Acessibilidade / Reportar erro

Estudo da relação entre o peso corporal e o quadro de limitação funcional e dor em pacientes com osteoartrite de joelho

RESUMO

Objetivo

Avaliar a influência do peso corporal na capacidade funcional e na dor de adultos e idosos com osteoartrite de joelho.

Métodos

A amostra foi constituída por 107 pacientes adultos e idosos com osteoartrite do joelho, divididos em dois grupos (peso/adiposidade adequados e peso/adiposidade em excesso), de acordo com o índice de massa corporal e a porcentagem de adiposidade corporal, e avaliados por bioimpedância elétrica. Os sujeitos foram avaliados quanto à mobilidade funcional (Timed Up and Go), dor, rigidez e função (Western Ontario and McMaster Universities Osteoarthritis Index − WOMAC), intensidade da dor (Escala Visual Analógica - EVA) e limiar de limiar de dor à pressão (algometria nos músculos vasto medial e vasto lateral). Os dados foram analisados pelo Statistical Package of the Social Sciences, versão 22 para Windows. As comparações entre os grupos foram feitas por meio do teste t de Student, com nível de significância estabelecido em 5%.

Resultados

Houve predomínio de mulheres na amostra (81,3%), com média de idade de 61,8±10,1 anos. Ao dividir a amostra por índice de massa corporal e adiposidade, 89,7% apresentaram peso/adiposidade em excesso, e 59,8% eram obesos. Não houve diferença entre os grupos quanto a idade, intensidade da dor, limiar de dor à pressão, mobilidade funcional, rigidez e função. Entretanto, a dor (WOMAC) foi maior (p=0,05) no grupo de pacientes com excesso de peso ou adiposidade, e a percepção da dor pela EVA foi pior no grupo de pacientes obesos (p=0,05).

Conclusão

O peso em excesso teve impacto negativo em pacientes com osteoartrite, aumentando a dor avaliada pelo WOMAC ou pela EVA, embora não tenham sido observadas diferenças na funcionalidade e na tolerância à dor sob pressão.

Articulação do joelho/patologia; Osteoartrite do joelho/complicações; Peso corporal; Índice de massa corporal; Dor; Adulto; Idoso

ABSTRACT

Objective

To assess the influence of the body weight in functional capacity and pain of adult and elderly individuals with knee osteoarthritis.

Methods

The sample consisted of 107 adult and elderly patients with knee osteoarthritis divided into two groups (adequate weight/adiposity and excessive weight/adiposity) according to body mass index and percent of body fat mass, assessed by electric bioimpedance. Subjects were evaluated for functional mobility (Timed Up and Go Test), pain, stiffness and function (Western Ontario and MacMaster Universities Osteoarthritis Index − WOMAC), pain intensity (Visual Analogue Scale − VAS) and pressure pain tolerance threshold (algometry in vastus medialis and vastus lateralis muscles). Data were analyzed with Statistical Package of the Social Sciences, version 22 for Windows. Comparisons between groups were made through Student’s t test, with significance level set at 5%.

Results

There was predominance of females in the sample (81.3%), and mean age was 61.8±10.1 years. When dividing the sample by both body mass index and adiposity, 89.7% of them had weight/adiposity excess, and 59.8% were obese. There was no difference between groups regarding age, pain intensity, pressure pain tolerance threshold, functional mobility, stiffness and function. However, pain (WOMAC) was higher (p=0.05) in the group of patients with weight or adiposity excess, and pain perception according to VAS was worse in the group of obese patients (p=0.05).

Conclusion

Excessive weight had negative impact in patients with osteoarthritis, increasing pain assessed by WOMAC or VAS, although no differences were observed in functionality and pressure pain tolerance.

Knee joint/pathology; Osteoarthritis; knee/complications; Body weight; Body mass index; Pain; Adult; Aged

INTRODUÇÃO

A osteoartrite (OA), uma das doenças crônicas mais prevalentes no mundo, é o distúrbio articular mais frequente e acomete 50% ou mais dos indivíduos idosos.(11. Allen KD, Golightly YM. State of the evidence. Curr Opin Rheumatol. 2015; 27(3):276-83. Review.,22. Alkan BM, Fidan F, Tosun A, Ardıçoğlu O. Quality of life and self-reported disability in patients with knee osteoarthritis. Mod Rheumatol. 2014;24(1)166-71.) Ela compromete os joelhos de aproximadamente 10% das mulheres e 13% dos homens com mais de 60 anos. A proporção de indivíduos sintomáticos cresce devido ao envelhecimento populacional e ao aumento da obesidade em diversos países.(33. Zhang Y, Jordan JM. Epidemiology of osteoarthritis. Clin Geriatr Med. 2010; 26(3):355-69. Review. Erratum in: Clin Geriatr Med. 2013;29(2):ix.)

