RESUMO
Objetivou-se avaliar os efeitos de retardantes de fogo de curta duração e de um polímero hidrorretentor sobre a emergência e crescimento inicial de Handroanthus ochraceus e Tabebuia roseoalba, em condições de ambiente protegido. Foram realizadas aplicações via substrato na semeadura e com intervalos quinzenais, dos seguintes retardantes de fogo e concentrações: Phos-Chek WD881® (0; 3,00; 6,00; 8,00; 10,00 mL L-1), Hold Fire® (0; 7,00; 9,00; 12,00; 15,00 mL L-1), e polímero hidrorretentor Nutrigel® (0, 0,25; 0,50; 0,75; 1,00 g L-1), em delineamento inteiramente casualizado, com 10 repetições por tratamento. Nas concentrações iguais a 0, utilizou-se apenas água. A emergência das plântulas foi avaliada por meio do índice de velocidade de emergência, porcentagem e tempo médio de emergência. Realizaram-se análises de crescimento destrutivas aos 30, 45, 60, 90 e 120 dias após a semeadura (DAS), enquanto as análises de fluorescência da clorofila a foram realizadas em três plantas por tratamento, a partir de 60 DAS. As concentrações testadas de Phos-Chek WD881, Hold Fire e Nutrigel não influenciaram na emergência das plântulas das espécies Handroanthus ochraceus e Tabebuia roseoalba. Aplicações de Phos-Chek WD881 até 5,00mL L-1 propiciam efeitos positivos sobre o crescimento das duas espécies. Concentrações de Hold Fire até 8,00 mL L-1 favorecem o crescimento inicial de Tabebuia roseoalba. O crescimento em diâmetro de Handroanthus ochraceus apresenta resposta positiva a partir de 9,60 mL L-1 quando submetido ao retardante Hold Fire. O intervalo de 0,50 g L-1 a 0,88 g L-1do polímero hidrorretentor Nutrigel promove o crescimento em diâmetro das duas espécies. A fluorescência da clorofila a indica que ocorreu pleno funcionamento da etapa fotoquímica no processo fotossintético de Handroanthus ochraceus e Tabebuia roseoalba na presença dos retardantes de fogo e do polímero hidroretentor.
Palavras-chave:
Análise de crescimento; Fluorescência; Retardante de fogo de curta duração; Hidrogel
ABSTRACT
The objective of this study was to evaluate the effects of short-term fire retardants and a water-retaining polymer on the emergence and initial growth of Handroanthus ochraceus and Tabebuia roseoalba, in protected environment conditions. Applications were made via substrate at sowing and at fortnightly intervals, of the following fire retardants and concentrations: Phos-Chek WD881® (0; 3.00; 6.00; 8.00; 10.00 mL L-1), Hold Fire ® (0.7.00; 9.00; 12.00; 15.00 mL L-1), and the water-retaining polymer Nutrigel® (0.25; 0.50; 0.75; 1.00 g L-1), in a completely randomized design, with 10 replicates per treatment. At concentrations equal to 0, only water was used. Seedling emergence was assessed using the emergence speed index, percentage and average emergence time. Destructive growth analyzes were performed at 30, 45, 60, 90 and 120 days after sowing (DAS), while chlorophyll fluorescence analyzes were performed on 3 plants per treatment, starting at 60 DAS. The tested concentrations of Phos-Chek WD881, Hold Fire and Nutrigel did not influence the emergence of seedlings of the species Handroanthus ochraceus and Tabebuia roseoalba. Applications of Phos-Chek WD881 up to 5.00 mL -1 provide positive effects on the growth of both species. Hold Fire concentrations up to 8.00 mL L-1 favor the initial growth of Tabebuia roseoalba. The growth in diameter of Handroanthus ochraceus shows a positive response from 9.60 mL L-1 when subjected to the Hold Fire retardant. The range of 0.50 g L-1 to 0.88 g L-1 of the water-retaining polymer Nutrigel promotes growth in diameter of the two species. The fluorescence of chlorophyll a indicates that the photochemical step has fully functioned in the photosynthetic process of Handroanthus ochraceus and Tabebuia roseoalba in the presence of fire retardants and the water-retaining polymer.
Keywords:
Growth analysis; Fluorescence; Short term fire retardant; Hydrogel
1 INTRODUÇÃO
Atualmente é crescente a preocupação em relação a frequência e tamanho dos incêndios florestais no Brasil e no mundo (ARAGÃO et al., 2018ARAGÃO, L. E. O. C. et al. 21st Century drought-related fires counteract the decline of Amazon deforestation carbon emissions. Nature Communications, [s.l.], v. 9, n. 1, 2018. ; SILVA et al., 2018SILVA, S. S. et al. Dynamics of forest fires in the southwestern Amazon. Forest Ecology and Management, [s.l.], v. 424, p. 312-322, 2018. ; CUI et al., 2019CUI, X. et al. Green firebreaks as a management tool for wildfires: Lessons from China. Journal of Environmental Management, [s.l.], v. 233, p. 329-336, 2019. ; VENKATESH; PREETHI; RAMESH, 2020VENKATESH, K.; PREETHI, K.; RAMESH, H. Evaluating the effects of forest fire on water balance using fire susceptibility maps. Ecological Indicators, [s.l.], v. 110, 105856, 2020.). Diante das consequências drásticas, muitas vezes irreversíveis, fazem-se necessárias a adoção de técnicas efetivas e sustentáveis para prevenção e combate do fogo.
Dentre as alternativas de uso direto ou indireto, os retardantes de fogo são utilizados para aumentar a eficiência da água na prevenção e combate a incêndios. Esses produtos classificam-se conforme o tempo de ação sobre o material combustível, em retardantes de longa e curta duração. Os retardantes de longa duração são compostos por sais fertilizantes, e mantém sua ação mesmo após a evaporação da água (MARSHAL; WALLER; LEKBERG, 2016MARSHALL, A.; WALLER, L.; LEKBERG, A. Y. Cascading effects of fire retardant on plant-microbe interactions, community composition, and invasion. Ecological Applications, [s.l.], v. 26, n. 4, p. 996-1002, 2016. ). Os produtos de curta duração, em geral, contêm surfactantes, espessantes e substâncias gelificantes, que não possuem ação após a evaporação da água (PLUCINSKI; SULLIVAN; HURLEY, 2017PLUCINSKI, M. P.; SULLIVAN, A. L.; HURLEY, R. J. A methodology for comparing the relative effectiveness of suppressant enhancers designed for the direct attack of wildfires. Fire Safety Journal, Oxford, v. 87, p. 71-79, 2017.).
