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Indicadores antropométricos em povos e comunidades tradicionais do Brasil: análise de registros individuais do Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional, 2019

Resumo

Objetivo:

Descrever a prevalência de indicadores de baixo peso e de obesidade entre os indivíduos registrados como povos e comunidades tradicionais no Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional, de todo o Brasil, em 2019.

Métodos:

Estudo descritivo, com dados individualizados secundários de participantes atendidos na Atenção Básica do Sistema Único de Saúde.

Resultados:

Na população estudada (N = 13.944), houve maior prevalência de altura baixa entre crianças e adolescentes do sexo masculino (14,2%), quando comparados aos do sexo feminino (11,8%); na população adulta do sexo feminino, observou-se maior prevalência de obesidade (23,0%), quando comparada à do sexo masculino (11,3%); destacou-se a prevalência de altura baixa para a idade nas comunidades ribeirinhas (18,5%), e de obesidade na população adulta faxinalense (75,1%).

Conclusões:

As heterogeneidades antropométricas entre as comunidades exigem respostas adaptadas, com ênfase na atenção primária à saúde e na garantia da segurança alimentar e nutricional.

Palavras-chave:
Epidemiologia Nutricional; Atenção Primária à Saúde; Sistemas de Informação em Saúde; Quilombolas; Roma (Grupo Étnico); Estudos Descritivos

Abstract

Objective:

To describe the prevalence of underweight and obesity indicators among individuals registered as traditional peoples and communities in the Food and Nutrition Surveillance System, across Brazil, in 2019.

Methods:

This was a descriptive study using individual secondary data from participants receiving care in the Primary Health Care within the Brazilian National Health System.

Results:

In the study population (N = 13,944), there was a higher prevalence of short stature among male children and adolescents (14.2%), when compared to their female counterparts (11.8%); in the adult female population, there was a higher prevalence of obesity (23.0%), when compared to the male population (11.3%); the prevalence of low height-for-age in riverine communities (18.5%) and obesity in the adult faxinalense population (75.1%) stood out.

Conclusion:

Anthropometric disparities between different communities require tailored responses, emphasizing targeted primary health care and programs to ensure food and nutrition security.

Keywords:
Nutritional Epidemiology; Primary Health Care; Health Information Systems; Quilombolas; Roma (Ethnic Group); Descriptive Studies

Resumen

Objetivo:

Describir la prevalencia de indicadores de bajo peso y obesidad entre individuos registrados como pueblos y comunidades tradicionales en el Sistema de Vigilancia Alimentaria y Nutricional, en todo Brasil, en 2019.

Métodos:

Estudio descriptivo, con datos secundarios individuales de participantes atendidos en atención primaria de Salud del Sistema Único de Salud.

Resultados:

En la población estudiada (N = 13.944), hubo mayor prevalencia de talla baja en niños y adolescentes en el sexo masculino (14,2%), cuando se compara con el femenino (11,8%); en la población adulta femenina hubo mayor prevalencia de obesidad (23,0%), en comparación con la masculina (11,3%); se destacó la prevalencia de baja talla para la edad en comunidades ribereñas (18,5%), y obesidad en la población adulta faxinalense (75,1%).

Conclusiones:

Las heterogeneidades antropométricas entre comunidades requieren respuestas adaptadas, con énfasis en la atención primaria de salud y en garantizar la seguridad alimentaria y nutricional.

Palabras-clave:
Epidemiología Nutricional; Primeros Auxilios; Sistemas de Información en Salud; Quilombolas; Romaní; Estudios Descriptivos

Contribuições do estudo

Principais resultados

Foi possível identificar maior prevalência de peso baixo e de altura baixa para a idade na população infantil de comunidades ribeirinhas, enquanto comunidades faxinalenses apresentaram maior prevalência de obesidade em adultos.

Implicações para os serviços

Indica-se o aprimoramento contínuo na aplicação dos protocolos do Sisvan, bem como o reforço na assistência prestada às comunidades com piores indicadores.

Perspectivas

Estudos que avaliem o impacto potencial de intervenções para mitigar os efeitos da desnutrição nas comunidades, por meio de pesquisas qualitativas em profundidade ou estudos quantitativos probabilísticos com dados primários.

