Resumo
Este estudo analisa marcadores sociais de diferença como vetores de produção de si na prostituição entre homens. Para tanto, realizou-se um processo etnográfico por três espaços (Rua, Bar e Sauna) da cidade de Porto Alegre, Brasil, nos quais foram feitos diários de campo e entrevistas narrativas. Contando, em termos analíticos, com propostas de análise discursiva e de perspectivas interseccionais, esta investigação mostra que marcadores sociais como território, geração, gênero e sexualidade se relacionam intrinsecamente com a expressão de formas de valorização e desvalorização na prostituição. Situando os sujeitos em posições diferentes de possibilidade de agência, estes marcadores compõem espaços existenciais economicamente estratégicos.
Palavras-chave:
prostituição masculina; intersecccionalidade; gênero; sexualidade
Abstract
This study analyzes social markers of difference as vectors of self-production in prostitution among men. For that, an ethnographic process was carried out through three spaces (Street, Bar and Sauna) of the city of Porto Alegre, Brazil, in which field diaries and narrative interviews were made. Analytically speaking, with proposals for discursive analysis and intersectional perspectives, this research shows that social markers such as territory, generation, gender and sexuality are intrinsically related to the expression of forms of valorization and devaluation in prostitution. Placing the subjects in different positions of possibility of agency, these markers make up an economically strategic existential space.
Key words:
male prostitution; intersectionality; gender; sexuality
Resumen
Este estudio analiza los marcadores sociales de diferencia como vectores de auto producción en la prostitución entre los hombres. Para ello, se llevó a cabo un proceso etnográfico en tres espacios (Calle, Bar y Sauna) en la ciudad de Porto Alegre, Brasil, donde se realizaron diarios de campo y entrevistas narrativas. Contando, en términos analíticos, con propuestas de análisis discursivo y perspectivas interseccionales, esta investigación muestra que los marcadores sociales como territorio, generación, género y sexualidad están intrínsecamente relacionados con la expresión de las formas de valorización y devaluación en la prostitución. Situando a los sujetos en diferentes posiciones de posibilidad de agencia, estos marcadores componen espacios existenciales económicamente estratégicos.
Palabras clave:
prostitución masculina; interseccionalidad; género; sexualidade
Introdução
As vivências que no dia a dia se expressam em múltiplas formas, cores e sons por vezes são tomadas em leituras genéricas e categóricas no campo teórico. Ao estudar prostituição, a tensão entre a produção de singularidades e o risco possível de reiterar planificações identitárias é um aspecto de importante análise. A visão da prostituição como fazer per se precário, as noções reducionistas de saúde, tanto quanto as leituras higienistas de formas de viver os sexos e as sexualidades compõem parte considerável desse quadro e nos desafiam à discussão da construção de singularidades em sua positividade, para além da conformação de subjetividades sob a égide de identidades estagnadas.
Para Rago (2008), essa positividade se constituiria não na produção de desvios do “normal”, mas de proposições para vidas outras, novos espaços de liberdade. Tal capacidade de produção ativa nas arenas cotidianas (Anzaldúa, 2005) pode sustentar formas outras de expressar-se, de se fazer sujeito no mundo. Assim, considerar faz do pesquisar uma possibilidade de produzir tensionamentos que não dizem respeito a uma determinada população de gênero e sexualidade substancializada/essencial, e sim a territórios existenciais possíveis de serem ocupados. Foi procurando pensar a prostituição entre homens, dentro desta paisagem ético-estética, pela via da diferença e da constituição de modos de existência outros - tentando abrir espaço para possibilidades de exercício de trabalho, sexualidade e relações de gênero não prescritas - que este estudo foi delineado.
Etnografando diplomacias sexuais na prostituição entre homens
Ao propor um processo etnográfico como modo de operar em pesquisa, a escolha na presente investigação não é uma novidade na literatura brasileira voltada ao estudo de prostituição (Perlongher, 2008PERLONGHER, Néstor. 2008. O Negócio do Michê - a prostituição viril em São Paulo. São Paulo: Perseu Abramo . [1986]; Olivar, 2013). Esta perspectiva metodológica é afirmada como uma eleição potente quando a proposta
se embrenhar em formas de produção de territórios existenciais. Neste sentido, a adesão à etnografia como trabalho de campo (e de corpo) se alinha à nossa concepção da pesquisa como fazer situado (Haraway, 1995HARAWAY, Donna. 1995. “Saberes localizados: a questão da ciência para o feminismo e o privilégio da perspectiva parcial”. Cadernos Pagu . Nº 5, p. 7-41. Disponível em: Disponível em: https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/cadpagu/article/ view/1773/1828
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), não focado em reiterar posições rígidas, mas sim em certas forças que se expressam (Guattari, 1981) na negociação de sexos, nas adesões e nas tensões cotidianas que desnudam políticas corporais. Marcamos isto para assinalar que este estudo tomou corpo a partir dos fazeres e das narrativas de vários homens que operavam ativamente aproximações e borramentos em relação às normativas sociais, o que não é menos verdade para o primeiro autor deste artigo - responsável pelas incursões etnográficas.
Esse processo de pesquisar se compôs pelo rastro de uma série de fluxos desejantes - ou seja, relativamente afastados do território mais estável das identidades
- se expressando nas negociações, estabelecendo fronteiras e porosidades com o que se entende por supostas “coerências” da vida na prostituição. Parte desse processo investigativo, focado em dimensões comunitárias (Hamann, Pizzinato & Rocha, 2017HAMANN, C.; PIZZINATO, A. & ROCHA, K. B. 2017. “Dinâmicas de gênero e sexualidade no sexo tarifado entre homens: uma análise por meio da noção de comunidades de prática”. Temas em Psicologia. Vol. 25, p. 1007-1024. Disponível em: https://doi.org/10.9788/TP2017.3-06Pt. [Acesso em 05/05/2020].
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), já demonstrava algumas possíveis fissuras nestas coerências quando abordado o campo da prostituição entre homens: de sexualidade (como, por exemplo, no esvaziamento da orientação sexual como campo de sentido em narrativas de homens sobre seu fazer na prostituição); de gênero (como fazer em que se borram atribuições sociais de homens e entre homens); de masculinidade (no descentramento do pênis nas negociações e outros desvios nas economias corporais masculinas); de idade (tensionamento dos estereótipos de clientes sempre velhos com garotos de programa sempre muito jovens); e de trabalho (seu caráter, por vezes afirmativo sob a forma de profissionalismo, por vezes estranho ao exercício do que muitas vezes designamos, enquanto outsiders, prostituição).
A esta grande seara de produção e desconstrução, a despeito da particularidade criativa que se faz nas negociações do sexo no sul brasileiro, caracterizamos como formas de biopoder1
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Ao buscar definir biopoder, que passou, desde o século XVIII e cada vez mais, a operar no tecido social, Foucault (1988, p. 131, itálicos nossos) diz que “a velha potência da morte em que se simbolizava o poder soberano é agora, cuidadosamente, recoberta pela administração dos corpos e pela gestão calculista da vida”.
