Densidade arbórea e sombreamento nas áreas verdes das quadras residenciais de Palmas, Tocantins

Tree density and shading in green areas of residential blocks in Palmas, Tocantins

RESUMO

Os espaços verdes urbanos estão entre as alternativas mais eficientes para mitigar os efeitos da poluição e das ilhas de calor presentes no meio urbano. Quanto mais densamente arborizados, mais efetivos na redução da temperatura, incremento da umidade e remoção de poluentes. Palmas, capital do estado do Tocantins, foi criada em 1989 e planejada com soluções diferenciadas onde cada quadra residencial teria um percentual de área verde não edificante e de esporte e lazer com o intuito de promover o conforto térmico e o convívio social. No entanto, os primeiros estágios da construção da cidade foram marcados por um amplo processo de desmatamento e mudança de funcionalidade desses espaços verdes. No presente estudo utilizamos índices espaciais para avaliar a cobertura arbórea das áreas verdes das quadras residenciais e se esta seria suficiente para influenciar no conforto térmico local. Foram obtidas informações sobre o tamanho das áreas verdes, composição e frequência das espécies e diâmetro de copa para calcular os índices de densidade arbórea - IDA e sombreamento - ISA. A reduzida dominância encontrada reflete uma elevada diversidade de espécies características de ambientes naturais, e os baixos valores dos índices espaciais indicam insuficiência arbórea na maioria das áreas verdes, corroborando nossa hipótese de que a promoção do conforto térmico local não estaria sendo alcançada em todas as quadras residenciais.

Palavras-chave
Arborização; Índices espaciais; Área urbana; Cerrado

ABSTRACT

Urban green spaces are among the most efficient alternatives to mitigate the effects of pollution and heat islands present in the urban environment, the more densely wooded, the more effective in reducing temperature, increasing humidity and removing pollutants. Palmas, capital of the state of Tocantins, was created in 1989, it was planned with differentiated solutions where each residential block would have a percentage of non-edifying green area and sport and leisure in order to promote thermal comfort and social interaction, however, the first stages of the construction of the city were marked by a broad process of deforestation and a change in the functionality of these green spaces. In the present study, we used spatial indices to assess the tree cover of green areas in residential blocks and whether this would be sufficient to influence local thermal comfort. Information on the size of green areas, composition and frequency of species and canopy diameter was obtained to calculate the tree density indices - ADI and shading - ISA. The reduced dominance reflects a high diversity of species characteristic of natural environments, and the low values of the spatial indexes indicate tree insufficiency in most green areas, corroborating our hypothesis that the promotion of local thermal comfort would not be achieved in all residential blocks.

Keywords
Afforestation; Spatial indices; Urban area; Cerrado

1 INTRODUÇÃO

A expansão urbana, ocorrida no último século, promoveu importantes modificações na estrutura física das cidades, acarretando significativos impactos no meio ambiente. O incremento nas taxas de urbanização é um fenômeno global e tende a ser mais acentuado nos países em desenvolvimento, sobretudo em regiões tropicais. No Brasil, onde aproximadamente 85% da população vive em áreas urbanas, o crescimento das cidades geralmente ocorre de maneira desordenada, mesmo em cidades recém planejadas como Palmas/TO (BAZZOLI, 2019), acentuando os agravos sociais e ambientais.

Os distúrbios atmosféricos estão entre os maiores problemas das áreas urbanas e ocorrem em função das modificações na cobertura e uso do solo urbano. A emissão de poluentes, verticalização, impermeabilização do solo, incremento de materiais de alta retenção de calor e redução da cobertura vegetal, somados às influências externas, climáticas e estacionais, alteram os padrões locais de circulação do ar, formando ilhas de calor urbano (FERNÁNDEZ; ALVAREZ-VÁZQUEZ; GARCÍA-CHAN; MARTÍNEZ; VÁZQUEZ-MÉNDEZ, 2015). A ilha de calor urbano é uma área onde a temperatura superficial é mais elevada que nas áreas do entorno, seja dentro da cidade ou entre esta e área rural ou suburbana, seus efeitos negativos podem afetar o conforto térmico e a saúde, sobretudo de idosos, crianças e cidadãos com problemas de saúde (LAFORTEZZA; CARRUS; SANESI; DAVIES, 2009).

