Resumo
O objetivo deste estudo foi avaliar o consumo regular de bebidas açucaradas e sua associação com aspectos sociodemográficos e comportamentais de adultos de uma cidade do sudoeste brasileiro. Trata-se de um estudo de base populacional com 1226 adultos de 20 a 59 anos, residentes na zona urbana do município de Viçosa-MG. Foi aplicado um questionário estruturado para medir as condições sociodemográficas e comportamentais. O consumo de bebidas açucaradas foi classificado como regular quando a frequência de ingestão foi igual ou superior a cinco vezes por semana. O consumo regular de bebidas açucaradas foi superior em homens e mulheres com idade entre 20 e 29 anos (p < 0,01). Homens com hábito de realizar refeições em frente à televisão (p = 0,03) e mulheres insatisfeitas com seu peso (p = 0,03) apresentaram maior consumo regular de bebidas açucaradas. Conclui-se que os indivíduos de maior idade apresentaram menor consumo regular de bebidas açucaradas e este consumo esteve associado a comportamentos obesogênicos, como o hábito em realizar refeições em frente à televisão, e em indivíduos insatisfeitos com o peso corporal.
Refrigerantes; Sucos; Adultos; Epidemiologia nutricional
Abstract
The aim of this study was to evaluate the regular consumption of sweetened beverages and its association with sociodemographic and behavioral aspects in a city in the southwest of Brazil. It involves is a population-based study of 1,226 adults aged 20 to 59 living in the urban area of the municipality of Viçosa in the state of Minas Gerais. A structured questionnaire to measure sociodemographic and behavioral conditions was applied. The consumption of sweetened beverages was considered regular when the frequency of consumption was five or more times a week. Regular consumption of sweetened beverages was higher in men and women aged between 20 and 29 years (p < 0.01). Men with the habit of eating meals in front of the television (p = 0.03) and women dissatisfied with their weight (p = 0.03) consumed greater regular amounts of sweetened beverages. The conclusion reached is that older individuals showed less regular consumption of sweetened beverages and that the consumption of same was associated with obesogenic behaviors, such as the habit of eating meals in front of the television and among individuals dissatisfied with their body weight.
Soft drinks; Juices; Adults; Nutritional epidemiology
Introdução
O elevado consumo de bebidas açucaradas, fontes líquidas de adição de açúcares na dieta, está associado com potencial desregulação hormonal, resistência à insulina, dislipidemia e obesidade11. Collino M. High dietary fructose intake: sweet or bitter life? World J Diabetes 2011; 2(6):77-81.,22. Ejtahed HS, Bahadoran Z, Mirmiran P, Azizi F. Sugar-Sweetened Beverage Consumption Is Associated with Metabolic Syndrome in Iranian Adults: Tehran Lipid and Glucose Study. Endocrinol Metab 2015; 30(3):334-342.. Está positivamente associado a uma pior qualidade da dieta, maior consumo de alimentos com alta densidade energética e a inferior ingestão de várias vitaminas e minerais33. Mathias KC, Slining MM, Popkin BM. Foods and beverages associated with higher intake of sugar-sweetened beverages. Am J Prev Med 2013; 44(4):351-357.. Estas bebidas incluem refrigerantes e sucos artificiais, e podem ocasionar o excesso de peso devido a seu elevado teor de açúcar, além de acarretar baixa saciedade e compensação incompleta para a quantidade de energia total44. Malik VSS, Matthias B, Hu FB. Intake of sugar-sweetened beverages and weight gain: A systematic review 1-3. Am J Clin Nutr 2006; 84(2):274-288.
5. Malik VS, Popkin BM, Bray GA, Després JP, Hu FB. Sugar sweetened beverages, obesity, type 2 diabetes and cardiovascular disease risk. Circulation 2010; 121(11):1356-1364.-66. Imamura F, O’Connor L, Ye Z, Mursu J, Hayashino Y, Bhupathiraju SN, Forouhi NG. Consumption of sugar sweetened beverages, artificially sweetened beverages, and fruit juice and incidence of type 2 diabetes: systematic review, meta-analysis, and estimation of population attributable fraction. Br J Sports Med 2016; 351:496-504..