(Foucault, 1987FOUCAULT, Michel. 1987. Vigiar e punir. Petrópolis: Ed. Vozes) e possibilidades politicamente encarnadas, ou políticas corporais. Considerá-las políticas é supor que se componham, potencialmente, territórios subjetivos possíveis de existência para além das fronteiras do biopoder - ainda que percebidos cotidianamente como estáveis, sexo e gênero são tomados nesta perspectiva enquanto dimensões fragmentadas, históricas, instáveis, nutridas por um investimento produtivo dos sujeitos (Weeks, 2011WEEKS, Jeffrey. 2011. “O corpo e a sexualidade”. In: LOPES LOURO, Guacira (org.). O corpo educado: pedagogias da sexualidade /. Trad. de Tomaz Tadeu da Silva. Belo Horizonte: Autêntica, 2000. p. 35-82. http://dx .doi.org /10.1590/1984-6487.sess.2020.34.05.a
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). Na esteira dessa discussão teórica, compreender como - por meio de quais práticas, articuladas a quais vetores de diferença, aliadas a que campos de força - se produzem políticas corporais compõe-se como continente epistêmico para a presente incursão etnográfica pela prostituição entre homens.
Prostituição, neste estudo, é considerado um termo polissêmico que encontra no campo etnográfico uma miríade de significados e fazeres diversos, ainda que seja entendido, transversalmente, como encontro que supõe troca econômica negociada (nas economias de corpo, afeto, tempo). Para a presente incursão, o termo prostituição é utilizado de modo a marcar uma tensão: o próprio caráter de negociação que lhe inscreve é o que potencialmente desestabiliza prescrições sociais, também compreendidas como “coerências”, como citado anteriormente. Isto porque evidencia e produz com/nas linhas das economias (corporais, afetivas, temporais), mostrando a fragilidade das supostas estabilidades expressas em sexualidades, masculinidades, trabalhos, gêneros.
Como será abordado ao longo deste texto, os diferentes encontros e as possibilidades de negociações (por vezes diminuindo oportunidades para certos homens em detrimento de outros, por vezes produzindo coalizões e estratégias de resistência) deram visão, cheiro, gosto e tato para o que se expressava na materialidade cotidiana de uma Sauna, um Bar e uma Rua de Porto Alegre. Estes três territórios, que servem à presente análise, compõem uma pequena fração dos distintos equipamentos citadinos torcidos ativamente para a produção erótica
- parques, bares, saunas, cinemas, banheiros utilizados para pegação - que se espalham por esta capital meridional brasileira. Diferentes diplomacias sexuais expressam-se diante das singularidades corporais (leia-se dos corpos humanos e não humanos) destes locais.
Feminismo, poder e interseccionalidade na prostituição entre homens
Perspectivas feministas para o estudo de homens e masculinidades foram convocadas a participar desta investigação, pois são vistas como dispositivo de dissecação dos anacronismos produzidos na atualização de um sujeito universal
- supostamente sem gênero ou sexualidade histórica. Compreende-se que esta leitura (de uma perspectiva feminista para o estudo de homens e masculinidades) é possível, em parte, por fazer reverberar a noção de relações de poder foucaultiana, que opera para além de binarismos como homem/mulher, vítima/algoz, homo/ heterossexual, jovem/velho. Neste campo de produção epistêmico, uma diversidade de pesquisas tem atualizado esta perspectiva de poder, tomada como vetor não vertical, mas sim horizontal e estratégico de constituição das relações sociais (Foucault, 1987FOUCAULT, Michel. 1987. Vigiar e punir. Petrópolis: Ed. Vozes). Inspiração para muitos escritos contemporâneos que se preocupam com a produção de conhecimento situado e parcial, essa noção (em especial na articulação saber-poder, que implica e compreende a produção de verdades como formações socialmente constituídas e inter-relacionadas) figura em uma diversidade de composições teóricas.
A perspectiva interseccional é uma delas e tem se mostrado forma potente de localizar, sócio-historicamente, os sistemas de saber-poder - por meio da compreensão dos marcadores sociais de diferença (a produção de espaços existenciais/materiais que se expressam como raça, classe, sexualidade, gênero, geração, território, entre outros) enquanto categorias em articulação. Este campo de análise, derivado das tensões provocadas pelo Feminismo Negro2
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O Black Feminism partiu da necessidade de refletir e responder sobre a situação das mulheres negras estadunidenses, e tem como algumas das estudiosas pioneiras Kimberlé Crenshaw e Patricia Hill Collins.
estadunidense, põe em pauta uma multiplicidade de questões sociais vistas a partir de uma perspectiva integrada, na qual não se procuram generalizações, mas sim se permite evidenciar agenciamentos, diferenças e desigualdades que nos situam no tecido social (Brah, 2006BRAH, Avtar. 2006. “Diferença, diversidade, diferenciação”. Cadernos Pagu. Nº 26, P. 329-376. Disponível em: https://dx.doi.org/10.1590/S0104-83332006000100014. [Acesso em 05/05/2020].
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). Não compreende, portanto, um somatório de operadores de dominação - ou simplesmente o reconhecimento de sistemas opressivos - mas sim questiona a hierarquização destes eixos relacionados a sistemas assimétricos de saber-poder (Pocahy, 2011POCAHY, Fernando Altair. 2011. “A idade um dispositivo. A geração como performativo. Provocações discursivo-desconstrucionistas sobre corpo-gênero-sexualidade”. Revista Polis e Psique. Nº 1 (3), p. 195. Disponível em: http://dx.doi. org/10.22456/2238-152X.31539. [Acesso em 05/05/2020].
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). Estes estudos de perspectiva interseccional - que dialogam a partir de uma noção não linear de poder e da constituição dos saberes, assim como a que vemos nos escritos de Foucault - possibilitam dizer que diferentes homens podem se localizar em espaços socialmente privilegiados ou periféricos, com possibilidades distintas de articulação e identificação, contestando um suposto modelo hegemônico de homem universal.
No que concerne a discussões sobre prostituição entre homens, pensamos que esses vetores analíticos podem ser úteis. Inscrita como um fazer no qual se dá por naturalizada sua ligação com o sexo - suposta coerência biopolítica gênero/sexo/prazer3 3 Naturalizamos que, em prostituição, se faz sexo. Como vemos no trabalho de Olivar (2011), para algumas mulheres prostitutas a distinção entre fazer programa e sexo não opera de forma estática. - também se atrela a essencializações de classe, gênero, idade. Comumente se supõe que, em especial no sul do Brasil, todos os clientes são homens mais velhos e/ou brancos e/ou economicamente abastados, enquanto os garotos de programa são jovens e/ou negros/pardos e/ou economicamente precarizados. O mais relevante nesta conjuntura não é que efetivamente não possam se compor situações em que as marcações sociais sejam mais rígidas do ponto de vista destas materialidades, mas sim o fato de que esses lugares não são estáticos e que se constituem de práticas micropolíticas que desestabilizam as relações prescritas de gênero, idade, raça, classe. Tendo em vista a relevância política de colocar em evidência singularidades vivenciadas na prostituição - como campo de produção de vida em contraponto e oposição a correntes categorias estanques - procuramos, neste escrito, discutir e realçar como, numa série de trajetórias, a interseção de marcadores sociais formam vetores de produção de si e possibilitam espaços de agenciamento para homens que exercem prostituição em uma capital do sul do Brasil.
