Resumo:
O turismo cinematográfico é um segmento que vem ganhando forças nas últimas décadas. Compreender o que induz uma pessoa a realizar viagens a lugares que foram cenários de filmes é importante para o mercado turístico traçar suas estratégias e ações. A saga Harry Potter, escrita por J. K. Rowling, ficou mundialmente famosa quando adaptada para os cinemas pela Warner Bros e tem se relacionado com práticas de turismo cinematográfico em diversos países do mundo, incluindo o Brasil. Tanto os locais descritos nos livros e utilizados nas filmagens da saga, como também equipamentos turísticos inspirados na saga construídos especificamente para captar esse público são visitados por turistas de todo o mundo. Considerando, portanto, sua importância cultural, popularidade e influência no público, escolheu-se a saga cinematográfica Harry Potter como estudo de caso do presente artigo, com o objetivo de analisar o perfil do turista cinematográfico brasileiro fã de Harry Potter. Para tanto, esta investigação buscou identificar as motivações e as práticas do turista cinematográfico brasileiro relacionadas à saga. Foi realizada uma pesquisa exploratório-descritiva com abordagem quantitativa. Como principal resultado, verificou-se que pessoas praticantes do turismo cinematográfico influenciadas por Harry Potter se encaixam no perfil do turista de filme específico, uma vez que realizam suas viagens sendo motivados pelo desejo de conhecer de perto as locações de filmagens.
Palavras-chave:
turismo cinematográfico; turista cinematográfico; motivação; práticas; Harry Potter
Abstract:
Film tourism is a segment that has been gaining strength in recent decades. Understanding what induces a person to travel to places that were once movie sets is important for the tourism market to design its strategies and actions. The Harry Potter saga, made world famous by author J.K. Rowling and adapted for theaters by Warner Bros, has been linked to film tourism practices in several countries around the world, including Brazil. Both the locations described in the books and used in the filming of the saga, as well as the saga-inspired tourist facilities built specifically to capture this audience are visited by tourists from all over the world. Considering, therefore, its cultural importance, popularity and influence on the public, the Harry Potter film saga was chosen as a case study for this article, with the aim of analyzing the profile of the Brazilian film tourist Harry Potter fan. To this end, this research sought to identify the motivations and practices of the Brazilian film tourist related to the saga. Exploratory-descriptive research with a quantitative approach was carried out. As a main result, it was verified that the people who practice film tourism influenced by Harry Potter fit the profile of the specific film tourist, since they make their trips motivated by the desire to get to know the filming locations up close.
Keywords:
Film tourism; Film tourist; Motivation; Practices; Harry Potter
Resumen:
El turismo cinematográfico es un segmento que ha ido cobrando fuerza en las últimas décadas. Entender qué induce a una persona a realizar viajes a lugares que fueron platós de cine es importante para que el mercado turístico diseñe sus estrategias y acciones. La saga de Harry Potter, mundialmente famosa por la autora J.K. Rowling y adaptada para los cines por Warner Bros, ha sido relacionada con prácticas de turismo cinematográfico en varios países del mundo, entre ellos Brasil. Tanto los lugares descritos en los libros y utilizados en la filmación de la saga, como las instalaciones turísticas inspiradas en la saga construidas específicamente para captar a este público son visitados por turistas de todo el mundo. Considerando, por lo tanto, su importancia cultural, popularidad e influencia en el público, se eligió la saga cinematográfica Harry Potter como caso de estudio del presente artículo, con el objetivo de analizar el perfil del turista cinematográfico brasileño fanático de Harry Potter. Para ello, esta investigación buscó identificar las motivaciones y prácticas del turista cinematográfico brasileño relacionadas con la saga. Se llevó a cabo una investigación exploratoria-descriptiva con enfoque cuantitativo. Como principal resultado, se verificó que las personas que practican turismo cinematográfico influenciadas por Harry Potter se ajustan al perfil del turista cinematográfico específico, ya que realizan sus viajes motivados por el deseo de conocer de cerca los lugares de rodaje.
Palabras Clave:
Turismo cinematográfico; Turista cinematográfico; Motivación; Prácticas; Harry Potter
INTRODUÇÃO
A relação entre turismo e cinema ganhou forças nos últimos anos por meio da popularização do acesso às produções audiovisuais. Estudos apontam que produções audiovisuais podem atrair turistas (Mendes, 2010Mendes, A. C. (2010). Showcasing India Unshining Film Tourism in Danny Boyle's Slumdog Millionaire. Third Text, 24, 471-479.; O'Boyle, 2019O'Boyle, N. (2019). Place, Peripherality, and Play: reflections on film Tourism in Ireland. The Journal of Popular Culture, 52 (6), 1355-1371.), além de beneficiar economicamente um destino (Liou, 2010Liou, D. Y. (2010). Beyond Tokyo Rainbow bridge: destination images portrayed in Japanese drama affect Taiwanese tourists perception. Journal of Vacation Marketing , 16(1), 5-15.) a partir da movimentação de vários setores comerciais, como o setor de alimentos e bebidas, meios de hospedagem e empresas relacionadas ao setor audiovisual (Marzal, 2009Marzal, E. O. (2009). Del turismo y el cine al turismo cinematográfico. HER & MUS, 2, 18-25.).
Para Connell (2012Connell, J. (2012). Film tourism e evolution, progress and prospects. Tourism Management, 33, 1007-1029.), o cinema é uma grande ferramenta para a prática do turismo, pois se trata de uma atividade de lazer apreciada pela grande maioria da população mundial e possibilita que as pessoas consigam ter acesso visual a lugares por meio de filmes e séries, induzindo o desejo para conhecer essas localidades. Beeton (2005Beeton, S. (2008). From the Screen to the Field: The Influence of Film on Tourism and Recreation. Tourism Recreation Research, 33 (1), 39-47.) defende que o cinema e a televisão são um fator importante na tomada de decisões das pessoas para conhecer destinos que são retratados em determinada produção audiovisual. Além disso, para Croy & Heitmann (2011Croy, W.; Heitmann, S. (2011). Tourism and film. In: Robinson, P.; Heitmann, P.; Peter, U. (Orgs.). Research Themes for Tourism. Cambridge: CABI. 188-204.), as grandes produções servem como fonte de informações para o turista, pois induzem de forma indireta as atividades que podem ser realizadas e os atrativos turísticos a serem visitados em um determinado destino.
Visitar um local associado a uma determinada obra, cena ou personagem, forma uma proposição de valor simbólico para o indivíduo pós-moderno (Connell, 2012Connell, J. (2012). Film tourism e evolution, progress and prospects. Tourism Management, 33, 1007-1029.). Assim, filmes e séries não ficcionais e fictícios tornam-se motivadores para a visitação das locações e atrativos turísticos relacionados às produções audiovisuais, sobretudo quando o enredo e os elementos visuais da obra estão intimamente relacionados (Beeton, 2005).
Para Jokinen (2018Jokinen, I. (2018). Motives of a Film Tourist - Case: Game of Thrones. Master's thesis, Saimaa University of Applied Sciences Faculty of Tourism and Hospitality, Imatra Degree Programme in Hotel, Restaurant and Tourism Management .), as obras audiovisuais, como filmes e séries, transportam as pessoas para outra história, outro mundo e a relação do turismo com o cinema permite vivenciar essas histórias. Nesse sentido, o envolvimento do público com determinada produção pode levar a uma conexão com os lugares, as histórias e os personagens retratados, e este envolvimento influencia de forma positiva as intenções de viagem para locais retratados nas produções (Fu, 2016) afetando as experiências turísticas (Kim, 2012Kim, S. (2012). The relationships of on site film tourism experiences, satisfaction, and behavioral intentions: the case of Asian audience's responses to a Korean historial TV drama. Journal of Travel & Tourism Marketing, 29(5), 472-484. ; Kim & Assaker, 2014Kim, S.; Assaker, G. (2014). An empirical examination of the antecedents of film tourism experience: a structural model approach. Journal of Travel & Tourism Marketing , 31(2), 251-268. ; Roesch, 2009Roesch, S. (2009). The Experiences of Film Location Tourists. Clevedon: Channel View Publications .; Lade et al., 2020Lade, C. et al. (2020). The Future of Film Tourism. In: LADE, Clare et al. (Orgs.). International Tourism Futures: The Drivers and Impacts of Change. Oxford: Goodfellow Publishers, 103-116.).
