um valor médio dos cinco ISAs previamente calculados, que representaria um valor de ISA geral para toda a cidade de Criciúma, Santa Catarina, e possibilitaria seu enquadramento global nos níveis de salubridade ambiental. Em outras pesquisas, como as de número 6, 8, 15, 17, 24, 25, 30, 31, 37 e 46 da Quadro 4, tal revés também foi diagnosticado. Nesses casos, os autores deste artigo realizaram a média aritmética das fatias de ISAs, determinando o valor final/geral do ISA para as regiões analisadas, bem como fizeram sua classificação de acordo com os estados de salubridade ambiental, conforme Quadro 4.
Ainda neste assunto, destaca-se o fato de que em estudos como os de número 3, 4, 10, 11, 12, 14, 19, 20, 23, 34, 35, 36, 52, 55 e 56 da Quadro 4 foram avaliados diversos municípios de um mesmo Estado, comunidades isoladas e bairros específicos de cidades diferentes, tornando infiel e não significativo apontar um valor geral do ISA e um nível de salubridade ambiental para a área em estudo. Assim, as regiões classificadas em função de seu nível de salubridade ambiental foram somente aquelas possíveis de se obter um ISA geral.
Descobriu-se que a maneira predominantemente verificada de se estabelecer os indicadores de primeira ordem de um ISA e seus respectivos pesos é por meio de revisão bibliográfica, sendo que para esses últimos a arbitrariedade também é bastante utilizada. Salienta-se, no entanto, que arbitrar indicadores e pesos encontra-se previsto nos princípios e na hipótese do Manual Básico do ISA, de 1999, item 4 da Quadro 2. Todavia, acredita-se que a utilização de métodos científicos para realizar tal tarefa torne o novo ISA formulado mais significativo e fidedigno à realidade do local que se deseja estudar.
DISCUSSÃO
O grande gargalo da utilização do ISA possui raízes no seu manual de criação. Como já mencionado, esse documento possibilita a inclusão de novos indicadores de primeira e segunda ordens e de novas variáveis durante a criação de um ISA, além de também permitir a arbitrariedade de seus pesos, desconfigurando sua composição original. Tais possibilidades, por mais que colaborem para que o ISA abarque as peculiaridades de cada região a ser analisada, suprimem uma premissa fundamental de indicadores: a comparabilidade, ratificada pelo estudo da OECD (2003ORGANIZAÇÃO PARA A COOPERAÇÃO E DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO (OECD). (2003) Environmental Indicators-Development, Measurement and Use-Reference Paper. Paris: OECD.). Uma vez realizada qualquer alteração, extingue-se a possibilidade de comparação entre ISAs, partindo-se do pressuposto de que uma propriedade essencial para tal é que seu cálculo seja realizado sob os mesmos critérios. Tal fato é uma peculiaridade negativa desse indicador, considerando que a característica comparabilidade é relevante para uma boa validação de qualquer indicador. A análise das Quadros 3 e 4 atesta que a comparação do valor final dos ISAs aplicados a regiões diferentes é algo impossível, visto que cada indicador possui suas próprias características.
Assim, a comparabilidade entre os resultados dos ISAs fica restrita somente a duas situações:
-
àqueles que possuem a mesma composição, isto é, mesmos pesos e indicadores de primeira e segunda ordens, bem como critérios de cálculo e pontuação iguais;
-
ao se comparar um mesmo ISA ao longo do tempo, possibilitando identificar avanços e retrocessos nas componentes socioambientais avaliadas pelo indicador.
Um exemplo da ineficiente comparação de resultados obtidos com o ISA acontece ao notar que a cidade de Florianópolis, Santa Catarina, registrou o menor valor do indicador (0,365; ano 2011) e ocupa 59ª colocação no Ranking do Saneamento no Brasil em 2016, enquanto a cidade de Macapá, Amapá, apresentou um ISA igual a 0,491 (ano 2012) e ocupa a 98ª posição no mesmo ranking (ITB, 2016INSTITUTO TRATRA BRASIL (ITB). (2016) Ranking do Saneamento. Relatório Completo. São Paulo: ITB.). Enfatiza-se que essa situação não afirma que o Ranking do Saneamento seja mais eficaz para avaliar os componentes do saneamento ambiental do que o ISA, uma vez que os critérios contidos em ambas as avaliações são distintos, possuindo cada um suas peculiaridades. A conclusão a ser obtida nessa explanação é a impossibilidade de se afirmar que, embora com um ISA inferior, a cidade de Florianópolis, Santa Catarina, seja menos salubre do que a de Macapá, Amapá.
