Promoção, proteção e apoio à amamentação no trabalho e o alcance do desenvolvimento sustentável: uma revisão de escopo

Resumo

O objetivo deste artigo é mapear estratégias de promoção, proteção e apoio direcionadas às mulheres trabalhadoras que amamentam e o seu potencial impacto para alcançar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), em particular os ODS 5 (igualdade de gênero e empoderamento da mulher) e 8 (trabalho decente e crescimento econômico). Revisão de escopo baseada no referencial do JBI (Joanna Briggs Institute), cujas buscas foram realizadas nas bases de dados PubMed, Web of Science, Scopus, Social Science Research Network e Open Knowledge Repository. Obtiveram-se 576 publicações, destas, 33 foram incluídas no estudo. A síntese narrativa foi organizada em três eixos: 1) promoção; 2) proteção; e 3) apoio ao aleitamento materno no contexto do trabalho. As ações voltadas às mulheres que amamentam no trabalho têm potencial para atingir diretamente os ODS 5 e 8, e atingem indiretamente os ODS 1 e 10. O aumento das taxas de amamentação contribui para atingir outros quatro ODS (2,3,4,12). As ações voltadas às mulheres trabalhadoras que amamentam podem contribuir direta e indiretamente para o alcance de oito dos 17 ODS, devendo, portanto, ser incentivadas e reforçadas.

Palavras-chave:
Aleitamento materno; Objetivo de Desenvolvimento Sustentável; Mulheres trabalhadoras; Equidade de gênero; Promoção da saúde

Abstract

This article aims to map promotion, protection, and support strategies aimed at working women who breastfeed and their potential impact on achieving the Sustainable Development Goals (SDGs), in particular SDGs 5 (gender equality and women’s empowerment) and 8 (decent work and economic growth). This study is a scoping review based on the Joanna Briggs Institute (JBI) framework, whose searches were performed in PubMed, Web of Science, Scopus, Social Science Research Network, and Open Knowledge Repository databases. This study’s search obtained 576 publications, of which 33 were included in the study. The narrative synthesis was organized into three axes: 1) promotion; 2) protection, and 3) support for breastfeeding in the work context. Actions aimed at women who breastfeed at work have the potential to directly achieve SDGs 5 and 8, and indirectly achieve SDGs 1 and 10. Increased breastfeeding rates also help to achieve another four SDGs (2, 3, 4, 12). Actions aimed at working women who breastfeed can contribute directly and indirectly to the achievement of eight of the 17 SDGs, and should therefore be encouraged and reinforced.

Key words:
Breastfeeding; Sustainable Development Goals; Women working; Gender equality; Health promotion

Introdução

Boas práticas de amamentação têm impacto positivo sobre sobrevivência, segurança alimentar e nutricional, desenvolvimento das crianças pequenas e trazem benefícios para a saúde das mães^1,2. Porém, globalmente, apenas 41% dos bebês menores de seis meses recebem amamentação exclusiva, e esforços precisam ser feitos para alcançar a meta de 70% estabelecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) para 2030³. Uma barreira para a melhoria das taxas de amamentação é o aumento da participação da mulher no mercado de trabalho, pois conciliar maternidade e emprego é desafiador^4,5. Quando o ambiente de trabalho não é favorável, as mulheres não se sentem encorajadas a manterem a amamentação, um dos motivos principais para o desmame precoce^4-6. Além disso, o esforço e a preocupação da mulher em como manter a amamentação, associados às dificuldades de extrair e conservar o leite em segurança no local de trabalho, podem causar estresse e falta de concentração nas atividades profissionais, impactando no seu rendimento e na produtividade no trabalho⁶.

Nesse sentido, é relevante que as empresas forneçam apoio para as mulheres exercerem seu direito de amamentar^2,7. O apoio à amamentação no ambiente de trabalho é incentivado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), que propôs implementação das convenções nº 183 e nº 191 para garantir a proteção da maternidade e do trabalho, incluindo a licença maternidade remunerada de no mínimo 14 semanas e as pausas para amamentar durante a jornada de trabalho, ou redução da carga horária de trabalho para amamentar⁸.

Estratégias de promoção, proteção e apoio à amamentação no ambiente de trabalho, como campanhas, licença maternidade (preferencialmente a de seis meses) e provisão de salas de apoio à amamentação, contribuem para o aumento dos índices de amamentação, além de reduzirem o absenteísmo e melhorarem o desempenho, o comprometimento e a retenção da força de trabalho². Essas estratégias são fundamentais para que as mulheres se dediquem às suas atividades profissionais com mais tranquilidade, aliviando o desconforto físico e emocional e mantendo a sua produtividade⁶. Portanto, pode-se inferir que as estratégias de promoção, proteção e apoio à amamentação no contexto do trabalho têm grande potencial de favorecer o alcance dos Objetivos para o Desenvolvimento Sustentável (ODS) relacionados à saúde e bem-estar, à igualdade de gênero, ao empoderamento das mulheres e ao trabalho decente e produtivo⁶.

Um trabalho decente é definido pela OIT como a promoção e o cumprimento dos direitos fundamentais no trabalho, com remuneração e emprego dignos, na proteção social e legal, com diálogo adequado entre empresários e trabalhadores. A produtividade está relacionada à eficiência e à eficácia do trabalho. Dessa forma, o emprego pleno e produtivo beneficia trabalhadores, empregadores e seus países. A igualdade de gênero visa proporcionar as mesmas oportunidades a todos, e a sua existência no ambiente de trabalho tem impacto sobre a disposição física e mental das mulheres^9,10.

Diante da relevância da amamentação para a saúde e a nutrição materno-infantil e da recente discussão sobre as influências do contexto do trabalho na proteção e no apoio à amamentação, este estudo teve como objetivo mapear estratégias voltadas às mulheres trabalhadoras que amamentam e discutir seu potencial impacto para ajudar a alcançar os ODS, em especial os ODS 5 (igualdade de gênero e empoderamento das mulheres) e 8 (trabalho decente e crescimento econômico).