Dentre as várias alternativas relacionadas às mudanças climáticas e seus efeitos nas cidades, os espaços verdes urbanos constituem uma estratégia local de baixo custo que podem ser facilmente implementadas na maioria das cidades (NERO; CALLO-CONCHA; ANNING; DENICH, 2017). Os espaços verdes urbanos são considerados ótimas soluções naturais para mitigar os efeitos das ilhas de calor urbano, no entanto, o grau de resfriamento pode ser influenciado por variáveis como a temperatura local, tipo de planta e densidade, ventos e tamanho da área verde (FEYISA; DONS; MEILBY, 2014). De acordo com Grilo, Pinho, Aleixo, Catita, Silva, Lopes, Freitas, Santos-Reis, Mcphearson e Branquinho (2020), áreas verdes mais densamente arborizadas são mais efetivas na redução da temperatura e incremento da umidade, tanto em intensidade como distância de influência desses dois fatores, além disso, as árvores são responsáveis pela remoção de vários poluentes do ar, como o ozônio, dióxido de enxofre e material particulado, incrementando a qualidade do ar e reduzindo os riscos à saúde da população. Mesmo árvores individuais são importantes para o fornecimento de sombra, reduzindo o desconforto térmico e melhorando a qualidade do ar em pequena escala (ROY; BYRNE; PICKERING, 2012).

O verde urbano e sua importância para a qualidade de vida vem permeando os debates sobre sustentabilidade urbana nas últimas décadas e sendo utilizado como um parâmetro para definir a identidade das cidades. Nascida após a Constituição Federal de 1988, que estabeleceu princípios de preservação ambiental vinculados à melhoria da qualidade de vida e no auge das discussões sobre sustentabilidade que permearam a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, ECO-92, a cidade de Palmas/TO, foi concebida para ser a capital do estado do Tocantins, e planejada sob um ponto de vista humanístico e ecológico, tendo a preservação ambiental como um de seus pilares. Em seu planejamento, as áreas com vegetação nativa nos fundos de vale seriam protegidas formando parques lineares e cada quadra residencial seria composta por áreas verdes não edificantes, criando um ambiente com temperatura mais amena e proporcionando melhor qualidade de vida para a população (TEIXEIRA, 2009).

Historicamente as cidades brasileiras planejadas vêm sendo descaracterizadas em função do acelerado crescimento da população urbana que não é acompanhado no mesmo ritmo por infraestruturas e serviços, fazendo com que o uso e ocupação do espaço urbano ocorra de forma ineficiente e insustentável. Em Palmas/TO, os primeiros estágios do processo de urbanização já foram marcados pela retirada indiscriminada da cobertura vegetal autóctone, alterações no zoneamento do uso do solo, com a mudança de funcionalidade de algumas quadras e a doação de áreas verdes internas das quadras para instituições de ensino e igrejas, evidenciando um grande distanciamento entre o planejado e o materializado (ADORNO; FIGUERA, 2005).

Palmas/TO está localizada em uma região tropical naturalmente quente, de clima seco-quente e úmido-quente, e vem apresentando aumento na temperatura e redução na umidade e ventilação (GOMES; FUZETO; PRATES, 2020). Segundo Silva e Souza (2019), o incremento no número de episódios de calor excessivo, períodos secos mais intensos e a maior frequência de desconforto térmico, sobretudo no período noturno, são fenômenos relacionados às ilhas de calor e que surgem com aumento da urbanização na cidade. A magnitude destas ilhas de calor superficial pode alcançar até 15ºC de diferença quando comparada ao entorno rural, principalmente nos períodos mais secos, neste cenário, as áreas verdes tendem a exercer um importante papel na amenização da temperatura em Palmas/TO (GOMES; FUZETO; PRATES, 2020).

Desde que foram implantadas, com o intuito de garantir o conforto térmico, a cobertura arbórea das áreas verdes das quadras residenciais de Palmas/TO ainda não foi avaliada. Considerando que as áreas verdes mais densamente arborizadas são mais efetivas na redução da temperatura e incremento da umidade, avaliamos por meio do cálculo de índices espaciais de densidade arbórea e de sombreamento se as áreas verdes em questão possuem déficit ou não de arborização e discutimos sobre a importância da cobertura arbórea para melhoria do microclima local.