Os retardantes de fogo são aplicados em áreas ambientalmente sensíveis, e quando atestada sua eficiência na extinção do fogo, torna-se imprescindível o conhecimento dos seus possíveis efeitos, pois permanecerão aderidos no material combustível, serapilheira e/ou solo. Em geral, pouca informação está disponível sobre a influência desses produtos sobre o solo, fauna e flora (BARREIRO et al., 2016BARREIRO, A et al. Long-term response of soil microbial communities to fire and fire-fighting chemicals. Biology and Fertility of Soils, [s.l.], v. 52, p. 963-975, 2016. ; SONG et al., 2014SONG, U. et al. Effects of three fire-suppressant foams on the germination and physiological responses of plants. Environmental Management, Korea, v. 54, p. 865-874, 2014. ), principalmente no que diz respeito aos retardantes de curta duração (COUTO-VAZQUÉZ; GONZALÉZ-PRIETO, 2013COUTO-VAZQUÉZ, A; GONZALÉZ-PRIETO, S. J. Efectos a longo prazo do lume e tres axentes extintores no sistema solo-planta. Braña, Santiago de Compostela, v. 11, n. 1, p. 01-25, 2013. ).
Para as caldas com produtos de longa duração já foram registrados efeitos como: maior invasão de espécies daninhas (BESAW et al., 2011BESAW, L. M. et al. Disturbance, resource pulses and invasion: short- term shifts in competitive effects, not growth responses, favor exotic annuals. Journal of Applied Ecology, [s.l.], v. 48, n.4, p. 998-1006, 2011. ), morte de plantas (BELL; TOLHURST; WORTERS, 2005BELL, T.; TOLHURST, K.; WORTERS, M. Effects of fire retardant Phos-Chek on vegetation in eastern Australian heathlands. International Journal of Wildland Fire, Roslyn, [s.l.], v. 14, p. 199-211, 2005. ), perturbações na comunidade microbiana do solo (COUTO-VAZQUÉZ; GONZALÉZ-PRIETO, 2013COUTO-VAZQUÉZ, A; GONZALÉZ-PRIETO, S. J. Efectos a longo prazo do lume e tres axentes extintores no sistema solo-planta. Braña, Santiago de Compostela, v. 11, n. 1, p. 01-25, 2013. ; BARREIRO et al., 2010BARREIRO, A. et al. Response of soil microbial communities to fire and fire-fighting chemicals. Science of the Total Environment, [s.l.], v. 408, p. 6172-6178, 2010. ) e redução da germinação de espécie vegetal aquática (ANGELER et al., 2004ANGELER, D. G. et al. Assessment of application-rate dependent effects of a long-term fire retardant chemical (Fire Trol 934R) on Typha domingensis germination. Environment International, Toledo, v. 30, p. 375-381, 2004. ; LUNA et al., 2007LUNA, B. et al. Effects of a long-term fire retardant chemical (Fire-Trol 934) on seed viability and germination of plants growing in a burned Mediterranean area. International. Journal Wildland Fire, [s.l.], v. 16, n. 3, p. 349-359, 2007. ).Considerando-se os retardantes de curta duração, as poucas pesquisas apontam toxicidade para organismos aquáticos (GAIKOWSKI et al., 1996GAIKOWSKI, M. P. et al. Acute toxicity of three fire-retardant and two fire-suppressant foam formulations to the early life stages of rainbow trout (Oncorhynchus mykiss). Environmental toxicology and Chemistry, [s.l.], v. 15, n. 8, 1996. ) e redução da germinação de espécies vegetais sul coreanas (SONG et al., 2014SONG, U. et al. Effects of three fire-suppressant foams on the germination and physiological responses of plants. Environmental Management, Korea, v. 54, p. 865-874, 2014. ). De encontro a esses resultados, outras pesquisas apontam que essa classe de retardantes não provoca nenhuma interferência no crescimento das comunidades vegetais avaliadas (HARTSKEERL; SIMMONS; ADAMS, 2004HARTSKEERL, K.; SIMMONS, D.; ADAMS, R. Does firefighting foam affect the growth of some Australian native plants. International Journal of Wildl and Fire, [s.l.], v. 13, p. 335-341, 2004. ; FERNÁNDEZ-FERNÁNDEZ; GOMÉZ-REY; GONZÁLEZ-PRIETO, 2015FERNÁNDEZ-FERNÁNDEZ, M.; GOMÉZ-REY, M.X.; GONZÁLEZ-PRIETO, S. J. Effects of fire and three fire-fighting chemicals on main soil properties, plant nutrient content and vegetation growth and cover after 10 years. Science of the Total Environment , [s.l.], v. 515-516, p. 92-100, 2015. ).
O uso de retardantes de fogo no Brasil é inexpressivo, contudo, tais produtos encontram-se disponíveis comercialmente, ainda que não exista uma legislação específica que regulamente seu uso (IBAMA, 2018INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS- IBAMA. Em atendimento à solicitação efetuada pela Diretoria de Proteção Ambiental (DIPRO) para que a Diretoria de Qualidade Ambiental (DIQUA) se manifeste tecnicamente sobre o uso de retardantes de chamas aplicáveis no combate a incêndios florestais. Brasília: Coordenação de Avaliação Ambiental de Substâncias e Produtos Perigosos/IBAMA, 2018. 15 p. (Parecer técnico, n.514/2018-COASP/CGASQ/DIQUA). Disponível em: <Disponível em: https://www.ibama.gov.br/phocadownload/quimicos-e biologicos/retardantes-dechamas/2018-SEI_IBAMA-Parecer-Tecnico-5142018COASP-CGASQ-DIQUA.pdf
>. Acesso em: 16 mai. 2019.
https://www.ibama.gov.br/phocadownload/q...
). Esse fato é preocupante, visto que poucos são os estudos sobre os efeitos dos retardantes sobre a vegetação brasileira (KEFFER, 2019KEFFER, J. F. Efeito de retardantes de fogo sobre a germinação de espécies florestais tropicais. 2019. 83 f. Dissertação (Mestrado em Ciências Ambientais) - Instituto de Ciências Naturais, Humanas e Sociais, Universidade Federal de Mato Grosso, Sinop, 2019.).