INTRODUÇÃO

No Brasil, a vigilância alimentar e nutricional é uma estratégia adotada no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) para monitorar e avaliar as condições nutricionais da população usuária da Atenção Básica.11. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Marco de referência da vigilância alimentar e nutricional na atenção básica. Brasília: Ministério da Saúde; 2015. Essa vigilância objetiva manter o diagnóstico atualizado de problemas da área de alimentação e nutrição, relevantes para a saúde pública, oferecendo subsídios ao planejamento e execução de medidas que visam melhorar a situação alimentar e nutricional da população brasileira.22. Ministério da Saúde (BR). Manual operacional para uso do Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional - SISVAN - v. 3.0 [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2017 [citado 2023 Jun 7]. 39 p. Disponível em: Disponível em: https://sisaps.saude.gov.br/sisvan/public/file/ManualDoSisvan.pdf .
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Uma das principais ferramentas utilizadas para o alcance desse objetivo é o Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional (Sisvan), em que são registradas informações sobre o consumo alimentar e o estado nutricional de indivíduos de ambos os sexos, todas as faixas etárias e raça/cor da pele, escolaridade, ou ainda, pertencentes a povos e comunidades tradicionais.22. Ministério da Saúde (BR). Manual operacional para uso do Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional - SISVAN - v. 3.0 [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2017 [citado 2023 Jun 7]. 39 p. Disponível em: Disponível em: https://sisaps.saude.gov.br/sisvan/public/file/ManualDoSisvan.pdf .
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Povos e comunidades tradicionais são grupos culturalmente diferenciados, reconhecem-se como tais, contam com formas próprias de organização social, ocupam territórios e dependem de recursos naturais como condição para sua reprodução - cultural, social, religiosa, ancestral e econômica -, utilizando-se, para tanto, de conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição.33. Brasil. Casa Civil. Decreto nº 6.040, de 7 de fevereiro de 2007. Institui a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais. Diário Oficial da União, Brasília (DF), 2007 Fev 8, Seção 1:316. Apesar de todo o arcabouço legal criado para assegurar seu desenvolvimento sustentável, diversas vulnerabilidades sociais ainda são vivenciadas nos territórios onde vivem esses povos,44. Piedras RC, Lima LL. Povos e comunidades tradicionais e a política de assistência social: uma revisão sistemática da literatura. Brazilian J Dev. 2022;8(8):60231-42. doi: 10.34117/bjdv8n8-348.
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atribuídas à influência de um paradigma de modernização, etnocentrismo, marginalização e interesses econômicos adversos a seu modus vivendi.55. Souza WKA. Trabalho-educação, economia e cultura em povos e comunidades tradicionais: a (re)afirmação de modos de vida como formas de resistência [tese]. Universidade Federal Fluminense, Faculdade de Educação; 2020 [citado 2023 Set 9]. 222 p. Disponível em: Disponível em: https://app.uff.br/riuff/handle/1/16380 .
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),(66. Cunha MC, Magalhães SB, Adams C. Povos tradicionais e biodiversidade no Brasil: contribuições dos povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais para a biodiversidade, políticas e ameaças [Internet]. São Paulo Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência; 2022 [citado 2023 Set 9]. Disponível em: Disponível em: http://portal.sbpcnet.org.br/publicacoes/povos-tradicionais-e-biodiversidade-no-brasil/ .
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Diretrizes que remontam à 3ª Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional já destacavam a vulnerabilidade dessas comunidades à insegurança alimentar.77. Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (BR). III Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional: por um desenvolvimento sustentável com soberania e segurança alimentar e nutricional. Brasília: Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional; 2007. 43 p. Esse fenômeno estaria diretamente relacionado à perda de seus territórios, degradação ambiental, mudanças climáticas, políticas públicas inadequadas e exclusão social, o que prejudicaria o acesso a alimentos de qualidade e em quantidade suficiente, podendo levar a outros problemas de saúde.44. Piedras RC, Lima LL. Povos e comunidades tradicionais e a política de assistência social: uma revisão sistemática da literatura. Brazilian J Dev. 2022;8(8):60231-42. doi: 10.34117/bjdv8n8-348.
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),(66. Cunha MC, Magalhães SB, Adams C. Povos tradicionais e biodiversidade no Brasil: contribuições dos povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais para a biodiversidade, políticas e ameaças [Internet]. São Paulo Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência; 2022 [citado 2023 Set 9]. Disponível em: Disponível em: http://portal.sbpcnet.org.br/publicacoes/povos-tradicionais-e-biodiversidade-no-brasil/ .
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),(88. Lopes AF, Carvalho MJLN, Aquino NB, Soares MLA, Carvalho SCC, Barros FB. Escala brasileira de insegurança alimentar: proposta adaptada para povos e comunidades tradicionais. Demetra (Rio J.). 2022;17:e66149. doi: 10.12957/demetra.2022.66149.
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Sob o prisma epidemiológico, particularidades foram observadas nessas comunidades, quando comparadas à população geral. Associações entre o índice de massa corpórea (IMC) e maiores prevalências de hipertensão arterial foram verificadas em comunidades quilombolas, por exemplo.99. Santos DMS, Prado BS, Oliveira CCC, Almeida-Santos MA. Prevalence of systemic arterial hypertension in quilombola communities, state of Sergipe, Brazil. Arq Bras Cardiol. 2019;113(3):383-390. doi: 10.5935/abc.20190143.
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No âmbito internacional, povos ciganos, residentes em assentamentos no Leste Europeu, referiram maior prevalência de obesidade, síndrome metabólica e doenças parasitárias, quando comparados à população não cigana.1010. Macejova Z, Kristian P, Janicko M, Halanova M, Drazilova S, Antolova D, et al. The Roma population living in segregated settlements in eastern Slovakia has a higher prevalence of metabolic syndrome, kidney disease, viral hepatitis b and e, and some parasitic diseases compared to the majority population. Int J Environ Res Public Health. 2020;17(9):3112. doi: 10.3390/ijerph17093112.
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A outra face da má nutrição também é percebida nesses povos, evidenciada pela ocorrência de altas taxas de mortalidade infantil e desnutrição em comunidades ribeirinhas da Amazônia.1111. Fundo das Nações Unidas para a Infância. Agenda pela Infância e Adolescência na Amazônia [Internet]. [s.l.]: Fundo das Nações Unidas para a Infância; [citado 2023 Set 9]. Disponível em: https://www.unicef.org/brazil/media/1131/file/Agenda_pela_infancia_e_adolescencia_na_Amazonia.pdf.
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O acompanhamento antropométrico dos povos e comunidades tradicionais é fundamental para o planejamento de políticas públicas voltadas à promoção da saúde, segurança alimentar e nutricional. Estes indicadores permitem mensurar, de forma indireta, o estado da insegurança alimentar, orientar estratégias de intervenção e monitorar a efetividade das políticas implementadas, no âmbito geral ou específico, em cada comunidade.1212. Athila AR, Leite MS. “A medida da fome”: as escalas psicométricas de insegurança alimentar e os povos indígenas no Brasil. Cad Saude Publica. 2020;36(10):e00208019. doi: 10.1590/0102-311X00208019.
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O presente estudo teve por objetivo descrever a prevalência de indicadores de baixo peso e de obesidade entre os indivíduos registrados como povos e comunidades tradicionais no Sisvan, em todo o Brasil, no ano de 2019.