2 MATERIAL E MÉTODOS

2.1 Caracterização da área de estudo

A cidade de Palmas/TO está situada na região central do Estado do Tocantins e localizada no paralelo 10°11’04” Sul e do meridiano 48°20’01” Oeste. Fundada em maio de 1989, possui atualmente uma população estimada de 313.349 habitantes (IBGE, 2022), sendo a última cidade brasileira planejada no século XX. A classificação do clima é Aw segundo a Köppen, com temperatura média igual a 26,8 °C e pluviosidade média anual de 1977 mm. A vegetação natural de Palmas/TO é típica do Cerrado, havendo fitofisionomias florestais (cerradão e mata de galeria), campestres (campo sujo) e savânicas (cerrado sensu stricto), que formam a paisagem local (IBGE, 2012).

A exemplo de outras cidades planejadas, Palmas/TO está estruturada em áreas administrativas, residenciais, comerciais e industriais situadas em quadras. As quadras residenciais possuem dimensões médias de 700 x 700 metros e foram projetadas para abrigar de 8 a 12 mil/habitantes por quadra, sendo dotadas de parcelamento interno próprio e planejadas como unidades básicas para organização da vida. Cada quadra urbanizada está dividida em lotes uni e multifamiliares, áreas públicas, comerciais, para esporte e lazer e áreas verdes não edificantes (TEIXEIRA, 2009).

No presente estudo, foram consideradas as áreas verdes não edificantes e as áreas verdes de esporte e lazer (praças) presentes no memorial descritivo de cada quadra. As áreas verdes de Palmas são regidas pela Lei de Uso do Solo de Palmas - TO, Lei n. 386/1993, alterada para a Lei Complementar n. 321/2015, artigo 15, parágrafo 5º, definida como: “Zona de uso caracterizada pela otimização das condições ecológicas do meio ambiente, sendo admitido o desenvolvimento de atividades de lazer compatíveis com essas condições” (PALMAS, 2015a). Este conceito se assemelha à definição de área verde urbana contida na Lei de Proteção da Vegetação Nativa, Lei no 12.651/2012, onde as áreas verdes urbanas são espaços públicos ou privados, com predomínio de vegetação, preferencialmente nativa, natural ou recuperada, indisponíveis para construção de moradias, destinados aos propósitos de recreação, lazer e melhoria da qualidade ambiental urbana (BRASIL, 2012).

2.2 Coleta e análise dos dados

Os dados sobre a arborização foram coletados entre fevereiro e dezembro de 2015, nas áreas verdes não edificantes e de esporte e lazer (Áreas Verdes - AV) de 32 das 63 quadras residenciais urbanizadas, selecionadas aleatoriamente e de maneira representativa das quatro regiões do Plano Diretor de Palmas/TO: Área Residencial Sudoeste - ARSO: 205S, 207S, 303S, 403S, 405S, 505S, 603S, 1005S e 1105S; Área Residencial Sudeste - ARSE: 204S, 210S, 306S, 308S, 404S, 504S, 606S e 704S; Área Residencial Noroeste - ARNO: 105N, 303N, 305N, 403N, 503N e Área Residencial Nordeste - ARNE: 106N, 110N, 208N, 304N, 404N, 406N, 504N, 506N, 604N e 606N (Figura 1) e incorporados em um coletor de dados Mesa Juniper System®, que utiliza planilha eletrônica do sistema computacional OpenOffice.

Figura 1
Esquema do Plano Diretor de Palmas/TO, evidenciando as quadras amostradas

No levantamento, foram considerados todos os indivíduos arbóreos adultos com altura superior a 2,0 metros para determinação da espécie, frequência e diâmetro da copa. Para obtenção da área sombreada, foram medidas as projeções das copas no solo, considerando quatro linhas radiais a partir do tronco com o auxílio de uma trena, em horários próximos ao meio-dia, para garantir uma visualização padronizada das projeções. O cálculo da área ocupada pela copa foi baseado em Sampaio e Angelis (2008), sendo utilizado o raio médio (r) da sombra projetada por cada árvore utilizando a Equação (1):

$$r=\frac{d1+d2}{4}$$ (1)

onde: d1 é o diâmetro no sentido leste-oeste; d2 é o diâmetro no sentido norte-sul.

