Resumos
Este trabalho objetivou verificar a prevalência do uso de drogas psicoativas (anfetamina, metanfetamina, canabinoides, cocaína, opioides e benzodiazepínicos) entre policiais militares do Estado de Goiás. Os dados foram obtidos a partir de amostras de urina cedidas voluntariamente pelos policiais participantes da pesquisa, os quais foram esclarecidos em relação à metodologia do estudo e assinaram o TCLE. As amostras foram submetidas à análise de triagem por imunocromatografia (Multi-DrugOneStep Test®) e, aquelas positivas, foram confirmadas por cromatografia em fase gasosa acoplada à espectrometria de massa. Os dados foram analisados por estatística descritiva. Os resultados apontaram a presença das seguintes drogas: anfetaminas (0,33%); canabinoides (0,67%); benzodiazepínicos (1,34%); 97,66% foram resultados negativos. A distribuição dos casos positivos foi: benzodiazepínicos (57,1%); canabinoides (28,6%) e anfetaminas (14,3%). Conclui-se que os achados de substâncias psicoativas na amostra de policiais militares voluntários chama a atenção sobre a necessidade da implantação de testes de drogas no efetivo da polícia militar e de políticas públicas preventivas, que visem evitar as consequências do consumo abusivo de psicotrópicos.
Policiais militares; Drogas; Triagem; Urina
The present study aimed to verify the prevalence of psychoactive drug use (amphetamines, methamphetamines, cannabinoids, cocaine, opioids and benzodiazepines) among military police officers in the state of Goiás. Data were obtained from urine samples voluntarily provided by the officers participating in the study, who were informed of the study methods and signed a free and informed consent form. The samples were subject to screening analysis by immunochromatography (Multi-DrugOneStep Test®), with positive tests confirmed by gas chromatography– mass spectrometry (GC-MS) and data analyzed by descriptive statistics. The results indicated the presence of the following drugs: amphetamines (0.33%), cannabinoids (0.67%) and benzodiazepines (1.34%); 97.66% showed negative results. The positive cases were distributed as follows: benzodiazepines (57.1%); cannabinoids (28.6%) and amphetamines (14.3%). In conclusion, the detection of psychoactive substances in voluntary sampling of military police officers indicates the need to implement drug testing among active military officers and preventive public policies aimed at eliminating the abusive consumption of psychotropic drugs.
Military police; Drugs; Screening; Urine
Introdução
O consumo de psicotrópicos no Brasil e em todo o mundo tem sido objeto de vários estudos, devido aos impactos sociais, econômicos e, principalmente, às implicações na saúde da população11. Lucas ACS, Parente RCP, Picanço NS, Conceição DA, Costa KRC, Magalhães IRS, Siqueira JCA. Uso de psicotrópicos entre universitários da área de saúde da Universidade Federal do Amazonas, Brasil. Cad Saude Publica 2006; 22(3):663-671.,22. Silva OA. Consumo de drogas de abuso no ambiente de trabalho no Brasil. Rev Bras Toxicol 1999; 11(1):7-10.. As consequências para o país, considerando a saúde e a segurança pública, são de grande importância, exigindo atitudes de toda natureza para diminuir este grave problema22. Silva OA. Consumo de drogas de abuso no ambiente de trabalho no Brasil. Rev Bras Toxicol 1999; 11(1):7-10..