O estilo de vida também pode estar associado ao consumo de bebidas açucaradas. Boulos et al.77. Boulos R, Vikre EK, Oppenheimer S, Chang H, Kanarek RB. ObesiTV: how television is influencing the obesity epidemic. Physiol Behav 2012; 107(1):146-153.citam que indivíduos com hábitos de vida sedentários, que têm elevada permanência em frente à televisão (TV), frequentemente apresentam comportamento alimentar não saudável. Estudo de coorte holandês mostrou que pré-escolares que assistem mais de duas horas de TV por dia tem 2,13 vezes mais chance de ingerir bebidas adicionadas de açúcar88. Wijtzes AI, Jansen W, Jansen PW, Jaddoe VWV, Hofman A, Raat H. Maternal educational level and preschool children’s consumption of high-calorie snacks and sugar-containing beverages: Mediation by the family food environment. Prev Med 2013; 57(5):607-612.. O hábito de comer enquanto assiste televisão também se associa negativamente ao comportamento alimentar99. Liang T, Kuhle S, Veugelers PJ. Nutrition and body weights of Canadian children watching television and eating while watching television. Public Health Nutr 2009; 12(12):2457-2463..
As recomendações dietéticas americanas para o período de 2015-2020 sugerem que a ingestão diária de calorias de açúcares adicionados não deve exceder 10% do total de calorias1010. Park S, Pan L, Sherry B, Blanck HM. Consumption of sugar-sweetened beverages among US adults in 6 states: Behavioral Risk Factor Surveillance System, 2011. Prev Chronic Dis 2014; 11:130304., porém o consumo de bebidas açucaradas em adultos norte-americanos representa cerca de um terço do consumo de açúcar1111. Drewnowski A, Rehm CD. Consumption of low-calorie sweeteners among U.S. adults is associated with higher healthy eating index (HEI 2005) scores and more physical activity. Nutrients 2014; 6(10):4389-4403.. Na Austrália, de acordo com estimativas nacionais, a população adulta consome por dia, em média, entre 110-120 mL de refrigerantes não dietéticos1212. Pollard CM, Meng X, Hendrie GA, Hendrie D, Sullivan D, Pratt IS, Kerr DA, Scott JA. Obesity, socio-demographic and attitudinal factors associated with sugar-sweetened beverage consumption: Australian evidence. Aust N Z J Public Health 2016; 40(1):71-77.. No Brasil, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o consumo de refrigerantes não dietéticos de adultos chega a 15 milhões de litros por dia e é o sexto alimento mais consumido, perdendo apenas para o café, feijão, arroz, carne e sucos1313. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF), 2008-2009: tabela de composição nutricional dos alimentos consumidos no Brasil. Rio de Janeiro: IBGE; 2011.. A Pesquisa de Orçamento Familiar (POF 2002-2003) registrou aumento de 400% na participação do refrigerante na aquisição domiciliar de alimentos pelos brasileiros1414. Levy-Costa RB, Sichieri R, Pontes NS, Monteiro CA. Disponibilidade domiciliar de alimentos no Brasil: distribuição e evolução (1974-2003). Rev Saude Publica 2005; 39(4):530-540..
Recentemente, os Estados Unidos da América implementaram uma política pública de saúde visando a melhora ao acesso a bebidas mais saudáveis, como forma de combate ao uso de bebidas açucaradas1515. Patel AI, Brindis CD. Maximizing School Policies to Reduce Youth Consumption of Sugar-Sweetened Beverages. J Adolesc Health 2016; 59(1):1-2.. No Brasil, o Plano de Ações Estratégicas para o Enfrentamento das Doenças Crônicas Não Transmissíveis, 2011-2022, que objetiva promover o desenvolvimento e a implementação de políticas públicas integradas e baseadas em evidências para a prevenção e o controle das DCNT e de seus fatores de risco1616. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Plano de Ações Estratégicas para o Enfrentamento das Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT) no Brasil 2011-2022. Brasília: MS; 2011., tem se atentado para a desestimulação do consumo de bebidas com elevado teor de açúcar, por meio de restrições sobre o marketing destes alimentos. No entanto, apesar do crescente interesse em reduzir o consumo de bebidas açucaradas e dos malefícios das práticas alimentares inadequadas, ainda são escassos estudos de base populacional que investigaram o consumo de bebidas açucaradas nas populações e determinaram os principais fatores associados ao consumo elevado.