A Área da Copa (AC) de cada espécie foi obtida a partir do tamanho médio das projeções de cada indivíduo medido daquela espécie usando a Equação (2):

$$AC=\pi r^2$$ (2)

onde: r é o raio médio.

O cálculo dos índices espaciais seguiu a metodologia proposta por Simões, Marotta, Pires, Umbelino e Costa (2001) sendo obtido: o Índice de Densidade Arbórea – IDA, constituído pelo número de árvores presentes em cada 100 m² de área verde, o qual denotará a suficiência ou deficiência da arborização na área, sendo obtido pela Equação (3):

$$ID{A}_{\mathit{\text{total}}}=\left(\frac{\mathit{\text{ total de árvores}}}{\mathit{\text{ área verde total }}\left(m^2\right)}\right)\times 100$$ (3)

O Índice de Sombreamento Arbóreo - ISA corresponde ao percentual de área sombreada em relação à área total, o qual permite obter o potencial de sombra resultante a partir do somatório das projeções da copa, calculado pela Equação (4):

$$IS{A}_{\mathit{\text{total }}}=\left(\frac{\mathit{\text{ área sombreada }}\left({\mathrm{m}}^2\right)}{\mathit{\text{ área verde total }}\left({\mathrm{m}}^2\right)}\right)\times 100$$ (4)

De acordo com Simões, Marotta, Pires, Umbelino e Costa (2001), o IDA satisfatório seria de uma árvore por 100 m² e o ISA de 50% para áreas residenciais. A relação entre o total de árvores adultas e da área verde total de cada quadra com os índices espaciais foi analisada por meio de regressão linear simples. Não foram incluídas mudas no cálculo dos respectivos índices.

3 RESULTADOS E DISCUSSÕES

3.1 Composição e distribuição da arborização nas áreas verdes

No inventário florestal realizado em áreas verdes das 32 quadras residenciais urbanizadas de Palmas/TO foram contabilizadas 10.155 árvores adultas de 179 espécies. Pinheiro, Marcelino e Moura (2018) apresentam a listagem completa das espécies arbóreas das áreas verdes dessas quadras, mostrando a importância e representatividade da arborização nativa do cerrado nessas áreas verdes. As dez espécies mais frequentes totalizaram 54,7% dos indivíduos arbóreos adultos, sendo Caryocar brasiliense Cambess (pequi) a espécie mais abundante com 13,0% do total de indivíduos amostrados (Figura 2). Os indivíduos desta espécie são autóctones, remanescentes da vegetação nativa local, sendo a segunda espécie mais frequente nas quadras residenciais urbanizadas de Palmas/TO (PALMAS, 2015).

Figura 2
Dez espécies adultas mais frequentes nas áreas verdes das quadras urbanizadas de Palmas/TO

Segundo Silva, Paiva e Gonçalves (2007), o percentual de cada espécie deve estar compreendido entre 12 e 15%, a fim de manter a diversidade de espécies na população, evitar paisagens monótonas e um possível ataque de pragas que destruam as árvores. A ausência de dominância arbórea nas áreas verdes das quadras residenciais de Palmas/TO ocorre devido a dois fatores: grande parte da vegetação nativa, que representa um pouco mais de 50% das espécies arbóreas, ser composta por espécies autóctones remanescentes do Cerrado que já existia antes da construção da cidade (PINHEIRO; MARCELINO; MOURA, 2018); e do plantio de mudas, que é realizado pela prefeitura ou população, seguir um padrão de seleção de espécies e distribuição espacial aleatória. Ainda que a população tenha preferência por frutíferas, como o Anacardium occidentale L. (cajueiro) e Mangifera indica L. (mangueira), a diversidade de espécies nas áreas verdes é elevada, totalizando 183 espécies (PINHEIRO; MARCELINO; MOURA, 2020). Nas áreas verdes, o Pinus sp. (pinheiro-americano), encontrado apenas em uma das áreas verdes amostradas, é a única espécie que se distribui de forma homogênea e restrita.