Métodos

Foi realizada uma revisão de escopo seguindo a abordagem PRISMA-ScR (Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses extension for Scoping Reviews)¹¹.

Identificação de questões de pesquisa e critérios de elegibilidade

Utilizou-se o acrônimo PCC’ (população, conceito e contexto) para guiar a pergunta de pesquisa: “quais são as estratégias de promoção, proteção e apoio ao aleitamento materno no contexto do trabalho, e como podem ajudar a alcançar os ODS, em especial o ODS 5 “igualdade de gênero e empoderamento das mulheres” e o ODS 8 “trabalho decente e crescimento econômico”? Os critérios de inclusão foram: população - mulheres que amamentam, mães de crianças menores de dois anos; conceito - estratégias de promoção, proteção e apoio ao aleitamento materno; contexto - estratégias relacionadas ao contexto do trabalho e à mulher trabalhadora que amamenta.

Fonte dos dados

Foram incluídos estudos primários e de revisão nos idiomas inglês, português e espanhol, sem restrição quanto à abordagem (quantitativos, qualitativos) ou ano da publicação, bem como notas técnicas. Excluiu-se publicações em formato de livros, capítulos de livros e guias de implementação de programas.

Estratégias de busca

A busca foi realizada em abril de 2021 nas bases de dados Medline, Web of Science e Scopus, e em dois repositórios: Scopus, Social Science Research Network (SSRN) e Open Knowledge Repository. Foram utilizados os descritores no idioma inglês: Breastfeeding; Intervention; Equity, Gender; Workplaces; Legislation; Woman, Working; Living Cost; Economic Conditions; Household Consumption; Expenditures Public; Expenditure Health; Public Policies; Income; Employment; Women; Empowerment; Economy. Na busca no repositório “Social Science Research Network”, foram utilizados apenas os descritores “Breastfeeding AND Intervention”, pois os modelos de busca com a combinação de outros descritores não retornaram resultados. O modelo completo das buscas combinando os descritores é apresentado no Material Suplementar A (disponível em: https://doi.org/10.48331/scielodata.1WZKVJ).

Seleção dos estudos e extração dos dados

Utilizou-se o software Rayyan QCRI 0.0.1 para a seleção por títulos e resumos. Três autoras selecionaram os estudos de forma interativa e os conflitos foram resolvidos por consenso. Após a leitura dos textos completos, os dados foram registrados em uma planilha de extração com as seguintes informações: autor, ano da publicação, país, tipo de estudo, tipo de estratégia (promoção/proteção/apoio), relação das estratégias e/ou desfechos com os ODS 5 e 8.

Análise dos dados

Uma síntese narrativa foi produzida¹² e as informações foram agrupadas para descrever as características dos estudos. Identificou-se a classificação da economia dos países dos estudos segundo o World Bank 2020-2021¹³. As estratégias identificadas nos estudos foram classificadas em três eixos, com base no referencial do Ministério da Saúde do Brasil¹⁴.

Promoção: ações publicitárias nas empresas e materiais informativos para promover a amamentação no local de trabalho; inclui ações de divulgação de declarações e diretrizes que incentivam a implantação de programas de apoio à amamentação nas empresas.

Proteção: políticas públicas no nível do governo federal, estado ou município, especialmente com leis de proteção da amamentação; inclui a licença maternidade remunerada e o direito a pausas na jornada de trabalho para amamentar ou extrair o leite do peito.

Apoio: ações de apoio à amamentação institucionalizadas no âmbito da empresa; políticas locais da própria empresa; inclui as salas para extrair e armazenar leite materno ou somente para amamentar; ofertas de creches; e apoio dos supervisores, colegas de trabalho e familiares.

Análise do potencial das estratégias para alcançar os ODS

Foram identificados os impactos das estratégias nas condições de trabalho das mães e nas práticas de amamentação e/ou na saúde e bem-estar das mães. Tendo como base o referencial das metas e indicadores para se alcançar os ODS da Agenda 2030, foi analisado o potencial de alcançar os ODS por meio das estratégias de promoção, proteção e apoio da amamentação no contexto do trabalho⁹. Para apoiar a análise, investigou-se na literatura evidências sobre as influências das boas condições de trabalho e das práticas de amamentação no bem-estar, na saúde e prosperidade das mães e crianças.

Resultados

A Figura 1 apresenta os resultados das buscas, as inclusões e exclusões com justificativas. A lista de referências dos estudos excluídos e motivos de exclusão são apresentados no Material Suplementar B (disponível em: https://doi.org/10.48331/scielodata.1WZKVJ).

Figura 1
Fluxograma da seleção dos estudos.

Características dos estudos

Os 33 estudos selecionados foram publicados entre 1990 e 2021, sendo a maioria (28) entre 2011 e 2021. A maioria dos estudos foi conduzida em países de alta renda (n = 23; 69,7%), principalmente nos Estados Unidos da América (EUA) (n = 15; 45,5%)^15-28, e seis estudos multicêntricos (18,2%) envolveram pesquisas de mais de 140 países^2,29-33. Dois foram realizados em países de média-alta renda (6,1%)^34,35 e outros dois em países de média-baixa renda (6,1%)^36,37.

Os desenhos dos estudos foram principalmente do tipo observacional analítico (n = 16; 47,5%)^{15,18,20-23,25,28,29,35}, seguido das abordagens qualitativas (n = 6; 18,2%)^{17,34,36,43-45}. Outros tipos de desenhos foram revisões (n = 9; 27,3%)^{2,16,19,24,26,27,29-31}, nota técnica (n = 1; 3,7%)³³ e outros métodos analíticos (n = 1; 3,7%)⁴⁶.