Em contrapartida, como opção ao entrave legal, o uso de produtos já consolidados no setor agroflorestal como potenciais retardantes de fogo tem sido o foco de algumas pesquisas nacionais (SOUZA; ARAÚJO; RIBEIRO, 2012SOUZA, H. N.; ARAÚJO, T. G. de; RIBEIRO, G. A. Avaliação da eficiência de um gel hidroretentor como retardante de fogo. Revista Árvore, Viçosa-MG, v. 36, n. 3, p. 471-477, 2012. ; LIMA et al., 2020aLIMA, D. C. et al. Volume de calda e concentração de retardantes de fogo em queimas controladas em área de eucalipto na transição Cerrado-Amazônia. Ciência Florestal, Santa Maria, v. 30, n. 1, p. 205-220, 2020a. bLIMA, D. C. et al. Comportamento do fogo em diferentes concentrações e tempos pós-aplicação de retardantes em plantação de eucalipto na transição Cerrado-Amazônia no Brasil. Ciências Agrárias, Lisboa, v. 43, n. 1, p. 109-123, 2020b. ). A capacidade de reter umidade, atrelada aos efeitos positivos sobre a germinação (YONEZAWA; MOURA; AOUADA, 2017YONEZAWA, U. G.; MOURA, M. R. de; AOUADA, F. A. Estado da arte: um estudo sobre polímeros biodegradáveis na germinação e desenvolvimento de plantas. Caderno de Ciências Agrárias, Montes Claros, v. 9, n. 2, p. 69-78, 2017.) e crescimento vegetal (MEWS et al., 2015MEWS, C. L. et al. Efeito do hidrogel e ureia na produção de mudas de Handroanthus ochraceus (Cham.) Mattos. Floresta e Ambiente, Rio de Janeiro, v. 22, n. 1, p. 107-116, 2015. ; AZEVEDO et al., 2016AZEVEDO, G. T. O. S. et al. Effect of hydrogel doses in the quality of Corymbia citriodora Hill & Johnson seedlings. Nativa, Sinop, v. 4, n. 4, p. 244-248, 2016.; NAVROSKI et al., 2016NAVROSKI, M. C. et al. Influência do polímero hidroretentor nas características do substrato comercial para produção de mudas florestais. Interciencia, Caracas, v. 41, n. 5, p. 357-361, 2016.) tornam os polímeros hidrorretentores utilizados como condicionadores de solo, uma opção promissora como potenciadores de água para emprego no combate de incêndios de forma indireta.
As espécies florestais Handroanthus ochraceus (Cham.) Mattos e Tabebuia roseoalba (Ridl.) Sandwith desempenham importante papel na recuperação de áreas degradadas, além de serem muito utilizadas na arborização urbana (LORENZI, 2016LORENZI, H. Árvores brasileiras: manual de identificação e cultivo de plantas arbóreas nativas do Brasil. 7. ed. Nova Odessa: Instituto Plantarum de Estudos da Flora, 2016. v. 1. 384 p.). A dispersão das sementes dessas espécies acontece no período seco, que coincide com a época de maior ocorrência de incêndios nas regiões sul, leste e oeste da Amazônia Legal (LUCENA et al., 2017LUCENA, L. R. R. et al. Análise de lacunaridade de distribuição espacial de queimadas na Amazônia Legal. Revista Brasileira de Biometria, Lavras, v.35, n.2, p.283-297, 2017.). Dessa forma, pesquisas sobre os efeitos de retardantes de fogo sobre o banco de sementes podem auxiliar na definição de concentrações efetivas e seguras para os ecossistemas. O objetivo com estre trabalho foi avaliar se ocorrem efeitos de diferentes concentrações de retardantes de fogo de curta duração e de polímero hidrorretentor sobre a emergência e crescimento inicial de Handroanthus ochraceus e Tabebuia roseoalba.
2 MATERIAL E MÉTODO
2.1 Caraterização do local
O experimento foi conduzido em casa de vegetação no setor de Produção Vegetal da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) Campus Sinop, situado a 11º51’50” latitude Sul e 55º29’08” longitude oeste e altitude média de 384 metros, entre março e julho de 2019. O clima predominante do município de Sinop é o Aw (tropical quente e úmido), caracterizado por duas estações bem definidas (chuvosa entre outubro e abril, e seca de maio a setembro), baixa amplitude térmica anual que varia entre 24 e 27ºC e precipitação média anual de 1970 mm (SOUZA et al., 2013SOUZA, A. P. et al. Classificação climática e balanço hídrico climatológico no estado de Mato Grosso. Nativa, Sinop, v. 1, p. 34-43, 2013. ).
2.2 Semeadura, aplicação dos tratamentos e emergência de plântulas
As sementes de Handroanthus ochraceus e Tabebuia roseoalba foram coletadas em árvores matrizes com adequadas condições fitossanitárias, na arborização urbana de Sinop-MT. Selecionaram-se 6 matrizes para cada espécie com distância mínima de 20 metros entre si e máxima de 1500 metros. Após beneficiamento, seguindo procedimentos de desinfestação, as sementes foram mergulhadas em solução de álcool70% por um minuto, depois imersas em solução de hipoclorito de sódio (1% de cloro) por 10 minutos, em seguida lavadas com água destilada. As sementes foram postas para germinar a 1,0 cm de profundidade em tubetes de polipropileno contendo substrato formado pela mistura 2:1 de solo florestal (Latossolo vermelho-amarelo distrófico) e composto orgânico comercial (com casca de pinus bioestabilizada, vermiculita, moinha de carvão vegetal e espuma fenólica). O substrato foi colocado em tubetes de 290 cm³, perfazendo uma densidade de 0,72±0,05 g cm-3 e capacidade de retenção de água de 0,48 cm3 cm-3. O manejo da irrigação na casa de vegetação foi realizado com fracionamento em duas irrigações (manhã e tarde) de mesma duração, baseadas na evapotranspiração da cultura, obtidas pelos métodos do tanque Classe A, considerando-se os coeficientes de tanque de 0,78 e os coeficientes de cultivo de 0,86 (MONTEIRO et al., 2016MONTEIRO, E. B. et al. Water requirements and crop coefficients of tropical forest seedlings in different shading conditions. Revista Brasileira de Engenharia Agrícola e Ambiental, [s.l.], v. 20, n. 8, p. 709-715, 2016. ).