MÉTODOS

Desenho do estudo

Estudo descritivo, utilizando-se dados individuados secundários, referentes ao estado nutricional de indivíduos pertencentes a povos e comunidades tradicionais do Brasil, registrados no Sisvan em 2019.

Contexto

O Sisvan é um sistema de informações em saúde de abrangência nacional, que provê dados contínuos sobre as condições nutricionais e alimentares da população usuária da Atenção Básica no SUS. Desde 2013, o Sistema fornece informações específicas da condição de pertencimento ou não do indivíduo registrado a algum povo e comunidade tradicional.1313. RedeNutri. SISVAN web lança sua primeira versão revisada a partir de março 2013 [Internet]. [s.l.]: RedeNutri; 2013 [citado 2023 Set 9]. Disponível em: http://ecos-redenutri.bvs.br/tiki-read_article.php?articleId=646.
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Em 2016, deu-se início ao processo de integração entre a estratégia e-SUS Atenção Básica (e-SUS AB) e o Sisvan, refletido no aumento dos registros no Sistema.1414. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Integração entre e-SUS AB e SISVAN [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2017 [citado 2023 Jun 7]. Disponível em: Disponível em: https://aps.saude.gov.br/noticia/2479 .
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Os dados deste estudo foram coletados no contexto das visitas de rotina dos indivíduos dessas comunidades a equipamentos públicos de saúde da Atenção Básica, de todo o país, registrados no período de 1o de janeiro de 2019 a 31 de dezembro de 2019.

No ano de 2019, cujos dados foram coletados para este estudo, o Programa Bolsa Família realizava a transferência de renda para famílias carentes sob a condição de manterem suas crianças com 7 anos de idade incompletos em acompanhamento nutricional.11. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Marco de referência da vigilância alimentar e nutricional na atenção básica. Brasília: Ministério da Saúde; 2015.

Participantes

Foram utilizados dados dos indivíduos registrados no Sisvan, considerando-se como critérios de inclusão o registro realizado em 2019 e o indivíduo registrado pertencente a povos e comunidades tradicionais reconhecidos na ficha de cadastro e acompanhamento do Sistema. O ano de 2019 foi escolhido pela maior quantidade de registros de povos e comunidades tradicionais, entre os dados que foram cedidos à equipe. Outros aspectos que pesaram na escolha desse período foram, primeiramente, ser imediatamente anterior a 2020, quando foram tomadas as medidas de distanciamento físico em razão da emergência da pandemia de covid-19, e o fato de o Bolsa Família estar vigente e devidamente implementado, permitindo sua comparabilidade com anos anteriores e os anos após a retomada do Programa.