Em um estudo realizado no Brasil em 2005, compreendendo 108 cidades com mais de 200 mil habitantes, 8,8% dos entrevistados relataram ter feito uso, pelo menos uma vez, de maconha; 2,9% de cocaína; 3,8% de anfetaminas e 5,6% de benzodiazepínicos33. Carlini EA, Galduróz JCF, Noto AR, Carlini CM, Oliveira LG, Nappo AS, Moura YG, Sanchez ZVDM. II levantamento domiciliar sobre o uso de drogas psicotrópicas no Brasil: 2005. Estudo envolvendo as 108 maiores cidades do país. São Paulo: Páginas & Letras; 2007.. Em 2007, a taxa de mortalidade atribuída ao uso de drogas foi de 4,3 por 100.000 habitantes. Quando se compara este número ao de outros países das Américas como Argentina (1,9), Chile (2,3) e Estados Unidos (2,4) observa-se que o Brasil necessita de políticas públicas que visem minimizar a difusão destas substâncias. Soma-se ainda, que o uso de medicamentos prescritos, especialmente benzodiazepínicos, nos Estados Unidos, Argentina, Brasil, México e Chile apresenta índices acima da média global44. Cruz MS, Impacto do uso de drogas na população brasileira: análise de dados epidemiológicos de indicadores – 2001 a 2007. In: Duarte PCAV, Stempliuk VA, Barroso L P, organizadoras. Relatório Brasileiro sobre drogas. Brasília: SENAD; 2009. p. 345-357..
Segundo a United Nations Office on Drugs and Crime (UNODC), no
relatório de 2011, de 3,3 a 6,1% da população mundial entre 15 e 64
anos teriam usado drogas ilícitas pelo menos uma vez ao ano, o que corresponde
de 149 a 272 milhões de pessoas desta faixa etária55. United Nations Office on Drugs and Crime (UNODC). World Drug
Report 2011. EUA: UNODC; 2012. [acessado 2012 maio 1]. Disponível em:
http://www.unodc.org.br
http://www.unodc.org.br...
. Este Relatório Mundial sobre Drogas aponta
que a mortalidade atribuída ao uso de drogas ilícitas chega a 1%, sendo as
mais utilizadas a maconha (prevalência anual entre 2,6% e 5,0%) e as
anfetaminas (excluindo o ecstasy), com prevalência de 0,3% a 1,2%. Estes
números podem ser ainda maiores, já que nem todas as mortes relacionadas
ao uso de drogas são notificadas desta maneira.
O abuso de drogas nos locais de trabalho custa ao comércio e às indústrias americanas bilhões de dólares, em virtude de erros no serviço, absenteísmos, além de desempenho insatisfatório e más relações interpessoais66. Garcia FE. The Determinants of Substance Abuse in the Workplace. The Social Sci J 1996; 33(1):55-68.. No Brasil, apesar de não existir uma legislação específica, algumas empresas têm participado de programas de testes de drogas nos locais de trabalho desde 1992. Em 2004, mais de 300 empresas em todo o país participaram de uma pesquisa de drogas (maconha, cocaína e anfetaminas) em amostras de urina feita no Laboratório da Universidade de São Paulo77. Silva OA, Yonamine M. Drug abuse among workers in Brazilian regions. Rev Saude Publica 2004; 38(4):552-556..
A profissão policial é de dedicação exclusiva e carrega consigo uma carga pesada de longas jornadas de trabalho, pressão psicológica e tensão diária. Alguns estudos apontam que o uso de substâncias psicoativas por estes profissionais é uma válvula de escape para aliviar as duras condições de trabalho e a baixa qualidade de vida destes profissionais88. Garcia SI. As implicações psicossociais do ato infracional: drogas e saúde [dissertação]. Rio de Janeiro: Fiocruz; 1996.,99. Zahradnik M, Stewart SH. Anxiety disorders and substance use disorder comorbidity. In: Antony MM, Stein B, editors. Oxford Handbook of Anxiety and Related Dosorders. New York: Oxford University Press; 2009. p. 565-575.. Outros estudiosos consideram o uso de drogas como resultante de problemas de autoestima e falta de habilidades para enfrentar situações adversas1010. Bucher R. Drogas e drogadição no Brasil. Porto Alegre: Artes Médicas; 1992.,1111. Campos GM, Figlie NB. Prevenção ao uso nocivo de substâncias focado no indivíduo e no ambiente. In: Diehl A, Cordeiro DC, Laranjeira R, organizadores. Dependência Química: prevenção, tratamento e políticas públicas. Porto Alegre: Artmed; 2011. p. 481-494..