A osteoartrite é a principal causa de dor, incapacidade e diminuição da qualidade de vida dos idosos.(44. Sofat N, Ejindu V, Kiely P. What makes osteoarthritis painful? The evidence for local and central pain processing. Rheumatology (Oxford). 2011;50(12):2157-65. Review.

5. Hunter DJ, McDougall JJ, Keefe FJ. The symptoms of osteoarthritis and the genesis of pain. Rheum Dis Clin North Am. 2008;34(3):623-43. Review.
-66. Salaffi F, Ciapetti A, Carotti M. The sources of pain in osteoarthritis: a pathophysiological review. Reumatismo. 2014;66(1):57-71. Review.) Dentre os fatores etiológicos da doença, destaca-se o aumento no peso corporal, pois ele causa maior pressão articular e contribui para degeneração da cartilagem, esclerose do osso subcondral e aparecimento de osteófitos.(77. Radominski SC. [Obesity and musculoeskeletal diseases]. Rev Bras Reumatol. 1998;38(5):275-8. Portuguese.,88. Blagojevic M, Jinks C, Jeffery A, Jordan KP. Risk factors for onset of osteoarthritis of the knee in older adults: a systematic review and meta-analysis. Osteoarthritis Cartilage. 2010;18(1):24-33. Review.) Isto provavelmente explica o fato de que indivíduos obesos apresentam um risco três vezes maior de desenvolverem OA em comparação a indivíduos com peso saudável.(88. Blagojevic M, Jinks C, Jeffery A, Jordan KP. Risk factors for onset of osteoarthritis of the knee in older adults: a systematic review and meta-analysis. Osteoarthritis Cartilage. 2010;18(1):24-33. Review.)

O excesso de peso é considerado fator de risco modificável para a OA.(44. Sofat N, Ejindu V, Kiely P. What makes osteoarthritis painful? The evidence for local and central pain processing. Rheumatology (Oxford). 2011;50(12):2157-65. Review.) A redução do peso corporal é recomendada como importante componente no tratamento de OA. Há relatos de diminuição da dor e da incapacidade física em pacientes com OA e excesso de peso após redução moderada do peso corporal.(99. Christensen R, Bartels EM, Astrup A, Bliddal H. Effect of weight reduction in obese patients diagnosed with knee osteoarthritis: a systematic review and meta-analysis. Ann Rheum Dis. 2007;66(4):433-9. Review.,1010. Jinks C, Jordan K, Croft P. Disabling knee pain -- another consequence of obesity: results from a prospective cohort study. BMC Public Health. 2006;19;6:258.) Além da sobrecarga mecânica trazida pelo excesso de peso, ainda há a possível influência de adipocitocinas(1111. Presle N, Pottie P, Dumond H, Guillaume C, Lapicque F, Pallu S, et al. Differential distribution of adipokines between serum and synovial fluid in patients with osteoarthritis. Contribution of joint tissues to their articular production. Osteoarthritis Cartilage. 2006;14(7):690-5.) e de metabolismo alterado de carboidratos e lipídeos, que podem gerar mudanças características do estado inflamatório crônico observado nesses pacientes.(1212. Sowers MR, Karvonen-Gutierrez CA. The evolving role of obesity in knee osteoarthritis. Curr Opin Rheumatol. 2010;22(5):533-7. Review.)

Estudo recente comparou indivíduos idosos obesos e não obesos com OA do joelho, com base no índice de massa corporal (IMC), e revelou que os indivíduos obesos apresentaram menor mobilidade funcional, maior lentidão na marcha, maior intensidade de dor, e dificuldade no desempenho de atividades diárias, em comparação àqueles com peso saudável.(1313. Gomes-Neto M, Araujo AD, Junqueira ID, Oliveira D, Brasileiro A, Arcanjo FL. Comparative study of functional capacity and quality of life among obese and non-obese elderly people with knee osteoarthritis. Rev Bras Reumatol Engl Ed. 2016;56(2):126-30. English.) No entanto, a amostra utilizada era relativamente pequena (n=35), e os autores reconheceram que uma avaliação de composição corporal poderia trazer resultados mais precisos, já que o uso isolado do IMC não permite a diferenciação entre massa gorda e magra.(1414. Cortez AC, Martins MC. [Anthropometric indicators of nutritional status in elderly: as system review]. UNOPAR Cient Cienc Biol Saude. 2012;14(4):271-7. Portuguese.)