É nesse contexto que emerge o turismo cinematográfico enquanto um segmento turístico no qual quaisquer produções audiovisuais (filme, televisão, mídia digital, etc.) induzem as pessoas a visitar os locais em que ocorreram as filmagens ou a participar de outras atividades vinculadas ao mundo audiovisual, tais como: visitar estúdios cinematográficos, parques temáticos ou participar de eventos de fãs associados a obras audiovisuais (Beeton, 2005; Connell, 2012Connell, J. (2012). Film tourism e evolution, progress and prospects. Tourism Management, 33, 1007-1029.).
O interesse por pesquisas que envolvem este segmento cresceu nas últimas décadas e autores como Riley e Van Doren (1992Riley, R.; Van Doren, C. (1992). Movies as tourism promotion: a "pull" in a "push" location. Tourism Management , 13 (3), 267-274.), Schofield (1996Schofield, P. (1996). Cinematographic images of a city. Tourism Management , 17 (5), 333-340.), Tooke e Baker (1996Tooke, N.; Baker, M. (1996). Seeing is believing: the effect of film on visitor numbers to screened locations. Tourism Management ,17 (2). 87-94.) e Riley, Baker e Van Doren (1998Riley, R., Baker, D.; Van Doren, C. S. (1998). Movie induced tourism. Annals of Tourism Research, 25 (4), 919-935.) na década de 1990, Busby e Klug (2001Busby, G.; Klug, J. (2001). Movie-induced tourism: The challenge of measurement and other issues. Journal of Vacation Marketing, 7(4), 316-332. ), Macionis (2004Macionis, N. (2004). Understanding the Film-Induced Tourist. In: Frost, W. et al. (Orgs.). International Tourism and Media Conference Proceedings. Melbourne: Tourism Research Unit, Monash University. 86-97.), Hudson e Ritchie (2006Hudson, S.; Ritchie, J. (2006). Promoting destinations via film tourism: an empirical identification of supporting marketing initiatives. Journal of Travel Research, 44(4), 387-396. ), Beeton (2008Beeton, S. (2008). From the Screen to the Field: The Influence of Film on Tourism and Recreation. Tourism Recreation Research, 33 (1), 39-47.), Hudson (2011Hudson, S. (2011). Working together to leverage film tourism: collaboration between the film and tourism industries. Worldwide Hospitality and Tourism Themes, 3(2), 165-172.), Lundberg, Ziakas e Morgan (2017Lundberg, C., Ziakas, V., & Morgan, N. (2017). Conceptualising on-screen tourism destination development. Tourist Studies, 18(1), 83-104. ), a partir do ano 2000, passaram a examinar os impactos induzidos pelas produções audiovisuais, bem como as intenções de viagens do turista, suas experiências e as motivações para visitar os destinos que visualizaram em obras audiovisuais. Deve-se destacar, ainda, a emergência do interesse também no campo institucional, a partir de publicações do Ministério do Turismo no Brasil, da Organização Mundial do Turismo e de outras entidades internacionais (Brasil, 2007Brasil (2007). Turismo cinematográfico brasileiro. Brasília: MTur.; Atout France, 2014Atout France (2014). Tourisme et Cinema - Comment dynamiser son territoire par l'audiovisuel. Paris: Atout France.; LATC, 2015LATC - Latin American Training Center. (2015). Guia para Film Commssions no Brasil: Orientação básica para a implantação e operação de um escritório de apoio às produções audiovisuais em um município ou estado do Brasil. Rio de Janeiro: Latin American Training Center.; UNWTO & NETFLIX, 2021UNWTO - World Tourism Organization; NETFLIX. (2021). Cultural Affinity and Screen Tourism - The Case of Internet Entertainment Services. Madrid: UNWTO.).
No Brasil, a produção científica sobre turismo e cinema é ainda mais recente, sendo de 2011 o primeiro artigo publicado em periódico nacional (Körössy et al., 2021Körössy, N.; Paes, R. G.; Cordeiro, I. (2021). Estado da arte sobre turismo e cinema no Brasil: uma revisão integrativa da literatura. PODIUM Sport, Leisure and Tourism Review, 10(1), 109-140.). Tal produção, segundo Körössy et al. (2021), é formada principalmente por estudos empíricos com foco em três temáticas: audiovisual, enquanto vetor de imagem, e promoção de destinos turísticos; estudos sobre imagem de localidades retratadas em produções audiovisuais; e práticas ou potencialidades do cinematográfico em cidades brasileiras. Assim, percebe-se, na literatura nacional, a ausência de estudos mais específicos sobre o comportamento da demanda brasileira relacionada ao turismo cinematográfico.
Por esse motivo, a fim de contribuir para o avanço dos estudos desta área, o presente artigo tem como foco o perfil de turistas cinematográficos. Como estudo de caso, selecionou-se a saga Harry Potter, mundialmente famosa, escrita por J. K. Rowling e adaptada para o cinema pela Warner Bros, por esta se relacionar com práticas de turismo cinematográfico realizadas tanto no Brasil como no exterior. Os locais descritos nos livros e utilizados nas filmagens da saga são visitados por turistas de todo o mundo e resultaram em um aumento de 100% no número de visitas a locais apresentados nos filmes na época do lançamento de suas primeiras adaptações (Mintel, 2003Mintel International (2003). 'Film tourism: the global picture', Travel and tourism analyst, October.).
A história do bruxo mais famoso do mundo deixou de ser apenas um tópico literário e se tornou um tema sociocultural, sendo adaptada, inicialmente, para os cinemas, com oito filmes lançados entre os anos de 2001 e 2011 e, mais tarde, nas diversas mídias digitais, com sucesso entre o público de diversas faixas etárias da época (Andrade, 2019Andrade, F. (2019). “Ele vai ser famoso, uma lenda”: Harry Potter, do público infantil ao adulto, dos livros às telas. In: Santos, A. et al. (Orgs.). Tramas e sentidos na Literatura Infantil e Juvenil. Rio de Janeiro: Dialogarts, 2019, 73-96.). E, mesmo após 20 anos do lançamento do primeiro filme, Harry Potter se mantém relevante para grande parte da indústria do entretenimento (Andrade, 2019Andrade, F. (2019). “Ele vai ser famoso, uma lenda”: Harry Potter, do público infantil ao adulto, dos livros às telas. In: Santos, A. et al. (Orgs.). Tramas e sentidos na Literatura Infantil e Juvenil. Rio de Janeiro: Dialogarts, 2019, 73-96.).
Considerando, portanto, a importância cultural, popularidade e influência desta produção audiovisual no comportamento de um nicho de turistas brasileiros, buscou-se compreender o perfil e as práticas de turistas brasileiros que foram motivados/influenciados a viajar após assistirem a alguma obra da saga e/ou por se considerarem fãs. Em outras palavras, este artigo busca analisar o perfil do turista cinematográfico brasileiro relacionado à saga cinematográfica de Harry Potter, concentrando-se nas características socioeconômicas, motivações e as práticas realizadas na viagem relacionadas à saga.
Espera-se que os achados desta pesquisa possam contribuir para o planejamento e desenvolvimento do segmento em destinos turísticos e direcionar novas possibilidades de pesquisas para o turismo cinematográfico no cenário nacional.
Este artigo está dividido em cinco partes, que correspondem aos diferentes momentos da pesquisa, sendo elas: Introdução, Revisão de Literatura, Procedimentos Metodológicos, Resultados e Discussão, e, por fim, as conclusões.
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Turismo cinematográfico
O turismo cinematográfico é considerado um segmento em crescimento, impulsionado pelo aumento da indústria do entretenimento e das viagens, movimentando a economia e diversificando a atividade turística (Kim, 2012Kim, S. (2012). The relationships of on site film tourism experiences, satisfaction, and behavioral intentions: the case of Asian audience's responses to a Korean historial TV drama. Journal of Travel & Tourism Marketing, 29(5), 472-484. ). Para Busby & Klug (2001Busby, G.; Klug, J. (2001). Movie-induced tourism: The challenge of measurement and other issues. Journal of Vacation Marketing, 7(4), 316-332. ), Roesch (2009Roesch, S. (2009). The Experiences of Film Location Tourists. Clevedon: Channel View Publications .) e Hudson & Ritchie (2006Hudson, S.; Ritchie, J. (2006). Promoting destinations via film tourism: an empirical identification of supporting marketing initiatives. Journal of Travel Research, 44(4), 387-396. ) o turismo cinematográfico está relacionado às visitas a um destino ou atrativos decorrentes de sua aparição não apenas no cinema, mas também em outras mídias, incluindo televisão e internet.