Em um estudo realizado em 12 unidades da polícia militar do Estado de Goiás, nos municípios de Goiânia e Aparecida de Goiânia, com 221 integrantes da corporação, foram observados os seguintes resultados: a) uso de drogas em qualquer período da vida: tabaco – 39,9%; álcool – 87,8%; maconha – 8,1%; cocaína – 1,8%; estimulantes – 7,2%; solventes – 10,0%; sedativos, ansiolíticos e antidepressivos – 6,8%; LSD – 0,5%. b) uso de drogas no último ano: tabaco – 15,4%; álcool – 72,9%; estimulantes – 6,3%; solventes – 0,5%; sedativos, ansiolíticos e antidepressivos – 3,7%. c) uso de drogas no último mês: tabaco – 14,5%; álcool – 57,5%; estimulantes – 5,0%; solventes – 0,5; sedativos, ansiolíticos e antidepressivos – 3,7%1212. Costa SHN, Cunha LC, Yonamine M, Pucci LL, Oliveira FGF, Sousa CG, Mesquita GA, Vinhal LB, Dalastra J, Leles CR. Survey on the use of psychotropic drugs by twelve military police units in the municipalities of Goiânia and Aparecida de Goiânia, state of Goiás, Brazil. Rev Bras Psiquiatr 2010; 32(4):389-395..
O consumo de drogas no meio militar determina a necessidade de controle rigoroso e adequado contra esta moderna “arma química”, causadora de progressiva dependência e degradação humana1313. Verstraete AG, Pierce A. Workplace drug testing in Europe. Forensic Sci Int 2001; 121(1-2):2-6.,1414. Meririnne E, Mykkänen S, Lillsunde P, Kuoppasalmi K, Lerssi R, Laaksonen I, Lehtomäki K, Henriksson M. Workplace drug testing in a military organization: results and experiences from the testing program in the Finnish Defence Forces. Forensic Sci Int 2007; 170(2-3):171-174.. Um estudo realizado na Finlândia, país em que uso de drogas ilícitas no meio militar é extremamente baixo, demonstrou que a eficiência dos testes para pesquisa de drogas em uma organização militar é um meio importante para melhorar a segurança no trabalho, devido ao êxito dessas estratégias de prevenção. As campanhas de conscientização constantes e a melhora das condições de trabalho também são ferramentas que, somadas, podem conseguir resultados positivos no sentido de diminuir os números alarmantes de usuários destas substâncias nocivas à saúde1414. Meririnne E, Mykkänen S, Lillsunde P, Kuoppasalmi K, Lerssi R, Laaksonen I, Lehtomäki K, Henriksson M. Workplace drug testing in a military organization: results and experiences from the testing program in the Finnish Defence Forces. Forensic Sci Int 2007; 170(2-3):171-174..
Como qualquer organização civil, as forças militares não estão livres dos transtornos relacionados ao uso de drogas, como o álcool e outras drogas ilícitas. Considerando-se que elas são uma atividade específica, em que há o manuseio de armas, o consumo de drogas no meio militar determina a necessidade de um controle rigoroso e adequado, visando minimizar o desenvolvimento da dependência química, pois seu uso pode afetar a segurança da sociedade1313. Verstraete AG, Pierce A. Workplace drug testing in Europe. Forensic Sci Int 2001; 121(1-2):2-6.,1414. Meririnne E, Mykkänen S, Lillsunde P, Kuoppasalmi K, Lerssi R, Laaksonen I, Lehtomäki K, Henriksson M. Workplace drug testing in a military organization: results and experiences from the testing program in the Finnish Defence Forces. Forensic Sci Int 2007; 170(2-3):171-174..