Além do IMC, outras maneiras mais precisas de avaliar a composição corporal podem contribuir para um melhor entendimento sobre o impacto do excesso de peso na OA. Como o conhecimento sobre a relação entre excesso de peso e dor, especialmente em pacientes com OA,(1212. Sowers MR, Karvonen-Gutierrez CA. The evolving role of obesity in knee osteoarthritis. Curr Opin Rheumatol. 2010;22(5):533-7. Review.) é limitado, reconhecer e entender os fatores que podem interferir na capacidade funcional e dor em indivíduos com OA pode contribuir para o desenvolvimento de novos tratamentos e estratégias de prevenção desta doença de alta prevalência.

OBJETIVO

Avaliar a influência do peso corporal na capacidade funcional e na dor em indivíduos adultos e idosos com osteoartrite do joelho.

MÉTODOS

Trata-se de um estudo transversal observacional de 107 indivíduos adultos e idosos com OA do joelho. A pesquisa foi conduzida entre agosto de 2013 e novembro de 2014. O recrutamento de participantes foi feito a partir de uma triagem com pacientes encaminhados para o serviço de fisioterapia em uma universidade privada, em São Paulo (SP), Brasil. Pacientes com diagnóstico de OA foram contatados por telefone, e aqueles interessados em participar da pesquisa foram convidados para uma sessão cujo objetivo era informá-los do estudo. Todos os pacientes passaram por tratamento de fisioterapia após sua participação.

Participaram do estudo os pacientes que preencheram os seguintes critérios de inclusão: diagnóstico de OA, recomendação médica para programa de fisioterapia e sem uso crônico de medicamentos (exceto prescrições para OA). Os critérios de exclusão estabelecidos foram indivíduos com prótese total ou parcial em um ou em ambos os joelhos ou quadris, hipertensão descompensada ou outras cardiopatias, artrite reumatoide, fibromialgia ou transtornos neurológicos que poderiam prejudicar a locomoção.

Os pacientes que concordaram em participar da pesquisa foram submetidos às seguintes avaliações: antropometria, composição corporal, dor, rigidez articular e funcionalidade e limiar de dor à pressão.

A avaliação antropométrica foi composta pela medição de peso e altura. O peso corporal (kg) foi avaliado com o participante descalço e com roupas leves, em uma balança digital, graduada em 0,1kg. A altura (cm) foi medida com estadiômetro graduado em 0,1cm. O IMC (kg/m2) foi calculado a partir do peso e da altura, e os participantes foram classificados em duas categorias: peso corporal adequado (IMC <25kg/m2) e excesso de peso (IMC ≥25kg/m2).

A composição corporal foi avaliada por bioimpedância elétrica (Biodynamics BI 450 com eletrodos de gel). Os participantes foram instruídos a não ingerirem alimentos durante 4 horas antes do exame, beber bastante água (especialmente 1 hora antes do exame), não ingerirem bebidas alcóolicas ou que contivesse cafeína nas 48 horas anteriores ao exame, e não praticarem atividades físicas pesadas por 24 horas antes do exame. Antes dos testes, pediu-se que os voluntários esvaziassem a bexiga e removessem objetos metálicos do corpo. Os participantes permaneceram em repouso durante 10 minutos antes da avaliação. A classificação dos resultados com relação à adiposidade (%F) foi feita de acordo com as recomendações do American College of Sports Medicine (ACSM),(1515. American College of Sports Medicine (ACSM). Guidelines for exercise testing and prescription. 9th ed. Philadelphia, PA: Wolters Kluwer-Lippincott Williams & Wilkins; 2014.) por sexo e faixa etária, e os pacientes foram divididos entre adiposidade adequada e adiposidade excessiva.