Segundo Beeton (2005), esse segmento pode ser classificado em diferentes tipologias: on-location (na locação), off-location (fora da locação), commercial (comercial), mistaken identities (identidades erradas) e one-off events (eventos únicos). Para Beeton (2005), o turismo on-location ocorre quando a locação do filme é uma atração por si só e com influência para motivar os turistas a incluir em suas viagens visitas a lugares utilizados em produções audiovisuais, como uma atividade no período de suas férias/feriados, com o intuito de homenagear os filmes e possivelmente realizar reconstruções de cenas marcantes.
Já o off-location é compreendido como o turismo que ocorre em lugares artificiais criados e ambientados especificamente para as gravações das produções, por exemplo, o desenvolvimento de estúdios cinematográficos e parques temáticos. Essas construções têm como principais características as noções de representação, simulação, imersão, realidade aumentada e buscam atrair demanda por meio do contato com os processos de filmagens das produções (Beeton, 2005).
A classificação one-off events abrange festivais de cinema que buscam atrair cinéfilos e fãs para uma determinada cidade em prol da participação de exibições de filmes, estreias e eventos voltados para fãs, como a Comic-Com, em que os visitantes se vestem como seus personagens favoritos e buscam conhecer os profissionais, cineastas e atores, responsáveis pelas grandes produções (Beeton, 2005). Por sua vez, a tipologia commercial tem como principal objetivo criar atrativos turísticos e influenciar a prática da atividade a partir do sucesso do filme após o seu lançamento no mercado (Beeton, 2005). Este tipo de turismo também pode ser classificado como on-location ou off-location, pois se relaciona com lugares reais ou artificiais. Isso porque geralmente passeios são organizados para as locações das produções audiovisuais ou ainda são criados parques temáticos e museus a partir de estúdios construídos para as grandes produções (Lin & Huang, 2008Lin, Y.; Huang, J. (2008). Analyzing the use of TV miniseries for Korea tourism marketing. Journal of Travel & Tourism Marketing , 24(2-3), 223-227. ; Kim & Nam, 2015Kim, S.; Nam, C. (2015). Hallyu Revisited: Challenges and Opportunities for the South Korean Tourism. Asia Pacific Journal of Tourism Research, 21(5), 524-540.; Lundberg, Ziakas, & Morgan, 2017Lundberg, C., Ziakas, V., & Morgan, N. (2017). Conceptualising on-screen tourism destination development. Tourist Studies, 18(1), 83-104. ), com a finalidade de atrair fãs (Beeton & Cavicchi, 2015Beeton, S.; Cavicchi, A. (2015). Not quite under the Tuscan sun... the potential of film tourism in Marche Region. AlmaTourism, 4, 146-160. ).
Questões financeiras ou logísticas eventualmente podem impedir cineastas e produtores audiovisuais de conseguir realizar filmagens nas locações em que as produções audiovisuais deveriam ser ambientadas, dando origem a produções do tipo runaway (produção em fuga). Trata-se de um termo para caracterizar as produções cujo roteiro é pertencente a um determinado destino, porém, suas filmagens ocorrem em outra localidade (Peltzman, 2012Peltzman, D. (2012). The Impact of Runaway Productions on Hollywood Labor Organizations. InMedia, The French Journal of Media Studies, 1-9. ). Esses casos fazem com que a tipologia de turismo cinematográfico conhecida como mistaken identities ocorra. Para Beeton (2005), essa tipologia acontece sempre que um filme ou série desperta interesse da demanda em um determinado país, região ou lugar onde a história se ambienta, mas não foi realmente filmado ali (Beeton, 2005).
O Turista Cinematográfico
O turista possui uma natureza heterogênea de múltiplas motivações que podem contribuir para um comportamento que induz a diferentes práticas do turismo. O turista cinematográfico é definido por Riley, Baker & Van Doren (1998Riley, R., Baker, D.; Van Doren, C. S. (1998). Movie induced tourism. Annals of Tourism Research, 25 (4), 919-935., p. 920, tradução própria) como “uma pessoa que busca um local que é visto em uma tela prateada”. Em outras palavras, este tipo de turista visita um destino turístico motivado por produções audiovisuais e viaja em busca de reproduzir atividades que ocorreram naquela determinada produção. Para Polianskaia, Rãdut e Stanciulescu (2016Polianskaia, A.; Rãdut, C.; Stanciulescu, G. C. (2016). Film Tourism responses to the tourist's expectations new challenges. SEA - Practical Application of Science, 4(1), 149-156), esses turistas que viajam com motivação principal baseada em produções audiovisuais são chamados de film location tourists.
Macionis (2004Macionis, N. (2004). Understanding the Film-Induced Tourist. In: Frost, W. et al. (Orgs.). International Tourism and Media Conference Proceedings. Melbourne: Tourism Research Unit, Monash University. 86-97.) classifica os turistas cinematográficos em três tipos, baseando-se na forma como eles visitam e interagem com os destinos turísticos utilizados como sets de gravações: serendipitous film tourist (turista cinematográfico casual), general film tourist (turista cinematográfico de cinema em geral) e specific film tourism (turistas cinematográficos de filmes específicos).
O turista casual pode visitar um local de filmagem por acaso, ou como uma atividade secundária. Neste sentido, o turista escolhe o destino por outros motivos, que não estão relacionados ao turismo cinematográfico, mas visita locações e/ou atrações turísticas relacionadas às produções cinematográficas como atividade secundária (Azcue, 2014Azcue, J. D. (2014). Análisis de la imagen de destino a través de la cinematografía: Málaga. Facultad de Turismo Máster Oficial en Dirección y Planificación del Turismo. Universidad de Málaga. Málaga, Espanha. ; Melo, 2021Melo, P. F. C. (2021). CINEMA E TURISMO EM CABACEIRAS: uma análise da atuação dos agentes públicos no desenvolvimento do Turismo Cinematográfico. 2021. 265 p. Dissertação (Mestrado em Hotelaria e Turismo) - Universidade Federal de Pernambuco, Recife.). Já o turista de cinema geral não visita um lugar porque ele apareceu em um filme. Nesse caso, o turista visita um destino que serviu de cenário para produções audiovisuais, porém sem a intenção de visitar as locações, e sim, o próprio destino (Azcue, 2014). O cinema aqui atua como um difusor de imagens do destino para potenciais turistas que desejam conhecer apenas os destinos, sem o interesse de visitar locações ou atrativos turísticos relacionados às produções audiovisuais (Polianskaia, Rãdut, & Stanciulescu, 2016Polianskaia, A.; Rãdut, C.; Stanciulescu, G. C. (2016). Film Tourism responses to the tourist's expectations new challenges. SEA - Practical Application of Science, 4(1), 149-156; Melo, 2021).
Por fim, o turista de filmes específicos tem como principal objetivo em suas viagens visitar locais de forma ativa que possuam ligações com as produções audiovisuais, ou seja, se refere ao fato de que filmes e demais produções audiovisuais têm efeito indutor para o turismo, atraindo pessoas para visitarem locações retratadas nas produções audiovisuais (Tooke & Baker, 1996Tooke, N.; Baker, M. (1996). Seeing is believing: the effect of film on visitor numbers to screened locations. Tourism Management ,17 (2). 87-94.; Riley, Baker, & Van Doren, 1998Riley, R., Baker, D.; Van Doren, C. S. (1998). Movie induced tourism. Annals of Tourism Research, 25 (4), 919-935.; Busby, Huang, & Jarman, 2012Busby, G.; Huang, R.; Jarman, R. (2012). The stein effect: an alternative film induced tourism perspective. International Journal of Tourism Research, 15(6), 570-582. ). Nesse sentido, Singh & Best (2004Singh, K.; Best, G. (2004). Film-Induced Tourism : Motivations of Visitors to the Hobbiton Movie Set as Featured in The Lord Of The Rings. In: Frost, W.; Croy, G.; Beeton, S. (orgs). International Tourism and Media Conference Proceedings . 24th-26th November 2004. Melbourne: Tourism Research Unit, Monash University , 98-111.) apontam que as atrações icônicas, ou seja, as representações realizadas nas produções audiovisuais são os principais motivos para que os turistas visitem as locações. Desse modo, as pessoas sentem o desejo de vivenciar e ter experiências que retratem as suas cenas favoritas em produções audiovisuais.