Os tratamentos consistiram em diluições em água de dois retardantes de curta duração (Phos-Chek WD-881® e Hold Fire®) e um polímero hidrorretentor (Nutrigel®). O principal critério de seleção dos retardantes foi seu uso e disponibilidade comercial no Brasil. As concentrações dos produtos avaliados foram baseadas nas queimas prescritas realizadas por Lima et al. (2020aLIMA, D. C. et al. Volume de calda e concentração de retardantes de fogo em queimas controladas em área de eucalipto na transição Cerrado-Amazônia. Ciência Florestal, Santa Maria, v. 30, n. 1, p. 205-220, 2020a. bLIMA, D. C. et al. Comportamento do fogo em diferentes concentrações e tempos pós-aplicação de retardantes em plantação de eucalipto na transição Cerrado-Amazônia no Brasil. Ciências Agrárias, Lisboa, v. 43, n. 1, p. 109-123, 2020b. ), em área de Eucalyptus urograndis Clone H13, para avaliação do comportamento do fogo e a eficiência dos produtos/concentrações/tempos pós-aplicação das caldas.
Phos-Chek WD-881® é um retardante de curta duração importado, cujas concentrações de aplicação recomendadas pelo fabricante variam de 0,1 a 1%; dentro desse intervalo, estabeleceram-se as seguintes concentrações para avaliação: 0; 3,00; 6,00; 8,00 e 10,00 mL L-1. Hold Fire® é um retardante fabricado no Brasil com concentração indicada de 0,7 a 1,5 %; dessa forma, para esse produto utilizaram-se as concentrações: 0; 7,00; 9,00; 12,00; e 15,00 mL L-1. Nutrigel® é um polímero hidrorretentor utilizado no setor agroflorestal como condicionador de solo, logo, não possui taxa de diluição recomendada para o combate a incêndios. Determinou-se em ensaios a quantidade máxima do hidrogel aplicável com uma bomba costal com bicos do tipo leque (LIMA et al., 2020aLIMA, D. C. et al. Volume de calda e concentração de retardantes de fogo em queimas controladas em área de eucalipto na transição Cerrado-Amazônia. Ciência Florestal, Santa Maria, v. 30, n. 1, p. 205-220, 2020a. ). A partir da concentração máxima estabelecida (1,00 g L-1), fracionaram-se as seguintes: 0; 0,25; 0,50; 0,75 e 1,00 g L-1.
Em todos os tratamentos, a concentração igual a 0 (zero) foi estabelecida com a aplicação de apenas água via substrato. Os tratamentos foram aplicados no substrato na semeadura e, posteriormente, a cada 15 dias, visando simular as deposições acumuladas dos produtos e os seus possíveis efeitos. As aplicações foram realizadas pela manhã, substituindo uma irrigação e tendo a evapotranspiração da cultura equivalente à calda fracionada, nesse caso, adotou-se 2,0 L m-2 como volume de calda máximo de referência, seguindo as recomendações de Lima et al., (2020aLIMA, D. C. et al. Volume de calda e concentração de retardantes de fogo em queimas controladas em área de eucalipto na transição Cerrado-Amazônia. Ciência Florestal, Santa Maria, v. 30, n. 1, p. 205-220, 2020a. ). A contabilização da emergência das plântulas foi realizada de forma visual, diariamente até o 21º dia após a semeadura, sendo considerada emergida a semente que expôs alguma parte dos seus cotilédones para fora do substrato. Desse modo, determinou-se: i) Índice de Velocidade de Emergência - IVE, conforme Maguire (1962MAGUIRE, J. D. Speed of germination aid in selection and evaluation for emergence and vigour. Crop Science, Madison, v. 2, p. 176-177, 1962. ); ii) Tempo Médio de Emergência - TME, de acordo Labouriau (1983LABOURIAU, L. G. A germinação das sementes. Washington: OEA, 1983. 174p.); iii) Porcentagem de Emergência - %E, segundo Brasil (2009)BRASIL, MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, PECUÁRIA E ABASTECIMENTO. Regras para análise de Sementes. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Secretaria de Defesa Agropecuária. Brasília: DF. Mapa/ACS, 399 p. 2009..
2.3 Análises de crescimento e Fluorescência da clorofila a
As análises de crescimento destrutivas foram realizadas aos 30, 45, 60, 90 e 120 dias após a semeadura (DAS), com avaliação das seguintes variáveis: i) número de folhas (por contagem visual); ii) área foliar por planta (medidor fotoelétrico L3000, Li-cor Company, Nebraska, USA); iii) diâmetro do coleto (obtido à altura do substrato com auxílio de um paquímetro digital); iv) altura da muda (medida do colo das plantas até a gema apical obtida utilizando uma régua graduada); v) volume de raiz (obtido com proveta graduada, por imersão das raízes lavadas em um volume de água conhecido); vi) massa seca de cada partição da planta (folhas, caule e raiz) e total. As massas secas foram determinadas em balança analítica com precisão de 0,0001 g, após a secagem do material vegetal em estufa de circulação forçada de ar à temperatura de 65ºC ± 2ºC por 72 horas.
A fluorescência da clorofila a foi registrada utilizando um Fluorômetro multimodular OS5p (Opti-Sciences, Hudson, USA). Para cada tratamento aos 60 DAS, foram selecionadas três plantas, separando-se uma folha por planta para as avaliações. Para representar o estrato intermediário das mudas, as folhas selecionadas localizavam-se sempre dois entrenós abaixo da gema apical. As avaliações foram realizadas aos 60, 75, 90, 120 DAS, no intervalo de 07 às 10 horas.
A fluorescência máxima (Fm) e a florescência inicial (Fo) foram determinadas após 30 minutos de aclimatação das folhas ao escuro. Essa aclimatação foi garantida por meio de um círculo do limbo foliar utilizando-se pinças apropriadas com vedação. Através do feixe de fibra ótica do aparelho, o tecido foliar era exposto a um pulso fraco de luz vermelha (0,05 µmol m-2 s-1), obtendo-se a fluorescência mínima (Fo). Sequencialmente, em um intervalo de aproximadamente 0,8 segundos, o equipamento emitia um pulso de luz actínica saturante de intensidade superior a 5000 µmol m-2 s-1 para mensuração da fluorescência máxima (Fm). Esses dados foram utilizados para obtenção do rendimento quântico máximo (Fv/Fm).