Foram excluídas do estudo (i) as observações duplicadas, mantendo-se o registro mais recente, (ii) os registros de adultos com peso inferior a 30 kg e superior a 300 kg ou com altura maior que 2,20 m e menor que 1,20 m, conforme recomendado pelo Ministério da Saúde para a Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico,1515. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Vigilância em Saúde Departamento de Análise em Saúde e Vigilância de Doenças Não Transmissíveis. Vigitel Brasil 2019: vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico: estimativas sobre frequência e distribuição sociodemográfica de fatores de risco e proteção para doenças crônicas nas capitais dos 26 estados brasileiros e no Distrito Federal em 2019 [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2020 [citado 2023 Jun 7]. Disponível em: Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/vigitel_brasil_2019_vigilancia_fatores_risco.pdf .
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e (iii) as observações de crianças ou adolescentes com escores Z, considerados implausíveis segundo recomendação pela OMS para inquéritos antropométricos infantis.1616. World Health Organization, United Nations Children’s Fund. Recommendations for data collection, analysis and reporting on anthropometric indicators in children under 5 years old [Internet]. Geneva: World Health Organization; 2019 [citado 2023 Jun 7]. 145 p. Available from: Available from: https://www.who.int/publications/i/item/9789241515559 .
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Variáveis

As variáveis utilizadas foram classificadas em dois grupos: sociodemográficas e antropométricas.

As variáveis sociodemográficas compreenderam:

a) macrorregião nacional de residência (Norte; Nordeste; Sudeste; Sul; Centro-Oeste);

b) sexo (feminino; masculino);

c) faixa etária, derivada da diferença no tempo entre a data de acompanhamento e a data de nascimento (0 a 5 meses; 6 a 11 meses; 1 ano; 2 anos; 3 a 5 anos; 6 a 10 anos; 11 a 19 anos; 20 a 39 anos; 40 a 49 anos; 50 a 59 anos; 60 a 69 anos; 70 a 79 anos; 80 anos ou mais);

d) raça/cor da pele (branca; parda; preta; indígena e amarela),

e) escolaridade (ensino fundamental incompleto ou menos; ensino fundamental completo; ensino médio completo; ensino superior completo ou mais);

f) povo ou comunidade tradicional, segundo a ficha de cadastro e acompanhamento do Sisvan (povos quilombolas; agroextrativistas; catingueiros; caiçaras; comunidades de fundo e fecho de pasto; comunidades do Cerrado; extrativistas; faxinalenses; geraizeiros; marisqueiros; pantaneiros; pescadores artesanais; pomeranos; povos ciganos; povos de terreiro; quebradeiras de coco de babaçu; retireiros; ribeirinhos; seringueiros; vazanteiros).1717. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Ficha de Cadastro e Acompanhamento Nutricional do SISVAN [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2023 [citado 2023 Jun 7]. 2 p. Disponível em: Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/composicao/saps/vigilancia-alimentar-e-nutricional/publicacoes/documentos-sisvan-web/ficha_cadastro_sisvan.pdf/view .
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As variáveis antropométricas foram:

a) peso, em quilogramas (kg);

b) altura ou comprimento, em centímetros (cm);

c) peso-para-idade, em escores Z;1818. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Orientações para a coleta e análise de dados antropométricos em serviços de saúde: norma técnica do Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional - SISVAN. Brasília: Ministério da Saúde; 2011. 71 p. (Série G Estatística e Informação em Saúde).

d) altura-para-idade, em escores Z;1818. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Orientações para a coleta e análise de dados antropométricos em serviços de saúde: norma técnica do Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional - SISVAN. Brasília: Ministério da Saúde; 2011. 71 p. (Série G Estatística e Informação em Saúde).

e) IMC-para-idade, em escores Z;1818. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Orientações para a coleta e análise de dados antropométricos em serviços de saúde: norma técnica do Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional - SISVAN. Brasília: Ministério da Saúde; 2011. 71 p. (Série G Estatística e Informação em Saúde).

f) IMC, em quilogramas por metro quadrado (kg/m²);1818. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Orientações para a coleta e análise de dados antropométricos em serviços de saúde: norma técnica do Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional - SISVAN. Brasília: Ministério da Saúde; 2011. 71 p. (Série G Estatística e Informação em Saúde).