Sobre as motivações do turista cinematográfico, a teoria de motivação dos fatores push and pull (impulso e atração) (Dann apudMacionis, 2004Macionis, N. (2004). Understanding the Film-Induced Tourist. In: Frost, W. et al. (Orgs.). International Tourism and Media Conference Proceedings. Melbourne: Tourism Research Unit, Monash University. 86-97.) propõe uma estrutura para investigar a motivação desse tipo de turista. Dann (apud Macionis, 2004) define fatores de atração como sendo elementos externos que estão associados às características tangíveis que existem no destino e que os turistas podem desfrutar, como atrativos naturais, culturais e gastronomia. Já os fatores de impulso estão associados aos elementos internos de um indivíduo que despertam o desejo para a realização de uma viagem, como fuga da rotina, nostalgia, entre outros. Nesse contexto, Macionis (2004) ressalta o papel da produção audiovisual como fonte de informação, ou fator de atração, e sua influência na motivação do turista como fator de impulso e na tomada de decisão de viajar para um destino.
Segundo Melo, Costa e Korossy (2023Melo, P. F. C.; Costa, M. F.; & Korossy, N. (2023). Turistas psicocêntricos e os fatores influenciadores no valor de compra hedônico de um destino turístico de massa. PODIUM Sport, Leisure and Tourism Review , 12(1), 1-37.), dentre os autores que dialogam sobre motivação, a teoria Push-Pull de Crompton (1979) é uma teoria de motivação bastante aplicada ao turismo a qual explica as diferentes necessidades e desejos dos turistas:
Assim, as motivações denominadas de Push são aquelas que motivam as pessoas a realizarem uma viagem a partir da auto realização, interação social e status (Abosag & Farah, 2014), ou seja, está associado às necessidades e desejos individuais. Além disso, pode-se dizer que a motivação push relaciona-se com questões intangíveis peculiares ao viajante, como o desejo de fuga, sair da rotina, descanso, aventura e status (Uysal & Hagan, 1993). Já a motivação denominada Pull está relacionada com fatores externos, que independem do turista (Abosag & Farah, 2014), ou seja, está associado ao próprio destino, e não com as necessidades ou valores pessoais do turista (Caber & Albayrak, 2016). Assim, a motivação push aborda os desejos e necessidades do turista em viajar, enquanto a motivação pull explicaria a seleção do destino a partir dos fatores atribuídos a ele (Melo, Costa, & Korossy, 2023Melo, P. F. C.; Costa, M. F.; & Korossy, N. (2023). Turistas psicocêntricos e os fatores influenciadores no valor de compra hedônico de um destino turístico de massa. PODIUM Sport, Leisure and Tourism Review , 12(1), 1-37., p. 12).
Logo, a literatura apresenta uma variedade de estímulos ou fatores de impulso que podem ser associados às visitações dos destinos cinematográficos, sendo eles: viver uma experiência fantástica, fuga da realidade, escapar da rotina, momento de relaxamento, status na sociedade, busca pelo autoconhecimento, participação de uma experiência única, sendo que alguns tipos de motivações podem prevalecer nas diferentes classificações de turistas cinematográficos. Desse modo, os turistas casuais são aqueles cujas motivações incluem interação social e novidades; os turistas de cinema em geral têm seus estímulos focados nas novidades, educação e nostalgia; e os turistas de filmes específicos são impulsionados pela aspiração da autoatualização, identidade própria, fantasia, atividades românticas e nostálgicas (Macionis, 2004Macionis, N. (2004). Understanding the Film-Induced Tourist. In: Frost, W. et al. (Orgs.). International Tourism and Media Conference Proceedings. Melbourne: Tourism Research Unit, Monash University. 86-97.).
Ao reconhecer a existência dessas motivações ou fatores de impulso, Macionis (2004Macionis, N. (2004). Understanding the Film-Induced Tourist. In: Frost, W. et al. (Orgs.). International Tourism and Media Conference Proceedings. Melbourne: Tourism Research Unit, Monash University. 86-97.) aborda o princípio da motivação do fator de atração para classificar as atrações de um destino em uma estrutura conhecida como “3P”: Place (lugar) se refere aos atributos de localização, cenário, paisagens, clima, origem cultural, origem social e origem da atividade; Personality (personalidade) relacionado ao elenco, personagens e celebridades; e Performance (desempenho) que são os atributos relacionados à trama, tema e gênero do filme.
O lugar é um fator que trata do destino em si, portanto, está relacionado ao produto do turismo, e é necessário focar na promoção e desenvolvimento da localidade, considerando as produções audiovisuais um recurso para esta finalidade no turismo cinematográfico (Macionis, 2004Macionis, N. (2004). Understanding the Film-Induced Tourist. In: Frost, W. et al. (Orgs.). International Tourism and Media Conference Proceedings. Melbourne: Tourism Research Unit, Monash University. 86-97.). Dessa forma, o elemento de lugar é explorado como fator de atração, em razão de envolver peculiaridades da localidade escolhida para a realização das filmagens, uma vez que são rapidamente vistas pelo consumidor, ou seja, as produções audiovisuais são aspectos relevantes para atrair visitantes a destinos que, muitas vezes, não teriam visualização anteriormente à reprodução dessas locações na mídia (Macionis, 2004).
No caso da personalidade, trata-se do interesse acerca dos personagens dos filmes que são protagonistas das produções audiovisuais e que as pessoas são fãs (Macionis, 2004Macionis, N. (2004). Understanding the Film-Induced Tourist. In: Frost, W. et al. (Orgs.). International Tourism and Media Conference Proceedings. Melbourne: Tourism Research Unit, Monash University. 86-97.). Já o desempenho argumenta sobre a imaginação e desejo, sendo os turistas atraídos pela história que envolve o filme e pela vida dos personagens retratado nos ambientes de filmagem, a narrativa, o cenário observado e a aspiração de se conectar com a trama e elenco (Macionis, 2004).
Os turistas cinematográficos costumam vivenciar os lugares visitados não como lugares reais, mas como lugares associados a um determinado filme, ou seja, ao ser atraído para um determinado destino, o turista raramente quer ter apenas o papel de observador passivo e busca interagir de todas as formas possíveis (Roesch, 2009Roesch, S. (2009). The Experiences of Film Location Tourists. Clevedon: Channel View Publications .). Dentre as diferentes atividades turísticas realizadas por esses turistas estão: interpretações cênicas, manuseio de itens relacionados às produções, posicionamento de miniaturas, recriações de cenas, interação com placas de sinalização e coleta de lembranças (Roesch, 2009Roesch, S. (2009). The Experiences of Film Location Tourists. Clevedon: Channel View Publications .).
Interpretações cênicas não estão necessariamente relacionadas a uma cena em específico, mas ocorre quando um indivíduo representa um personagem, reproduzindo falas e ações dos filmes (Roesch, 2009Roesch, S. (2009). The Experiences of Film Location Tourists. Clevedon: Channel View Publications .). Um exemplo são as pessoas que passam a agir como Bellatrix Lestrange (personagem de Harry Potter), repetindo suas falas. Neste momento, o reconhecimento do valor presente no local é importante, em razão de que a cena será registrada mediante fotografias e deverá conter o máximo de aspectos semelhantes aos que aparecem nas cenas dos filmes. Para que isso aconteça, os turistas comumente recorrem à utilização de imagens dos filmes para conseguir encontrar as posições ideais (Roesch, 2009).
