Solubilização de fosfatos in vitro por Aspergillus brasiliensis Varga, Frisvad & Samson na presença de fontes de carbono

In vitro solubilization of phosphates by Aspergillus brasiliensis Varga, Frisvad & Samson in the presence of carbon sources

ARTIGOS

Solubilização de fosfatos in vitro por Aspergillus brasiliensis Varga, Frisvad & Samson na presença de fontes de carbono

In vitro solubilization of phosphates by Aspergillus brasiliensis Varga, Frisvad & Samson in the presence of carbon sources

Flavia Paiva Coutinho^I,*; Jennifer Figueiredo da Silva^II; Izabela Pinheiro de Santana^II; Wagner Pereira Felix^II; Adriana Mayumi Yano-Melo^II

^IUniversidade Federal de Pernambuco, Centro de Ciências Biológicas, Departamento de Micologia, Rua Nelson Chaves s/n, CEP 50670-420 Recife, PE, Brasil

^IIUniversidade Federal do Vale do São Francisco, Campus de Ciências Agrárias, Rodovia BR 407, Km 12 Lote 453, Projeto de Irrigação Nilo Coelho C1, CEP 56300-990 Petrolina, PE, Brasil

RESUMO

Os fungos solubilizadores de fosfatos desempenham importante papel na disponibilização de fósforo para as plantas, pois apresentam capacidade de reverter fosfatos insolúveis em formas solúveis. No entanto, a solubilização de fosfatos pode ser influenciada pelo crescimento do fungo, que depende da disponibilidade da fonte de carbono. O objetivo deste trabalho foi avaliar a capacidade e o potencial de solubilização de fontes de fosfato in vitro por Aspergillus brasiliensis na presença de fontes de carbono convencionais (amido, glicose e sacarose) e alternativas (coprodutos da vinificação), na região do Vale do São Francisco, Petrolina, PE, Brasil. Todas as fontes de carbono foram assimiladas pelos espécimes, proporcionando diferentes respostas. Os coprodutos da vinificação estimularam mais o crescimento fúngico, proporcionando maior solubilização dos fosfatos. Conclui-se que os coprodutos da vinificação podem ser utilizados na agricultura como alternativa viável e de menor custo para produzir inóculo de fungos solubilizadores e estimular o crescimento de fungos autóctones, visando a otimização na disponibilização de fontes não renováveis.

Palavras-chave: bagaço de uva, fósforo, fungos filamentosos

ABSTRACT

Phosphate-solubilizing fungi play an important role in the availability of phosphorus for plants, as they are capable of reverting insoluble phosphates into soluble forms. However, the solubilization of phosphates may be influenced by the growth of the fungus, which depends on the availability of carbon. The aim of this study was to evaluate the capacity and potential in vitro solubilization of phosphate sources by Aspergillus brasiliensis in the presence of conventional (starch, glucose, and sucrose) and alternative (co-products of winemaking) carbon sources, in the region of Vale do São Francisco, Petrolina, Pernambuco State, Brazil. All carbon sources were assimilated by the specimens, although providing different responses. The co-products of winemaking stimulated fungal growth, providing greater solubilization of phosphates. It is concluded that the co-products of winemaking can be used in agriculture as a viable alternative and a less costly way to produce inoculum of solubilizing fungi and stimulate the growth of indigenous fungi in order to optimize the availability of non-renewable sources.

Keywords: filamentous fungi, grape bagasse, phosphorus

Introdução

O fósforo (P) é um nutriente essencial às plantas, mas, em geral, encontra-se em baixa disponibilidade no solo, sendo necessárias altas dosagens de adubos fosfatados para a obtenção de alta produtividade (Barroso & Nahas 2008). As adubações são realizadas principalmente com fosfatos solúveis em água, atingindo dosagens de P muito superiores às necessidades das culturas vegetais, pois a maior parte do P adicionado torna-se indisponível às plantas (Wakelin et al. 2004).

Por outro lado, fungos solubilizadores de fosfatos (FSP) desempenham importante papel no suprimento de P para as plantas, pois apresentam capacidade de reverter fosfatos insolúveis em formas solúveis (Xin et al. 2002, Son et al. 2006) através de estratégias bioquímicas, como a produção de ácidos orgânicos, que propiciam uma dissolução direta de fosfatos insolúveis ou a quelação de cátions da molécula (Vassilev et al. 2006). Estes fungos têm sido associados à produção de ácidos orgânicos e, em particular, espécies de Aspergillus e Penicillium mostram habilidade para solubilizar diferentes fontes de fosfato (Bizukojc & Ledakowicz 2004, Vassilev et al. 2006, Chuang et al. 2007). Devido ao fato dessas espécies estarem bem distribuídas na maioria dos solos, a solubilização de P por meio dos fungos pode constituir em alternativa para reduzir os custos de produção e estabelecer a sustentabilidade do sistema agrícola.