g) indicativo de peso baixo para a idade, em crianças (escore Z < -2);1919. Ferreira HS. Anthropometric assessment of children’s nutritional status: a new approach based on an adaptation of Waterlow’s classification. BMC Pediatr. 2020;20(1):65. doi: 10.1186/s12887-020-1940-6.
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h) indicativo de altura baixa para a idade, em crianças e adolescentes (escore Z < -2);1919. Ferreira HS. Anthropometric assessment of children’s nutritional status: a new approach based on an adaptation of Waterlow’s classification. BMC Pediatr. 2020;20(1):65. doi: 10.1186/s12887-020-1940-6.
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i) indicativo de peso e altura baixos para a idade, segundo o critério adaptado de Waterlow, em crianças (escores Z < -2, em ambos);1919. Ferreira HS. Anthropometric assessment of children’s nutritional status: a new approach based on an adaptation of Waterlow’s classification. BMC Pediatr. 2020;20(1):65. doi: 10.1186/s12887-020-1940-6.
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j) indicativo de peso alto para a idade, em crianças (escore Z > 2);1919. Ferreira HS. Anthropometric assessment of children’s nutritional status: a new approach based on an adaptation of Waterlow’s classification. BMC Pediatr. 2020;20(1):65. doi: 10.1186/s12887-020-1940-6.
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k) baixo peso, em adultos (IMC < 18,5 kg/m²) e idosos (IMC ≤ 22 kg/m²);1818. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Orientações para a coleta e análise de dados antropométricos em serviços de saúde: norma técnica do Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional - SISVAN. Brasília: Ministério da Saúde; 2011. 71 p. (Série G Estatística e Informação em Saúde).

l) obesidade em adultos (IMC ≥ 30 kg/m²);1818. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Orientações para a coleta e análise de dados antropométricos em serviços de saúde: norma técnica do Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional - SISVAN. Brasília: Ministério da Saúde; 2011. 71 p. (Série G Estatística e Informação em Saúde).

m) excesso de peso em adultos (IMC ≥ 25 kg/m²) e idosos (IMC ≥ 27 kg/m²).1818. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Orientações para a coleta e análise de dados antropométricos em serviços de saúde: norma técnica do Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional - SISVAN. Brasília: Ministério da Saúde; 2011. 71 p. (Série G Estatística e Informação em Saúde).

Fontes e mensuração de dados

Os dados individuais oriundos do Sisvan foram obtidos mediante encaminhamento de ofício, no qual foi solicitada a cessão dos dados ao Gabinete da Secretaria de Atenção à Saúde, acompanhado do Termo de Responsabilidade devidamente preenchido e da documentação listada em portaria específica.2020. Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 884, de 13 de dezembro de 2011 [Internet]. Diário Oficial da União, Brasília (DF) , 2011 Dez 14 [citado 2023 Jun 7], Seção 1:80. Disponível em: Disponível em: https://pesquisa.in.gov.br/imprensa/jsp/visualiza/index.jsp?jornal=1&pagina=80&data=14/12/2011 .
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Relativamente à mensuração dos dados, destaca-se a existência de protocolos para a coleta de dados antropométricos no âmbito do Sisvan, que abrangem todas as fases da vida. Entretanto, não é possível assegurar que todos os profissionais encarregados da aferição dos dados utilizados neste estudo tiveram acesso a instrumentos calibrados ou passaram por treinamentos padronizados, dada a amplitude e a heterogeneidade das realidades brasileiras. Para crianças com até 2 anos de idade, recomenda-se que o peso seja coletado em balanças pediátricas, mecânicas ou digitais, com a criança posicionada de modo a distribuir o peso igualmente. O comprimento deve ser aferido por meio de infantômetros, mantendo-se a cabeça apoiada firmemente contra a parte fixa do equipamento, o pescoço reto e o queixo afastado do peito, no plano de Frankfurt.1818. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Orientações para a coleta e análise de dados antropométricos em serviços de saúde: norma técnica do Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional - SISVAN. Brasília: Ministério da Saúde; 2011. 71 p. (Série G Estatística e Informação em Saúde).

Para pessoas maiores de 2 anos de idade, espera-se que o peso seja aferido por meio de balanças mecânicas de plataforma ou digitais. O indivíduo deve ser posicionado de costas para a balança, descalço, com o mínimo de roupa possível, no centro do equipamento, ereto, com os pés juntos e os braços estendidos ao longo do corpo. Indica-se que a altura seja mensurada por estadiômetro, com o indivíduo descalço e sua cabeça livre de adereços, no centro do equipamento, mantido de pé, ereto, com os braços estendidos ao longo do corpo, olhando para um ponto fixo na altura dos olhos, com a cabeça erguida, posicionada no plano de Frankfurt.1818. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Orientações para a coleta e análise de dados antropométricos em serviços de saúde: norma técnica do Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional - SISVAN. Brasília: Ministério da Saúde; 2011. 71 p. (Série G Estatística e Informação em Saúde).