O manuseio de itens relacionados ao filme ocorre em visitas a locações e os guias de turismo costumam fornecer réplicas exatas dos filmes ou itens reais utilizados nas produções que os turistas podem olhar, tocar e posar para fotos aumentando a autenticidade da experiência (Roesch, 2009Roesch, S. (2009). The Experiences of Film Location Tourists. Clevedon: Channel View Publications .). Exemplos relacionados a Harry Potter são: varinhas de bruxos, partes de fantasias do uniforme de Hogwarts ou roteiros.
A interação com placas de sinalização diz respeito às placas que descrevem lugares específicos auxiliando os turistas na identificação das locações, principalmente para aqueles que realizam viagens por conta própria (Roesch, 2009Roesch, S. (2009). The Experiences of Film Location Tourists. Clevedon: Channel View Publications .). Esses espaços também são registrados pelos turistas cinematográficos como uma forma de elucidar sua passagem naquele ambiente. A exemplo, pode-se mencionar a primeira passagem de Harry Potter pela Plataforma 9 – da estação ferroviária King’s Cross em Londres, ao embarcar no Expresso de Hogwarts.
Por fim, o posicionamento em miniatura abrange atividades em que um turista se encontra na posse de miniaturas dos personagens ou itens de um filme para tirar fotografias (Jokinen, 2018Jokinen, I. (2018). Motives of a Film Tourist - Case: Game of Thrones. Master's thesis, Saimaa University of Applied Sciences Faculty of Tourism and Hospitality, Imatra Degree Programme in Hotel, Restaurant and Tourism Management .), como as fotos com a maquete da escola de Hogwarts em visitações pela Warner Bros Studios. Outras atividades, como relacionar-se com outros fãs de um filme, conhecer os criadores e os atores das sagas, obter autógrafos, tirar fotos ou ir para um concerto musical com os músicos que compuseram a trilha sonora e/ou uma peça de teatro relacionada à produção cinematográfica, também podem ser relacionadas como práticas do turista cinematográfico (Jokinen, 2018; Roesch, 2009Roesch, S. (2009). The Experiences of Film Location Tourists. Clevedon: Channel View Publications .).
Para uma melhor compreensão, segue o quadro com os constructos e respectivos autores que dialogam sobre as questões abordadas, os quais foram utilizados para a definição das categorias de análise empregadas no estudo do caso empírico e construção do instrumento de coleta dos dados.
METODOLOGIA
Este tópico tem por objetivo apresentar o conjunto de procedimentos metodológicos empregados no desenvolvimento da presente pesquisa. Como trilha metodológica, adotou-se a pesquisa exploratório-descritiva, fazendo-se uso da pesquisa bibliográfica e da pesquisa de campo. A pesquisa é caracterizada como estudo de caso com abordagem quantitativa para coleta e análise dos dados por meio da aplicação de uma survey (Malhotra, 2012Malhotra, N. K. (2012). Pesquisa de Marketing: uma orientação aplicada. 6th ed. Bookman.).
A pesquisa teve início com o levantamento bibliográfico sobre a prática do turismo cinematográfico e sua demanda, buscando desenvolver uma base conceitual sólida para a realização da revisão de literatura, uma vez que é a partir desse processo que surgem novas teorias, possíveis lacunas, possibilidade de análise crítica (Vosgerau & Romanowski, 2014Vosgerau, D. S. R.; Romanowski, J. P. (2014). Estudos de revisão: implicações conceituais e metodológicas. Revista Diálogo Educacional, 14 (41), 165-189.) e, consequentemente, pesquisas futuras (Botelho, Cunha, & Macedo, 2011Botelho, L. L. R.; Cunha, C. C. D. A.; & Macedo, M. (2011). O método da revisão integrativa nos estudos organizacionais. In: Gestão e Sociedade, 5 (11), 121-136.).
Para a condução da pesquisa bibliográfica, foram consultados o portal de Periódicos Capes e o Google Acadêmico. A partir do objetivo da pesquisa e para assegurar que os resultados encontrados fossem relevantes para este estudo, foram utilizadas as seguintes palavras-chave nos idiomas português e inglês: (1) turismo cinematográfico; (2) turista cinematográfico; (3) demanda turística; (4) motivação; (5) tomada de decisão. Buscando nortear o contexto central do estudo, procurou-se identificar todos os artigos que discutissem sobre turismo cinematográfico para posteriormente selecionar os artigos que tratam especificamente sobre demanda do turismo cinematográfico em um destino turístico. Para tanto, foi necessário estipular os critérios de inclusão e exclusão dos artigos, a fim de obter informações relevantes para esta pesquisa. Dessa forma, foram selecionados apenas artigos que estivessem publicados no idioma inglês ou em português, sendo excluídos artigos científicos em outros idiomas e que os descritores não estivessem presentes em destaque como palavra-chave, resumo ou no título do paper. Essa etapa da pesquisa permitiu a construção do quadro teórico de análise para investigação do caso empírico.
Para realização do estudo de caso, relacionado à análise do perfil e das práticas dos turistas cinematográficos brasileiros que tiveram contato com a saga de Harry Potter, foi feita uma pesquisa de campo para coleta de dados. Considerando o cenário brasileiro impactado pela pandemia, uma pesquisa de cunho virtual foi considerada condizente com o levantamento. Sendo assim, a estratégia de pesquisa utilizada foi de aplicação de uma survey online em plataformas virtuais, metodologia alinhada à natureza quantitativa deste estudo.
População e amostra de estudo
A triagem dos participantes iniciou-se com base no critério do acesso à internet, já que se trata de um questionário online. A população foi baseada nas pessoas de nacionalidade brasileira, residentes no Brasil, de diferentes faixas etárias que tiveram contato com pelo menos um dos filmes da saga Harry Potter - Pedra Filosofal, Câmara Secreta, Prisioneiro de Azkaban, Cálice de Fogo, Ordem da Fênix, Enigma do Príncipe, Relíquias da Morte parte 1 e 2 - e que tivessem realizado pelo menos uma viagem e/ou participado de eventos e atividades de lazer relacionadas à saga.
Procedimentos para coleta de dados
Após definição dos critérios de inclusão para participação da pesquisa, foi elaborado o instrumento de coleta de dados. Optou-se por um questionário estruturado, do tipo survey online, de autopreenchimento, disponibilizado e acessado por meio da plataforma digital do Google Forms.
O questionário foi elaborado, a fim de identificar o perfil, as motivações e as práticas do turista cinematográfico brasileiro relacionado à saga Harry Potter, tendo-se adaptado o modelo de survey proposto por Jokinen (2018Jokinen, I. (2018). Motives of a Film Tourist - Case: Game of Thrones. Master's thesis, Saimaa University of Applied Sciences Faculty of Tourism and Hospitality, Imatra Degree Programme in Hotel, Restaurant and Tourism Management .). Iniciou-se a survey com uma breve apresentação da pesquisa, seguida por 26 questões no total, das quais 16 foram perguntas fechadas, 2 de múltiplas escolhas, 6 abertas e 2 de grades de múltipla escolha.
Após elaboração do instrumento, foi realizado um pré-teste virtual com 11 indivíduos. Nesta etapa, foram obtidos feedbacks dos respondentes e o instrumento passou por um processo de refinamento da sua estrutura e do seu conteúdo. Após validação, a coleta foi iniciada no dia 11/07/2021, por meio do envio do link de acesso do formulário online, e finalizada no dia 28/07/2021, totalizando 17 dias ininterruptos de coleta.
Para alcançar um público representativo, algumas estratégias foram seguidas para a realização da coleta. Inicialmente, destaca-se a divulgação da survey em grupos de discussão no Facebook destinados aos fãs da saga Harry Potter (quadro 2), além do compartilhamento nas redes sociais Twitter, Instagram e no WhatsApp. A técnica escolhida para alcançar o público alvo foi a snowball, que se caracteriza pela divulgação da pesquisa por meio de indicações entre indivíduos, possibilitando o compartilhamento em grupos sociais diversos (Bickman & Rog, 1997Bickman, L.; Rog, D.J. (1997). Handbook of applied social research methods. Thousand Oaks, Sage.).
Para seleção dos informantes da pesquisa, considerou-se como requisito ter realizado algum tipo de viagem motivada ou com algum interesse na saga. Sendo assim, do total de 146 questionários respondidos, foi necessário excluir aqueles cujos respondentes nunca haviam realizado viagens motivadas e ou relacionadas à referida saga, tendo-se chegado a um total de 86 questionários válidos para o estudo. Assim, consideraram-se para a amostra da pesquisa apenas as pessoas que haviam realizado, nos últimos anos, alguma viagem ou atividades relacionadas à saga Harry Potter.