Posteriormente, utilizando-se as mesmas folhas, porém, em estado adaptado à luz ambiente, foram aplicados múltiplos pulsos sequenciais de luz actínica (5000, 10000 e 15000 micromols m-2 s-1) ao limbo foliar, a fim de obter a máxima fluorescência adaptada à luz (F’m), em quatro repetições por folha. Obteve-se a dissipação não-fotoquímica (Non-photochemical quenching -NPQ) com base na fluorescência do estado adaptado à luz e dados do estado adaptado ao escuro.
2.4 Análises estatísticas
O delineamento estatístico foi inteiramente casualizado. Após atestada a homocedasticidade, os dados foram avaliados quanto à normalidade pelo teste de Shapiro-Wilk, a um nível de significância de 5%, e quando necessário (não normais) empregou-se a transformação pela função Y = (x+1)0,5. Os efeitos na análise de crescimento foram analisados separadamente por produto, para cada espécie, no início (30 DAS) e no final do experimento (120 DAS).
Realizaram-se análises de variância, e quando significativas (p<0,05), foram ajustadas regressões lineares e polinomiais de segundo grau. Utilizaram-se os valores originais para representação das curvas de regressão, com a estatística dos dados transformados.
3 RESULTADOS E DISCUSSÃO
Apenas algumas variáveis morfométricas de crescimento apresentaram significância para as concentrações dos diferentes retardantes para as duas espécies ao longo do período experimental. Para percepção do crescimento das mudas foram apresentados os valores médios apenas para altura, área foliar e massa seca total (Tabela 1).
Em conformidade com os objetivos do estudo, não foram realizadas comparações entre os produtos, uma vez que estes possuem composições e ações distintas. Também não foi relacionado o efeito do tempo após semeadura no desenvolvimento das mudas, porque demandariam análises de taxas de crescimento. Portanto os resultados apresentados por produto foram considerados aos 30 e 120 DAS, os quais indicam os possíveis efeitos dos tratamentos na fase inicial de estabelecimento da muda e cumulativos (com aplicações consecutivas em intervalos de 15 dias) ao longo do ciclo da muda.
3.1 Phos-Chek
Não houve diferenças na emergência de plântulas de Handroanthus ochraceus e Tabebuia roseoalba quando submetidas a caldas com concentrações do retardante Phos-Chek WD881 em condições de cultivo em substrato. Keffer (2019KEFFER, J. F. Efeito de retardantes de fogo sobre a germinação de espécies florestais tropicais. 2019. 83 f. Dissertação (Mestrado em Ciências Ambientais) - Instituto de Ciências Naturais, Humanas e Sociais, Universidade Federal de Mato Grosso, Sinop, 2019.), em laboratório, observou redução no índice de velocidade de germinação de Tabebuia roseoalba com aumento das concentrações desse retardante.
Com esses resultados percebe-se que o efeito negativo do retardante Phos-Chek WD881 é anulado quando a aplicação é feita no substrato, o que evidencia que as concentrações testadas não prejudicariam o banco de sementes em áreas tratadas com esse produto. Torna-se necessário o desenvolvimento de outras pesquisas que contemplem mais espécies para que se ateste a segurança ambiental do uso desse retardante importado, contribuindo para a legalização de sua aplicação no combate a incêndios em ecossistemas brasileiros.
A diferença no processo germinativo de sementes submetidas a retardantes de fogo em ambientes variados também foi detectada por Song et al. (2014SONG, U. et al. Effects of three fire-suppressant foams on the germination and physiological responses of plants. Environmental Management, Korea, v. 54, p. 865-874, 2014. ). Esses autores testaram a influência de Phos-Chek WD881 na germinação de sementes em câmara de germinação e sua emergência em campo. Eles observaram que as sementes das três espécies estudadas em laboratório tiveram taxas de germinação menores, quando imersas em soluções de retardantes de curta duração, todavia, nenhum efeito significativo sobre as taxas de emergência foi detectado para as germinações em campo, nem mesmo quando ocorreu a duplicação da concentração de aplicação.
Aos 30 DAS, o número de folhas das mudas de Handroanthus ochraceus apresentou comportamento quadrático em relação às concentrações de Phos-Chek WD881, com ponto máximo estimado na concentração de 4,80 mL L-1 (Figura 1).
Número de folhas das mudas de Handroanthus ochraceus em função das concentrações do retardante de fogo Phos-Chek WD881 aos 30 DAS.
O número de folhas, área foliar, volume de raiz e massa seca das folhas de Tabebuia roseoalba também apresentaram comportamento quadrático aos 30 DAS para as concentrações do retardante Phos-Chek WD881. Os pontos de máximos foram estimados para as concentrações de 5,87; 4,76; 5,80 e 5,06 mL L-1, respectivamente (Figura 2).
Número de folhas (a), área foliar (b), volume de raiz (c) e massa seca das folhas (d) das mudas de Tabebuia roseoalba em função das concentrações do retardante de fogo Phos-Chek WD881 aos 30 DAS
Aos 120 DAS, o número de folhas e o volume de raiz das mudas de Handroanthus ochraceus apresentaram comportamento quadrático, porém inversos. Enquanto o número de folhas apresentou valor mínimo na concentração ajustada de 5,38 mL L-1, com tendência positiva a partir dessa (Figura 3a), ocorreu aumento do volume de raiz até a concentração estimada de 4,73 mL L-1, decrescendo a partir desse ponto (Figura 3b). Já para Tabebuia roseoalba, o ponto máximo do diâmetro do coleto das mudas aos 120 DAS ocorreu na concentração estimada de 6,29 mL L-1 (Figura 4).
Com base nas regressões ajustadas para as variáveis de crescimento de Handroanthus ochraceus (Figuras 1 e 2) e Tabebuia roseoalba (Figuras 3 e 4), o retardante de fogo Phos-Chek WD881 tem efeito positivo no crescimento das espécies até concentrações intermediárias do limite indicado pelo fabricante. Independente da espécie estudada, a utilização de concentrações superiores a 6,3 mL L-1 pode ocasionar prejuízos no crescimento inicial de mudas florestais. Desse modo, é preciso cautela com o uso desse retardante de fogo, para não causar danos maiores em áreas já prejudicadas com a perda da diversidade devido à presença do fogo. Recomenda-se o uso de 5 ml L-1 (metade da concentração indicada pelo fabricante), para que, após o uso desse produto no combate a incêndios, a área afetada não sofra ainda mais para recompor a sua estrutura vegetal.