Dentre as espécies mais frequentes destacam-se algumas exóticas consideradas invasoras e, portanto, não recomendadas para arborização urbana, como Mangifera indica L. (mangueira), Pinus sp. (pinheiro-americano), Syzygium cumini (L.) (jamelão) e Corymbia sp. (eucalipto). De acordo com Dias, Da Fonte, Baptista, Mantoani, Holdefer e Torezan (2013) no Brasil são encontradas aproximadamente 54 espécies vegetais exóticas consideradas invasoras. Na área urbana de Curitiba-PR, Biondi e Pedrosa-Macedo (2008) relataram a presença de 21 espécies consideradas invasoras no Brasil, o que representa um risco para a degradação da vegetação nativa remanescente na região. Tamanha preocupação ocorre porque as espécies exóticas invasoras representam a segunda causa mundial de perda de biodiversidade (IUCN, 2000).

3.2 Índices espaciais por região de Palmas/TO

Os valores referentes ao IDA, ISA e o percentual de área verde ocupado em cada uma das regiões de Palmas estão representados respectivamente nas Figuras 3, 4 e 5 e Tabela 1.

Figura 3
Valor médio e amplitude de variação do índice de densidade arbórea (IDA) nas áreas verdes das quadras residenciais por região de Palmas/TO

Figura 4
Valor médio e amplitude de variação do índice de sombreamento arbóreo (IDA) nas áreas verdes das quadras residenciais por região de Palmas/TO

Figura 5
Valor médio e amplitude de variação do percentual de área ocupado pelas áreas verdes nas quadras residenciais por região de Palmas/TO

Tabela 1
Índice de Densidade Arbórea (%IDA), Índice de Sombreamento Arbóreo (%ISA) e percentual de área verde (%AV) por região de Palmas/TO

Região	IDA (%)	ISA (%)	%AV
ARNO	0,79	47,8	11,1
ARNE	0,80	35,1	13,0
ARSO	0,83	37,4	11,3
ARSE	0,90	40,3	9,6
TOTAL	0,83	38,8	11,4

• Fonte: Autores (2022)

Na região ARNO, o IDA foi satisfatório apenas na área verde de uma das quadras (>1%), enquanto o ISA apresentou valores suficientes em três quadras (>50%). Essa foi a região que na média apresentou o índice de sombreamento mais elevado (47,8%) entre todas as regiões de Palmas/TO, no entanto, seu percentual ainda ficou abaixo do mínimo recomendado.

A região ARNE foi a que apresentou maior amplitude na variação do IDA (0 - 2,6%) e ISA (1,7 - 87,3%), bem como a menor proporção de quadras com IDA e ISA satisfatórios, apesar do maior percentual de cobertura de áreas verdes, ocupando em média 13,0% da área das quadras. No somatório, esta foi a região com menor ISA (35,1%) e o segundo menor IDA (0,80%), uma situação preocupante e que pode estar influenciando na formação de ilhas de calor nessa região da cidade, com temperaturas médias de até 7,8^oC acima da média, conforme avaliado por Paz (2010). Ilhas de calor foram igualmente registradas em outras regiões da cidade (SILVA; SOUZA, 2019; GOMES; FUZETO; PRATES, 2020).

Na região ARSO, também foi verificada uma baixa proporção de áreas verdes com índices satisfatórios. No entanto, essa foi a região com o segundo maior IDA médio (0,83%) e o terceiro maior ISA médio (37,4%). Esses índices foram alcançados em função da presença de quadras recentemente urbanizadas, onde o cuidado com a manutenção dos remanescentes de vegetação nativa nas áreas verdes foi maior.

Na região ARSE, que possui o menor percentual médio de área verde (9,6%), o IDA e ISA calculados foram satisfatórios em metade das áreas verdes amostradas. Embora essa região tenha alcançado o maior IDA médio (0,90%), não foi constatada a presença de mudas em nenhuma área verde, o que pode futuramente influenciar negativamente no sombreamento dessas quadras. A arborização e o manejo das áreas verdes são de responsabilidade da prefeitura municipal, que deve atentar para a necessidade de suprir o déficit de arborização, bem como orientar a população quanto ao correto plantio de árvores (PALMAS, 2016).