Assim, este estudo teve como objetivo realizar o levantamento da prevalência do uso de drogas psicotrópicas em unidades da polícia militar de Goiás, Brasil, por meio da pesquisa de maconha, cocaína, anfetamina, metanfetamina, opiáceos e benzodiazepínicos em amostras de urina, a fim de oferecer subsídios para a implantação de testes de drogas aleatórios para militares em serviço.
métodos
O projeto deste estudo foi inicialmente submetido à apreciação do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Goiás, tendo sido aprovado. A pesquisa foi conduzida de acordo com a Declaração de Helsinque, revisada em 20081515. Associação Médica Mundial. Declaração de Helsinque da Associação Médica Mundial (WMA). Princípios Éticos para Pesquisa Médica envolvendo Seres Humanos. Helsinque, Finlândia, Junho 1964; Revisada em 2008. Helsinque: WMA; 2008..
Um total de 299 amostras de urina de militares da ativa, sendo 285 do sexo masculino e 14 do sexo feminino, pertencentes ao quadro de servidores da polícia militar do Estado de Goiás, foi coletado de forma voluntária e sem identificação, no período de março a outubro de 2008. As amostras de urina foram coletadas no início da jornada de trabalho mediante a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. As amostras foram provenientes de 12 diferentes unidades da polícia militar das cidades de Goiânia e Aparecida de Goiânia. Após recebimento, as amostras foram submetidas a um teste de triagem imunocromatográfico, Multi-Drogas One Step Test da marca Inlab Diagnóstica, com os seguintes limites de detecção (cut-off): metanfetamina 500 ng/mL; anfetamina 1000 ng/mL; opiáceos/morfina 300 ng/mL; canabinoides (tetrahidrocanabinol) 50 ng/mL; cocaína (benzoilecgonina) 300 ng/mL e benzodiazepínicos 300 ng/ mL, teste validado por Costa et al.1616. Costa SHN, Cunha LC, Doles LA, Yonamine M, Campos SV, Penna KGBD, Nascente KRSM. Revisão crítica do uso de testes rápidos imunológicos para verificar o consumo de substâncias psicoativas. Rev Bras Toxicol 2005; 18(2):123-130.. Estes testes foram adquiridos pela Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação da Universidade Federal de Goiás e permitiram a avaliação, também, da existência do uso associado de duas ou mais das drogas testadas por cada indivíduo.
As amostras positivas para drogas de abuso ilícitas foram submetidas à confirmação por GC-MS (gas chromatography-mass spectrometry) no Laboratório de Análises Toxicológicas da Universidade de São Paulo – LAT-USP (espectrômetro de massa modelo 5972, associado a um equipamento de cromatografia em fase gasosa modelo 6890 (GC/MS), ambos da Hewlett Packard (Little Falls, EUA), equipado com coluna capilar de sílica fundida HP-5MS (Hewlett Packard) com as seguintes dimensões: 30 m x 0.25 mm x 0.1 µm. Os valores de referência utilizados (cut off) para a técnica confirmatória foram: 11-nor-9-COOH-Δ99. Zahradnik M, Stewart SH. Anxiety disorders and substance use disorder comorbidity. In: Antony MM, Stein B, editors. Oxford Handbook of Anxiety and Related Dosorders. New York: Oxford University Press; 2009. p. 565-575.-THC 15 ng/mL; anfetamina/metanfetamina 200 ng/mL; benzoilecgonina 150 ng/mL. Em resumo, amostras foram submetidas à extração líquido-líquido, extração em fase sólida ou microextração em fase líquida, submetidas a derivação química e injetados no sistema GC-MS de acordo com métodos publicados, os quais são utilizados, rotineiramente, nas análises toxicológicas e de antidoping efetuadas pelo LAT-USP1717. Eller SCWS, Gonçalves FL, Paranhos BAPB, Costa JL, Lourenço FR, Yonamine M. Analysis of 11-nor-9-carboxy–9-tetrahydrocannabinol in urine samples by hollow fiber-liquid phase microextraction and gas chromatography-mass spectrometry in consideration of measurement uncertainty. Forensic Toxicol 2014; 32:282-291.–1919. Yonamine M, Silva OA. Confrmation of cocaine exposure by gas chromatography–mass spectrometry of urine extracts after methylation of benzoylecgonine. J Chromatogr B 2002; 773(1):83-87.. As amostras positivas para benzodiazepínicos não foram confirmadas por GC/MS, uma vez que o método imunocromatográfico apresenta sensibilidade e especificidade adequadas para sua identificação.