Método
O processo etnográfico desenvolvido teve como disparador do campo a participação de um informante-chave da Secretaria Municipal de Saúde de Porto Alegre. Este indicou iniciarmos o campo com visitas a uma Sauna especializada em prostituição, além de estreitar contato com um organizador de festas no local. O trabalho de campo, que se iniciou na Sauna, foi ampliado a cada visita no local - participantes que lá exerciam prostituição, ao contarem sobre seus itinerários, indicavam outros ambientes voltados para a prática de trabalho sexual. Esse processo, compreendido como snowball (Flick, 2009FLICK, Uwe. 2009. Introdução à pesquisa qualitativa. 3ª ed. Porto Alegre: Artmed.), permitiu, além da construção de uma rede de contatos (clientes, profissionais que trabalhavam na organização das atividades nas casas e profissionais do sexo), o mapeamento dos locais de trabalho sexual na cidade de Porto Alegre. Ao longo do campo (que envolveu o trânsito por casas noturnas, bares e saunas), foram escolhidos dois espaços fechados (aqui, O Bar e A Sauna) por se mostrarem os mais frequentados, e uma rua (A Rua), por ser reiteradamente citada nas trajetórias como contrastante em relação às vivências nos estabelecimentos.
Para além das conversas e dos diários elaborados, oito entrevistas foram realizadas - seis com trabalhadores do sexo, uma com um gerente de casa noturna e outra com um promotor de festas - seguindo uma perspectiva narrativa. No formato de entrevista realizada, a questão disparadora é elaborada de forma ampla e procura-se não interromper a construção do participante (Flick, 2009FLICK, Uwe. 2009. Introdução à pesquisa qualitativa. 3ª ed. Porto Alegre: Artmed.). Para esta investigação, a questão formulada - e que esteve sujeita a uma aproximação com os termos utilizados pelos participantes no decorrer das interações - foi: “Como começou e vem se desenvolvendo a tua trajetória neste fazer?”. Não se estabeleceu um tempo específico de entrevista, como indicado em literatura especializada (Flick, 2009), ainda que a duração média tenha sido de 50 minutos. Os participantes são aqui indicados por meio de nomes fictícios. Nenhuma entrevista foi realizada com clientes, de modo que as informações derivadas destes provêm de conversas registradas em diários de campo.
As interpelações do primeiro autor nos ambientes - tomado eventualmente como trabalhador ou como possível cliente - mostraram que a singularidade das relações, no campo dialógico da prostituição, era marcada fortemente por inscrições como as de raça, classe, idade e território. Neste sentido, a perspectiva analítica adotada, interseccional e discursiva, se engendrou subsidiária do trabalho de campo inicial. Esta primazia do trabalho de campo sustentou a ideia de que, durante o processo de escrita, fossem utilizadas nomenclaturas que derivassem diretamente das incursões etnográficas.
Resultados e discussão
A Rua: Uma via de profissionais e picaretas
Durante os dias úteis da semana, a Rua José Bonifácio é um espaço de circulação de carros e pessoas, abriga escolas, lancherias e bares, além de muitos prédios residenciais. É possível sentar nos bancos que a margeiam e olhar o fluxo bastante heterogêneo de transeuntes, casais, idosos, militares (uma unidade do Exército compõe a vizinhança), estudantes, nas mais diversas funções - trabalhando com vendas, correndo, tomando sol. Entretanto, para além destas, coexistem outras sociabilidades (em especial pelos fins de tarde e noite), compondo certa penumbra exuberante deste território.
Localizada entre o Parque Farroupilha e a área historicamente boêmia da Cidade Baixa, a Rua foi palco para muitos. Um deles,4 4 Todos os interlocutores estão referidos por meio de nomes fictícios. Ezequiel.5 5 Autodeclarado negro, heterossexual, 50 anos. iniciou suas atividades nos anos 1980 neste espaço como profissional do sexo, termo que utiliza para se nomear. Naquele tempo, segundo conta, a quantidade de garotos era bem mais expressiva do que aquela que se vê agora e, entre estes, muitos eram jovens militares (como ele). Nada parecido com os três ou quatro que usualmente são vistos frequentando as atuais noites da Rua - eles se estendiam em grande número e fluxo. As “batidas policiais” e a hostilidade entre os trabalhadores do sexo eram corriqueiras e podiam ser especialmente complicadas para um jovem negro como ele. Não bastasse isso, conviveu com a constante demanda de explicações e a necessidade de criar subterfúgios que garantissem o sigilo de seu fazer para com os pais e irmãos, evangélicos praticantes.
Para Ezequiel, a sensação de insegurança (que se compunha por um misto de vontade de sigilo e a potencial violência das ruas) levou não só ele, mas vários dos homens que ali estavam a se deslocarem para casas específicas de prostituição (Saunas e Bares, em especial) e para atendimentos domiciliares. Considerando importante manter uma boa rede de contatos e clientela, mas também uma relação de segurança com seu fazer, passou a lançar mão de anúncios dominicais em jornal de grande circulação local e regional. De outra forma, como estratégia de estabilidade, Ezequiel investiu em se tornar funcionário público - condição possível com sua trajetória educacional - o que ajudou a manter uma renda mensal segura para o jovial senhor de aproximadamente 50 anos.
Acumulando experiências de três décadas de trabalho sexual, disse não gostar do contato pela Internet e outros meios eletrônicos para exercer essa função, que lhe pareciam estratégias arriscadas devido à possibilidade de ser reconhecido por pessoas “fora do meio”. Esse receio não impediu que se filiasse a Organizações Não Governamentais (inicialmente, uma com políticas mais direcionadas para homens e, posteriormente, a que frequentava no momento da pesquisa, voltada para o protagonismo da população trans6 6 A participação dos homens que exercem prostituição em movimentos sociais voltados para a temática, neste estudo, se mostrou rarefeita. Ezequiel era o único interlocutor que se filiava a alguma organização política. ). Elas o auxiliavam, atuando como rede de proteção, ainda que nestes espaços fosse um dos únicos profissionais do sexo homem - a grande parcela era de mulheres trans e travestis.
Frequentando estes espaços, continuou seu fazer acompanhando casais e homens a danceterias, casas de swing e privês (que não fossem declaradamente destinadas ao público homossexual) pela cidade de Porto Alegre, sem deixar de ter um tempo para aproveitar visitas a locais de prostituição feminina em momentos de lazer com os amigos. Esse itinerário na prostituição feminina possibilitou que conhecesse sua atual esposa, também dedicada à prostituição e que, segundo Ezequiel, compreende as demandas de seu fazer. Segundo ele, ser um profissional do sexo havia gerado problemas insustentáveis em suas outras relações amorosas, de modo que a atual companheira era a “escolha certa”.