A Escala Visual Analógica (EVA)(1616. Chapman RS, Syrjala KL. Measurement of pain. In: Bonica JJ, editor. The management of pain. London: Lea & Febiger; 1990. p. 580-94.) foi usada para avaliar a intensidade da dor. Para análise de dor, rigidez articular e funcionalidade, foi empregado o questionário Western Ontario and McMaster Universities Osteoarthritis Index (WOMAC)(1717. Bellamy N, Buchanan WW, Goldsmith CH, Campbell J, Stitt LW. Validation study of WOMAC: a health status instrument for measuring clinically important patient relevant outcomes to antirheumatic drug therapy in patients with osteoarthritis of the hip or knee. J Rheumatol. 1988;15(12):1833-40.) em sua versão em português.(1818. Fernandes MI. Tradução e validação do questionário de qualidade de vida específico para osteoartrose WOMAC (Western Ontario and McMaster Universities) para a língua portuguesa [dissertação]. São Paulo: Universidade Federal de São Paulo; 2001. 103f.) Os escores WOMAC estão demonstrados na escala Likert, na qual cada pergunta tem um escore entre zero e 100, distribuídos da seguinte maneira: zero se nenhum; 25, baixo; 50, moderado; 75, grave; 100, muito grave. Cada uma das dimensões (dor, rigidez e funcionalidade) recebe um escore que é então traduzido em uma escala de zero (mais saudável) a 100 pontos (estado de saúde mais grave possível).

Para medir a mobilidade funcional, utilizou-se o teste Timed Up and Go (TUG), que consiste na medição, em segundos, do tempo que cada indivíduo gasta para se levantar da cadeira, andar 3m, voltar até a cadeira e sentar-se de novo. O teste foi repetido três vezes, e o tempo mais curto obtido foi selecionado para análise.(1919. Podsiadlo D, Richardson S. The timed “Up & Go”: a test of basic functional mobility for frail elderly persons. J Am Geriatr Soc. 1991;39(2):142-8.)

Para avaliar o limiar de dor à pressão, utilizou-se a algometria (J Tech Algometer, Salt Lake City, UT, Estados Unidos). O algômetro é um instrumento manual formado por um pistão contendo, em sua extremidade, uma borracha de 1cm de diâmetro, que registra a pressão aplicada à determinada superfície, por meio de seu aparelho eletrônico. Sua confiabilidade já tinha sido previamente demonstrada.(2020. Ylinen J, Nykänen M, Kautianine H, Häkkinen A. Evaluation of repeatability of pressure algometry on the neck muscles for clinical use. Man Ther. 2007; 12(2):192-7.,2121. Visscher C, Lobbezoo F, Naeije M. Comparison of algometry and palpation in the recognition of temporomandibular disorder pain complaints. J Orofac Pain. 2004;18(3):214-9.) A pressão de 1kg/cm2 foi aplicada com velocidade constante, utilizando-se um ângulo de 90° entre a superfície de estimulação e o ponto estimulado, sobre todos os pontos, até o nível em que o participante apontava dor ou desconforto. A leitura dos dados foi expressa em libras e, então, convertida para quilogramas. Durante a avaliação, cada participante foi instruído a dizer “pare” assim que a pressão passasse de desagradável para dolorosa. Avaliaram-se alguns pontos dos músculos vasto medial e vasto lateral, conforme previamente descrito.(2222. Imamura M, Imamura ST, Kaziyama HH, Targino RA, Hsing WT, de Souza LP, et al. Impact of nervous system hyperalgesia on pain, disability, and quality of life in patients with knee osteoarthritis: a controlled analysis. Arthritis Rheum. 2008;59(10):1424-31.)

Os dados foram analisados por meio do Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 22 para Windows, e os resultados foram expressos em médias ± desvio padrão. A distribuição dos dados foi analisada pelo teste D’Agostino Pearson. Comparações entre os grupos (peso adequado/peso em excesso, adiposidade adequada/adiposidade em excesso) foram feitas pelo teste t de Student, com nível de significância estabelecido em 5% (p<0,05).

O presente estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Centro Universitário Adventista de São Paulo, protocolo 243.745, CAAE: 15199713.2.0000.5377. Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

RESULTADOS

A amostra foi composta por 107 indivíduos com OA do joelho, em sua maioria do sexo feminino e com a média de idade de 61,8±10,1 anos (Tabela 1). A maioria dos participantes (62,6%; n=67) apresentavam OA nos dois joelhos, 21,5% (n=23) apenas no joelho esquerdo e 15,9% (n=17) apenas no joelho direito.

Tabela 1
Dados demográficos

A tabela 2 apresenta os dados da amostra total com relação à dor (duração, EVA e algometria) e à funcionlidade (TUG e WOMAC).