Número de folhas (a) e volume de raiz (b) das mudas de Handroanthus ochraceus em função das concentrações do retardante de fogo Phos-Chek WD881 aos 120 DAS
Diâmetro do coleto das mudas de Tabebuia roseoalba em função das concentrações do retardante de fogo Phos-Chek WD881 aos 120 DAS
Os resultados observados para as variáveis de fluorescência da clorofila a das mudas das duas espécies estudadas demonstraram que os processos fotoquímicos relacionados ao fotossistema II não sofreram danos devido às concentrações de Phos-Chek WD881. Os valores de NPQ das mudas de Handroanthus ochraceus cresceram com o aumento das concentrações até o ponto máximo estimado de 4,95 mL L-1 do retardante (Figura 5), porém, essa variação está dentro da faixa que caracteriza bom funcionamento do aparelho fotossintético (0,5 -3,5) de acordo com Maxwell e Johnson (2000MAXWELL, K.; JOHNSON, G. N. Chlorophyll fluorescence-a practical guide. Journal of Experimental Botany, [s.l.], v. 51, n. 345, p. 659-668, 2000. ).
Dissipação não fotoquímica (NPQ) das mudas de Handroanthus ochraceus em função das concentrações do retardante de fogo Phos-Chek WD881
Em concordância com os resultados obtidos através da técnica de fluorescência neste estudo, Song et al. (2014SONG, U. et al. Effects of three fire-suppressant foams on the germination and physiological responses of plants. Environmental Management, Korea, v. 54, p. 865-874, 2014. ) constataram que Phos-Chek WD881 não provoca nenhum efeito fitotóxico de longo prazo no crescimento de plantas florestais, visto o acúmulo de biomassa ocorrer normalmente como resultado do processo fotossintético. Esses autores observaram mudanças nos teores de clorofila uma semana após o tratamento com o retardante, no entanto, após três semanas, as plantas já haviam se recuperado do estresse. Além disso, foram realizadas medidas da atividade da enzima superóxido dismutase, muito utilizada como indicadora de estresse por poluição. Os resultados indicaram que o estresse induzido pela aplicação de retardantes de curta duração são insignificantes e não afetam a sobrevivência das plantas.
Phos-Chek WD881 é um produto composto em grande parte por surfactantes. Segundo Moya et al. (2001MOYA, I.; et al. Time-resolved fluorescence analysis of the photosystem II antenna proteins in detergent micelles and liposomes. Biochemistry, [s.l.], v. 40, p. 12552-12561, 2001. ), surfactantes podem danificar as membranas celulares, corroborando com Mohammad e Moheman (2012MOHAMMAD, A.; MOHEMAN, A. Effect of anionic and non-ionic surfactants in soil-plant system under pot culture. Chemistry of Phytopotentials: Health, Energy and Environmental Perspectives [s.l.], p. 261-264, 2012.), que observaram nas concentrações elevadas de surfactantes (iônico e não iônico) influências na biomassa seca de raiz e da parte aérea de plantas de trigo. Dessa forma, associando com os resultados obtidos no presente trabalho, indica-se a necessidade de atenção com as concentrações aplicadas de retardantes de curta duração, principalmente as espumas supressoras ricas em surfactantes.
3.2 Hold Fire
O aumento das concentrações de Hold Fire não influenciou a emergência de plântulas das espécies Handroanthus ochraceus e Tabebuia roseoalba. Em câmara de germinação, Keffer (2019KEFFER, J. F. Efeito de retardantes de fogo sobre a germinação de espécies florestais tropicais. 2019. 83 f. Dissertação (Mestrado em Ciências Ambientais) - Instituto de Ciências Naturais, Humanas e Sociais, Universidade Federal de Mato Grosso, Sinop, 2019.) também não detectou diferenças nas taxas de germinação de Tabebuia roseoalba sob as mesmas concentrações de Hold Fire. Esses resultados indicam que esse produto não apresenta um risco a curto prazo para a sobrevivência do banco de sementes. Todavia são necessários mais estudos que analisem os efeitos do retardante de fogo a longo prazo para garantir que efeitos fitotóxicos não persistirão nos ambientes pós-utilização do retardante.
Poucos parâmetros morfométricos de crescimento apresentaram significância para as concentrações, para as duas espécies, aos 30 e 120 DAS. Aos 30 DAS o número de folhas e volume de raiz das mudas de Tabebuia roseoalba apresentaram comportamento quadrático em função das concentrações de Hold Fire. Os valores máximos para essas variáveis ocorreram nas concentrações estimadas de 10,87 e 8,04 mL L-1, respectivamente (Figura 6). Ao final da fase de viveiro (120 DAS), mesmo com sucessivas aplicações, as mudas cresceram indiferentes às aplicações dos retardantes. Hartskeerl, Simmons e Adams (2004HARTSKEERL, K.; SIMMONS, D.; ADAMS, R. Does firefighting foam affect the growth of some Australian native plants. International Journal of Wildl and Fire, [s.l.], v. 13, p. 335-341, 2004. ) e Fernández-Fernández, Goméz-Rey e González-Prieto(2015)FERNÁNDEZ-FERNÁNDEZ, M.; GOMÉZ-REY, M.X.; GONZÁLEZ-PRIETO, S. J. Effects of fire and three fire-fighting chemicals on main soil properties, plant nutrient content and vegetation growth and cover after 10 years. Science of the Total Environment , [s.l.], v. 515-516, p. 92-100, 2015. também constataram que os efeitos de retardantes de curta duração sobre as comunidades vegetais são relativamente curtos.
As mudas de Handroanthus ochraceus manifestaram padrão diferente em relação à Tabebuia roseoalba aos 30 DAS, visto que as concentrações de Hold Fire não interferiram nas variáveis de crescimento. Apesar disso, com o acúmulo de aplicações até os 120 DAS, o crescimento em diâmetro do coleto passou a ser positivo a partir de 9,61 mL L-1 (Figura 7). Assim, além de se determinar concentrações seguras, deve-se ter cuidado com o número de aplicações de Hold Fire em uma mesma área. Geralmente, locais de recorrência de incêndios se tornam áreas ambientalmente sensíveis e podem conter espécies raras ou ameaçadas de extinção (HARTSKEERL; SIMMONS; ADAMS, 2004HARTSKEERL, K.; SIMMONS, D.; ADAMS, R. Does firefighting foam affect the growth of some Australian native plants. International Journal of Wildl and Fire, [s.l.], v. 13, p. 335-341, 2004. ).