Nas trajetórias de trabalho, ser acompanhante, como também definiu Ezequiel, por vezes era sê-lo ao “pé da letra”: levar de carro ou encontrar casais e homens em locais de diversão sem necessariamente fazer sexo, mas, em especial, exercitar o que considerava ser um “saber escutar”. Esta característica foi indicada como a que cultivou ao longo do tempo, tornando-se um atributo que lhe garantiu uma rede ampla de contatos e clientes frequentes (da qual ainda colhia frutos). Este “saber escutar”, em parte, caracterizava os “bons profissionais”, em contraposição aos “picaretas”. Os picaretas eram aqueles que, segundo ele, enganavam, utilizando a imagem de profissional do sexo para roubar, assaltar e extorquir dinheiro dos e das clientes, ou cobrar “mixaria” - representando também um risco econômico para os homens que trabalhavam na José Bonifácio, já que aumentavam a concorrência pelos clientes. Essa separação entre picaretas e profissionais mostrava-se intrinsecamente ligada a certo traquejo em relação à atividade, envolvendo determinados conhecimentos, habilidades, práticas e valores direcionados a um desempenho ótimo. O jogo sensível e delicado da boa escuta como atributo profissional fazia com que essa particularidade do trabalho fosse função de um profissional.
A constituição da rede de contatos, para Ezequiel, se fez intrinsecamente relacionada a essa percepção de cuidado profissional, o que demandava, em especial na forma da escuta do cliente, uma diferenciação entre intimidade e trabalho. Se uma série de habilidades cultivadas na prostituição remete a uma economia do jogo erótico, para Ezequiel essa negociação econômica se dava em razão de certo capital cultural, um traquejo social que (na figura narrativa da picaretagem) não seria muito comum entre os atuais garotos de programa. Sensível a estas diferenciações, Ezequiel usava seu know-how para acumular uma clientela recorrente (da qual faziam parte clientes de décadas), vislumbrando no futuro a possibilidade de se “aposentar” da prostituição, termo utilizado por ele. As formas de incorporação desses aspectos, entretanto, podem ser muito diferentes e se articulam não só com território e capital cultural, mas também com outros marcadores sociais que nos permitem identificar certo jogo - mais ou menos periculoso, mais ou menos aparente, na prostituição entre homens.
Ser negro, para Ezequiel, estava ligado tanto ao reconhecimento de seu corpo como detentor, nas palavras dele, de uma juventude inerente a pessoas negras quanto era característica que possibilitava a procura de clientes por certo ethos sexual. Ser negro pode ser compreendido, dentro das economias do desejo no panorama brasileiro, como circunscrito a uma disposição heterossexual, representativa de apetite sexual e potência corporal (Lima & Cerqueira, 2007LIMA, Ari & CERQUEIRA, Filipe de Almeida. 2007. “Identidade homossexual e negra em alagoinhas”. Bagoas estudos gays: gêneros e sexualidades. Vol. 1, nº 1, p. 269-286. Disponível em: Disponível em: https://periodicos.ufrn.br/bagoas/article/view/2262
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). Com Ezequiel, vemos que essa posição a ser ocupada, como sujeito negro, se compunha com estas dimensões, mas não as coroava enquanto espaço de estagnação. Ezequiel, ativamente, reconhecia e utilizava esse lugar como possibilidade de ganho econômico e produção de saúde mental - pela utilização da imagem de homem negro, viril como forma de sedução de clientes e valorização do itinerário de experimentações eróticas.
Na mesma Rua em que Ezequiel começa a trabalhar como profissional do sexo, Daniel,7 7 Autodeclarado branco, heterossexual, 23 anos. um jovem garoto de programa, branco e também heterossexual, inicia sua trajetória. Daniel começa suas atividades com apenas 13 anos, em uma situação de exploração sexual e com uma história de vida de pouco suporte familiar e educação formal precária. No momento desta pesquisa já exercia prostituição há dez anos. Durante esse processo de incursão no trabalho sexual não recorreu a jornais ou outras formas de divulgação impressa, ou a aplicativos de celular (uma possibilidade que emergiu por volta de 2010), pois considerava um risco ser reconhecido por pessoas fora do circuito. Junto com os colegas que fez na JB, Daniel foi para locais fechados e, no período desta pesquisa, frequentava um Bar específico da cidade.
Daniel também ressaltava certa performatividade etária (como Ezequiel na composição negritude/juventude), entretanto, sua juventude se fazia por linhas outras. No início de sua trajetória, com 13 anos, a percepção da juventude era um mecanismo mais concreto. Mas ao longo do seu percurso como garoto de programa parece ter desenvolvido certa acuidade em se fazer perceber como jovem “malandro” (aspecto aparentemente relacionado a uma estética de masculinidade popular, “safada” e audaciosa que se materializa na abordagem à clientela). Seu corpo esbelto e essa malandragem, de acordo com Daniel, favoreciam a captação de clientela e o sustentavam economicamente enquanto não conseguia investir no difícil projeto de ser modelo. Naquele momento, segundo ele, enquanto a modelagem não era uma possibilidade, percorria o Bar quase todas as noites procurando oportunidades.
Em Daniel a juventude se expressava nessa estética de malandragem popular, por meio da qual o encontro íntimo, sedutor e afetivo era uma possibilidade - de antemão vislumbrada - de captar clientes fixos. Este tipo de clientela (ainda que exigisse uma maior dedicação dos garotos de programa) usualmente pagava mais e dava diferentes auxílios (mensalidades de apartamentos, despesas diárias com alimentação, roupas ou academia de musculação e maior segurança). A presença de clientes fixos possibilitava não ficar muito tempo nas negociações com clientes novos, tendo que eventualmente recorrer às propostas da “baixa” clientela. Por vezes essa clientela, mais difícil de negociar, não pagava o combinado anteriormente, exigia a utilização de drogas ilícitas ou sexo sem proteção (por um valor mais alto, mas causando preocupações para os trabalhadores). Ainda que grande parte dos homens que exerciam a prostituição no Bar se organizasse de modo a proteger-se entre si (identificando os clientes mais ou menos vantajosos numa rede de comunicação interna ao grupo), a precariedade econômica e o vislumbre do ganho rápido (ainda que difícil e, por vezes, perigoso) tornavam a busca por clientes eventuais uma posição vulnerável de se ocupar.
Se, por um lado, a literatura aponta que os territórios são elementos importantes nesse enquadre moral da prostituição (Viana, 2010VIANA, José Queiroz. 2010. É tudo psicológico/dinheiro/pruuu e fica logo duro!: desejo, excitação e prazer entre boys de programa com práticas homossexuais em Recife. Dissertação de Mestrado, Programa de Pós-graduação em Psicologia, Recife, Ufpe. Disponível em: Disponível em: http://repositorio.ufpe.br/handle/123456789/8588
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), aqui vemos, de maneira singular entre os homens, estes termos despontarem marcando não somente quais espaços frequentar, mas quem poderia, e como deveria, atuar na prostituição. As decorrências morais desse jogo (que supõe uma conduta apropriada) podem ser observadas, de outro modo, no intenso exercício de sigilo vinculado aos fazeres de Ezequiel e Daniel. É este um aspecto que parece ligado a certa ética de relação com clientes e outros garotos de programa/profissionais do sexo na situação de colegas. Os fazeres destes homens são negociados sob a forma de uma economia do que é ou não dito, sobre si (e por isso restringem-se a lugares fechados para prostituição e não utilizam mídias sociais ou por meio de nomes e identidades que variam conforme o espaço de circulação, já que nos espaços relacionais conseguem negociar seus limites e possibilidades também de acordo com o cliente, suas expectativas e seu potencial financeiro) e sobre os outros (restringindo qualquer identificação dos clientes ou recusando-se a comentar as vivências de outros trabalhadores) - daí uma mais das justificativas para o não uso da internet, para esses participantes, como forma de anunciação.