Viés

No intuito de reduzir o risco da ocorrência de vieses, protocolos do Sisvan22. Ministério da Saúde (BR). Manual operacional para uso do Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional - SISVAN - v. 3.0 [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2017 [citado 2023 Jun 7]. 39 p. Disponível em: Disponível em: https://sisaps.saude.gov.br/sisvan/public/file/ManualDoSisvan.pdf .
https://sisaps.saude.gov.br/sisvan/publi...
),(1717. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Ficha de Cadastro e Acompanhamento Nutricional do SISVAN [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2023 [citado 2023 Jun 7]. 2 p. Disponível em: Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/composicao/saps/vigilancia-alimentar-e-nutricional/publicacoes/documentos-sisvan-web/ficha_cadastro_sisvan.pdf/view .
https://www.gov.br/saude/pt-br/composica...
),(1818. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Orientações para a coleta e análise de dados antropométricos em serviços de saúde: norma técnica do Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional - SISVAN. Brasília: Ministério da Saúde; 2011. 71 p. (Série G Estatística e Informação em Saúde).),(2121. Ministério da Saúde (BR). Manual orientador para aquisição de equipamentos antropométricos: Portaria nº 2.975, de 14 de dezembro de 2011. Brasília: Ministério da Saúde; 2012. 18 p. foram observados no sentido de manter coerência entre os procedimentos de rotina e a análise realizada. Além dessas medidas, aplicou-se o critério de exclusão de valores antropométricos implausíveis, no intuito de reduzir possíveis equívocos quando da aferição de peso e altura, ou ainda, na digitalização das informações no Sistema.

Métodos estatísticos

A qualidade dos dados foi investigada e não foram identificadas evidências de inconformidades, de acordo com o recomendado pela OMS.1616. World Health Organization, United Nations Children’s Fund. Recommendations for data collection, analysis and reporting on anthropometric indicators in children under 5 years old [Internet]. Geneva: World Health Organization; 2019 [citado 2023 Jun 7]. 145 p. Available from: Available from: https://www.who.int/publications/i/item/9789241515559 .
https://www.who.int/publications/i/item/...
O material gráfico relacionado a essa verificação está disponibilizado em material suplementar. A distribuição de frequências, absolutas e relativas, das características sociodemográficas e antropométricas foi descrita segundo o sexo. Regressões quantílicas bivariadas foram conduzidas, tendo como variável dependente “peso”, “altura” ou “IMC”; e como variável independente, “idade”. Termos quadráticos foram inseridos em todos os modelos, dando conta de relações curvilíneas entre cada uma das variáveis independentes e a variável dependente. Cada regressão bivariada foi realizada cinco vezes, para os percentis 3, 15, 50, 85 e 97. Diagramas de dispersão foram elaborados, contando com os pontos observados e as curvas estimadas nas regressões quantílicas, referentes a cada percentil mencionado.

Foram calculados escores Z a partir dos dados de peso, altura, idade e sexo, referenciados segundo as curvas de crescimento fornecidas pela OMS.2222. Vidmar SI, Cole TJ, Pan H. Standardizing anthropometric measures in children and adolescents with functions for egen: update. Stata J. 2013;13(2):366-78. doi: 10.1177/1536867X1301300211.
https://doi.org/10.1177/1536867X13013002...
A média e o intervalo de confiança de 95% (IC95%)do IMC e dos escores Z de peso-para-idade, altura-para-idade e IMC-para-idade foram calculados segundo cada povo e comunidade tradicional. Afinal, foram descritas as prevalências e respectivos IC95% dos seguintes indicativos: altura baixa para a idade, em crianças e adolescentes; peso baixo para a idade, peso e altura baixos para a idade e excesso de peso, em crianças; e baixo peso, obesidade e excesso de peso, em adultos.

A manipulação da base de dados referente à população total registrada no Sisvan foi realizada utilizando-se o aplicativo Google Colab para a linguagem de programação Python. Após a seleção, os dados foram armazenados, limpos e analisados com o uso do software Stata, versão 16. Valores faltantes foram tratados com exclusão de linha.