Tabela 2
Funcionalidade e dor na amostra total

Na divisão dos grupos por IMC (<25 e ≥25) e por %F (ACSM, 2014),(1515. American College of Sports Medicine (ACSM). Guidelines for exercise testing and prescription. 9th ed. Philadelphia, PA: Wolters Kluwer-Lippincott Williams & Wilkins; 2014.) em ambos os casos, 89,7% da amostra (n=96) apresentou excesso de peso e de adiposidade. A predominância de participantes do sexo feminino mostrou-se significativamente maior no grupo com IMC ≥25 do que no grupo com IMC <25 (p=0,016). O mesmo foi observado nos grupos divididos por adiposidade: havia muito mais mulheres no grupo com excesso de adiposidade do que no grupo com adiposidade adequada (p=0,001).

O grupo com IMC <25 apresentou IMC médio de 23,5±1,8, ao passo que, no grupo de pacientes com IMC ≥25, o IMC médio foi de 32,6±4,9. Quando os participantes foram divididos por adiposidade, o grupo que apresentou adiposidade adequada obteve IMC médio de 25,1±2,8, e no grupo com adiposidade em excesso, o IMC médio foi de 32,5±5,2. A comparação entre os grupos revelou que os participantes mais pesados IMC e aqueles com mais adiposidade (%F) apresentaram significativamente mais dor quando avaliados pelo WOMAC. Não foi encontrada diferença significativa entre os grupos com relação à duração da dor, avaliada pela EVA, por algometria e pela funcionalidade (Tabela 3).

Tabela 3
Comparação de funcionalidade e dor entre pacientes com e sem excesso de peso e de adiposidade

Os pacientes também foram classificados como obesos (IMC <30kg/m2) e não obesos (IMC ≥30kg/m2), conforme demonstrado na tabela 4. Esta análise demonstrou que os pacientes com OA e obesidade apresentaram percepção de dor significativamente maior do que os pacientes não obesos, conforme avaliado pela EVA (p=0,05).

Tabela 4
Comparação de funcionalidade e dor entre pacientes obesos e não obesos

DISCUSSÃO

Em ambas as formas de classificação usadas neste estudo (IMC e adiposidade), os indivíduos com OA e com excesso de peso ou adiposidade excessiva obtiveram diferentes resultados no WOMAC para dor em relação àqueles com adiposidade e peso normais.

A literatura relata que indivíduos obesos têm maior probabilidade de sobrecarregar as articulações e, portanto, enfrentarem maior incapacidade física.(2323. Rodrigues Franco L, Santos Simão L, Oliveira Pires ED, Alves Guimarães E. [Influence of age and obesity in the diagnosis of osteoarthritis of knee]. ConScientiae Saude. 2009;8(1):41-6. Portuguese.) No entanto, diferentemente desta teoria e dos resultados do estudo de Gomes-Neto et al.,(1313. Gomes-Neto M, Araujo AD, Junqueira ID, Oliveira D, Brasileiro A, Arcanjo FL. Comparative study of functional capacity and quality of life among obese and non-obese elderly people with knee osteoarthritis. Rev Bras Reumatol Engl Ed. 2016;56(2):126-30. English.) que verificou dor mais intensa e incapacidade em pacientes com IMC >25, a amostra do presente estudo apresentou diferenças apenas na dor avaliada pelo WOMAC, e não na rigidez ou funcionalidade medidas pelo mesmo instrumento. Quando classificados como obesos (IMC ≥30) e não obesos (IMC <30), os grupos diferiram apenas com relação à percepção de dor (EVA).

Além do IMC, o excesso de adiposidade também pode estar associado à maior sensibilidade à dor;(2424. Khimich S. Level of sensitivity of pain in patients with obesity. Acta Chir Hung. 1997;36(1-4):166-7.) porém, apesar da tolerância absoluta mais baixa observada em indivíduos com excesso de peso e de adiposidade, não foram observadas diferenças estatisticamente significativas entre os grupos. Isso deve-se, provavelmente, ao fato de que o aumento do peso corporal está relacionado ao aumento de dor.(2525. Heo M, Allison DB, Faith MS, Zhu S, Fontaine KR. Obesity and quality of life: mediating effects of pain and comorbidities. Obes Res. 2003;11(2):209-16.)

Com relação a outras formas de avaliação de dor empregadas no presente estudo, não foram encontradas diferenças significativas entre os grupos, embora os resultados da EVA e algometria tenham sido piores nos grupos com peso/adiposidade em excesso ou obesos, do que nos grupos com peso/adiposidade normais e sem obesidade. Em nossa amostra, o índice WOMAC mostrou-se um instrumento mais sensível na avaliação da dor, quando o excesso de peso ou de adiposidade foi o critério para divisão dos grupos. Por outro lado, a EVA mostrou-se eficiente na discriminação da percepção de dor quando os pacientes foram classificados como obesos e não obesos.