Em decorrência disso, emerge a sugestão de se padronizar o ISA. Formular um ISA padrão será um desafio, dada a peculiaridade de cada local a ser estudado, no entanto possibilitará a comparação entre as regiões avaliadas à luz do índice e a elaboração de um ranking de salubridade ambiental pautado nos valores do ISA, uma vez que todas serão mensuradas sob idênticos pesos e critérios de cálculo. Em contrapartida, a possibilidade de padronização do ISA aflora mais um obstáculo associado à ferramenta: a fonte de dados para a realização dos cálculos. Em Conesan (1999CONSELHO ESTADUAL DE SANEAMENTO (CONESAN). (1999) ISA-Indicador de Salubridade Ambiental - Manual Básico. São Paulo: Conesan.) nota-se que as variáveis que o compõem não são de fácil acesso, cabendo às instituições públicas o seu fornecimento, sendo essas, em muitos casos, munidas por informações provenientes de autodeclarações e de órgãos municipais (secretarias, autarquias etc.) que sofrem de carência estrutural, o que coloca em juízo a confiabilidade dos dados disponibilizados. Logo, padronizar o ISA requer, também, a padronização da fonte de dados - princípio já previsto na criação do ISA, conforme Quadro 2.
Outra lacuna do indicador refere-se à sua desatualização. Devido à época em que foi criado, o ISA não incorpora em seus indicadores de segunda ordem temas atuais do saneamento ambiental, como coleta seletiva de resíduos, índice de desempenho de estação de tratamento de esgoto, consumo de água per capita, entre outros. Sendo assim, há iminente necessidade de sua atualização. Como visto na Figura 2, o indicador vem sendo cada vez mais utilizado nos últimos anos, tornando-se importante instrumento capaz de mensurar salubridade ambiental, que passará a ser ainda mais efetiva quando conteúdos atuais relativos ao saneamento ambiental forem avaliados.
Como visto, o ISA é um indicador ambiental predominantemente urbano. Sua rara aplicação em zonas rurais apresenta-se como importante lacuna observada, porque se sabe da relevância das melhorias de saneamento no meio rural, tanto no Brasil como no mundo. A Organização Nações Unidas (ONU), em seu Relatório dos Objetivos do Milênio, de 2015, destacou o desafio das melhorias de saneamento nas áreas rurais. Ainda hoje, apenas 51% da população rural mundial dispõe de condições satisfatórias de saneamento e 25% defeca a céu aberto (ONU, 2015ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU). (2015) The Millennium Development Goals Report 2015. Nova York: ONU. 72 p.). Configura-se, portanto, necessária a proposição de um ISA que contemple as peculiaridades e auxilie os gestores na tomada de decisão e definição de políticas públicas dessas áreas.
Por fim, a cada ano, mais regiões são avaliadas à luz do ISA, o que demonstra que sua utilização vem se fortalecendo e sendo difundida, sobretudo na esfera acadêmica, e empregada timidamente pelas prefeituras municipais em seus planos de saneamento. Como está intrínseco aos princípios de um índice, o ISA é apto a fundamentar decisões dos gestores públicos em suas deliberações e fornece diagnóstico eficaz do saneamento ambiental da região em análise, sendo capaz de apontar potencialidades e fragilidades dos serviços que o compõem. Além disso, consegue expressar a informação contida em seu valor final de maneira simples e objetiva. No entanto, mais importante do que se avaliar apenas o valor final do ISA é o entendimento e a interpretação dos resultados particulares de cada um de seus indicadores de primeira e segunda ordens, a partir dos quais informações essenciais podem ser extraídas, fazendo com que gestores foquem investimentos públicos objetivando melhorias na salubridade ambiental de uma região. Nesse contexto, destaca-se a necessidade de se divulgar o ISA no meio da administração pública visando a torná-lo um conhecido instrumento de planejamento ambiental.
REFERÊNCIAS
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
May-Jun 2018
Histórico
-
Recebido
20 Out 2016 -
Aceito
13 Mar 2017