As estratégias de promoção da amamentação no contexto do trabalho foram descritas em poucos estudos (n = 2; 6,1%)^16,33, enquanto a maioria descreveu estratégias de proteção (n = 27; 81,8%)^{2,15,17-33,37,39-41,44-46}, seguidas das estratégias de apoio (n = 18; 54,5%)^{2,19-22,27,32,34,36-45}. Algumas pesquisas abordaram mais de um tipo de estratégia, por exemplo: proteção e apoio. Uma síntese das características das estratégias citadas nos estudos é apresentada nos quadros 1, 2, e 3.

Quadro 1
Síntese narrativa das estratégias para promoção da amamentação no contexto do trabalho e para a mulher trabalhadora identificadas nos estudos selecionados.

Autor, ano	Características das estratégias de promoção da amamentação
Barber-Madden, 199016	Foram desenvolvidas ações de promoção para superar as lacunas e os desafios para melhoria da prevalência de amamentação na década de 1990 nos EUA. Foi criado um comitê para abordar as barreiras para a promoção da amamentação. Foram formados grupos de força tarefa para realizar diversas ações, entre elas, estratégias de promoção voltadas à mulher trabalhadora, com a criação de diretrizes para programas de saúde e nutrição no local de trabalho para trabalhadoras grávidas e lactantes.
Marinelli et al., 201333	Foi divulgada uma declaração que tem como objetivo fornecer aos líderes médicos da medicina da amamentação, um resumo baseado em evidências dos desafios médicos, jurídicos e políticos enfrentados pela mãe que amamenta separada de seu filho no local de trabalho ou em ambientes educacionais. A declaração enfatiza que a presença de programas de lactação formalizados, suporte e instalações físicas em escolas ou locais de emprego melhora a capacidade das mães de amamentar com sucesso. É orientado que empregadores sejam informados para entenderem como o apoio às funcionárias que amamentam afetará positivamente seus negócios.

• Fonte: Autoras.

Quadro 2
Síntese narrativa das estratégias para proteção da amamentação no contexto do trabalho e para a mulher trabalhadora identificadas nos estudos selecionados.

Autor, ano	Características das estratégias de proteção à amamentação
Abdulloeva e Eyler, 201315	Lei estadual de aleitamento materno: inclui o intervalo e um local privado, fora do banheiro, para mães que amamentam possam retirar o leite materno durante a jornada de trabalho por um ano após o nascimento da criança, sempre que precisar.
Alb et al., 201728	Lei federal de apoio à amamentação no trabalho. A Lei exige que os empregadores forneçam um intervalo e um espaço privado, além de um banheiro, para as funcionárias que amamentam extraírem o leite materno por um ano após o nascimento do filho.
Bradford et al., 201717	Políticas estaduais e práticas de apoio ao aleitamento materno em quatro setores: hospitais, clínicas, ambientes de cuidados e educação da primeira infância, e locais de trabalho.
Chen et al., 200645	Licença maternidade e direito a intervalos para extrair o leite das mamas.
Dozier e McKee, 201118	Existência de estatuto estadual de amamentação no local de trabalho que exige um local e/ou intervalo para amamentar.
Grummer-Strawn e Shealy, 2009 19	Os empregadores permitiam às mulheres tempo e espaço para extrair leite no trabalho. Os estados promulgaram legislação para garantir que acomodações fossem feitas para mulheres empregadas e para proteger o direito de amamentar em público.
Hauck et al., 202046	Estados aplicaram a legislação “US workplace breastfeeding policy”, que são leis de apoio à amamentação no local de trabalho com diferentes aplicabilidades, incentivando ou exigindo que as empresas forneçam instalações que permitam às mães extrair leite materno em privacidade e armazená-lo adequadamente.
Heymann et al., 201129	Licença maternidade remunerada e direito a intervalos para amamentar.
Heymann et al., 201330	Licença maternidade remunerada e direito a intervalos para amamentar.
Hilliard e Brunt, 202020	Política estadual de promoção da saúde implementada para prevenir práticas de emprego injustas contra as mulheres, especificamente mães trabalhadoras que amamentam. Direito a intervalos flexíveis e espaço privado para amamentar. A política dá a designação (selo de certificação) de empresa amiga da criança.
Jacknowitz, 200821	Direito à disponibilidade de horário flexível (horas trabalhadas em casa e trabalhadas em cronograma fixo).
Kozhimannil et al., 201622	Direito a intervalo com tempo suficiente para extrair o leite das mamas.
Lee et al., 201539	Licença maternidade por seis meses.
Marinelli et al., 201333	Licença maternidade. Declaração para líderes médicos sobre evidências dos desafios médicos, jurídicos e políticos enfrentados pela mãe que amamenta separada de seu filho no local de trabalho ou em ambientes educacionais. Entre as declarações, inclui a licença maternidade adequada.
Mirkovic et al., 201623	Licença maternidade remunerada.
Murtagh e Moulton, 201124	Lei federal que exige acomodação para mães que desejam continuar amamentando enquanto trabalham fora de casa e dá o direito de tempo de pausa razoável para extrair o leite das mamas.
Nandi et al., 2018 31	Licença parental remunerada.
Ogbuanu et al., 201125	Licença maternidade remunerada.
Rowbotham et al., 202144	Direito a horários de trabalho flexíveis.
Rollins et al., 20162	Licença maternidade e direito a intervalos para amamentar.
Ruhm, 201126	Licença maternidade remunerada; direitos estendidos não pagos, como menor carga horária de trabalho e licença por tempo prolongado.
Soomro et al., 201637	Licença maternidade paga por três meses; direito a ajustes de tarefas e a intervalos durante o período de lactação.
Stumbitz et al., 201832	Direito a tempo para extrair o leite das mamas.
Taylor et al., 2020 27	Políticas e leis federais que estimulam as empresas a reconhecer e apoiar as necessidades das funcionárias que amamentam.
Tsai, 2014a40	Direito a intervalos para extrair o leite das mamas.
Tsai, 2014b41	Direito a intervalos para extrair o leite das mamas.
World Bank, 201235	Licença maternidade e paternidade em Mauricius.