Embora a intensidade de dor possa influenciar no desempenho de atividades funcionais em indivíduos obesos com OA do joelho,(2626. Vasconcelos KS, Dias JM, Dias RC. [Relationship between pain intensity and functional capacity individuals with knee osteoarthritis]. Rev Bras Fisioter. 2006;10(2):213-8. Portuguese.) neste estudo surpreendentemente não houve diferença entre os grupos no teste TUG, que avalia a mobilidade funcional por meio de atividades que incluem levantar-se, andar e sentar.

Ao comparar mulheres com OA bilateral do joelho (13 obesas, IMC >30kg/m2 e 15 com obesidade mórbida, IMC >40kg/m2), Vasconcelos et al.,(2727. Vasconcelos KS, Dias JM, Dias RC. [Impact of the degree of obesity on symptoms and functional capacity of women with knee osteoarthritis]. Fisioter Pesq. 2008;15(2):125-30. Portuguese.) viram que o grau de obesidade não tinha impacto nos sintomas de dor, rigidez ou dificuldades funcionais (avaliadas pelo WOMAC). Os autores concluíram que outros fatores devem influenciar no desempenho funcional de mulheres obesas com OA do joelho. Isso explica o fato de não termos achado diferença no tempo levado para a realização do TUG entre os grupos deste estudo. As diferenças médias de 0,3 segundos encontrada entre os grupos, quando estes foram separados por IMC (≥25 ou ≥30), e de 0,7 segundos entre grupos separados por adiposidade não foram significativas, mas mostram que estes indivíduos provavelmente já sofrem de problemas de mobilidade funcional, já que o tempo médio levado para a realização do teste foi superior a 10 segundos.(1919. Podsiadlo D, Richardson S. The timed “Up & Go”: a test of basic functional mobility for frail elderly persons. J Am Geriatr Soc. 1991;39(2):142-8.) Estudo prévio(2828. Arthur K, Nascimento LC, Figueiredo DA, Souza LB, Alfieri FM. [Effects of geotherapy and phytitherapy associated with kinesiotherapy in the knee osteoarthritis: randomized double blind study]. Acta Fisiatr. 2012;19(1):11-5.) verificou valores ainda mais altos no TUG de indivíduos com OA do joelho e IMC semelhante ao dos pacientes neste estudo.

No presente estudo, além do uso do IMC como critério de classificação, conforme feito por outro autores,(1313. Gomes-Neto M, Araujo AD, Junqueira ID, Oliveira D, Brasileiro A, Arcanjo FL. Comparative study of functional capacity and quality of life among obese and non-obese elderly people with knee osteoarthritis. Rev Bras Reumatol Engl Ed. 2016;56(2):126-30. English.) buscou-se empregar uma classificação que demonstrasse a composição corporal de massa gorda e magra dos participantes, e não apenas a presença de alterações no balanço calórico dos indivíduos.(2929. Bliddal H, Leeds AR, Christensen R. Osteoarthritis, obesity and weight loss: evidence, hypotheses and horizons - a scoping review. Obes Rev. 2014;15(7): 578-86. Review.) Porém, na amostra avaliada, o IMC mostrou-se ferramenta adequada na estimativa de adiposidade, já que a classificação dos participantes por IMC (< ou ≥25) resultou em dados muito similares àqueles obtidos por meio da classificação de participantes por adiposidade (adequada ou excessiva).

Também é importante notar que, neste estudo, o excesso de peso ou de adiposidade mostra-se condição muito prevalentes em pacientes com OA do joelho. No grupo de 107 pacientes estudados, 89,7% apresentaram excesso de peso ou de adiposidade quando avaliados por IMC ou %F, respectivamente, e 59,8% dos mesmos eram obesos (IMC ≥30). Sabe-se que a obesidade, além de ser amplamente reconhecida como fator de risco para OA, contribui para o aumento da gravidade da doença.(2929. Bliddal H, Leeds AR, Christensen R. Osteoarthritis, obesity and weight loss: evidence, hypotheses and horizons - a scoping review. Obes Rev. 2014;15(7): 578-86. Review.) Isso ressalta a magnitude do problema representado pelo excesso de peso em pacientes com OA, além de levantar e corroborar a tese de que só a prática de exercícios terapêuticos pode não ser 100% eficaz no tratamento da doença. Da mesma forma, o controle do peso corporal e da adiposidade, e a educação sobre a doença e terapia cognitivo-comportamental, entre outras abordagens, parecem estar associadas a um melhor controle de doenças crônica, como a OA.(3030. Ambrose KR, Golightly YM. Physical exercise as non-pharmacological treatment of chronic pain: Why and when. Best Pract Res Clin Rheumatol. 2015;29(1):120-30. Review.)