Alguns pesquisadores (Ahuja et al. 2007, Scervino et al. 2011) têm estudado o efeito de fontes de carbono (C) na solubilização de P, uma vez que a produção de ácidos orgânicos está associada ao crescimento dos fungos, o qual por sua vez está sujeito à disponibilidade de C (Papagianni et al. 2005). Deste modo, o crescimento dos FSP pode ser incrementado pela incorporação de fontes de C, visando à produção de bioinoculantes em larga escala e com baixo custo. Os trabalhos indicam que os FSP representam uma opção eficiente para maximizar a utilização de fontes naturais não renováveis. Desta forma, o objetivo deste trabalho foi avaliar a capacidade e o potencial de solubilização de fontes de fosfato in vitro por espécimes de Aspergillus brasiliensis Varga, Frisvad & Samson na presença de fontes de carbono convencionais e alternativas.

Material e métodos

Cinco espécimes de fungos solubilizadores de fosfatos (FSP), Aspergillus brasiliensis Varga, Frisvad & Samson, foram isolados de solos rizosféricos de maniçoba (Manihot glaziovii Muell. Arg.), na região do Vale do São Francisco, Petrolina, PE, Brasil (08º59'49"S e 40º16'19"W), utilizando a técnica de suspensão em série (1:1.000 v/v) do solo.

Estes FSP foram cultivados em erlenmeyers contendo 50 ml de meio de cultura GL (Sylvester-Bradley et al. 1982) líquido suplementado com 25 mg P₂O₅ 100 ml^-1 de fonte de fosfato (17% P₂O₅ - RP17; 18% P₂O₅- RP18; 48% P₂O₅ - RP48) e pH do meio ajustado para 6,5. Um mililitro de suspensão de esporos de cada espécime de FSP, representando ca. 10⁷ esporos ml^-1, foi adicionado como inóculo. Os erlenmeyers foram agitados a 160 rpm a 32 ºC por um período de sete dias. Para avaliar o efeito das fontes de carbono na melhoria da solubilização de fosfato, a glicose do meio GL foi substituída por uma das seguintes fontes: amido, sacarose, bagaço de uva derivado da produção de vinho ou da produção de suco. Erlenmeyers com o mesmo meio de cultura, sem inoculação, correspondendo ao tratamento controle, foram mantidos.

As avaliações do fósforo solúvel na solução foram feitas após sete dias de inoculação, retirando-se 5 ml da cultura de cada erlenmeyer. As culturas foram centrifugadas a 10.000 × g por cinco minutos e o sobrenadante foi filtrado (Whatman Nº 40). O fósforo solúvel na solução (filtrado) foi determinado por espectrofotometria (660 nm), segundo procedimento descrito por Tedesco et al. (1995). O pH do sobrenadante foi determinado por potenciômetro e o micélio de cada tratamento foi lavado com água destilada e seco a 70 ºC por três dias ou até peso constante para estimativa da biomassa seca.

Para cada fonte de fosfato foi realizado um experimento em delineamento inteiramente casualizado em arranjo fatorial de seis tratamentos de inoculação (cinco espécimes e um controle) × cinco fontes de carbono (amido, glicose, sacarose, bagaço de uva derivado da produção de suco e da produção de vinho), em cinco repetições. As variáveis analisadas foram P solúvel, pH e biomassa seca.

Os dados foram submetidos à análise de variância (ANOVA) e as médias comparadas pelo teste de Tukey a 1% de probabilidade utilizando-se o programa Statistica 5.0 (Statsoft 1997).

Os dados de P solúvel foram utilizados no cálculo de incremento (Weber et al. 2004) proporcionado pelo FSP, utilizando a fórmula 100[(X-Y)/Y], em que X representa o tratamento inoculado com FSP e Y, o tratamento controle.

Resultados e Discussão

A maioria dos tratamentos com fungos solubilizadores de fosfatos (FSP) apresentou potencial de solubilização das fontes de fosfato, redução do pH do meio de cultura líquido e aumento da biomassa seca dos fungos (tabelas 1, 2 e 3). Contudo, a solubilização de fosfatos tem sido atribuída a inúmeros mecanismos, muitas vezes interdependentes, como o crescimento do fungo e a diminuição do pH (Ahuja et al. 2007).