• Fonte: Autoras.

Quadro 3
Síntese narrativa das estratégias para apoio da amamentação no contexto do trabalho e para a mulher trabalhadora identificadas nos estudos selecionados.

Autor, ano	Características das estratégias de apoio à amamentação
Burns e Triandafilidis, 201943	Disponibilização de local para armazenar o leite materno extraído pelas funcionárias e alunas da universidade.
Cervera-Gasch et al., 202038	Existência de política da universidade para o apoio à amamentação por suas funcionárias. Provisão de acomodações especiais para extrair e armazenar o leite materno após o retorno ao trabalho na universidade. Promoção de grupos de apoio. Existência de supervisora mulher.
Chen et al., 200645	Existência de políticas nas empresas para tornarem o ambiente de trabalho favorável à amamentação. Disponibilização de salas para extrair o leite materno.
Febrianingtyas et al., 201936	Disponibilização de instalações, no escritório, para extrair o leite materno. Existência de apoio dos gestores/supervisores e colegas de trabalho.
Fernandes et al., 201834	Apoio do gestor para ter a funcionária ter flexibilidade de função, de horário e espaço que viabilizem a amamentação. Oferta de creche e bom tratamento à trabalhadora.
Grummer-Strawn e Shealy, 200919	Disponibilização de salas de lactação ou acomodações para amamentação.
Hilliard e Brunt, 202020	Empresas fornecem um espaço privado, diferente de um banheiro, para mulheres bombearem/extraírem o leite e uma fonte de água limpa para lavar as mãos, bem como um refrigerador para armazenamento do leite materno.
Jacknowitz, 200821	Disponibilidade de creches patrocinadas pelo empregador.
Kosmala-Anderson e Wallace, 200642	Desenvolvimento de instalações e políticas gerais nas empresas para o bem-estar das mães no retorno ao trabalho. Acesso a creches no local de trabalho.
Kozhimannil et al., 201622	Acesso a acomodações para amamentação e para extrair o leite materno no local de trabalho.
Lee et al., 201539	Disponibilização de sala de apoio para amamentação em locais de trabalho.
Rollins et al., 20162	Disponibilização de salas de lactação.
Rowbotham et al., 202144	Existência de instalações para extrair o leite das mamas e armazená-lo. Apoio dos supervisores e colegas de trabalho.
Soomro et al., 201637	Local nas organizações multinacionais e nacionais para amamentar e/ou extrair o leite das mamas e geladeira para armazená-lo. Disponibilização de bomba para leite materno e berçário para o cuidado infantil.
Stumbitz et al., 201832	Programas de lactação empresarial em pequenas e médias empresas para lidar com a gravidez e o retorno das mães ao trabalho, oferecendo tempo e espaço privado para extrair o leite materno.
Taylor et al., 202027	Disponibilização de salas de lactação para extrair e armazenar o leite materno.
Tsai, 2014a40	Existência de local na empresa para extrair leite materno após retornar ao trabalho.
Tsai, 2014b41	Existência de local na empresa para extrair leite materno após retornar ao trabalho e realização de ações educativas na empresa incluindo o parceiro da mãe.

• Fonte: Autoras.

Estratégias de promoção da amamentação

Em uma pesquisa, a estratégia citada foi a criação de diretrizes para programas de promoção da saúde e nutrição no local de trabalho para grávidas e lactantes, visando superar as lacunas e desafios para a melhoria da prevalência de amamentação na década de 1990 nos EUA. Essas ações demonstraram sucesso para a promoção do aleitamento materno em grandes áreas urbanas¹⁶. O estudo de revisão de Marinelli et al. (2013)³³ apresentou uma declaração baseada em evidências sobre desafios médicos, jurídicos e políticos enfrentados pela mãe que amamenta separada de seu filho no local de trabalho ou em ambientes educacionais. A declaração apresenta recomendações aos médicos e empregadores, como evitar a separação de mãe e filho por causa do emprego, oferecer licença maternidade adequada, reduzir a carga horária de trabalho/estudo e implementar programas de lactação formalizados e instalações físicas em escolas ou locais de emprego.

Estratégias de proteção da amamentação

A estratégia de proteção da amamentação no contexto do trabalho mais frequente (n = 16; 59,5%) foi o direito a intervalos no horário de trabalho para extrair o leite materno ou para amamentar^{2,15,18-20,22,24,26,28-30,32,37,40,41,45}. Alguns estudos descreveram o direito a ajuste de tarefas, a flexibilidade de horário de trabalho em casa ou na empresa e a redução da carga horária de trabalho como formas de proteger o direito da mãe de amamentar^20,21,37,44. A execução do direito à licença maternidade foi uma estratégia frequente entre os estudos (n = 11; 33,3%)^{2,23,25,26,29-31,35,37,39,45}, sendo que dois deles citaram como estratégia a licença parental^32,35. Outro exemplo de estratégias legislativas foi a existência de leis e estatutos federais e estaduais que exigiam das empresas o apoio para suas funcionárias amamentarem por meio da disponibilidade de acomodações de lactação e flexibilidade de horário de trabalho^{15,18,19,24,46}.

Os estudos mostraram que as leis e políticas federais e estaduais permitem o aumento da participação das mulheres e mães no trabalho remunerado, melhorando a renda familiar e a equidade de gênero, ambos também associados à melhoria nos resultados de saúde para mulheres e crianças^26,29,31. Algumas nações europeias utilizam políticas num esforço de aumentar a equidade de gênero e a fertilidade^26,35. O direito a intervalos e horários de trabalho flexíveis são intervenções de baixo custo que podem reduzir o absenteísmo e melhorar o desempenho, o comprometimento e a retenção da força de trabalho². A licença maternidade remunerada foi considerada importante mediador da redução da “lacuna familiar” em termos de rendimentos e promotora do crescimento econômico, visto que os pais tendem a não se demitir do emprego para poder cuidar dos filhos²⁶.