Pesquisas futuras, com métodos ainda mais precisos de avaliação de composição corporal, como a tomografia computadorizada, podem confirmar os resultados do presente estudo, além de estabelecer relações entre a composição corporal e outras variáveis que podem ter impacto na qualidade de vida e funcionalidade de indivíduos com OA do joelho.

Os participantes deste estudo foram selecionados entre indivíduos encaminhados a um serviço de fisioterapia, e seu peso e adiposidade foram avaliados junto de avaliações anteriores ao encaminhamento. Todos os voluntários tiveram diagnóstico de OA, mas não foram classificados quanto ao grau da doença, fato este que limita nossas conclusões. Embora essa forma de seleção tenha resultado em uma disparidade no número de participantes em ambos os grupos, esta distribuição provavelmente reflete, de fato, a composição corporal dos pacientes com OA nas práticas diárias médica e de reabilitação. O baixo número de participantes nos grupos com IMC e %F adequados pode ter impedido a observação de algumas diferenças significativas entre os grupos. Apesar destas limitações, nossos resultados proporcionam novas informações sobre a influência do peso corporal e da composição corporal nos indivíduos com OA do joelho.

CONCLUSÃO

O excesso de peso e de adiposidade e obesidade tiveram impacto negativo em pacientes com osteoartrite, aumentando sua percepção de dor. Embora os resultados médios da capacidade funcional e limiar de dor à pressão tenham sido piores em pacientes com excesso de peso ou de adiposidade, as diferenças nestes parâmetros não alcançaram significância estatística, em comparação aos grupos com peso e adiposidade normais.