Considerações éticas

Informações individuais inominadas foram cedidas pela Secretaria de Atenção Primária à Saúde do Ministério da Saúde (SAPS/MS), e foram utilizadas exclusivamente para fins estatísticos. Na obtenção dos dados, levou-se em consideração a relevância social do estudo e a avaliação de potenciais riscos e benefícios, conforme preconiza o Conselho Nacional de Saúde (CNS). O projeto do estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos da Universidade de Fortaleza (Coética/Unifor): processo de aprovação iniciado em abril de 2020, sob o Parecer n.º 4.348.452 e Certificado de Apresentação para Apreciação Ética (CAAE) n.º 31540320.9.1001.5052.

RESULTADOS

A população de estudo contou com 13.944 indivíduos de ambos os sexos, entre 0 e 101 anos de idade. Esse quantitativo resultou da aplicação dos critérios de inclusão e exclusão, a partir de 79.100.900 registros ocorridos em 2019, em todo o país (Figura 1).

Figura 1
Seleção da população do estudo

Na Tabela 1, são descritas as características sociodemográficas e antropométricas da população de estudo, estratificadas de acordo com o sexo. Os povos e comunidades tradicionais mais frequentes foram os ribeirinhos (50,3%), os geraizeiros (13,3%) e os quilombolas (9,9%).

Tabela 1
Caracterização sociodemográfica e antropométrica de brasileiros pertencentes a povos e comunidades tradicionais registrados no Sisvan, segundo sexo (N = 13.944), Brasil, 2019

As comunidades com menor população registrada no Sisvan foram as de quebradeiras de coco-de-babaçu (< 0,1%), os faxinalenses (0,1%) e o povo cigano (0,1%).

Houve predomínio de participantes da região Norte (56,4%), seguida pelo Nordeste (20,8%), Sudeste (18,9%), Sul (2,2%) e Centro-Oeste (1,6%). Houve maior frequência da faixa etária de 10 a 19 anos no sexo feminino (23,4%), e de 5 a 9 anos no sexo masculino (28,3%). A raça/cor da pele mais frequente foi a parda (65,0%), seguida pela branca (13,7%), amarela (7,1%), preta (5,0%) e indígena (4,3%). O grau de escolaridade mais frequente foi o da categoria de ensino “fundamental incompleto ou menos” (58,3%), e a maior parte dos registros foi realizada no sistema e-SUS AB (56,7%) (Tabela 1).

Houve maior prevalência de indicativo de altura baixa para a idade entre crianças e adolescentes no sexo masculino (14,2%), quando comparado ao mesmo indicativo no sexo feminino (11,8%). Não houve evidência de maior prevalência de indicativo de peso baixo para a idade e peso alto para a idade entre as crianças e adolescentes de algum dos sexos. Em relação aos registros da população adulta do sexo feminino, foram observadas maiores prevalências de obesidade (23,0%) e de excesso de peso (57,6%), na comparação com o sexo masculino (11,3% e 42,4%, respectivamente) (Tabela 1).

A distribuição do peso por idade segundo os sexos é apresentada na Figura 2. Observou-se que o peso, a altura e o IMC medianos dos indivíduos não se relacionaram de forma linear com a idade, mas de forma curvilínea. As observações referentes ao peso nas crianças distribuem-se de forma similar entre os sexos, sendo ligeiramente maiores para o sexo masculino aos 5 anos de idade. A distribuição da altura na população entre 0 e 19 anos de idade diferiu entre os sexos, de forma mais pronunciada a partir dos 14 anos, em que a mediana para o sexo feminino tendeu a estabilizar-se, em comparação à mediana observada no sexo masculino, que continuou a aumentar até os 19 anos. Verificou-se, ainda, mediana de IMC maior na faixa etária de 50 a 55 anos, em ambos os sexos.

Figura 2
Distribuição e percentis de peso, altura e índice de massa corpórea de brasileiros pertencentes a povos e comunidades tradicionais registrados no Sisvan,a segundo sexo e idade, Brasil, 2019

As comunidades que apresentam menores médias de escores Z de peso-para-idade e altura-para-idade foram as comunidades ribeirinhas. Comunidades de quebradeiras de coco-de-babaçu apresentaram as menores médias de escores Z de IMC-para-idade e IMC em adultos do sexo feminino. Os povos ciganos apresentaram as maiores médias de escores Z de peso-para-idade até 5 anos, enquanto comunidades faxinalenses referiram a maiores médias de escores Z de peso-para-idade em crianças e de IMC no sexo feminino. A maior média de IMC no sexo masculino ocorreu nas comunidades pomeranas (Figura 3).