Em relação aos impactos positivos das legislações e/ou políticas nas práticas de amamentação, um estudo demonstrou que trabalhar em casa (> de oito horas por semana) aumentou a probabilidade de amamentar em 8% ao nascer e 16,8% aos seis meses²¹. O direito a intervalos no horário de trabalho e acomodações de lactação melhorou as taxas de aleitamento materno exclusivo aos seis meses¹⁵. Exigir um local e/ou intervalo para amamentar por meio de um estatuto estadual aumentou a probabilidade de amamentar aos seis meses¹⁸. A execução de legislação estadual foi apontada como efetiva para aumentar 2,3 pontos percentuais as taxas de aleitamento materno em comparação a estados sem legislação, embora esse impacto seja observado somente um a dois anos após a assinatura das leis⁴⁶. As mães eram mais propensas a amamentar por mais tempo quando recebiam a licença maternidade de pelo menos 12 semanas^23,25,39,45. A prevalência da continuidade da amamentação após os seis meses melhorou a partir da licença maternidade remunerada^23,39, além de diminuir as taxas de mortalidade neonatal e infantil em 10%²⁹.

Alguns desafios na execução das estratégias de proteção foram descritos: muitos empregadores não oferecem boas condições no trabalho para as mulheres amamentarem e os períodos de licença maternidade remunerada estão aquém das recomendações da OIT^{2,23,31,37,39}. No Paquistão, somente 45% das empresas ofereciam ajuste de tarefas às mães durante o período de lactação, e apenas 15% ofereciam intervalos para amamentação e não mais que três meses de licença maternidade remunerada³⁷. Em Taiwan, a licença-maternidade remunerada era de dois meses para a maioria das mães, não sendo comum as mulheres optarem por períodos mais longos, possivelmente devido ao medo de perder o emprego e a renda³⁹. Outro estudo utilizou dados de uma pesquisa nacional estado unidense e revelou que 28% das mulheres empregadas entre 2006 e 2010 não receberam nenhuma licença maternidade remunerada²³. Revisões sistemáticas^1,2 demonstraram durações curtas de licença maternidade em diversos países, não atingindo o padrão mínimo de 14 semanas estabelecido pela OIT².

Estratégias de apoio à amamentação

Entre os 18 estudos que reportaram estratégias de apoio, 16 citaram a disponibilização de uma sala no local de trabalho para as mães amamentarem e/ou extraírem o leite materno e armazená-lo de forma segura, descritas nesse estudo como salas de apoio à amamentação^{2,19,20,22,27,32,36-45}. Também foram consideradas estratégias de apoio a existência de políticas internas das empresas, que incentivavam principalmente a instalação das salas de apoio à amamentação, os intervalos para extrair o leite materno^38,42,45, o subsídio de creches para os filhos das trabalhadoras⁴³ ou a disponibilização de creches no local de trabalho⁴². Quatro estudos destacaram a importância do apoio dos gerentes e dos colegas para criarem um ambiente de trabalho amigável à amamentação e disponibilizarem recursos que permitam às mulheres exercerem o direito de amamentar^34,36,42,44. Foram promovidas também ações educativas de forma combinada a outras ações de apoio citadas^38,41.

Foram identificados benefícios das salas de apoio no contexto do trabalho. A oferta dessa infraestrutura promoveu melhor desempenho pelas trabalhadoras, melhorou a satisfação com o trabalho e reduziu o absenteísmo^2,32. O uso das salas de apoio no trabalho cresceu ao longo dos anos em Taiwan, de 51,1% em 2008 para 64,1% em 2011³⁹, e a disponibilização delas pode aumentar a intenção das mães de fazerem intervalos para extrair o leite após retornar ao trabalho^40,41. Em relação aos impactos nas práticas de amamentação, a oferta adequada das salas de apoio à amamentação foi associada à maior duração da amamentação após retorno ao trabalho^20,38. Entre 2011 e 2012, nos EUA, 40% das mulheres tiveram acesso tanto ao intervalo como ao espaço privado. Essas mulheres tiveram 2,3 vezes mais probabilidade de estar amamentando exclusivamente aos seis meses (IC95% 1,03-4,95) e 1,5 mais probabilidade de continuar amamentando exclusivamente a cada mês (IC95% 1,08-2,06), em comparação às mulheres sem acesso a essas acomodações²².

Ainda existe baixa oferta de salas para amamentação e o acesso a elas é dependente do tamanho organizacional, sendo mais provável que empresas maiores consigam fornecer suportes instrumentais, incluindo salas para amamentação e armazenamento do leite materno³⁶. A disponibilidade das salas foi menos frequente (9%) em empresas de pequeno porte (< 100 empregados), em comparação com as de grande porte (42%)¹⁹. Um dos fatores que torna desafiador reverter esse cenário, principalmente entre as empresas de pequeno porte, é a falta de requisitos obrigatórios para que os empregadores forneçam salas adequadas para amamentação^37,44. Mesmo em estudos conduzidos em países de alta renda, como Austrália e Inglaterra, em algumas empresas as salas disponíveis para mulheres extraírem ou armazenarem o leite estavam em condições insalubres^42,43.

A existência de uma política empresarial de apoio à amamentação, que implementa as referidas salas, foi um fator associado à continuidade da amamentação (p = 0,009)³⁸. Entretanto, dois estudos enfatizaram haver baixo uso das salas pelo fato de as mães não terem conhecimento da política e de seus direitos trabalhistas na maternidade^42,45. Uma política empresarial que disponibilizou creches aumentou em 47% a probabilidade de amamentar por seis meses após o nascimento, segundo dados de pesquisas nacionais de 1979 nos EUA²¹. Em estudo conduzido na Inglaterra, o acesso a creches no local de trabalho estava disponível apenas para uma minoria⁴².