Número de folhas (a) e volume de raiz (b) das mudas de Tabebuia roseoalba em função das concentrações do retardante de fogo Hold Fire aos 30 DAS
Diâmetro das mudas de Handroanthus ochraceus em função das concentrações do retardante de fogo Hold Fire aos 120 DAS
Considerando-se as diferenças de sensibilidade às concentrações de Hold Fire para Tabebuia roseoalba e Handroanthus ochraceus, entende-se que as espécies vegetais podem interagir de formas diferentes com os compostos do retardante. Logo, requer-se mais conhecimento específico sobre a composição de Hold Fire. Esse retardante tem a vantagem de ser produzido em território nacional e mais informações poderiam agregar segurança, principalmente à vegetação brasileira.
O funcionamento do aparelho fotossintético é um indicador fisiológico para detectar a sensibilidade vegetal ao estresse ambiental (OLIVEIRA et al., 2018OLIVEIRA, W. J. et al. Fluorescência da clorofila como indicador de estresse salino em feijão caupi. Revista Brasileira de Agricultura Irrigada, [s.l.], v. 12, n. 3, p. 2592-2603, 2018. ). A relação entre a fluorescência máxima e a fluorescência variável (Fv/Fm) é uma medida da eficiência intrínseca do fotossistema II (MAXWELL; JOHNSON, 2000MAXWELL, K.; JOHNSON, G. N. Chlorophyll fluorescence-a practical guide. Journal of Experimental Botany, [s.l.], v. 51, n. 345, p. 659-668, 2000. ). Quando o aparelho fotossintético da planta está intacto, a razão Fv/Fm varia entre 0,75 e 0,85 (BOLHÀR-NORDENKAMPF et al., 1989BOLHÀR-NORDENKAMPF, H. R. et al. Chlorophyll fluorescence as probe of the photosynthetic competence of leaves in the field: a review of current instrument. Functional Ecology, [s.l.], v. 3, p. 497-514, 1989. ). Observa-se que o aumento das concentrações de Hold Fire para as mudas de Tabebuia roseoalba aproxima os valores de Fv/Fm aos valores considerados ideais (Figura 8a). A dissipação não fotoquímica (NPQ) das mudas de Tabebuia roseoalba, apesar de diminuir em função das concentrações do retardante Hold Fire, denota bom funcionamento do fotossistema II de acordo com os limites sugeridos por Maxwell e Johnson (2000MAXWELL, K.; JOHNSON, G. N. Chlorophyll fluorescence-a practical guide. Journal of Experimental Botany, [s.l.], v. 51, n. 345, p. 659-668, 2000. ) (Figura 8b), indício de que o retardante de fogo em questão não prejudica o metabolismo da planta no que diz respeito aos processos fotossintéticos.
Relação Fv/Fm (a) e dissipação não fotoquímica (NPQ) (b) das mudas de Tabebuia roseoalba em função das concentrações do retardante Hold Fire
3.3 Nutrigel
A emergência de plântulas das espécies Handroanthus ochraceus e Tabebuia roseoalba não sofreu influência das concentrações de Nutrigel. Esses resultados corroboram com Keffer (2019KEFFER, J. F. Efeito de retardantes de fogo sobre a germinação de espécies florestais tropicais. 2019. 83 f. Dissertação (Mestrado em Ciências Ambientais) - Instituto de Ciências Naturais, Humanas e Sociais, Universidade Federal de Mato Grosso, Sinop, 2019.) que também testou a germinação de Tabebuia roseoalba sob concentrações desse hidrogel em laboratório.
Handroanthus ochraceus e Tabebuia roseoalba são espécies adaptadas a terrenos secos. Isso pode explicar a falta de efeitos nas taxas de emergência das espécies na presença de hidrogel. Os polímeros hidrorretentores aplicados no solo possibilitam a disponibilidade de água por mais tempo, comparando-se com solos sem polímeros (YANG et al., 2014YANG, L. et al. Influence of super absorbent polymer on soil water retention, seed germination and plant survivals for rocky slopes eco-engineering. Ecological Engineering, [s.l.], v. 62, p. 27-32, 2014. ; TAO et al., 2018TAO, J. et al. Effects of eco-friendly carbohydrate-based superabsorbent polymers on seed germination and seedling growth of maize. Royal Society Open Science, [s.l.], v. 5, n. 2, 171184, 2018. ). Assim, hidrogéis promovem e melhoram a germinação de outras espécies, como colza (Brassica napus Huayouza) (TANG et al., 2016TANG, H. et al. Application of chitin hydrogels for seed germination, seedling growth of rapeseed. Journal Plant Growth Regulation, [s.l.], v. 33, p. 195-201, 2014. ), quiabo (Abelmoschus esculentus (L.) Moench) (JAMARI; GHAZALI; YAACOB, 2015JAMARI, S. S.; GHAZALI, S.; YAACOB, W. S. N. W. Effect of superabsorbent polymer composite filled carbon fiber towards the germination of Abelmoschus esculentus. Journal of Advanced Agricultural Technologies, [s.l.], v. 2, p. 156-159, 2015. ) eucalipto (Eucalyptus saligna Smith) e acácia (Acacia stenophylla Benth) (DEHKORDI, 2018DEHKORDI, D. K. Effect of hydrophilic polymers on seed germination and plant survival for sloping area. Journal of Soil and Water Conservation, [s.l.], v. 73, n. 2, p. 73-178, 2018. ).
O aumento das concentrações de Nutrigel aos 30 DAS apresentou efeito positivo para o diâmetro das mudas de Tabebuia roseoalba a partir da concentração 0,49 g L-1 (Figura 9a), e ainda favoreceu o crescimento linear do volume de raiz das mudas desta espécie (Figura 9b). Navroski et al., (2015NAVROSKI, M. C. et al. Influência do hidrogel no crescimento e no teor de nutrientes das mudas de Eucalyptus dunnii. Floresta, Curitiba, v. 45, n. 2, p. 315-328, 2015. ) e Azevedo et al. (2016AZEVEDO, G. T. O. S. et al. Effect of hydrogel doses in the quality of Corymbia citriodora Hill & Johnson seedlings. Nativa, Sinop, v. 4, n. 4, p. 244-248, 2016.) também observaram boas respostas no sistema radicular de Eucalyptus dunnii Maidene Corymbia citriodora Hill & Johnson respectivamente, sob concentrações de hidrogel. Portanto a utilização de Nutrigel (> 0,49 g L-1) em aceiros molhados com a finalidade de quebrar a barreira de fogo em uma floresta ou área rural não apresenta consequência ameaçadora ao ambiente vegetal em regeneração, pelo contrário, pode proporcionar condições que garantam a sobrevivência das plantas.