Nos aplicativos e nos sites, por exemplo, como pontuam Cardoso et al. (2019CARDOSO, J. G. M.; PAZ, B. M.; ROCHA, K. B. & PIZZINATO, A. 2019. “Imagem, corpo e linguagem em usos do aplicativo Grindr”. Psicologia USP. Nº 30, e180160. Epub Abril 11, 2019. Disponível em: https://doi.org/10.1590/0103-6564e180160. [Acesso em 05/05/2020].
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), esses espaços de comunicação sexual têm um código estético e lexical em que se hipervalorizam aspectos físicos, habilidades e preferências de forma muito explícita, antes de qualquer conversação, pela anunciação semiótica dos próprios perfis. Já nas relações fisicamente presenciais, como nas das ruas, compõe-se nestas situações a própria relação com as sexualidades (ocupar espaços “fora do meio”, performar um corpo “malandro”), sendo dados indícios de um ethos heterossexual que será indicado posteriormente como não tão dependente da enunciação física.
O Bar: Cachaça com suco de laranja e outras artimanhas
O Bar (escolhido por Daniel para seus fazeres como garoto de programa) era um espaço muito popular de prostituição masculina em Porto Alegre. Ficava em uma pequena rua paralela à central Avenida Farrapos, e se caracterizava como estabelecimento de um andar, discreto, cuja entrada era indicada por um toldo escuro e guardada usualmente por seguranças. A decoração, com cores fortes e luzes de danceteria, se mesclava a uma arquitetura de ar decadente. Entretanto, apesar do território ermo e do composé pouco convidativo, as festas podiam ser movimentadas e a presença de garotos/boys8 8 “Garotos” ou “boys” são os termos utilizados neste local para indicar homens que se prostituem, relacionados ao circuito bar/sauna que será adiante apresentado. era sempre ressaltada nas narrativas do gerente do local.
Sob o olhar atento desse gerente, os garotos se organizavam seguindo um conjunto de normas: não sair para fumar acompanhado de outros garotos, apresentar-se limpo e com roupas em bom estado (que podem compreender a utilização de acessórios que ressaltam partes específicas do corpo, como tórax e braços), não usar ou vender drogas ilícitas no estabelecimento e não cometer furtos. Estas eram medidas reiteradas frequentemente nas ações do gerente e justificadas sob a alegação de que a circulação de “garotos novos” na casa era considerável, tanto quanto o tráfico. Segundo ele, evitar o agrupamento dos homens nas mediações do local era visto como forma de diminuir a sensação de insegurança no acesso dos clientes - em que a garantia do anonimato era bastante presente e a associação com o tráfico sempre podia figurar. Ainda assim, era interessante notar como essas medidas produziam/expressavam certos limiares morais. De acordo com alguns garotos, para parte da clientela ou alguns “funcionários não garotos de programa”, um dos cômodos internos do Bar era disponibilizado para consumo de cocaína.
Os garotos “novos” que chegavam eram principalmente trazidos por outros que já frequentavam o Bar. A medida usual, neste caso, era o próprio gerente conversar pessoalmente com o recém-chegado, de modo a narrar o funcionamento da casa, suas regras e seus benefícios. Os benefícios eram, por exemplo, jantares oferecidos e bebidas para “relaxar” - não era raro o gerente perguntar aos garotos que se encontravam ali por volta das 20 horas se eles gostariam de jantar, ou promover enquetes sobre a bebida que mais agradaria (uma mistura de cachaça e suco de laranja era a preferida do momento). As bebidas eram servidas antes da chegada dos clientes, entre 21h e 22h, depois disso, normalmente poucos consumiam álcool. Neste contexto, a presença de namoradas/esposas/companheiras era possível e, ainda que não usual, podia-se encontrar mesas compostas por cliente, garoto de programa e namorada, ou presenciar estas esperando, no final do horário de trabalho, na calçada do Bar. Nas narrativas de clientes, o itinerário heterossexual destes homens, por vezes, parecia marcar certa qualidade distintiva.
Com exceção de cigarros e remédios para estimulação erétil, os garotos indicaram não utilizar drogas ilícitas durante o intercurso dos “programas”, reiterando certo uso estratégico de substâncias que vemos também em outros ambientes onde as práticas sexuais são a tônica (Braz, 2010BRAZ, Camilo Albuquerque. 2010. “‘Mas agora confessa...’. Notas sobre clubes de sexo masculinos”. Sexualidad, Salud y Sociedad - Revista Latinoamericana. Nº 4, p. 127-156. Disponível em: Disponível em: http://repositorio.ufsc.br/xmlui/handle/ 123456789/1249
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). Para o gerente, esse cuidado garantia o bom desempenho dos garotos e, concomitantemente, o Bar como referência de bom atendimento; para os garotos, parecia ser uma forma de controle e estratégia no desempenho sexual e na manutenção de uma performance delicadamente mensurada (a sobriedade/relaxamento em nível ótimo permitia o controle não só das ereções, mas de performances de masculinidade nas investidas para com a clientela). Estas performances se davam como reiteração constante de corpos masculinos e viris, dotados de certa estética que figurava na interação com e para clientes (mesmo as relações de trabalhadores com trabalhadores, que aconteciam, em especial, ao redor de uma mesa de sinuca, estavam sob a visibilidade dos clientes e suscitavam um clima de exibição).
Logo que um possível cliente chegava ao estabelecimento, diversos garotos se apresentavam ordenadamente, oferecendo companhia. Esse ritual de exibição cavalheiresca por vezes tomava outra forma. Não eram incomuns concursos de beleza nos quais os garotos competiam por premiações, em geral quantias em dinheiro. Em uma noite, houve inclusive um desfile para a escolha do “melhor boy”. Ao começar o desfile, comentários jocosos e erotizados das “bichas mais desbocadas”, como em determinado evento falou um cliente, faziam referência aos garotos, suas “malas”9 9 Referência ao volume do pênis evidente sob as roupas. sob as sungas e corpos joviais e sarados - demonstrando, eventualmente, certa decepção com os mais displicentes com este tipo de cuidado do corpo. Garotos mais fortes faziam poses de halterofilismo e deixavam mais explícitas suas formas masculinas e viris.
Nas festas oferecidas podiam ser encontrados clientes de 30 a 70 anos, enquanto a idade dos trabalhadores parecia compor-se, majoritariamente, dos 20 aos 30 anos. Segundo Samuel,10 10 Autodeclarado branco, heterossexual, 25 anos. um garoto de programa com quem foi possível conversar durante um dos eventos promovidos, a quantidade maior de clientes nesses dias exigia ter certa capacidade de escolha crítica, certa “caça”. “Caçar”, para ele, era um termo (e uma atuação) muito comum no itinerário de prostituição entre homens em Porto Alegre, uma artimanha que se compunha na identificação de possíveis clientes e que demandava uma observação acurada do ambiente. Parte do processo da caça era possibilitado pelas redes de informação entre os garotos, calcadas principalmente no fluxo de pessoas que se repetiam nos bares - como se referia outro trabalhador (Jonas11 11 Autodeclarao branco, heterossexual, 30 anos. ) sobre os clientes nos quais valia a pena investir e em que contexto: “(os garotos) já conhecem aquele mundo, já sabem quem que paga, quem que tem dinheiro, que não vai te enrolar... e tem uns que o pessoal já diz: Não, esse cara paga bem, ah, esse aí já não paga tanto, com aquele só em último caso...”.