Aos dados coletados foi conferido um tratamento estatístico descritivo, condizente com o caráter quantitativo da pesquisa exploratório-descritiva. Para a elaboração dos gráficos, o programa utilizado foi o Microsoft Excel. Após os gráficos gerados, as análises foram realizadas com base na teoria sobre as motivações e atrações induzidas por filmes de Macionis (2004Macionis, N. (2004). Understanding the Film-Induced Tourist. In: Frost, W. et al. (Orgs.). International Tourism and Media Conference Proceedings. Melbourne: Tourism Research Unit, Monash University. 86-97.), experiência dos turistas em locações de filmes de Roesch (2009Roesch, S. (2009). The Experiences of Film Location Tourists. Clevedon: Channel View Publications .) e tipologias do turismo cinematográfico de Beeton (2005).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Perfil e atividades realizadas pelos turistas
Primeiramente, foi realizado um delineamento do perfil demográfico dos respondentes. Entre os respondentes, verifica-se a predominância de pessoas que se identificam com o gênero feminino, totalizando quase 67,4% que já tiveram contato com os filmes e/ou realizaram alguma atividade de turismo cinematográfico a partir dos filmes de Harry Potter (quadro 3).
Pessoas com idade entre 25 a 39 anos representam a maior parcela dos informantes, seguida pelo público na faixa etária entre 15 a 24 anos. Inicialmente, o enredo da história foi voltado para o público infantojuvenil e, com passar dos anos, se popularizou entre pessoas de todas as idades. Após 10 anos do lançamento do seu último filme nos cinemas - Harry Potter e as Relíquias da Morte Parte 2, em 2011 - a saga continua se popularizando entre as pessoas por meio de outras produções audiovisuais baseadas no mesmo universo, conhecida como a franquia de filmes Animais Fantásticos.
Em relação ao estado civil dos respondentes, observa-se que solteiro representa quase 63% das pessoas que tiveram algum tipo de contato audiovisual e realizaram atividades turísticas relacionadas a Harry Potter, o que pode ser entendido pela predominância do público jovem. Já o nível de escolaridade que predominou nesta pesquisa foram as pessoas que possuem ensino superior completo (36,4%) e pós-graduação (27,9%) e uma pequena parcela de 10,5% estudou até o ensino médio. Quanto à ocupação profissional do público-alvo, identificou-se que os servidores públicos e assalariados representam 40,7% do público que teve uma atividade/viagem relacionada à Harry Potter, seguidos pelos estudantes que representam 24,4% do total.
Além disso, no perfil sociodemográfico foi identificado que mais da metade (52,3%) da demanda é composta por respondentes do estado de Pernambuco (52,3%). Na sequência, por ordem de importância, os estados São Paulo, Rio de Janeiro, Paraíba, Paraná, Minas Gerais, Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Rio Grande do Norte (gráfico 1). Nota-se que existiu uma concentração da amostra na região do Nordeste brasileiro. Este acúmulo pode estar relacionado com o local de origem da pesquisa e os resultados podem não representar com clareza todos os indivíduos brasileiros.
Surgida na virada do milênio e consolidada como um sucesso da indústria do entretenimento, a saga de Harry Potter teve seus benefícios atrelados, em grande parte, às novidades tecnológicas da era digital e por meio delas a série sobreviveu transcendendo as páginas dos livros e as telas do cinema (Andrade, 2019Andrade, F. (2019). “Ele vai ser famoso, uma lenda”: Harry Potter, do público infantil ao adulto, dos livros às telas. In: Santos, A. et al. (Orgs.). Tramas e sentidos na Literatura Infantil e Juvenil. Rio de Janeiro: Dialogarts, 2019, 73-96.). Tendo em vista esse cenário, o quadro 4 revela que 100% dos respondentes tiveram contato com, pelo menos, um dos oito filmes da saga.
Dentre os que assistiram aos filmes, 90,7% se consideram fãs da franquia e alegaram ser apaixonados pela saga (respostas obtidas nas perguntas abertas) desde a época do lançamento dos livros, que deram origem à franquia de filmes, no ano de 1997. No entanto, quase metade dos respondentes (48,8%) viajou apenas uma vez e 27,9%, duas vezes, influenciado pela franquia de Harry Potter. Apenas uma pequena parcela de 23,3% de respondentes teve a oportunidade de realizar três ou mais viagens para outra cidade, estado ou país para vivenciar experiências em relação à saga.
Foi possível identificar, também, que as viagens impulsionadas pelos filmes de Harry Potter têm sido praticadas por um público que prefere viajar sozinho ou acompanhado por amigos, totalizando 54,6%. Esses hábitos provavelmente são reflexo da predominância do público que se identifica como solteiro. Verifica-se também que o segundo maior público que realiza viagens opta por realizá-las acompanhado por seus parentes/familiares e totalizam 31,4% e que apenas 11,1% optam por viajar com namorados e/ou com membros do fandom Potterhead.
Na busca por compreender a relação dos fãs com o turismo cinematográfico, foi possível identificar as palavras que mais se destacam entre eles, como visitas a estúdios, locais de gravações, restaurantes e lojas (Figura 1). Também foram identificados termos que dão destaque a eventos da cultura pop/geek, encontros de fãs e festas temáticas relacionadas à saga. Identificou-se também que as cidades de Orlando, Londres e São Paulo são os principais destinos visitados pelos turistas brasileiros fãs de Harry Potter.
Para identificar as principais atividades realizadas por esses turistas durante suas viagens relacionadas à saga, é apresentado, na Tabela 1, um ranking das atividades elencadas.
Observa-se que as atividades realizadas estão relacionadas às tipologias de turismo cinematográfico abordadas por Beeton (2005): on location, off location, commercial e one-off events. O commercial é a tipologia que mais se destaca dentre os turistas cinematográficos brasileiros, uma vez que eles realizam visitas a lugares que foram criados com o intuito de comercializar produtos e serviços após o sucesso dos filmes no mercado. Dentre essas atividades, estão: visita a lojas inspiradas no universo de Harry Potter, parque temático de Orlando, estúdio da Warner Bros e realização de tours por meio de uma agência de viagem.
As atividades relacionadas aos estúdios e parques temáticos também são classificadas como turismo off-location, uma vez que esses locais proporcionam aos turistas uma experiência de imersão no universo das histórias dos filmes, pois propõem o contato com os processos das produções audiovisuais.
A segunda tipologia do turismo que mais se destaca com as atividades apontadas pelos turistas são a de one-off events, uma vez que existiu a participação em eventos de lançamento dos filmes e eventos voltados para fãs. Por último, a classificação on-location de Beeton (2005) também é citada dentre as atividades realizadas, pois os turistas visitaram locais utilizados para as gravações dos filmes.
Dentre os locais mais visitados e relacionados à franquia de filmes, destacam-se a loja do Harry Potter em Nova York; Plataforma 9 – na estação de King’s Cross, em Londres; Universidade de Oxford, a qual inspirou diversas partes do castelo de Hogwarts; balada com tema de Harry Potter em Miami; restaurante temático em São Paulo.
Dentre os principais eventos que os fãs participaram, destacam-se Comic Con Experience; eventos de encontro de fãs e lançamento dos filmes em parques, shoppings e livrarias; Potter Weekend que ocorre no Taubaté Shopping, em São Paulo; evento da Escola de Magia e Bruxaria baseado no universo e que acontece em Campos do Jordão; evento Saga que ocorre em Fortaleza; e o Potter ano 1 e 2, do Potterando, em Pernambuco.
Já as atividades que mais tiveram destaque foram os tours pelos cenários reais ou que serviram como inspiração em Londres; roteiro na Warner Bros Studios; festa temática inspirada em um Baile Bruxo; passeio pela Maria Fumaça no Rio Grande do Sul; assistir a uma peça de teatro na Broadway, em Nova York; e jogar quadribol com amigos em parques.