Diante do exposto, este estudo objetivou avaliar o consumo regular de bebidas açucaradas e sua associação com aspectos sociodemográficos e comportamentais em adultos de uma cidade do sudoeste brasileiro.
Metodologia
Foi conduzido um estudo transversal, de base populacional, pelo grupo de Estudos sobre Saúde e Alimentação de Viçosa (ESA/Viçosa) na zona urbana do município de Viçosa – Minas Gerais. O município apresenta uma área de 299,4 km22. Ejtahed HS, Bahadoran Z, Mirmiran P, Azizi F. Sugar-Sweetened Beverage Consumption Is Associated with Metabolic Syndrome in Iranian Adults: Tehran Lipid and Glucose Study. Endocrinol Metab 2015; 30(3):334-342.e densidade demográfica de 249,3 habitantes por km22. Ejtahed HS, Bahadoran Z, Mirmiran P, Azizi F. Sugar-Sweetened Beverage Consumption Is Associated with Metabolic Syndrome in Iranian Adults: Tehran Lipid and Glucose Study. Endocrinol Metab 2015; 30(3):334-342..
A amostra do estudo foi constituída por adultos com faixa etária entre 20 a 59 anos de idade, de ambos os sexos e residentes na área urbana do município. Segundo dados do IBGE1717. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Censo Demográfico 2010. Características da população e dos domicílios. Rio de Janeiro: IBGE; 2010., a população do município no ano 2010 foi de 72.220 habitantes, sendo que 67.305 destes habitantes (93%) se localizavam na zona urbana e 43.431 indivíduos, 52% da população, correspondiam aos adultos. O processo de amostragem segue a metodologia descrita anteriormente por Segheto et al.1818. Segheto W, Silva DCG, Coelho FA, Reis GV, Morais SHO, Marins JCB, Ribeiro AQ, Longo GZ. Body adiposity index and associated factors in adults: method and logistics of a population-based study. Nutr Hosp 2015; 32(1):101-109..
Para definir o tamanho da amostra, considerou-se a população de referência, descrita anteriormente, a prevalência esperada do fenômeno desconhecida (50%), o erro amostral de 3,8 pontos percentuais e o efeito do desenho do estudo (amostra por conglomerados) estimado a 1,5. Houve acréscimo de 20% para perdas e recusas e 10% para controle de fatores de confusão, totalizando 1.294 indivíduos. O cálculo do tamanho da amostra foi realizado pelo programa Epi Info 6.04. Foram excluídos da amostra: gestantes, indivíduos acamados e impossibilitados para aferição das medidas.
Inicialmente, o participante assinou o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, que continha todas as informações referentes às etapas do estudo e foi aplicado um questionário estruturado englobando variáveis sociodemográficas e comportamentais.
A variável dependente foi o consumo de bebidas açucaradas, medida a partir da pergunta: “Em quantos dias da semana o (a) Sr.(a) toma refrigerante e/ou suco artificial?”, utilizadas em outros inquéritos populacionais. O consumo dessas bebidas foi classificado como regular quando a frequência de ingestão relatada foi igual ou superior a 5 vezes por semana1919. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Vigitel Brasil 2011: Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico. Brasília: MS; 2012.,2020. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Pesquisa Nacional de Saúde 2013: percepção do estado de saúde, estilos de vida e doenças crônicas – Brasil, Grandes Regiões e Unidades da Federação. Rio de Janeiro: IBGE; 2014..