O cálculo do tamanho da amostra foi realizado utilizando a ferramenta
StatCalc do programa EpiInfo™ versão 3.5, tomando
como base o tamanho da população estudada e dados percentuais de uso de
drogas obtidos em levantamentos epidemiológicos realizados pelo Centro
Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas55. United Nations Office on Drugs and Crime (UNODC). World Drug
Report 2011. EUA: UNODC; 2012. [acessado 2012 maio 1]. Disponível em:
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, além de outros estudos de
prevalência realizados no Brasil22. Silva OA. Consumo de drogas de abuso no ambiente de trabalho no
Brasil. Rev Bras Toxicol 1999; 11(1):7-10.,1212. Costa SHN, Cunha LC, Yonamine M, Pucci LL, Oliveira FGF, Sousa
CG, Mesquita GA, Vinhal LB, Dalastra J, Leles CR. Survey on the use of
psychotropic drugs by twelve military police units in the municipalities of
Goiânia and Aparecida de Goiânia, state of Goiás, Brazil.
Rev Bras Psiquiatr 2010; 32(4):389-395.. Dessa
forma, a estimativa do tamanho da amostra, na população estudada (N =
1709), foi de 287 amostras. Foi considerado o nível de significância de
0,05 para as drogas mencionadas com expectativa de frequência em torno de
1,0%.
Resultados
A distribuição dos sujeitos da pesquisa, quanto à faixa etária e sexo, está demonstrada na Tabela 1.
A frequência do uso de drogas psicotrópicas, obtidas por meio da realização dos ensaios nas amostras provenientes dos 299 participantes da pesquisa, está apresentada na Figura 1.
Não foi encontrado nenhum caso de associação de drogas. Dos seis casos positivos nos testes de triagem imunológicos, três foram confirmados como positivos e os outros três foram negativos na cromatografia por GC/MS.
Em relação aos casos positivos, 57,1% corresponderam ao uso de benzodiazepínicos; 28,6% ao uso de canabinoides e 14,3% ao uso de anfetaminas.
Discussão
A prevalência do uso de drogas de abuso do presente estudo foi de 2,34%. Este dado é superior ao encontrado por outro estudo, feito em 200477. Silva OA, Yonamine M. Drug abuse among workers in Brazilian regions. Rev Saude Publica 2004; 38(4):552-556., que avaliou o perfil de drogas de abuso ilícitas no ambiente de trabalho nas cinco regiões do Brasil, por meio de triagem por imunoens e confirmação por GC/MS, cujo percentual de amostras positivas foi de 1,8%. No entanto, esta diferença pode ser devido à inclusão de drogas prescritas neste estudo, que avaliou, além das de abuso ilícitas, a presença de benzodiazepínicos, que perfizeram um total de 1,34%, enquanto canabinoides e anfetaminas representaram 1,0% do total.
Em relação ao II Levantamento Sobre o Uso de Drogas Psicotrópicas,
realizado em 2005, por meio de questionário validado, ficou demonstrado que a
região Centro-Oeste apresentou o percentual de dependentes de maconha de 0,6%;
benzodiazepínicos de 0,2% e estimulantes de 0,2%. Nesse mesmo levantamento,
considerando todas as regiões brasileiras, o percentual de dependentes de
maconha foi de 1,2%; benzodiazepínicos 0,5% e estimulantes 0,2%55. United Nations Office on Drugs and Crime (UNODC). World Drug
Report 2011. EUA: UNODC; 2012. [acessado 2012 maio 1]. Disponível em:
http://www.unodc.org.br
http://www.unodc.org.br...