Em relação ao apoio dos empregadores e colegas de trabalho, essas atitudes promovem a proteção e disseminação dos direitos de mães que amamentam no retorno ao trabalho^36,44. Estudo conduzido no Brasil apontou que os gerentes têm condutas positivas de apoio e promoção da amamentação quando compreendem os impactos positivos do apoio à maternidade no melhor rendimento no trabalho. O oposto foi observado quando os gerentes tinham uma visão negativa em relação à implantação das salas de amamentação, desconheciam as legislações e a situação da trabalhadora ou se isentavam dessa responsabilidade³⁴. Em pesquisa realizada na Inglaterra, a falta de apoio do empregador foi percebida como uma grande fonte de insatisfação das mulheres. Foi uma razão para algumas ficarem afastadas do trabalho por mais tempo do que desejavam ou para solicitar demissão após a licença maternidade⁴².

Ações educativas foram empreendidas, em geral, em combinação com outras ações de apoio. Grupos de apoio foram organizados em uma universidade da Espanha para as funcionárias, e disponibilizadas acomodações especiais para extrair e armazenar o leite materno, colocando-se em prática uma política de apoio à amamentação na universidade. O conjunto de estratégias foi associado a uma maior duração da amamentação ao retornar ao trabalho (p < 0,001)³⁸. Na Indonésia, os pesquisadores forneceram informações para as gestantes no local de trabalho incentivando a amamentação e disponibilizaram instalações para extração de leite materno³⁶. Em Taiwan foram desenvolvidas ações de educação ou atividades pré-natais no local de trabalho que incluíam o parceiro das mulheres trabalhadoras. O apoio inicial do parceiro à escolha de amamentar e o incentivo da empresa para as mães usarem a sala de lactação e as pausas para extração do leite aumentou as taxas de amamentação⁴¹.

Potencial das estratégias para alcançar os ODS

A Figura 2 sintetiza reflexo das estratégias de promoção, proteção e apoio à amamentação no contexto do trabalho em melhores condições de trabalho para as mulheres que amamentam, levando a resultados positivos nas práticas de amamentação. Esses desfechos apresentam conexões com o alcance dos ODS. Os impactos das estratégias no trabalho da mulher têm potencial para alcançar o ODS 5 (igualdade de gênero e empoderamento das mulheres) e o ODS 8 (trabalho decente e crescimento econômico), que potencializam o alcance do ODS 10 (reduzir iniquidades) e ODS 1 (combater a pobreza). Em relação ao ODS 5, as estratégias impactam três metas ​​(5.1, 5.6 e 5c), relacionadas a acabar com todas as formas de discriminação contra todas as mulheres, assegurar os direitos reprodutivos e adotar e fortalecer políticas sólidas e legislação para a promoção da igualdade de gênero e o empoderamento de todas as mulheres^{2,26,29,31,35,47}. No que se refere ao ODS 8, as estratégias têm potencial para alcançar duas metas (8.5 e 8.8): conseguir emprego pleno e produtivo e trabalho decente para todas as mulheres e homens; e proteger os direitos trabalhistas e promover ambientes de trabalho seguros e protegidos para todos os trabalhadores^{2,26,29,31,35,47}. Duas metas do ODS 10 (10.1 e 10.2) são atingidas indiretamente por meio dos impactos das estratégias, as quais visam alcançar e sustentar progressivamente o crescimento da renda e fortalecer e promover a inclusão social, econômica e política de todos^26,29,31,47. Essas ações influenciam o alcance de duas metas (1.2 e 1.3) do ODS 1, pois promovem a redução da pobreza e incentivam a implementação de sistemas de proteção social^26,29,31,47.

Figura 2
Relações dos resultados das estratégias de proteção, apoio e promoção da amamentação no contexto do trabalho com o alcance dos Objetivos para o Desenvolvimento Sustentável (ODS).

O aumento das práticas de amamentação exclusiva e da amamentação continuada após o retorno ao trabalho potencializam o alcance dos ODS 2 (fome zero), 3 (saúde e bem-estar) e 12 (consumo e produção responsáveis). Esses resultados potencializam o alcance dos ODS 1, 4 e 10. Em relação ao ODS 2, melhores prevalências de aleitamento materno podem ajudar a alcançar duas metas (2.1 e 2.2), pois amamentar é um meio de acabar com a fome e garantir o acesso a um alimento seguro e nutritivo para os bebês, e porque as boas práticas de amamentação são um caminho para acabar com todas as formas de desnutrição^1,2,47. No que se refere ao ODS 3, as estratégias que aumentam o número de crianças amamentadas promovem duas metas (3.1 e 3.2), pois é constatada a redução das chances de câncer de mama nas mulheres que amamentam e a queda na mortalidade neonatal^1,2,47.

Como o leite materno é uma fonte natural de alimento, amamentar também ajuda a alcançar uma meta do ODS 12 (12.3), pois contribui para reduzir o desperdício alimentar e as perdas de alimentos ao longo das cadeias de produção e fornecimento^1,2,47. A boa nutrição e saúde das crianças promovida pela amamentação nos dois primeiros anos de vida é essencial para o pleno desenvolvimento infantil, que é uma das metas para se alcançar o ODS 4 (4.2: educação de qualidade)^1,2,47. A promoção do desenvolvimento infantil de qualidade promove o crescimento de populações mais saudáveis e prósperas, efeito que impacta positivamente na redução da pobreza (ODS 1) e promove o ODS 10 para alcançar e sustentar progressivamente o crescimento da renda^1,2,47.