Esse conhecimento - que se incorpora em estratégias consideradas mais adequadas de aproximação, escolhas de clientes e investimento em possíveis clientes fixos - era compreendido por clientes com os quais se conversou nesta pesquisa como representativo de certa “malícia”. Em sintonia com essa interpretação, alguns desses homens (clientes) entendiam que a busca por garotos mais jovens, ou mais “novos”, se justificava não tanto ou não exclusivamente por seus atributos estéticos, mas por eles não terem sido “contaminados” pelos “malefícios da prostituição”. Entretanto, este aspecto de “contaminação” pareceu estar associado à capacidade crescente, ao longo do tempo no local, que os garotos demonstravam em conseguir negociar com mais autonomia seus programas e seduzir outros clientes - processo que acontecia no desenrolar da experiência e do aprendizado nos locais.
A despeito da disparidade de significados e sentidos atribuídos a essas artimanhas de sedução, a valorização dos que eram “novos” aos poucos se mostrou transversal. Esta característica parecia intrinsecamente relacionada a uma ideia de que valeria a pena investir nos portadores de certa inocência e integridade (intrinsecamente vinculadas a uma posição de outsider). Esse investimento, neste sentido, não se restringia a uma leitura concernente à idade dos garotos. Ainda que a idade fosse um marcador possível nas estratégias de sustentação/produção do outsider, ela parecia mais relacionada à possibilidade da ostentação de um corpo vitrine, corpo jovem. Garotos de programa cuja idade era superior à da maioria dos outros trabalhadores - principalmente acima de 30 anos, encarnavam o corpo “digno de vitrine”. Eram requisitados apesar de estarem sujeitos, em função do tempo de circulação nos espaços, a uma vinculação com ideias de periculosidade e malícia.
Neste panorama, o uso estratégico de atributos essencializados para a conquista - como, por exemplo, vemos na literatura acerca da produção de agência no turismo sexual a partir de uma estereotipia de brasilidade e racialização (Cantalice, 2009CANTALICE, Tiago Silva Trindade. 2009. Dando um banho de carinho! Os caça-gringas e as interações afetivo-sexuais em contextos de viagem turística (Pipa RN). Dissertação de Mestrado, Universidade Federal de Pernambuco. Disponível em: Disponível em: http://repositorio.ufpe.br/handle/123456789/606
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) - oportuniza pensarmos paralelos interessantes com o que se vive no contexto do Bar. Ainda que num panorama regional a distância da cidade grande, como local de origem para alguns garotos, possibilite agenciamentos no processo de exibição/produção de si na prostituição, vir do interior do estado e, por isso, ser considerado outsider, pode dar certas vantagens, como dizia um dos garotos de programa que frequentava o Bar, com sotaque interiorano e mais de 30 anos: “Quando tu chegas lá, eles já sabem que tu é novo. Eles já: ‘Ah! gurizinho novo!’. Eles já vêm em cima já”. Ser “novo” parece não se reduzir exclusivamente à presença recente na prostituição, nem à idade, mas se liga a uma conjuntura na qual se articula certa possibilidade de agenciamento por via de um estar forasteiro (as performatividades de juventude e/ou de territorialidade entram para o campo das estratégias de afastamento do estereótipo de prostituto “contaminado”, que afasta a clientela e dificulta a efetividade da economia erótica).
De outro modo, ser cliente “novo” também tem suas peculiaridades. O reconhecimento praticamente imediato dos garotos de um cliente “novo”, vinculado a uma clientela usual do Bar, faz com que se atente para algumas questões. Estar “vestido como cliente” e “com cara de quem tem dinheiro”, como dizia um garoto depois de saber da pesquisa, pareceu bastante próximo da avaliação pela qual passou um garoto de programa, branco, de 20 anos e economicamente abastado: “Quando cheguei pensaram que eu era cliente”. Esta relação se mostra imbricada à concepção de cliente com uma dimensão na qual perpassa determinada hierarquia estética (Schucman, 2014SCHUCMAN, Lia Vainer. 2014. “Sim, nós somos racistas: estudo psicossocial da branquitude em São Paulo”. Psicologia & Sociedade. Nº 26 (1), p. 83-94. Disponível em: http://dx.doi.org/10.1590/S0102-71822014000100010. [Acesso em 05/05/2020].
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), que se compõe articulada com marcadores como raça, capital cultural e idade. Homens mais velhos e que denotavam estabilidade financeira, a caráter de exemplo, por suas roupas, relógios e chaves de carro - no Bar eram usualmente brancos - pareciam ter um especial investimento dos garotos. Estes fatores fazem atentar para a questão performativa dos marcadores de diferença, com particular atenção à idade. Essa plasticidade da idade fazia, como vimos, com que o garoto de 30 anos pudesse ser visto como “gurizinho”, o cliente bom como pagante “maduro”, e o pesquisador branco e jovem como um cliente eventual.
Joel12 12 Autodeclarado pardo, heterossexual, 18 anos. trabalhava neste espaço. Era um garoto jovem, autoidentificado pardo, com escolaridade precária e um contexto familiar de pouco suporte econômico e afetivo. Estava pela segunda vez em Porto Alegre e vinha diretamente de sua cidade natal (do interior do estado). Desta vez parecia mais focado em ficar na cidade, principalmente com o falecimento recente de sua mãe. Ter sido “criado pelo Conselho Tutelar”, como ele referiu, compôs a narrativa sobre sua vida, assim como os envolvimentos com drogas ilícitas que acompanharam a história de sua família. Alguns meses atrás havia sido internado por abuso de substâncias e, após fugir, recorreu a conhecidos que o ajudaram com uma passagem para a capital. Depois de pouco tempo trabalhando como segurança em locais de prostituição de homens, por meio de indicações de um amigo, resolveu ser garoto de programa. Segundo Joel, o lucro era maior e, além disso, mais “divertido”.