Neste estudo constatou-se que o tamanho das áreas verdes tende a aumentar com a área da quadra, porém o percentual médio do espaço ocupado pelas áreas verdes ficou em média abaixo do recomendado, perfazendo 11,4% da área das quadras (Tabela 1), valor inferior aos 15% de área verde planejado para cada quadra. Apenas 21,9% das quadras amostradas nas quatro regiões da cidade apresentaram áreas verdes com tamanho superior ou igual ao originalmente planejado. Em algumas quadras, parte da área verde cedeu lugar para a abertura de ruas (110N), estacionamento (105N), construção de igreja (504S), escola (204S), posto de saúde (210S), quartel do corpo de bombeiros (403S), invasão de residências (606S), entre outras obras, uma prática que já havia sido relatada desde o início da construção da cidade por Adorno e Fighera (2005).

A análise de regressão linear simples demonstrou que o IDA e ISA tendem a crescer com o aumento do número de árvores nas áreas verdes (Figura 6), seguindo o mesmo padrão evidenciado por Oliveira, Silva, Fernandes, Santos e Giongo (2018) em Gurupi/TO.

Figura 6
Relação entre o total de árvores adultas e o índice de densidade arbórea (IDA) e índice de sombreamento arbóreo (ISA) das áreas verdes das quadras residenciais urbanizadas de Palmas/TO

Entretanto, ao analisar a relação entre o índice de densidade arbórea e a dimensão das áreas verdes, não há nenhuma tendência perceptível, o que deve estar relacionado à amplitude da variação do IDA entre quadras (0,0% a 2,6%) (Figura 7). Por outro lado, essa relação é negativa quando analisamos o índice de sombreamento, que tende a diminuir com o incremento do tamanho da área verde, mostrando que a arborização é deficiente na maioria das áreas verdes das quadras residenciais urbanizadas (Figura 7). De acordo com o Plano de Arborização Urbana de Palmas/TO, existe um déficit de aproximadamente 100 mil árvores nas áreas verdes da cidade (PALMAS, 2016).

Figura 7
Relação entre o índice de densidade arbórea (IDA) e índice de sombreamento arbóreo (ISA) com a área da área verde das quadras residenciais urbanizadas de Palmas/TO

Pouco mais de um terço das áreas verdes das quadras apresentaram índices de densidade arbórea e de sombreamento satisfatórios, valores aquém do esperado, considerando que as áreas verdes das quadras residenciais foram concebidas para amenização climática local. Em Aracajú/SE e Gurupi/TO, também houve uma baixa proporção de áreas verdes públicas em áreas residenciais com índices de densidade dentro do recomendado (LIMA NETO; MELO; SOUZA, 2009; OLIVEIRA; SILVA; FERNANDES; SANTOS; GIONGO, 2018).

As áreas verdes das quadras que apresentaram índices de densidade e sombreamento satisfatórios correspondem àquelas onde ainda existem remanescentes de vegetação nativa medianamente preservados. Porém, na maioria das áreas verdes, o reduzido número de árvores se deve a supressão parcial ou total de extensas áreas de vegetação nativa e o plantio de espécies arbóreas exóticas que teve início durante os primeiros anos de construção da cidade (ADORNO; FIGHERA, 2005).

Os espaços verdes urbanos podem influenciar significativamente no microclima, reduzindo a temperatura, aumentando a umidade e a velocidade do fluxo de ar, produzindo um efeito positivo no corpo humano e proporcionando uma agradável sensação de conforto térmico (FEYISA; DONS; MEILBY, 2014). Em outras cidades brasileiras onde as temperaturas também são elevadas, como Teresina/PI e Cuiabá/MT, estudos demonstraram o importante papel da vegetação na melhoria microclimática e conforto térmico local ao reduzir as ilhas de calor do meio urbano (IBIAPINO; NÄÄS, 2020; PASA; LENCI; PEREIRA; MIRANDA, 2020).