As variáveis sociodemográficas estudadas foram: sexo (masculino/feminino), idade em anos completos, categorizada em períodos de dez anos, escolaridade em anos completos de estudo, definida em 0-4, 5-8, 9-12 e ≥ 13 anos de estudo, a cor da pele autoreferida foi categorizada em branca e não branca e o nível socioeconômico, determinado pela Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa2121. Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa (ABEP). Critério de classificação econômica Brasil. São Paulo: ABEP; 2012. e classificado em nível socioeconômico elevado (A e B), intermediário (C) e baixo (D e E).
Quanto às variáveis comportamentais, para o tabagismo, os indivíduos foram classificados como não fumante, ex-fumante e fumante atual2222. Menezes AMB, Victora CG, Perez-Padilla R. The Platino project: methodology of a multicenter prevalence survey of chronic obstructive pulmonary disease in major latin american cities. BMC Med Res Methodol 2004; 17(4):15.. Foi considerado fumante o indivíduo que consumiu qualquer quantidade de tabaco nos últimos trinta dias, e como ex-fumante o indivíduo que fumou em algum momento da vida. O hábito de consumo de carnes gordurosas foi obtido por meio da combinação das respostas sobre o consumo de carne vermelha gordurosa ou de frango com pele sem remoção da gordura visível do alimento1919. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Vigitel Brasil 2011: Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico. Brasília: MS; 2012.. Os participantes também foram questionados quanto ao hábito de realizar as refeições em frente à televisão2323. Carús JP, França GVA, Barros AJD. Local e tipo das refeições realizadas por adultos em cidade de médio porte. Rev Saude Publica 2014; 48(1):68-74., sua satisfação com o peso corporal através da questão “você está satisfeito com o seu peso corporal?”, tendo o participante as opções de responder que sim, não e gostaria de diminuir ou não gostaria de aumentar, conforme utilizado no estudo de Duca et al.2424. Duca GFD, Oliveira ESA, Sousa TF, Silva KS, Nahas MV. Inatividade física no lazer em trabalhadores da indústria do Rio Grande do Sul, Brasil. Motriz: Rev Educ Fis 2011; 17(1):180-188.. O tempo de TV foi avaliado por meio da soma do tempo em que o indivíduo passava assistindo programas de televisão ou usando o computador, nos dias da semana e durante o final de semana. Utilizou-se como ponto de corte, a soma de tempo maior ou igual a três horas por dia2525. Maia EG, Gomes FMD, Alves MH, Huth YR, Claro RM. Hábito de assistir à televisão e sua relação com a alimentação: resultados do período de 2006 a 2014 em capitais brasileiras. Cad Saude Publica 2016; 32(9):e00104515.,2626. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Vigitel Brasil 2013: Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico. Brasília: MS; 2014., em frente a televisão ou usando o computador, como um indicador de comportamento sedentário.
Após a verificação do controle de qualidade e consistência dos dados, foram realizadas as análises no STATA versão 13.1, levando em consideração o efeito do delineamento amostral, pelo grupo de comandos svy, o qual considera o efeito da expansão da amostra na análise dos dados. As análises foram ponderadas por sexo, idade e escolaridade, sendo os pesos determinados pela razão entre as proporções de indivíduos segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e na amostra.
Foram calculadas as proporções, razões de prevalência e seus respectivos intervalos com 95% de confiança dos fatores associados ao consumo de refrigerante para a amostra, segundo o sexo. Na análise bivariada através da Regressão de Poisson, foram avaliadas as associações entre idade, escolaridade, cor da pele, nível socioeconômico, tabagismo, hábito de consumir carnes gordurosas, realização das refeições em frente à TV, satisfação com o peso corporal, tempo de TV e consumo regular de bebidas açucaradas. Aquelas que apresentaram p < 0,20 foram incluídas na regressão múltipla. A análise múltipla foi realizada por meio da Regressão de Poisson sendo todas as variáveis que atenderam o critério de seleção (p < 0,20) incluídas no modelo e a seleção das variáveis realizadas através do método backward. Permaneceram no modelo final aquelas com nível de significância de 5%.
O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Federal de Viçosa.
Resultados
A taxa de resposta foi de 95,64%, perfazendo os 1226 adultos elegíveis que foram entrevistados. O consumo de bebidas açucaradas foi relatado por 27,8% (IC95% 23,8 – 32,3) dos avaliados, sendo maior no sexo masculino (31,8% IC95% 25,9 – 38,3). A Tabela 1 descreve a proporção do consumo de bebidas açucaradas para o sexo masculino e feminino.