Para Samuel, que tinha 25 anos, branco, de olhos claros e não era residente em Porto Alegre, o Bar funcionava principalmente como ponto de encontro com uma lista de clientes que já havia construído em pouco tempo - diferente de Joel, Samuel permanecia pouco tempo no local. Em geral, Samuel se encontrava com clientes em motéis e em domicílio, o que era visto como possibilidade de maior intimidade e conforto para si e para seus clientes. Samuel tinha feito programas, pois alegava que representava uma renda rápida, divertida e um bom investimento. Ao contrário de muitos garotos, Samuel não tinha, como dizia o gerente, a “sua vida na mochila”. Isto porque, entre outras coisas, deixava suas bagagens no hotel pago por um dos clientes fixos em todos os fins de semana em que ia a Porto Alegre. Samuel não fazia o tipo “aba reta”13 13 Termo êmico referente à estética de movimentos de cultura popular, como movimentos de grafite, funk ou pop music, com uso de bonés grandes, roupas largas de marcas esportivas, bijuterias e relógios chamativos, por exemplo - para além dos elementos étnico-raciais associados aos tons escuros de pele e dos cabelos, usualmente raspados. de Joel e da maioria dos garotos. Usava geralmente camisa, um tênis mais formal e calça jeans. Fazia programas para ajudar a pagar a faculdade, economizar dinheiro para o futuro e considerava os programas uma possibilidade agradável de investimento. O fato de sua namorada residir em outra cidade parecia tornar a situação menos complicada, entretanto, ressaltava que era necessário tomar cuidado, já que nem ela, nem suas famílias sabiam que ele exercia a função de garoto de programa em Porto Alegre.
Joel e Samuel, que frequentavam o mesmo Bar, tinham não somente histórias de vida distintas, mas também circulavam de forma diferente pelo espaço. Joel, que tinha a renda do Bar como a principal em sua vida, costumava frequentar o local mais vezes por semana. Samuel, que se dedicava ao curso universitário e ao trabalho nos negócios da família, ia ao Bar somente nos fins de semana e compunha o que o gerente identificava como o “grupo dos garotos mais bonitos” (a partir da narrativa do gerente, uma pessoa que se enquadrava num modelo eurocêntrico). Os dois tinham, mesmo estando no mesmo local de prostituição, possibilidades distintas de negociação e vinculação com os clientes. Enquanto para Joel os clientes disponíveis eram majoritariamente eventuais (o que exigia uma maior quantidade de clientes se a meta fosse um maior ganho financeiro), para Samuel, uma quantidade reduzida de clientes fixos já garantia o pagamento da faculdade e uma considerável renda extra.
A Sauna: “Após o jantar a gente dá a sobremesa”
A Sauna era um estabelecimento grande em comparação com os outros espaços para prostituição em Porto Alegre, funcionando das 15h às 23h30, todos os dias da semana. Em seu site na Internet, o estabelecimento é descrito como local com segurança total, com 14 anos de sucesso e bom atendimento no mercado. Entre as divulgações de festas temáticas e fotos dos ambientes, o lugar é lembrado por ter Dois andares de Alegria e Prazer com cabines e mais de 40 Massagistas. A presença de espaços para massagem é usual, entretanto, é o número de sujeitos divulgados na Internet faz remeter mais especificamente aos boys (termo comumente utilizado para falar dos homens que se dedicam à prostituição em saunas). A fachada tem uma característica já demarcada na literatura, um local sem grandes indicativos (Viana, 2010VIANA, José Queiroz. 2010. É tudo psicológico/dinheiro/pruuu e fica logo duro!: desejo, excitação e prazer entre boys de programa com práticas homossexuais em Recife. Dissertação de Mestrado, Programa de Pós-graduação em Psicologia, Recife, Ufpe. Disponível em: Disponível em: http://repositorio.ufpe.br/handle/123456789/8588
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), e parece materializar o desejo de segurança e sigilo anunciado na página da Internet.
Entrando no prédio há uma recepção, seguida de lugares para despir-se e guardar pertences e, mais adiante, cabines para encontros (cada uma dotada de monitores em que se costumam disponibilizar filmes eróticos heterossexuais). Subindo um lance de escadas, estão o bar onde acontecem shows, corredores com antessalas decoradas com sofás desgastados e, por último, um espaço com vídeos eróticos, alguns assentos e uma área para fumantes. Em frente ao bar, local amplo onde se tem acesso às saunas, encontra-se também um conjunto de mesas e cadeiras. Neste ambiente a entrada das saunas é composta por uma grande parede de vidro, com chuveiros usados pelos boys, comumente como lugar para exibir os atributos corporais para quem está no salão de festas.
O salão tem mobiliário simples e desgastado, com cadeiras e mesas de plástico, e é todo direcionado para um pequeno palco, no qual Drags, com longa ou curta jornada na noite porto-alegrense, se apresentam. Além destas - que lideram a apresentação de shows na casa - strippers e gogoboys divertem os clientes do local. Nos eventos em que performers estão presentes, assim como no caso supracitado do Bar, são servidos jantares para boys e clientes (o mais comum é o churrasco das sextas-feiras). Como indica o promotor de festas: “Eles (os boys) são o atrativo do dia ou da noite. Após o jantar a gente dá como sobremesa”.
Neste ambiente, assim como no Bar, os boys davam dicas (entre si) de possíveis bons clientes, assim como estreitavam laços de coleguismo que acabavam em momentos de lazer e intimidade fora do ambiente. Essas interações, entretanto, não se davam sem conflitos e contradições. Muitas vezes a situação na Sauna era de represália (organizada pelos próprios boys) a quem não obedecesse às combinações das tarifas. A despeito destas e de outras particularidades vinculadas ao território, os controles que envolvem as negociações eram tidos como um problema do âmbito do coleguismo e da boa conduta - uma conduta estabelecida com base numa noção de “negociação entre cavalheiros”. Ainda que a atuação da gerência e de funcionários indique certo controle sobre o que acontece, na Sauna os boys pareciam exercer uma dimensão potente de poder: “[...] a gente é que faz funcionar aquilo ali, né, sem os boys não tem cliente. Antes pagava, pagava R$ 5 pra entrar. E agora não precisa pagar nada, o que tu fizer é teu. Só tem que fazer o cliente gastar, né” (Jonas).
Na Sauna o cliente ruim era principalmente o que tomava muito tempo do boy ou que se satisfazia com os “arretos” (termo êmico que descreve o contato físico que não supõe penetração ou felação e pode incluir masturbação) pelos sofás e antessalas. Como a Sauna é um lugar onde técnicas de sedução como masturbação e exibição de nudez estão mais presentes, faziam-se mais recorrentes as acusações de boys sobre clientes que se satisfaziam sem pagar o programa. Entretanto, no que se referia ao cliente considerado bom, mostrava-se preponderante a combinação cliente fixo/pessoa agradável. O cliente fixo na Sauna era visto da mesma forma que no Bar: um bom “pagador”, generoso e mais estável. Em geral concebido como uma grande oportunidade de ganho, como um dos garotos referiu: uma galinha dos ovos de ouro. Uma forma de conseguir um cliente fixo e também evitar alguns incômodos provenientes dos “arretos” na Sauna era uma postura menos exibicionista e guiada por outras artimanhas, como ilustra Jonas: “Eu fico ali, quietinho, eu fico na minha. Espero o cara chegar, vir conversar comigo, troco uma ideia, bem na manha. E tu vai mais de boa, porque aí ganha um cliente fixo. Eu tô com esse senhor aí que quer me tirar (da prostituição)”.