. No grupo estudado identificou-se a
presença de 0,67% de maconha; 0,33% de anfetaminas e 1,34% de
benzodiazepínicos, portanto com valores próximos, quando se consideram
anfetaminas e maconha, na região Centro-Oeste, e superior, no caso dos
benzodiazepínicos. Entretanto, o percentual de dependentes para maconha no
Brasil (1,2%) é superior ao percentual de sujeitos da pesquisa que faziam uso
de maconha, encontrados neste trabalho55. United Nations Office on Drugs and Crime (UNODC). World Drug
Report 2011. EUA: UNODC; 2012. [acessado 2012 maio 1]. Disponível em:
http://www.unodc.org.br
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.
O resultado encontrado neste estudo vai de encontro ao de Souza et al.2020. Souza ER, Schenker M, Constantino P, Correia BSC. Consumo de substâncias lícitas e ilícitas por policiais da cidade do Rio de Janeiro. Cien Saude Colet 2013; 18(3):667-676. que avaliou o consumo de drogas lícitas e ilícitas entre policiais civis e militares do Rio de Janeiro/RJ, Brasil, por meio de questionário pré-testado. Dentre estes, o consumo de substâncias psicoativas é mais alto até 10 vezes entre os policiais militares.
Quando se considera a natureza da atividade militar, notadamente nas atividades
operacionais, muitas vezes é observado o desenvolvimento de desequilíbrio
emocional, que necessita ser tratado por meio de psicofármacos2121. Orlandi P, Noto AR. Uso indevido de benzodiazepínicos: um
estudo com informantes-chave no município de São Paulo. Rev
Latino-am Enfermagem 2005; (13):896-902.–2323. Mura P, Kintz P, Papet Y, Ruesch G, Piriou A. Evaluation de six
tests rapides pour le despitage du cannabis dans la sueur, la salive et les
urines. Acta Clin Belg 1999; 1:35-38., situação que pode ser observada pela
maior prevalência do uso de benzodiazepínicos neste estudo. Outro aspecto
relevante é que a maioria (63,2%) dos participantes deste estudo possui
meia-idade (≥ 35 anos de idade). Esse fato corrobora as observações
de um estudo feito em 20052222. Colombia. Ministerio del Interior. Consejo Nacional para el
Control de Estupefacientes; 2006. [[acessado 2009 janeiro 8]. Disponível
em: http://www.conacedrogas.cl/inicio/obs_naci.php
http://www.conacedrogas.cl/inicio/obs_na...
, que
verificou, por meio de entrevistas, que os usuários de benzodiazepínicos
apontam como indicações terapêuticas o tratamento dos distúrbios
do sono e de transtornos da ansiedade.
Estudos realizados em instituições militares de outros países demonstram que o uso de drogas psicoativas (principalmente maconha e anfetaminas) é responsável por transtornos graves tanto no local de trabalho como no ambiente familiar, e que merecem atenção especial, por meio da implementação de programas e/ou políticas de prevenção para dissuadir o uso de drogas2424. Jedrzejczak M. Drug addiction among service soldierscauses of phenomenon development. Przegl Epidemiol 2002; 56(1):169-177.–2727. Bray RM, Hourani LL. Substance use trends among active duty military personnel: findings from the United States Department of Defense Health Related Behavior Surveys, 1980-2005. Addiction 2007; 102(7):1092-1101.. Estes dados corroboram os de Souza et al.2020. Souza ER, Schenker M, Constantino P, Correia BSC. Consumo de substâncias lícitas e ilícitas por policiais da cidade do Rio de Janeiro. Cien Saude Colet 2013; 18(3):667-676., segundo os quais, após o consumo das substâncias em questão, mais agentes militares tiveram problemas no trabalho (4,9%) ou faltaram ao serviço (4,4%).