Características demográficas, socioeconômicas e comportamentais, segundo o consumo de bebidas açucaradas, em adultos. Viçosa, MG, 2012-2014.
No sexo masculino, após ajustes para as variáveis de confusão, a faixa etária de 40 a 49 anos (0,6 IC95% 0,4 – 0,9) e 50 a 59 anos (0,3 IC95% 0,2 – 0,6) mantiveram-se inversamente associada ao consumo de bebidas açucaradas, enquanto o hábito de comer em frente à televisão (1,4 IC95% 1,0 – 1,8) esteve associado positivamente ao consumo de bebidas açucaradas (Tabela 2). No sexo feminino, as faixas etárias de 40 a 49 anos (0,5 IC95% 0,3 – 0,8) e 50 a 59 anos (0,2 IC95% 0,1 – 0,4) também estiveram inversamente associadas ao consumo de bebidas açucaradas, enquanto a insatisfação com o peso corporal (1,4 IC95% 1,1 – 1,9) esteve positivamente associada ao consumo de bebidas açucaradas (Tabela 3).
Análise univariada e multivariada do consumo regular de refrigerantes de acordo com as variáveis sociodemográficas e comportamentais em adultos do sexo masculino. Viçosa, MG, 2012-2014.
Análise univariada e multivariada do consumo regular de refrigerantes de acordo com as variáveis sociodemográficas e comportamentais em adultos do sexo feminino. Viçosa, MG, 2012-2014.
Discussão
Quase um terço dos adultos deste estudo (27,8 IC95% 23,8 – 32,3) referiram o consumo regular de bebidas açucaradas. Este consumo foi inferior em indivíduos com maior idade, em ambos os sexos. Homens com hábito de fazer refeições em frente a televisão e mulheres com insatisfação com o peso corporal apresentaram maior consumo regular destas bebidas.
Essa análise torna-se importante uma vez que em função do alto índice glicêmico dessas bebidas2727. Vartanian LR, Schwartz MB, Brownell KD. Effects of Soft Drink Consumption on Nutrition and Health: A Systematic Review and Meta-Analysis. Am J Public Health 2007; 97(4):667-675. há um aumento da ingestão calórica, o que pode levar ao aumento da adiposidade corporal, elevar o risco de obesidade e outras doenças crônicas degenerativas. Além disso, ao optarem por consumir bebidas açucaradas, como os refrigerantes, por exemplo, pode ocorrer uma diminuição no consumo de outras bebidas saudáveis, como o leite e os sucos naturais2828. Grimm GC, Harnack L, Story M. Factors associated with soft drink consumption in school-aged children. J Am Diet Assoc 2004; 104(8):1244-1249. É importante destacar que a deficiência de micronutrientes é fator de risco para a carga global de doenças, estando entre os vinte principais fatores e afetando cerca de dois bilhões de indivíduos em todo mundo2929. Lopez AD, Mathers CD, Ezzati M, Jamison DT, Murray CJL. Global burden of disease and risk factors. Washington: World Bank; 2006.. Segundo a Organização Mundial de Saúde3030. World Health Organization (WHO). Food and Agriculture Organization of the United Nations (FAO). Expert Consultation on Diet, Nutrition and the prevention diseases. Diet Nutrition and the Prevention of chronic diseases: report of a joint WHO/FAO WHO expert consultation. Geneva: WHO; 2003. [acessado 2016 Maio 2]. Disponível em: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/42665/1/WHO_TRS_916.pdf
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há evidências suficientes para desencorajar o consumo de refrigerantes como estímulo da alimentação saudável.