Ir de boa se fazia como tática para conseguir clientes fixos e envolvia demonstrações diferentes das usualmente relacionadas à prostituição masculina na literatura. Performatizar relacionamentos românticos, envolvendo beijos, afagos e olhares, compunha essa forma de sedução. Se para os boys o cliente fixo gente boa era indicado como escolha genuína, apresentando-se em narrativas sob a forma de certa tensão entre a dimensão ocupacional e a afetiva, para o promotor de festas entrevistado a interpretação era diferente. Segundo ele, o contexto da Sauna podia ser compreendido na figura de um açougue, imagem que inscreve narrativamente a prostituição de homens na lógica capitalista. Para o promotor de festas, ao contrário do que disse Jonas, “o cliente é o número um porque é quem mantém a Sauna”. A despeito da evidente necessidade de interdependência das partes no todo da organização, discursivamente as posições tomadas pelos interlocutores demonstravam processos de negociação do espaço, em jogos de poder (Foucault, 1987FOUCAULT, Michel. 1987. Vigiar e punir. Petrópolis: Ed. Vozes), nos quais a posição de fala também dá a tônica.
Considerações finais
As diferentes relações que se produziram no campo de pesquisa geraram alguns eixos analiticamente estratégicos para a compreensão das prostituições entre homens. A territorialidade analisada e as possíveis composições de sociabilidade que “lumpenizam” a cidade, utilizando a expressão de Perlongher (2008PERLONGHER, Néstor. 2008. O Negócio do Michê - a prostituição viril em São Paulo. São Paulo: Perseu Abramo . [1986]) para dizer de marcas eróticas na urbe, e a série de marcadores sociais que possibilitaram diferentes formas de agenciar-se nesses territórios dizem das possibilidades de exercícios de si e de modos de vida na prostituição.
importante notar que essas composições possíveis não se dão de forma apenas descritiva, mas também prescritiva (Miskolci & Pelúcio, 2008MISKOLCI, Richard & PELÚCIO, Larissa. 2008. “Prefácio - Aquele não mais obscuro negócio do desejo”. In: PERLONGHER, Néstor. O Negócio do Michê - a prostituição viril em São Paulo. São Paulo: Perseu Abramo.). Entendemos que tais dimensões aparecem em particular nesta pesquisa quando ativamente se produzem formas de estar e de se relacionar. Alguns termos êmicos denotaram a intensidade destes aspectos. Como vimos, para alguns ser profissional/picareta configurava posições corretas/incorretas, justas/injustas, honestas/desonestas na prostituição (sem que esta suposta dualidade não fosse possível de quebra, já que o trânsito por essas posições poderia se mostrar bastante volátil). Além disso, compreender o que era um cliente eventual (que poderia nunca mais ser visto, pois conjuntural), recorrente (cuja parceria se fazia presente em muitos momentos, por períodos às vezes longos) ou fixo (nos quais a disposição dicotômica trabalho/ namoro se expressava mais pulverizada e nebulosa) mostrava-se importante forma de acuidade nos negócios. Estas expressões se misturavam às artimanhas vivenciadas na Rua e nas casas de prostituição (artimanhas vistas como formas estratégicas de relação entre gerentes, profissionais do sexo e clientes, por vezes compostas num ambíguo jogo de malícia, afeto, exploração e companheirismo).
De toda forma, nestas diferentes posições possíveis de serem ocupadas (especificamente no caso dos trabalhadores na prostituição entre homens), um aspecto mostrava particular potência no jogo interseccional: o “ser novo”. O “novo” indicava uma especial posição estratégica (predominantemente associada aos jovens, mas não só), uma forma de inserir-se e deslocar-se na prostituição deslizando pelas lógicas de consumo. Ser “novo”, neste sentido, apareceu como produção de subjetividade que coadunava uma série de marcadores sociais de diferença (conjuntamente à geração) como território, masculinidade, orientação sexual, sem a prevalência (a priori) de uma marcação sob as outras.
Parece significativo que marcadores como geração, transversal às vivências dos homens nesta pesquisa, apareçam pela via não simplesmente da marcação cronológica da idade, aspecto já discutido na literatura. Também é significativa a singularidade das situações em análise, na qual se estabelece uma vinculação da geração com espaços existenciais fundados na produção dos corpos (dignos de observação e investimento, não necessariamente de uma idade específica) e dos territórios (na identificação de homens que não são da “cidade grande”, ou conhecedores dos espaços voltados para o público gay). As juventudes que se fazem no cultivo do corpo, no “não ser da cidade”, nos exercícios de masculinidade e nos jogos de presença de companheiras/esposas/namoradas (dando indícios de uma produção estratégica de referência à heterossexualidade) caracterizaram certa forma polimorfa de se compor nas prostituições, inscrevendo diferentes oportunidades nas economias eróticas. Essas produções se expressaram de maneira singular, amparadas por aspectos como raça, capital, aparência, “malandragem”, inocência/integridade enquanto possibilidades não sustentadas em uma dimensão isolada e autoexplicativa.
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Ao buscar definir biopoder, que passou, desde o século XVIII e cada vez mais, a operar no tecido social, Foucault (1988, p. 131FOUCAULT, Michel. 1988. História da Sexualidade I: A vontade de saber. Rio de Janeiro: Ed. Graal., itálicos nossos) diz que “a velha potência da morte em que se simbolizava o poder soberano é agora, cuidadosamente, recoberta pela administração dos corpos e pela gestão calculista da vida”.
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O Black Feminism partiu da necessidade de refletir e responder sobre a situação das mulheres negras estadunidenses, e tem como algumas das estudiosas pioneiras Kimberlé Crenshaw e Patricia Hill Collins.
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Naturalizamos que, em prostituição, se faz sexo. Como vemos no trabalho de Olivar (2011OLIVAR, José Miguel Nieto. 2010. Guerras, trânsitos e apropriações: políticas da prostituição de rua a partir das experiências de quatro mulheres militantes em Porto Alegre, Brasil. Tese de Doutorado, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre. Disponível em: Disponível em: http://www.lume.ufrgs.br/ handle/10183/24035 . [Acesso em 05/05/2020].
http://www.lume.ufrgs.br/ handle/10183/2... ), para algumas mulheres prostitutas a distinção entre fazer programa e sexo não opera de forma estática. -
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Todos os interlocutores estão referidos por meio de nomes fictícios.
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Autodeclarado negro, heterossexual, 50 anos.
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A participação dos homens que exercem prostituição em movimentos sociais voltados para a temática, neste estudo, se mostrou rarefeita. Ezequiel era o único interlocutor que se filiava a alguma organização política.
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Autodeclarado branco, heterossexual, 23 anos.
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“Garotos” ou “boys” são os termos utilizados neste local para indicar homens que se prostituem, relacionados ao circuito bar/sauna que será adiante apresentado.
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Referência ao volume do pênis evidente sob as roupas.
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Autodeclarado branco, heterossexual, 25 anos.
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Autodeclarao branco, heterossexual, 30 anos.
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Autodeclarado pardo, heterossexual, 18 anos.
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Termo êmico referente à estética de movimentos de cultura popular, como movimentos de grafite, funk ou pop music, com uso de bonés grandes, roupas largas de marcas esportivas, bijuterias e relógios chamativos, por exemplo - para além dos elementos étnico-raciais associados aos tons escuros de pele e dos cabelos, usualmente raspados.
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
18 Maio 2020 -
Data do Fascículo
Jan-Apr 2020
Histórico
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Recebido
09 Jun 2019 -
Aceito
06 Abr 2020