Diâmetro do coleto (a) e volume de raiz (b) de mudas de Tabebuia roseoalba em função das concentrações do polímero hidrorretentor Nutrigel aos 30 DAS
Depois de estabelecidas (120 DAS), o número de folhas das mudas de Handroanthus ochraceus manifestou interação positiva com o Nutrigel a partir 0,49 g L-1 (Figura 10a). Provavelmente, esse comportamento sofreu influência dos processos fisiológicos normais como a senescência foliar, dado o tempo de vida útil do órgão folha. A partir da concentração de 0,59 g L-1, o Nutrigel promoveu o crescimento em diâmetro do coleto das mudas da mesma espécie (Figura 10b), enquanto o diâmetro do coleto das mudas de Tabebuia roseoalba respondeu positivamente ao aumento das concentrações do hidrogel, até a concentração estimada de 0,88 g L-1 (Figura 11). Sendo assim, recomenda-se o intervalo de 0,59 g L-1 até 0,88 g L-1 do polímero hidrorretentor Nutrigel como retardante alternativo de chamas, visando contribuir com o crescimento de espécies vegetais na recomposição da área pós fogo.
Número de folhas (a) e diâmetro (b) de mudas de Handroanthus ochraceus em função das concentrações do polímero hidrorretentor Nutrigel aos 120 DAS
Diâmetro do coleto das mudas de Tabebuia roseoalba em função das concentrações do polímero hidrorretentor Nutrigel aos 120 DAS
Percebe-se que o aumento das concentrações de Nutrigel até 0,67 g L-1 favorece a aproximação da relação Fv/Fm das mudas de Tabebuia roseoalba ao valor considerado ideal (BOLHÀR-NORDENKAMPF et al., 1989BOLHÀR-NORDENKAMPF, H. R. et al. Chlorophyll fluorescence as probe of the photosynthetic competence of leaves in the field: a review of current instrument. Functional Ecology, [s.l.], v. 3, p. 497-514, 1989. ), todavia, a partir dessa concentração há uma diminuição na eficiência fotoquímica, porém não é um indicativo de fotoinibição (Figura 12a). Para Critchley (1998CRITCHLEY, C. Photoinhibition. In: RAGHAVENDRA, A.S. (Ed.). Photosynthesis: A comprehensive treatise. Cambridge: Cambridge University Press, 1998. p.264-272.), valores abaixo de 0,725 indicam dano fotoinibitório, processo caracterizado pela diminuição da eficiência na incorporação do carbono pela elevada energia luminosa (LONG; HUMPHRIES; FALKOWSKI, 1994LONG, S.P.; HUMPHRIES, S.; FALKOWSKI, P.G. Photoinhibition of photosynthesis in nature. Annual Review of Plant Physiology and Plant Molecular Biology, New York, v. 45, p.633-662, 1994.). Os valores de dissipação não fotoquímica (NPQ) das folhas de Tabebuia roseoalba sob concentrações de Nutrigel (Figura 12b) indicam eficiente sistema de dissipação energética na forma de calor, segundo intervalo sugerido por Maxwell e Johnson (2000MAXWELL, K.; JOHNSON, G. N. Chlorophyll fluorescence-a practical guide. Journal of Experimental Botany, [s.l.], v. 51, n. 345, p. 659-668, 2000. ). A capacidade de disponibilização de água para a planta reforça o benefício do uso de Nutrigel como retardante alternativo, assegurando que após a passagem do fogo, a vegetação poderá se regenerar sendo favorecida por um ambiente úmido ocasionado pelos aglomerados do hidrogel.
Relação Fv/Fm(a) e dissipação não fotoquímica (NPQ) (b) das mudas de Tabebuia roseoalba em função das concentrações do polímero hidrorretentor Nutrigel
Os resultados encontrados neste trabalho mostram a ausência de interferências negativas no desenvolvimento inicial das duas espécies estudadas, considerando os limites recomendados de eficiência dos produtos observados em campo por Lima et al. (2020LIMA, D. C. et al. Comportamento do fogo em diferentes concentrações e tempos pós-aplicação de retardantes em plantação de eucalipto na transição Cerrado-Amazônia no Brasil. Ciências Agrárias, Lisboa, v. 43, n. 1, p. 109-123, 2020b. a). Assim, esta pesquisa poderá compor o conjunto de referências necessárias para que sejam estabelecidas normas para o uso dos retardantes de fogo no Brasil, principalmente no tangente às concentrações, contemplando não somente a extinção efetiva de incêndios, mas também a ausência de danos ao ambiente após o lançamento de tais produtos no meio silvestre.
4 CONCLUSÕES
A emergência de plântulas das espécies Handroanthus ochraceus e Tabebuia roseoalba não é afetada pelas concentrações testadas dos retardantes Phos-Chek WD881 (0; 3; 6; 8; 10 mL L-1), Hold Fire (0; 7; 9; 12; 15 mL L-1), e do polímero hidrorretentor Nutrigel (0; 0,25; 0;50; 0;75; 1,00 g L-1).
Aplicações com concentrações crescentes de Phos-Chek WD881 até 5,00 mL L-1 têm efeitos positivos sobre o crescimento de Handroanthus ochraceus e Tabebuia roseoalba.
Aplicações crescentes de Hold Fire até a concentração de 8,00 mL L-1 favorecem o aumento do número de folhas e do volume de raiz de Tabebuia roseoalba. O crescimento em diâmetro do coleto de mudas de Handroanthus ochraceus tem resposta positiva após sucessivas aplicações de Hold Fire em concentrações de 9,61 a 15 mL L-1.
O intervalo de 0,59 g L-1 até 0,88 g L-1 do polímero hidrorretentor Nutrigel promove o crescimento em diâmetro do coleto de Handroanthus ochraceus e Tabebuia roseoalba.
A fluorescência da clorofila a como parâmetro para avaliação de estresse indica que as concentrações dos retardantes de fogo Phos-Chek WD881 e Hold Fire, e do polímero hidrorretentor Nutrigel não prejudicam os processos fotossintéticos relacionados ao fotossistema II para as duas espécies estudadas.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
30 Abr 2021 -
Data do Fascículo
Jan-Mar 2021
Histórico
-
Recebido
01 Abr 2020 -
Aceito
31 Jul 2020 -
Publicado
15 Mar 2021