Discussão

O presente estudo mapeou estratégias de promoção, proteção e apoio voltadas às mulheres trabalhadoras que amamentam e demonstrou o potencial de seus resultados para alcançar os ODS, tema pouco abordado na literatura. Os resultados evidenciaram o potencial dessas estratégias de contribuir para o alcance dos ODS 5 (igualdade de gênero e empoderamento das mulheres), 8 (trabalho decente e crescimento econômico) de forma mais direta, e os ODS 1 (combater a pobreza) e 10 (reduzir iniquidades) de forma indireta. Os impactos positivos das estratégias nos índices de amamentação têm potencial para alcançar os ODS 2 (fome zero), 3 (saúde e bem-estar) e 12 (consumo e produção responsáveis) de forma direta, e os ODS 4 (educação de qualidade), 1 e 10 indiretamente.

A maioria dos estudos foi conduzida em países de alta renda, especialmente nos EUA⁴⁶, onde, apesar de existirem avanços para proteger e apoiar a mulher trabalhadora que amamenta^19,20, a maior parte das mulheres não recebe licença maternidade remunerada²⁵ ou intervalos e salas para amamentar ou extrair o leite no local de trabalho^19,22. Segundo o Unicef, os países mais ricos do mundo não oferecem soluções abrangentes a todas as famílias em relação à duração das licenças remuneradas para as mães e pais⁴⁶. Além disso, é relevante intensificar a agenda de pesquisas sobre o tema das mulheres trabalhadoras que amamentam nos países de menor renda, onde as crianças estão em iminente risco de desenvolvimento subótimo e onde também há falta da oferta de leis trabalhistas e suporte social decente durante a maternidade⁴⁸.

Observou-se que as estratégias do eixo 1 (promoção) foram implementadas em somente dois estudos, frequência muito menor em comparação com ações de proteção e apoio. As intervenções para promoção da amamentação incluem a criação de diretrizes para programas de saúde e nutrição no local de trabalho e campanhas para informar os empregadores sobre os benefícios que podem obter ao apoiarem suas trabalhadoras que amamentam^2,16. No entanto, dados sobre os efeitos dessas intervenções raramente são reportados², portanto é relevante o estímulo à divulgação científica dos métodos e resultados desse tipo de intervenção.

Em relação ao segundo eixo de estratégias (proteção), o direito de pausas para extrair o leite materno foi a mais frequente. Extrair o leite das mamas na jornada de trabalho, além de contribuir para manter a produção do leite, alivia o desconforto físico, permitindo melhores condições de realização das atividades profissionais. Geralmente as instituições que seguem essa lei possuem salas de apoio à amamentação, ou seja, também implementam estratégias de apoio no âmbito da empresa^{34,36,38,41,44}. Essas ações podem contribuir para a promoção do trabalho decente (ODS 8) e para a equidade de condições de trabalho entre homens e mulheres (ODS 5). Em relação à existência de legislação que dê o direito à licença maternidade, compreende-se que contribui para a igualdade de gênero e empoderamento das mulheres (ODS 5) porque dá a elas direito à fonte de renda enquanto exercem seus direitos reprodutivos⁴⁵. A licença maternidade também tem potencial para aumentar a estabilidade no emprego, aumentando potencialmente a produtividade e resultando em melhores ganhos a longo prazo e progressão na carreira, o que se relaciona com o ODS 8. Além disso, a equidade de acesso à renda pode contribuir para combater a pobreza (ODS 1) e promove igualdade socioeconômica (ODS 10) por meio da diminuição do desemprego e da oferta de proteção social legal^26,35,42. No Brasil, o Programa Empresa Cidadã, que é um dispositivo não obrigatório que concede incentivo fiscal às empresas, permite a ampliação da licença maternidade de quatro para seis meses e da licença paternidade de cinco para 20 dias⁴⁹.

Com relação ao terceiro eixo (apoio), os estudos afirmam que quando os gerentes e empresas adotam estratégias como prover salas para extrair e armazenar o leite ou para amamentar no trabalho, isso pode contribuir para reduzir situações de discriminações contra as mães trabalhadoras^2,32,34. Grupos de apoio e outras ações educativas contribuem para melhorar o suporte dos gerentes e colegas de trabalho para as mães amamentarem^2,32,34. Essas ações podem incluir os parceiros das mulheres trabalhadoras e ter influência significativa no incentivo à amamentação⁴¹. No Brasil, os serviços de atenção primária oferecem o acolhimento dos pais/parceiros durante o pré-natal e incluem orientações sobre como estimular e favorecer a amamentação, além de divisão das atividades domésticas e de cuidado com a criança⁵⁰. No entanto, seria válida a inclusão de informações sobre direitos relacionados às pausas e retirada do leite durante a jornada de trabalho.

Recentemente, um estudo analisou a percepção de mulheres trabalhadoras formais no Brasil sobre as salas de apoio à amamentação. Foi encontrada uma relação favorável entre as salas e os ODS 5 e 8. A relação entre a igualdade de gênero e empoderamento das mulheres (ODS 5) e as salas de apoio a amamentação é estabelecida por estas contribuírem para que as mulheres desempenhem suas atividades profissionais sem estresse físico ou emocional, sentindo-se valorizadas e reconhecidas profissionalmente, permitindo que se dediquem às suas atividades profissionais com uma certa igualdade de condições de trabalho em comparação ao gênero masculino que não possui essas preocupações ⁶. Em relação ao trabalho decente (ODS 8), o acesso às salas proporciona conforto e bem-estar, físico e emocional, para as mulheres exercerem suas atividades. Além disso, contribui para o bom relacionamento entre empregadas e empregadores, uma vez que as mulheres reconhecem a importância das salas para a plena realização de suas atividades e reconhecem e valorizam a empresa que atende às suas necessidades como mulher, mãe e profissional⁶.