A prevalência do uso de drogas de abuso, encontrada neste estudo, alerta sobre a possibilidade da implantação de testes aleatórios para a detecção de substâncias psicoativas no efetivo ativo da polícia militar, como uma alternativa adicional para o encaminhamento dos usuários para tratamento com equipe multiprofissional de saúde e, obtendo sucesso, para a reinserção laboral. Dessa forma, é possível colaborar para a diminuição dos problemas de saúde, atrasos, absenteísmos, baixo desempenho no trabalho (alternância entre elevada e baixa produtividade, capacidade de julgamento prejudicada, indisciplina, falhas de memória) e más relações interpessoais.
Os resultados positivos evidenciaram que os testes imunológicos (triagem) para pesquisa de drogas de abuso devem ser confirmados por metodologia em GC-MS, mais sensível, em virtude da possibilidade de ocorrência de resultados falsos-positivos que podem classificar erroneamente uma amostra2828. Reinhard VED, Mídio AF. Revisão dos métodos analíticos para detecção de canabinóides em material biológico. Rev Bras Toxic 1995; 8(2):29-40.–3030. Peat M. Workplace Drug Testing. Clarke's Analysis of Drugs and Poisons: in pharmaceuticals, body fluids and postmortem material. London: Pharmaceutical Press; 2002. p. 68-79.. Este fato foi verificado em três amostras, sendo duas para metanfetamina (500 ng/mL) e uma para opiáceos (300 ng/mL), provavelmente pelos limites de detecção dos testes utilizados3030. Peat M. Workplace Drug Testing. Clarke's Analysis of Drugs and Poisons: in pharmaceuticals, body fluids and postmortem material. London: Pharmaceutical Press; 2002. p. 68-79.,3131. De La Torre R, Segura J, De Zeeuw R, Eillians J. Recommendation for the reliable detection of illicit drugs in urine in the European Union, with special attention to the workplace. Ann Clin Biochem 1997; 34(Pt 4):339-344..
É importante ressaltar que os resultados obtidos foram de sujeitos que cederam de forma voluntária suas amostras de urina para análise, e que, mesmo assim, foram encontrados casos positivos. Sendo a análise toxicológica incluída no ambiente de trabalho, esta deve ser aplicada em momentos diferentes do vínculo empregatício, como na admissão ao trabalho, nos acidentes ou incidentes de trabalho, quando existir suspeita razoável em um membro da tropa, nas análises voluntárias e aleatórias e, finalmente, durante a reabilitação do indivíduo3232. Odo SA, Araújo AC, Santos AF, Toledo FCP, Yonamine M, Silva OA, Leite MC. Indicações e limites das análises toxicológicas para substâncias psicoativas. Rev Psiquiatr Clin 2000; 27(1):50-56..
O uso de substâncias psicoativas é classificado de acordo com a frequência e a quantidade do consumo, as características do indivíduo e do seu contexto sociocultural, podendo variar da simples experimentação ao uso ocasional, uso abusivo até a dependência. Sendo assim, uma limitação deste estudo é o fato de apenas uma coleta de amostras ter sido realizada, não sendo possível, desta forma, classificar os indivíduos analisados como dependentes. Alguns autores ponderam que nem todas as pessoas que experimentam algum tipo de substância psicoativa tornam-se usuários habituais ou são dependentes dela. A maioria das pessoas faz apenas um uso experimental dessas substâncias, contrariando os defensores da teoria da escalada, em que o uso de uma droga é sucedido por outra mais forte e com frequência mais intensa3333. American Psychiatric Association. Diagnostic and statistical manual of mental disorders: DSM-IV- TR. 4th ed. Washington: APA; 2002.–3535. Aragão ATM, Milagres E, Figlie NB. Qualidade de vida e desesperança em familiares de dependentes químicos. Psico-USF 2009; 14(1):117-123..