Na Tabela 2, nota-se que mais da metade dos respondentes (53,5%) pode ser classificada, de acordo com Macionis (2004Macionis, N. (2004). Understanding the Film-Induced Tourist. In: Frost, W. et al. (Orgs.). International Tourism and Media Conference Proceedings. Melbourne: Tourism Research Unit, Monash University. 86-97.), como turista de filmes específicos, uma vez que viajaram tendo como objetivo principal realizar pelo menos uma atividade relacionada à prática do turismo cinematográfico. Na somatória, 31,4% são representados por turistas de filmes em geral, uma vez que não tiveram o turismo cinematográfico como principal objetivo e realizaram atividades como uma decisão espontânea e/ou como parte das suas férias.
Com base nas atividades descritas por Roesch (2009Roesch, S. (2009). The Experiences of Film Location Tourists. Clevedon: Channel View Publications .), foi possível identificar, conforme a Tabela 3, que os respondentes realizam com maior frequência as seguintes atividades: tirar uma foto com paisagens/placas decorativas (87,2%), tirar uma selfie (84,9%), comprar uma lembrança para ficar de recordação (77,9%), fotografar miniaturas (65,1%) e conhecer membros da comunidade de fãs Potterhead (52,3%). Compreende-se que os turistas realizam estas atividades, pois estão em busca de coletar lembranças que remetem às suas visitas pelos locais relacionados à saga de Harry Potter. Também é possível notar que existe a realização de atividades com membros do fandom, uma vez que compartilham do amor pela franquia, podendo existir a troca de experiências e debates sobre tudo o que envolve o universo cinematográfico e literário da Wizarding World.
Fatores de motivação
Nesta seção, serão abordados os fatores de impulso e atração. O Gráfico 2 revela o principal fator de impulso relacionado à saga Harry Potter que motivou o turista a participar de atividades de lazer e realizar uma viagem relacionada ao turismo cinematográfico. Nota-se que 68,3% dos turistas realizaram atividades cinematográficas relacionadas à saga por se considerarem fãs e terem um sonho desde suas infâncias de conhecer lugares relacionados à saga. Já 24,7% relataram que a imersão no mundo mágico da Wizarding World, reviver momentos dos filmes e a interação entre fãs foi o que os motivaram a realizar suas viagens. Uma pequena parcela, menor que 10%, relatou que jogar quadribol em campeonatos/eventos, conhecer atores das sagas, conhecer os parques de Orlando, acompanhar amigos em visitas, realizar atividades românticas com parceiros fãs da saga foram os principais motivos para a realização das visitas.
Principais motivos relacionados a Harry Potter que influenciaram a realização das viagens e atividades
A seguir, foi utilizada a teoria de Push and Pull (Dann apudMacionis, 2004Macionis, N. (2004). Understanding the Film-Induced Tourist. In: Frost, W. et al. (Orgs.). International Tourism and Media Conference Proceedings. Melbourne: Tourism Research Unit, Monash University. 86-97.) para avaliar os fatores que geraram as motivações e atrações dos turistas. Sobre o fator de impulso, foram elaborados componentes que estivessem associados ao impulso que influencia uma pessoa a realizar atividades a partir da sua vontade individual.
Assim, com base nos dados coletados no questionário, e apresentados no quadro 5, percebe-se que com relação à curiosidade sobre o destino, 88% dos respondentes acreditam que esse é um fator de muita importância, porém 20% afirmam que esse fator não foi relevante para a decisão da viagem. Já com relação às novas experiências, apenas 10% dos entrevistados não consideram esse fator importante como uma forma de impulsionar a visitação a um destino ou atrativo turístico relacionado a uma produção audiovisual. Conhecer novas pessoas também foi considerado um fator importante, visto que obtém 50% de respostas muito importante e 20% importante, somando 70% dos respondentes.
Outro fator de impulso é escapar da rotina, que está relacionado ao desejo de fuga e sair da rotina. Neste caso, 90% dos respondentes apontam este fator como importante para a visitação de destinos e atrativos turísticos relacionados a Harry Potter, assim como ter um momento de lazer, o qual nenhum respondente selecionou esta opção como não importante, sendo 100% das respostas positivas.
Quanto ao fator “realizar atividades educativas”, 70% dos respondentes acreditam que este fator não é importante e apenas 30% acreditam ser importante e/ou muito importante. Sendo assim, os aspectos educacionais revelam possuir pouco impacto no que motiva um turista a viajar e relacionar a viagem ao cinema. Reviver o passado também não representa um fator de impulso significativo entre esses turistas, uma vez que metade dos respondentes acredita não ser nada importante, enquanto 40% acreditam ser importante e uma pequena parcela (10%) respondeu como muito importante. Diferente do fator de autoconhecimento, no qual 80% consideram um fator importante, apresentando, assim, que o turismo cinematográfico vai além do lazer e diversão, mas que também está relacionado ao conhecimento individual proporcionado pelas novas experiências.
Ainda sobre o Quadro 5, o status é algo em que habitualmente as pessoas se apegam, em virtude dos acontecimentos desempenhados na vida social de cada indivíduo e que pode determinar em que posição o indivíduo se encontra na sociedade. Isto posto, o resultado obtido mostra que o fator status se mostrou bem fracionado, indicando que 50% dos respondentes acreditam ser um fator de importância, todavia, 30% acreditam ser pouco importante e 20% nada importante, levando a considerar que status porventura venha a não ser um fator fundamental no momento da escolha de um destino equiparando a outros fatores.
Por fim, foi analisado o fator de realizar uma atividade romântica, o qual mostra ser o menos importante dentre os fatores de motivação, uma vez que 50% dos respondentes concordam ser um elemento nada importante e 30% acreditam ser pouco importante, somando 80% do total, enquanto que 20% acreditam ser importante e/ou muito importante. Esse achado pode ser justificado pelo fato de que poucos respondentes realizaram viagens com seus companheiros afetivos, fundamentadas no turismo cinematográfico, com base na saga Harry Potter e, quando a viagem acontece, se encaixa no perfil de turistas casuais, em que, por exemplo, costumam realizar a viagem como acompanhantes (Macionis, 2004Macionis, N. (2004). Understanding the Film-Induced Tourist. In: Frost, W. et al. (Orgs.). International Tourism and Media Conference Proceedings. Melbourne: Tourism Research Unit, Monash University. 86-97.).
Por sua vez, o Quadro 6 mostra os fatores tangíveis do Push and Pull analisados com base na estrutura de 3P de Macionis (2004Macionis, N. (2004). Understanding the Film-Induced Tourist. In: Frost, W. et al. (Orgs.). International Tourism and Media Conference Proceedings. Melbourne: Tourism Research Unit, Monash University. 86-97.). Sendo assim, foram analisados elementos de atração relacionados ao local, elementos de personalidade e o desempenho.
De acordo com esse quadro, 30% dos respondentes consideram a população local como um fator de atração muito importante e 70% dos respondentes não consideram a população local como um fator de atração, ou seja, apenas uma pequena parcela considerou esse fator como muito importante. Esse fato reflete, também, as pesquisas acadêmicas sobre turismo cinematográfico, nas quais a relação com os residentes não é um tema abordado com frequência.
Já os atrativos turísticos são de total importância para a visitação de destinos relacionados ao turismo cinematográfico, visto que 60% dos respondentes consideram muito importante e 40% importante, somando 100% das respostas. Sendo assim, quando comparados com outros elementos relacionados ao lugar, os atrativos turísticos tornam-se o elemento que mais atrai o turista para um determinado destino.
Outro fator de atração foi o clima, considerado pouco importante por 10% dos respondentes, enquanto que 60% acreditam ser muito importante e 30% importante. Isso reflete na disponibilidade de visitação aos atrativos turísticos, parques e demais atrativos relacionados à saga Harry Potter, na qual dias mais chuvosos e frios podem dificultar o acesso a esses locais.
Os locais de gravações, assim como os atrativos turísticos, também são considerados importantes, uma vez que 50% consideram muito importante e 20% importante, somando 70% dos respondentes, seguido de 20% nada importante e 10% pouco importante.