As ilhas de calor são uma consequência do processo de urbanização que ocorre de acordo com a evolução do crescimento da malha urbana. A vegetação reduzida ou ausente e a concentração de materiais de alta retenção de calor estão entre as principais causas da distribuição espacial e da intensidade da ilha de calor urbana, sendo registrada em cidades de pequeno (ROMERO; SILVA; MARQUES; MACEDO; FARIA; ALVES, 2020), médio (IBIAPINO; NÄÄS, 2020) e grande porte (SIQUEIRA-GAY; DIBO; GIANNOTI, 2017). A presença de ilhas de calor em regiões com déficit de arborização em Palmas/TO revela o descaso do poder público ao descumprir o planejamento original da cidade, que concebeu as áreas verdes não edificantes como ambientes cuja vegetação proporcionaria conforto térmico para seu entorno.

A supressão da vegetação nessas áreas verdes, além de afetar o microclima local, reduz a diversidade, comprometendo diversos serviços ambientais proporcionados pela vegetação local. De acordo com Pinheiro, Marcelino e Moura (2018), mais de 79% das espécies das áreas verdes das quadras residenciais de Palmas/TO apresentam algum tipo de uso medicinal, 66,5% são atrativas para a fauna de vertebrados e invertebrados e 40,7% tem uso na alimentação humana.

O Plano de arborização urbana de Palmas/TO, publicado a mais de seis anos, definiu que a arborização das áreas verdes é uma atribuição exclusiva da prefeitura municipal, e que esta deve seguir as suas recomendações (PALMAS, 2016), a legislação Estadual, no que se refere às espécies arbóreas imunes ao corte (TOCANTINS, 1999) e a legislação federal no caso das espécies ameaçadas (MMA, 2021). Porém, diversas quadras que tiveram a vegetação de suas áreas verdes suprimidas ao longo dos anos (208N, 604N, 403N, 504N, 608N) ainda não foram reflorestadas, refletindo nos baixos valores dos índices espaciais e o descuido do poder público municipal com as áreas verdes.

Estudos demonstram que o arrefecimento promovido pelas árvores pode ocorrer no entorno de áreas verdes bem pequenas de 0,001 ha (GIRIDHARAN; LAU; GANESAN; GIVONI, 2008) e 0,005 ha (REIS; LOPES, 2019). De acordo com Grilo, Pinho, Aleixo, Catita, Silva, Lopes, Freitas, Santos-Reis, Mcphearson e Branquinho (2020), quanto maior a área das copas das árvores nas áreas verdes, maior a redução na temperatura e o aumento na umidade do entorno, sugerindo que mesmo as pequenas áreas verdes devem ser consideradas não apenas como solução para mitigar os efeitos das ilhas de calor, mas também para aumentar a biodiversidade, economizar energia, melhorar a qualidade do ar e a saúde física e mental da população.

4 CONCLUSÕES

A presença de áreas verdes não edificantes e de esporte e lazer nas quadras residenciais de Palmas/TO, criadas para promover a melhoria bioclimática e o entretenimento da população, merece destaque, sendo um dos grandes diferenciais no planejamento da cidade. Entretanto, com exceção de umas poucas áreas verdes onde foi mantida a cobertura vegetal original, a maioria das quadras apresenta déficit de arborização nestes espaços públicos.

O déficit de arborização nas áreas verdes pode estar influenciando na formação de ilhas de calor em algumas regiões da área urbana de Palmas/TO. Estudos que relacionem a cobertura arbórea e as áreas construídas na cidade são necessários para averiguar os fatores responsáveis pela formação dessas ilhas de calor e para a busca de soluções para mitigar os efeitos negativos deste fenômeno à saúde e qualidade de vida da população.

AGRADECIMENTOS

Agradecemos o apoio da Fundação de Apoio Científico e Tecnológico do Tocantins- FAPTO, a Fundação Municipal de Meio Ambiente - FMA de Palmas-TO e a Lojas Havan.

Como citar este artigo

• Pinheiro, R. T.; Moura, D. R.; Marcelino, D. G. Densidade arbórea e sombreamento nas áreas verdes das quadras residenciais de Palmas, Tocantins. Ciência Florestal, Santa Maria, v. 33, n. 2, e71225, p. 1-20, 2023. DOI 10.5902/1980509871225. Disponível em: https://doi.org/10.5902/1980509871225.

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  07 Ago 2023
• Data do Fascículo
  2023

Histórico

• Recebido
  03 Ago 2022
• Revisado
  16 Fev 2023
• Aceito
  21 Jun 2023