A delicada questão do uso de drogas no meio policial demanda a necessidade de um Estado mais engajado em atender às expectativas desses agentes da segurança pública. Isso conferirá uma vantagem direta à sociedade, uma vez que esta é a primeira afetada pela qualidade dos serviços de segurança e ordem prestados pelos policiais3636. Figueiredo AEB, Souza ER. Sofrimento psíquico em policiais civis do Estado do Rio de Janeiro. Cien Saude Colet 2013; 18(3):633-644.,3737. Pinto LW, Domingo-Salvany A, Brugal MT, Barrio G, González-Saiz F, Bravo MJ, La Fuente L, ITINERE Investigators. Gender differences in health related quality of life of young heroin users. Health Qual Life Outcomes 2010; 8:145.. Como afirmou Minayo3838. Minayo MCS. Valorização profissional sob a perspectiva dos policiais do Estado do Rio de Janeiro. Cien Saude Colet 2013; 18(3):611-620., o êxito de organizações tão importantes como as Corporações Policiais dependem do fato de manterem, sempre, seus agentes motivados, oferecendo boas condições de trabalho e ambiente psicologicamente favorável.
Conclusão
A partir dos resultados encontrados foi possível verificar a prevalência do uso de substâncias psicoativas em profissionais de segurança pública, lotados em unidades da polícia militar do Estado de Goiás, que pode ser considerada significativa, se comparada à média da população em geral. Desta forma, este estudo chama a atenção para a necessidade da elaboração de leis específicas, que permitam a implantação de testes em amostras biológicas para verificar a exposição a substâncias psicoativas no efetivo da corporação, como uma alternativa adicional, visando contribuir para minimizar o uso de tais substâncias por parte dos profissionais desta área.
Agradecimentos
Ao Laboratório de Análises Toxicológicas da Universidade de São Paulo e à Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação da Universidade Federal de Goiás, que possibilitaram a realização dos testes de triagem e dos testes cromatográficos. E, também, à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Goiás (FAPEG) pelo constante apoio financeiro.
Referências
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1Lucas ACS, Parente RCP, Picanço NS, Conceição DA, Costa KRC, Magalhães IRS, Siqueira JCA. Uso de psicotrópicos entre universitários da área de saúde da Universidade Federal do Amazonas, Brasil. Cad Saude Publica 2006; 22(3):663-671.
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2Silva OA. Consumo de drogas de abuso no ambiente de trabalho no Brasil. Rev Bras Toxicol 1999; 11(1):7-10.
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3Carlini EA, Galduróz JCF, Noto AR, Carlini CM, Oliveira LG, Nappo AS, Moura YG, Sanchez ZVDM. II levantamento domiciliar sobre o uso de drogas psicotrópicas no Brasil: 2005. Estudo envolvendo as 108 maiores cidades do país São Paulo: Páginas & Letras; 2007.
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4Cruz MS, Impacto do uso de drogas na população brasileira: análise de dados epidemiológicos de indicadores – 2001 a 2007. In: Duarte PCAV, Stempliuk VA, Barroso L P, organizadoras. Relatório Brasileiro sobre drogas Brasília: SENAD; 2009. p. 345-357.
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5United Nations Office on Drugs and Crime (UNODC). World Drug Report 2011. EUA: UNODC; 2012. [acessado 2012 maio 1]. Disponível em: http://www.unodc.org.br
» http://www.unodc.org.br -
6Garcia FE. The Determinants of Substance Abuse in the Workplace. The Social Sci J 1996; 33(1):55-68.
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7Silva OA, Yonamine M. Drug abuse among workers in Brazilian regions. Rev Saude Publica 2004; 38(4):552-556.
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8Garcia SI. As implicações psicossociais do ato infracional: drogas e saúde [dissertação]. Rio de Janeiro: Fiocruz; 1996.
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9Zahradnik M, Stewart SH. Anxiety disorders and substance use disorder comorbidity. In: Antony MM, Stein B, editors. Oxford Handbook of Anxiety and Related Dosorders New York: Oxford University Press; 2009. p. 565-575.
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Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
Jun 2015
Histórico
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Recebido
07 Mar 2014 -
Revisado
16 Out 2014 -
Aceito
18 Out 2014