Constatou-se que a solubilização das fontes de fosfato pelos FSP variou entre as fontes de carbono utilizadas. Os tratamentos com FSP na presença de fosfato RP48 e bagaço de uva derivado da produção de suco, de fosfato RP18 e bagaço de uva derivado da produção de vinho, e de fosfato RP17 e glicose, destacaram-se por apresentarem maiores valores de P solúvel no meio de cultura líquido e, consequentemente, maior incremento (tabelas 1, 2 e 3). Registros na literatura relatam aumento (67%, 44% e 79%) de fosfato solúvel a partir da inoculação com Aspergillus niger Tiegh. (= A. brasiliensis) e Aspergillus sp., respectivamente, em meio de cultura líquido contendo glicose (Saber et al. 2009, Coutinho et al. 2012, Zeroual et al. 2012).

Ahuja et al. (2007), no entanto, ao avaliarem a capacidade de Paecilomyces marquandii (Massee) S. Hughes na presença de amido quanto à solubilização da fonte de fosfato constataram incremento de 195%; Scervino et al. (2011) observaram que a solubilização do fosfato por Penicillium purpurogenum Stoll foi otimizada com adição de glicose como fonte de carbono.

Diferenças na capacidade e no potencial de solubilização, contudo, podem ser atribuídas à eficiência dos espécimes de FSP. Alterações nas condições do meio, entretanto, como a mudança de fontes de carbono, podem modificar a eficiência do processo de solubilização de fosfatos.

Houve alta produção de biomassa seca dos fungos na presença de todas as fontes de fosfato e de carbono. As maiores produções de biomassa fúngica foram registradas na presença de bagaço de uva derivado da produção de suco e da produção de vinho (tabelas 1, 2 e 3), podendo estar associadas à maior solubilização de fosfato. Esses resultados demonstram que fontes de carbono provindas de coprodutos da vinificação mostram-se eficientes para o crescimento de FSP.

Diferenças comportamentais dos FSP quanto às fontes de carbono também têm sido relatadas na literatura. Silva Filho et al. (2002) registraram para Aspergillus sp., maior biomassa seca e P solúvel em meio contendo glicose. Por outro lado, Barroso & Nahas (2008) relataram que a taxa de biomassa e fosfato solubilizado por A. niger foi maior em meio de cultura com manitol.

A redução do pH do meio contendo as fontes de fosfato e de carbono foi observada (tabelas 1, 2 e 3). Contudo, o mecanismo de solubilização de P foi relacionado na literatura à produção de ácidos orgânicos, a qual pode ser atribuída à absorção de carboidrato durante o crescimento fúngico, e à consequente diminuição do pH (Vassilev et al. 2006, Chuang et al. 2007). No entanto, as fontes de fosfato associadas às fontes de carbono de coprodutos da vinificação não apresentaram redução significativa do pH na maioria das vezes, embora tenham apresentado alta solubilização e maior produção de biomassa seca. Assim, podemos indicar que o aumento da biomassa pode elevar o potencial de solubilização e que, além disso, a produção de ácidos orgânicos pode ter sobrepujado esta condição, corroborando o relato de Barroso & Nahas (2008), que afirmaram que efetivamente pode ser observada relação significativa entre a solubilização e a produção de ácidos, mas não com a diminuição do pH.

Com base nos presentes resultados, pode-se sugerir que o aumento na quantidade de fosfato solubilizado em meio contendo bagaço de uva derivado da produção de suco ou da produção de vinho pode ocorrer em razão da alta produção de micélio (biomassa), o que acarreta, por conseguinte, maior produção de ácidos orgânicos pelos fungos durante seu crescimento.

O bagaço de uva torna-se de fundamental importância como alternativa para a utilização em culturas vegetais, auxiliando no crescimento de fungos solubilizadores de fosfatos (FSP) e consequente solubilização do fosfato para as plantas. Além de apresentar custo reduzido por tratar-se de resíduo da uva gerado na fabricação de suco e vinho, o aproveitamento dessa fonte de carbono pode reduzir os impactos gerados pelo seu descarte.

Desse modo, os coprodutos da vinificação podem ser utilizados na agricultura como alternativa viável e de menor custo para produzir inóculo de fungos solubilizadores de fosfatos e estimular o crescimento de fungos autóctones, visando a otimização na disponibilização de fontes não renováveis.

Agradecimentos

Os autores agradecem ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), pelas bolsas de IC (Silva), GD (Coutinho) e PQ (Yano-Melo); à Fundação de Amparo à Ciência e Tecnologia do Estado de Pernambuco (FACEPE), pelo auxílio à pesquisa; à Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa Semiárido), pelo suporte à pesquisa.

Literatura citada

Recebido: 2.10.2013; aceito: 20.01.2014

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  01 Jul 2014
• Data do Fascículo
  Jun 2014

Histórico

• Recebido
  02 Out 2013
• Aceito
  20 Jan 2014