Estudo conduzido com a população brasileira indicou que houve um aumento na aquisição per capita de refrigerantes de 490% no período de 1975 a 20033131. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Pesquisa de Orçamentos Familiares 2002-2003: Análise da disponibilidade domiciliar de alimentos e do estado nutricional no Brasil. Rio de Janeiro: IBGE; 2004.. Dados mais recentes2626. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Vigitel Brasil 2013: Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico. Brasília: MS; 2014. demonstraram que a frequência do consumo de refrigerantes é de 20,8%, sendo maior entre os homens (23,9%). Estudo de base populacional realizado na cidade de Pelotas, RS, em adultos, identificaram que cerca de 20,4%, dos avaliados ingeriam refrigerantes3232. Rombaldi AJ, Neutzling MB, Silva MC, Azevedo MR, Hallal PC. Fatores associados ao consumo regular de refrigerante não dietético em adultos de Pelotas, RS. Rev Saude Publica 2011; 45(2):382-390., sendo o consumo maior referido pelos homens. O consumo de refrigerantes relatado pela população brasileira e por adultos de Pelotas foram inferiores aqueles encontrados em nosso estudo (27,8%). Essa prevalência elevada de consumo de bebidas açucaradas descrita em nossa amostra pode está relacionada à característica da cidade que possui um número elevado de estudantes universitários sendo que grande parte não reside com seus familiares, favorecendo a alimentação em locais onde a disponibilidade de refrigerantes e sucos artificiais são maiores.
As bebidas açucaradas, como os refrigerantes e os sucos artificiais, são classificadas como alimentos ultraprocessados segundo o Guia Alimentar Para a População Brasileira3333. Brasil. Ministério da saúde (MS). Guia alimentar para a população brasileira. 2ª ed. Brasília: MS; 2014., sendo o crescente consumo deste tipo de alimento considerado um fator de risco para o aumento da prevalência de obesidade e doenças crônicas3030. World Health Organization (WHO). Food and Agriculture Organization of the United Nations (FAO). Expert Consultation on Diet, Nutrition and the prevention diseases. Diet Nutrition and the Prevention of chronic diseases: report of a joint WHO/FAO WHO expert consultation. Geneva: WHO; 2003. [acessado 2016 Maio 2]. Disponível em: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/42665/1/WHO_TRS_916.pdf
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,3434. Canella DS, Levy RB, Martins AP, Claro RM, Moubarac J-C, Baraldi LG, Cannon G, Monteiro CA. Ultra-processed food products and obesity in Brazilian households (2008-2009). PLoS One 2014; 9(3):e92752.. No Brasil, estudo recente conduzido com a população adulta, a Pesquisa Nacional de Saúde, indicou que dois em cada 10 brasileiros consomem refrigerantes, sendo que a prevalência de consumo regular de refrigerante ou suco artificial foi maior entre os homens, apresentando redução na medida do incremento da idade3535. Claro RM, Santos MAS, Oliveira TP, Pereira CA, Szwarcwald CL, Malta DC. Consumo de alimentos não saudáveis relacionados a doenças crônicas não transmissíveis no Brasil: Pesquisa Nacional de Saúde, 2013. Epidemiol Serv 2015; 24(2):257-265.. Em nosso estudo essa relação está próxima de 3/10 adultos, sendo importante ressaltar que o consumo de bebidas açucaradas tende a ocorrer com a ingestão simultânea de outros alimentos com alto teor calórico.
Importante atenção deve ser dada aos alimentos ultraprocessados, como os refrigerantes e sucos artificiais, uma vez que o consumo destes alimentos apresentaram associação com a densidade energética e ao teor de gorduras saturadas e trans, açúcar livre e sódio, além de conteúdo insuficiente de fibras e potássio3636. Louzada MLC, Martins APB, Canella DS, Baraldi LG, Levy RB, Claro M, Moubarac JC, Cannon G, Monteiro CA. Alimentos ultraprocessados e perfil nutricional da dieta no Brasil. Rev Saude Publica 2015; 49:38.. Além disso, os alimentos ultraprocessados possuem um teor de micronutrientes inferior aqueles observados em outros alimentos, principalmente, quando comparado aos alimentos in natura ou minimamente processados3737. Louzada MLC, Martins APB, Canella DS, Baraldi LG, Levy RB, Claro RM, Moubarac JC, Cannon G, Monteiro CA. Impacto de alimentos ultraprocessados sobre o teor de micronutrientes da dieta no Brasil. Rev Saude Publica 2015; 49:45.. Em função disso, atenção especial deve ser dada ao consumo de bebidas açucaradas devido ao alto teor de sódio, açúcar e ao baixo valor nutritivo.