Com relação aos atores, 60% dos respondentes consideram que os atores dos filmes têm bastante importância para se visitar um destino, confirmando o que Beeton (2005) ressalta sobre a importância das celebridades para atração do turismo cinematográfico. Do mesmo modo, o enredo dos filmes de Harry Potter também é considerado fator de atração, visto que 90% dos respondentes o consideram como um fator importante; e apenas uma pequena parcela (10%) considerou como sendo pouco importante. Assim como o gênero do filme e os personagens que também foram considerados importantes, apresentando 60% e 70%, respectivamente, das respostas dos informantes.
Satisfação e planos futuros em relação ao turismo cinematográfico
Esta seção busca apresentar a satisfação dos turistas com as viagens ou atividades realizadas com relação à saga dos filmes de Harry Potter, além de apresentar planos futuros sobre turismo cinematográfico. Dessa forma, a partir dos dados apresentados na Tabela 4, observa-se que 100% dos respondentes ficaram satisfeitos com as viagens, eventos e/ou atividades realizadas baseadas na saga, portanto, esse é um resultado muito significativo para este estudo, visto que os turistas, após terem suas expectativas atendidas em suas visitas, podem retornar ou indicar o destino para outras pessoas, contribuindo para o desenvolvimento do segmento e trazendo benefícios para o turismo local.
Buscou-se, também, por meio de uma nuvem de palavras (Figura 2) apresentar o que mais agradou os visitantes. Os respondentes apontaram a exposição de figurinos e objetos dos filmes nos estúdios na Inglaterra, conhecer toda a produção que ocorre por trás das câmeras, comprar um item para sua coleção, participar de uma imersão idêntica ao universo dos filmes/livros em eventos para fãs, conhecer e trocar ideias com outros fãs do Brasil, andar pelo cenário do Beco Diagonal, ter uma experiência imersiva dentro do castelo Hogwarts, recriar algumas cenas e beber cerveja amanteigada no parque temático, conhecer os atores, jogar quadribol, visitar Millenium Bridge e Oxford que serviram como locação para os filmes.
Quando questionados sobre se recomendariam a prática de atividades turísticas relacionadas à saga, levando em consideração as experiências e os desejos motivacionais para o turismo cinematográfico, 96,5% responderam que sim, o que demonstra a satisfação desses turistas. Sobre a pretensão de realizar outras atividades turísticas baseadas em Harry Potter, a maioria dos respondentes (83,7%) deseja praticar outras atividades da saga, porém 2,3% não possuem esse desejo (Quadro 7).
Ainda no Quadro 7, quando questionados se visitariam locais relacionados a outras produções audiovisuais, apenas 20,9% disseram que sim e 79,1% responderam talvez. Esta resposta pode estar relacionada a questões de envolvimento com a produção audiovisual, não se interessando em realizar turismo cinematográfico relacionado a outras produções audiovisuais, uma vez que a pesquisa apresenta que 100% dos entrevistados encontram-se satisfeitos com o turismo cinematográfico realizado com a saga Harry Potter.
Dos que tiveram a oportunidade de visitar locais relacionados a outras produções audiovisuais, os respondentes informaram que visitaram locações de filmes da Marvel e da Disney, parques temáticos de Orlando que não tinham ligação com a franquia de filmes do Harry Potter, diversos eventos de cultura pop e lançamento de filmes da cultura pop/geek que aconteceram em território brasileiro e/ou lugares relacionados às séries televisivas.
Quando questionados se tinham a pretensão de visitar locais de gravações utilizados em outras produções cinematográficas, 53,5% dos respondentes desejam conhecer outros locais de produções audiovisuais, 43,0% estão em dúvida e 3,5% afirmam não possuir vontade de realizar visitas a locais de gravações de outros filmes.
CONCLUSÃO
O propósito deste trabalho foi compreender o perfil, as motivações e as práticas do turista cinematográfico brasileiro. Para isso, optou-se por realizar um estudo de caso baseado na franquia de filmes da saga de Harry Potter. Partindo do pressuposto de que os fãs têm o desejo de vivenciar experiências relacionadas às produções audiovisuais, buscou-se entender quais são as principais motivações que os levam a ter esse interesse, visto que o nível de interesse e desejo depende de como essas produções envolvem os fãs. Logo, estudar sobre essas motivações contribui para uma melhor organização do turismo cinematográfico por parte de toda cadeia produtiva do turismo.
Os achados da pesquisa mostram que pessoas praticantes do turismo cinematográfico influenciadas pela saga Harry Potter se encaixam no perfil do turista de filme específico, uma vez que realizam suas viagens motivadas pelo desejo da realização do sonho de conhecer de perto as locações de filmagens. Conforme as respostas obtidas, as principais motivações baseiam-se em sentimentos de amor pela saga, nostalgia em conhecer locais que possuem conexão especial com o filme, curiosidade de contemplar de perto os cenários das produções e a possibilidade de realizar momentos de lazer nesses atrativos cinematográficos. As motivações mais relevantes para esses turistas consistem na possibilidade de poder estar no mesmo local em que o personagem contracena no filme, assim como, poder ter a oportunidade de vê-los presencialmente, de fazer parte da história e dos cenários dos filmes, tanto reais quanto fictícios.
A pesquisa identificou um alto nível de satisfação por meio das experiências obtidas nas viagens e atividades baseadas na saga Harry Potter. Dentre os locais mais visitados, encontram-se os parques temáticos de Orlando, estúdios da Warner Bros, restaurantes temáticos e lojas de produtos relacionados à saga. São numerosos os frequentadores dos eventos destinados para fãs em busca de conhecer diversas pessoas que disponham do mesmo amor pela franquia e de atividades lúdicas que os remetam ao universo da saga, consequentemente, adquirindo novas experiências, aprendendo mais sobre o destino, tal como suas obras de interesse, concebendo lembranças extraordinárias.
Percebe-se que muitas pessoas realizam o turismo cinematográfico baseado em Harry Potter sem precisar sair do território brasileiro, na medida que se identificam diversos atrativos, atividades de lazer e eventos relacionados à saga em diferentes estados do país, especificamente criados no intuito de aproveitar essa oportunidade de mercado ao atender aos desejos dos fãs e de atraí-los a esses destinos. É importante os órgãos governamentais brasileiros observarem a existência da possibilidade de implementação do turismo cinematográfico nas regiões e realizar um estudo sobre o perfil do turista cinematográfico, suas motivações e formas de consumo, com a finalidade de observar se esse perfil está alinhado com o destino e, desse modo, compreender melhor a demanda que procura por aquele determinado local. Caso seja constatada uma oportunidade desse segmento na localidade, é essencial o desenvolvimento do marketing turístico e ações de planejamento para impulsionar atrativos criativos e conquistar o público identificado como fã de obras audiovisuais e, assim, desenvolver e impulsionar o segmento do turismo cinematográfico, além de maximizar as potencialidades do destino turístico.
A pesquisa obteve um alcance satisfatório, porém observou-se uma concentração da amostra na região do Nordeste brasileiro, mais especificamente no estado de Pernambuco. Acredita-se que este acúmulo tenha se dado em função do local de origem da pesquisa. Assim, recomenda-se a continuidade de estudos que abranjam todo o território brasileiro, explorando a influência da motivação na tomada de decisão do turista cinematográfico, bem como as estratégias de marketing que são utilizadas pelos destinos.
Perante os resultados expostos e as limitações existentes nessa investigação, posto que há escassez de material acadêmico nacional a respeito dessa temática, recomenda-se a utilização desse trabalho como contribuição para a construção de novos estudos sobre demanda do turismo cinematográfico no Brasil. Espera-se, assim, o desenvolvimento desse segmento no território brasileiro, buscando sempre aprofundar os estudos que envolvam a demanda do turismo cinematográfico, seu perfil e motivações. Isso pode permitir que empresas nacionais que trabalham ofertando produtos e serviços de Harry Potter (e de outras produções audiovisuais), tais como as produtoras de eventos de cultura geek/pop, possam entender o perfil da demanda de potterheads e, assim, traçar estratégias eficazes de atuação.
AGRADECIMENTO:
A pesquisa que gerou este artigo recebeu apoio do CNPq (processo 403170/2021-4) e da Fundação de Amparo à Ciência e Tecnologia do Estado de Pernambuco (FACEPE).
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
05 Jun 2023 -
Data do Fascículo
May-Aug 2023
Histórico
-
Recebido
08 Jul 2022 -
Aceito
18 Fev 2023