Percebe-se, portanto, que as mudanças positivas no contexto do trabalho são sinérgicas ao contribuírem para o alcance dos ODS 5 e 8. Um ambiente de trabalho com essas mudanças positivas é mais amigável para as mulheres que amamentam e isso pode ser considerado um trabalho decente e seguro. Esse apoio poderá impactar a produtividade e consequentemente o crescimento econômico⁶.

Em relação aos impactos positivos das estratégias dos três eixos no aumento das práticas de amamentação, as evidências são consistentes. Vários autores identificaram os benefícios da licença maternidade remunerada para o aumento da amamentação^2,23,25. Iniciativas de apoio ao aleitamento materno, como a oferta de acomodações especiais para extrair e conservar o leite materno, o incentivo dos colegas e supervisores e ações educativas com as mães e parceiros são associadas a uma maior duração do aleitamento materno das trabalhadoras³⁸ e à continuidade da amamentação⁴¹. Um grande número de evidências reforça o importante papel da amamentação para alcançar o ODS 2 (fome zero). O aleitamento materno é considerado a primeira proteção de uma criança contra a fome e não gera custos para o orçamento familiar. Amamentar é um investimento duradouro nos aspectos físico, cognitivo e social⁵¹, contribuindo para a garantia da segurança alimentar e nutricional e o pleno crescimento e desenvolvimento infantil⁶. Diversos autores já evidenciaram a relação existente entre amamentação e saúde materno-infantil, tema do ODS 3 (saúde e bem-estar), pois proporciona inúmeros benefícios tanto para a saúde das crianças^1,2,51 como para as mulheres^1,2,52, contribuindo também para o fortalecimento do vínculo afetivo entre a mãe e o bebê⁶. Sabe-se que a amamentação reduz mortes infantis^1,7,51 e pode evitar 13% das mortes em crianças com menos de cinco anos de idade em todo o mundo⁷.

Em relação ao ODS 12 (consumo e produção responsáveis), considera-se que a amamentação tem potencial de contribuir para o seu alcance por ser uma prática sustentável. O leite produzido pela mulher é “um alimento natural e renovável” de fácil acesso, portanto não provoca impactos negativos ao meio ambiente². Mulheres trabalhadoras consideram que o uso das salas de apoio à amamentação contribui para reduzir o uso de fórmulas infantis⁶. Dessa forma, quanto maiores as taxas de amamentação, menor será o consumo de embalagens de produtos substitutos do leite materno, reduzindo a produção de lixo e toda a cadeia de poluição do meio ambiente proveniente da produção e distribuição desses alimentos².

O alcance do ODS 4 (educação de qualidade) pode ser potencializado com o aumento das práticas de amamentação, uma vez que a boa nutrição das crianças é essencial para o desenvolvimento infantil de qualidade, uma das metas desse ODS (4.2)⁹. Além disso, quanto maior o tempo de amamentação, maiores serão os impactos positivos no desenvolvimento intelectual das crianças (aumento médio de três pontos no coeficiente de inteligência)². Tais impactos poderão resultar em melhor desempenho escolar, melhor qualificação para o mercado de trabalho, maior renda na vida adulta e redução da pobreza e das desigualdades sociais, temas dos ODS 1 e 10⁴⁷.

Ressalta-se que ainda são necessários esforços para que mais países incluam a licença maternidade em sua legislação, e para haver mais empresas que assumam o compromisso de oferecer as salas de apoio à amamentação em condições salubres^7,41,45. As pequenas e médias empresas empregam a maioria das mulheres em todo o mundo, mas a maternidade é uma causa primária da desigualdade de gênero e sua gestão é um dilema comum para os pequenos empregadores³². Por isso é preciso incentivar e facilitar o ambiente de trabalho amigável ao aleitamento materno³⁷, com a institucionalização de uma política escrita de promoção, proteção e apoio à amamentação no ambiente de trabalho³⁴. Nesse sentido, deve haver esforços colaborativos entre os gestores e empregadores para a garantia de estratégias eficazes, tanto para melhorar os desfechos relacionados ao trabalho decente e produtivo para as mulheres como para os desfechos de amamentação.

Considera-se que os resultados positivos das estratégias de promoção da amamentação no desempenho do trabalho deveriam ser mais divulgados para os gestores, aumentando dessa forma a adesão para a implementação das ações nas empresas²⁸. Ressalta-se que em grandes setores de trabalho informal existem milhões de mulheres trabalhadoras que não têm proteção à maternidade ou têm uma proteção inadequada². Existe, portanto, o grande desafio de ampliar as estratégias de promoção, proteção e apoio à amamentação para mulheres que estão no setor informal, autônomas e/ou sem vínculo empregatício.

Considerações finais

A análise crítica com base em evidências científicas possibilitou apontar como as estratégias que promovem, protegem e apoiam a amamentação no contexto do trabalho se relacionam com a promoção do trabalho decente e o crescimento econômico (ODS 8) e com a igualdade de gênero e o empoderamento das mulheres (ODS 5), além de contribuir para o alcance de mais seis ODS, como a redução da pobreza e das iniquidades sociais (ODS 1 e 10), a redução da fome (ODS 2), a garantia da saúde e do bem-estar do binômio mulher e criança (ODS 3), o pleno desenvolvimento infantil e a educação de qualidade (ODS 4) e a redução do impacto ambiental (ODS 12).

Conclui-se que as ações voltadas às mulheres trabalhadoras que amamentam contribuem direta e indiretamente para o alcance de oito dos 17 ODS, devendo portanto ser incentivadas e reforçadas.

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Editores-chefes:

Romeu Gomes, Antônio Augusto Moura da Silva

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  07 Abr 2023
• Data do Fascículo
  Abr 2023

Histórico

• Recebido
  06 Set 2022
• Aceito
  28 Nov 2022
• Publicado
  30 Nov 2022