Essa prevalência elevada de consumo regular de bebidas açucaradas observada neste estudo pode ser em função da divulgação excessiva desses produtos na mídia. Monteiro3838. Monteiro CA. Nutrition and health. The issue is not food, nor nutrients, so much as processing. Public Health Nutr 2009; 12(5):729-731. destacam que o consumo de alimentos e/ou preparações não estão relacionados aos nutrientes desses alimentos, mas sim ao comercio e indústria alimentícia que oferecem um tipo de alimento mais atrativo para a população. As políticas públicas que tratam do cuidado na transmissão de informações pelos veículos de comunicação e nas embalagens dos produtos ainda são escassas em nosso país3939. Bielemann RM, Motta JVS, Minten GC, Horta BL, Gigante DP. Consumo de alimentos ultraprocessados e impacto na dieta de adultos jovens. Rev Saude Publica 2015; 49:28., reforçando a necessidade de trabalhos de educação alimentar e nutricional com a população em função das consequências negativas do consumo elevado desses produtos para a saúde.
Algumas limitações inerentes a este estudo devem ser destacadas, dentre elas, o viés de informação oriundo de registros alimentares. Este tipo de instrumento pode levar a uma subestimação do consumo de bebidas açucaradas devido ao conhecimento pela população da contraindicação deste tipo de alimento. Outra limitação é o desenho transversal deste estudo que impede determinar o intervalo de tempo entre as variáveis dependentes e independentes, favorecendo o viés de causalidade reversa. Como pontos positivos, destaca-se o fato de ser um dos poucos estudos de base populacional com adultos realizados em países de média renda, onde observa-se um crescimento significativo do consumo de alimentos ultraprocessados e da obesidade.
Conclui-se que o consumo regular de bebidas açucaradas é elevado na população estudada, sendo inferior em indivíduos com maior idade e superior nos homens que possuem o hábito de fazer as refeições em frente a televisão e nas mulheres que estão insatisfeitas com o peso corporal. Estratégias de intervenção alimentar e nutricional devem ser implementadas com o objetivo de diminuir o consumo de bebidas açucaradas, uma vez que estes alimentos apresentam baixo teor nutricional e alto valor calórico e estão associados a comportamentos obesogênicos tal como o hábito de realizar refeições em frente à televisão, além da presença de adiposidade abdominal excessiva.
Referências
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5Malik VS, Popkin BM, Bray GA, Després JP, Hu FB. Sugar sweetened beverages, obesity, type 2 diabetes and cardiovascular disease risk. Circulation 2010; 121(11):1356-1364.
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11Drewnowski A, Rehm CD. Consumption of low-calorie sweeteners among U.S. adults is associated with higher healthy eating index (HEI 2005) scores and more physical activity. Nutrients 2014; 6(10):4389-4403.
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12Pollard CM, Meng X, Hendrie GA, Hendrie D, Sullivan D, Pratt IS, Kerr DA, Scott JA. Obesity, socio-demographic and attitudinal factors associated with sugar-sweetened beverage consumption: Australian evidence. Aust N Z J Public Health 2016; 40(1):71-77.
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13Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF), 2008-2009: tabela de composição nutricional dos alimentos consumidos no Brasil Rio de Janeiro: IBGE; 2011.
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14Levy-Costa RB, Sichieri R, Pontes NS, Monteiro CA. Disponibilidade domiciliar de alimentos no Brasil: distribuição e evolução (1974-2003). Rev Saude Publica 2005; 39(4):530-540.
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15Patel AI, Brindis CD. Maximizing School Policies to Reduce Youth Consumption of Sugar-Sweetened Beverages. J Adolesc Health 2016; 59(1):1-2.
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Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
Mar 2019
Histórico
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Recebido
27 Ago 2016 -
Revisado
23 Mar 2017 -
Aceito
25 Mar 2017