REFERENCES

  • 1
    Allen KD, Golightly YM. State of the evidence. Curr Opin Rheumatol. 2015; 27(3):276-83. Review.
  • 2
    Alkan BM, Fidan F, Tosun A, Ardıçoğlu O. Quality of life and self-reported disability in patients with knee osteoarthritis. Mod Rheumatol. 2014;24(1)166-71.
  • 3
    Zhang Y, Jordan JM. Epidemiology of osteoarthritis. Clin Geriatr Med. 2010; 26(3):355-69. Review. Erratum in: Clin Geriatr Med. 2013;29(2):ix.
  • 4
    Sofat N, Ejindu V, Kiely P. What makes osteoarthritis painful? The evidence for local and central pain processing. Rheumatology (Oxford). 2011;50(12):2157-65. Review.
  • 5
    Hunter DJ, McDougall JJ, Keefe FJ. The symptoms of osteoarthritis and the genesis of pain. Rheum Dis Clin North Am. 2008;34(3):623-43. Review.
  • 6
    Salaffi F, Ciapetti A, Carotti M. The sources of pain in osteoarthritis: a pathophysiological review. Reumatismo. 2014;66(1):57-71. Review.
  • 7
    Radominski SC. [Obesity and musculoeskeletal diseases]. Rev Bras Reumatol. 1998;38(5):275-8. Portuguese.
  • 8
    Blagojevic M, Jinks C, Jeffery A, Jordan KP. Risk factors for onset of osteoarthritis of the knee in older adults: a systematic review and meta-analysis. Osteoarthritis Cartilage. 2010;18(1):24-33. Review.
  • 9
    Christensen R, Bartels EM, Astrup A, Bliddal H. Effect of weight reduction in obese patients diagnosed with knee osteoarthritis: a systematic review and meta-analysis. Ann Rheum Dis. 2007;66(4):433-9. Review.
  • 10
    Jinks C, Jordan K, Croft P. Disabling knee pain -- another consequence of obesity: results from a prospective cohort study. BMC Public Health. 2006;19;6:258.
  • 11
    Presle N, Pottie P, Dumond H, Guillaume C, Lapicque F, Pallu S, et al. Differential distribution of adipokines between serum and synovial fluid in patients with osteoarthritis. Contribution of joint tissues to their articular production. Osteoarthritis Cartilage. 2006;14(7):690-5.
  • 12
    Sowers MR, Karvonen-Gutierrez CA. The evolving role of obesity in knee osteoarthritis. Curr Opin Rheumatol. 2010;22(5):533-7. Review.
  • 13
    Gomes-Neto M, Araujo AD, Junqueira ID, Oliveira D, Brasileiro A, Arcanjo FL. Comparative study of functional capacity and quality of life among obese and non-obese elderly people with knee osteoarthritis. Rev Bras Reumatol Engl Ed. 2016;56(2):126-30. English.
  • 14
    Cortez AC, Martins MC. [Anthropometric indicators of nutritional status in elderly: as system review]. UNOPAR Cient Cienc Biol Saude. 2012;14(4):271-7. Portuguese.
  • 15
    American College of Sports Medicine (ACSM). Guidelines for exercise testing and prescription. 9th ed. Philadelphia, PA: Wolters Kluwer-Lippincott Williams & Wilkins; 2014.
  • 16
    Chapman RS, Syrjala KL. Measurement of pain. In: Bonica JJ, editor. The management of pain. London: Lea & Febiger; 1990. p. 580-94.
  • 17
    Bellamy N, Buchanan WW, Goldsmith CH, Campbell J, Stitt LW. Validation study of WOMAC: a health status instrument for measuring clinically important patient relevant outcomes to antirheumatic drug therapy in patients with osteoarthritis of the hip or knee. J Rheumatol. 1988;15(12):1833-40.
  • 18
    Fernandes MI. Tradução e validação do questionário de qualidade de vida específico para osteoartrose WOMAC (Western Ontario and McMaster Universities) para a língua portuguesa [dissertação]. São Paulo: Universidade Federal de São Paulo; 2001. 103f.
  • 19
    Podsiadlo D, Richardson S. The timed “Up & Go”: a test of basic functional mobility for frail elderly persons. J Am Geriatr Soc. 1991;39(2):142-8.
  • 20
    Ylinen J, Nykänen M, Kautianine H, Häkkinen A. Evaluation of repeatability of pressure algometry on the neck muscles for clinical use. Man Ther. 2007; 12(2):192-7.
  • 21
    Visscher C, Lobbezoo F, Naeije M. Comparison of algometry and palpation in the recognition of temporomandibular disorder pain complaints. J Orofac Pain. 2004;18(3):214-9.
  • 22
    Imamura M, Imamura ST, Kaziyama HH, Targino RA, Hsing WT, de Souza LP, et al. Impact of nervous system hyperalgesia on pain, disability, and quality of life in patients with knee osteoarthritis: a controlled analysis. Arthritis Rheum. 2008;59(10):1424-31.
  • 23
    Rodrigues Franco L, Santos Simão L, Oliveira Pires ED, Alves Guimarães E. [Influence of age and obesity in the diagnosis of osteoarthritis of knee]. ConScientiae Saude. 2009;8(1):41-6. Portuguese.
  • 24
    Khimich S. Level of sensitivity of pain in patients with obesity. Acta Chir Hung. 1997;36(1-4):166-7.
  • 25
    Heo M, Allison DB, Faith MS, Zhu S, Fontaine KR. Obesity and quality of life: mediating effects of pain and comorbidities. Obes Res. 2003;11(2):209-16.
  • 26
    Vasconcelos KS, Dias JM, Dias RC. [Relationship between pain intensity and functional capacity individuals with knee osteoarthritis]. Rev Bras Fisioter. 2006;10(2):213-8. Portuguese.
  • 27
    Vasconcelos KS, Dias JM, Dias RC. [Impact of the degree of obesity on symptoms and functional capacity of women with knee osteoarthritis]. Fisioter Pesq. 2008;15(2):125-30. Portuguese.
  • 28
    Arthur K, Nascimento LC, Figueiredo DA, Souza LB, Alfieri FM. [Effects of geotherapy and phytitherapy associated with kinesiotherapy in the knee osteoarthritis: randomized double blind study]. Acta Fisiatr. 2012;19(1):11-5.
  • 29
    Bliddal H, Leeds AR, Christensen R. Osteoarthritis, obesity and weight loss: evidence, hypotheses and horizons - a scoping review. Obes Rev. 2014;15(7): 578-86. Review.
  • 30
    Ambrose KR, Golightly YM. Physical exercise as non-pharmacological treatment of chronic pain: Why and when. Best Pract Res Clin Rheumatol. 2015;29(1):120-30. Review.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Sep 2017

Histórico

  • Recebido
    6 Abr 2017
  • Aceito
    26 Jul 2017
Instituto Israelita de Ensino e Pesquisa Albert Einstein Avenida Albert Einstein, 627/701 , 05651-901 São Paulo - SP, Tel.: (55 11) 2151 0904 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revista@einstein.br