Figura 3
Média e intervalos de confiança de 95% de escores Z e de índice de massa corpórea de brasileiros pertencentes a povos e comunidades tradicionais registrados no Sisvan,a segundo grupo etário e de pertencimento, Brasil, 2019

Prevalências de indicadores antropométricos são apresentadas na Figura 4 e detalhadas em material suplementar. A prevalência de altura baixa para a idade foi maior em comunidades ciganas (44,4%). Em comunidades ribeirinhas, houve maior prevalência de altura baixa para a idade (18,5%), de forma estatisticamente significante quando comparada à prevalência nas demais comunidades - à exceção das comunidades de retireiros, pescadores artesanais, extrativistas, de fundo e fecho de pasto e faxinalenses. Entre os povos e comunidades tradicionais em que ocorreram casos indicativos de peso baixo para a idade, as comunidades ribeirinhas apresentaram maior prevalência desse indicador (6,5%), quando comparada à mesma prevalência nos povos caiçaras (1,4%) e geraizeiros (2,4%). Comunidades faxinalenses apresentaram maior prevalência de obesidade (75,1%), quando comparada à mesma prevalência nos demais povos e comunidades tradicionais - à exceção dos povos de terreiro, pomeranos, seringueiros, retireiros, ciganos e caiçaras.

Figura 4
Prevalência de indicativos de baixo peso e obesidade em brasileiros pertencentes a povos e comunidades tradicionais registrados no Sisvan,a segundo grupo etário e de pertencimento, Brasil, 2019

DISCUSSÃO

Maiores prevalências de baixo peso para a idade em crianças foram observadas em comunidades ribeirinhas, quando comparadas a outros povos e comunidades tradicionais. As comunidades ribeirinhas e de pescadores artesanais também apresentaram as maiores prevalências de altura baixa para a idade entre crianças e adolescentes. Comunidades faxinalenses apresentaram a maior prevalência de obesidade entre adultos, bem como de excesso de peso, na comparação com outras comunidades estudadas.

O povo ou comunidade tradicional presente em maior proporção foi o ribeirinho, para o qual se observou a segunda maior prevalência de indicativos de altura baixa para a idade e de peso baixo para a idade. Essas comunidades localizam- -se, em grande medida, no território da Amazônia, e seus indicadores de saúde vêm sendo descritos, inclusive, em relatórios internacionais.1111. Fundo das Nações Unidas para a Infância. Agenda pela Infância e Adolescência na Amazônia [Internet]. [s.l.]: Fundo das Nações Unidas para a Infância; [citado 2023 Set 9]. Disponível em: https://www.unicef.org/brazil/media/1131/file/Agenda_pela_infancia_e_adolescencia_na_Amazonia.pdf.
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As dificuldades ambientais vivenciadas nos territórios, com ciclos intermitentes de secas e cheias nos cursos de água, ocasionando as dificuldades sazonais em atividades de pesca,2323. Tregidgo D, Barlow J, Pompeu PS, Parry L. Tough fishing and severe seasonal food insecurity in Amazonian flooded forests. People Nat. 2020;2(2):468-82. doi: 10.1002/pan3.10086.
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somadas aos aspectos observados na gestão do governo federal, a exemplo da extinção do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional em 2019,2424. Santarelli M, David G, Burity V, Rocha NC. Informe Dhana 2019: autoritarismo, negação de direitos e fome [Internet]. Brasília: FIAN Brasil; 2019 [citado em 2023 Jun 7]. 102 p. Disponível em: Disponível em: https://fianbrasil.org.br/informe-dhana-2019-faca-download-aqui/ .
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o não cumprimento de metas para projetos de segurança alimentar e nutricional de populações amazônicas em 20192525. Fundação Nacional do Índio. Relatório anual de gestão: 2019 [Internet]. Brasília: Fundação Nacional do Índio; 2020 [citado em 2023 Set 9]. 235 p. Disponível em: Disponível em: https://www.gov.br/funai/pt-br/acesso-a-informacao/auditorias/Relatorio_Anual_de_Gestao_2019_versao_final.pdf .
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e o foco em ações de segurança alimentar de cunho emergencial, em detrimento de medidas estruturantes para populações indígenas,2626. Instituto de Estudos Socioeconômicos, Indigenistas Associados. Fundação Anti-Indígena: um retrato da Funai sob o governo Bolsonaro. Brasília: Instituto de Estudos Socioeconômicos; 2022 [citado em 2023 Set 9]. 211 p. Disponível em: https://static.poder360.com.br/2022/06/dossie-funai-governo-bolsonaro.pdf.
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podem ter ocasionado situações de insegurança alimentar, manifestada pela insuficiência de alimentos, e influenciado as altas prevalências de baixo peso infantil encontradas.

A maior parte dos povos ou comunidades tradicionais deste estudo apresentaram, pelo menos, um caso indicativo de peso baixo para a idade ou altura baixa para a idade em crianças ou adolescentes.

Segundo critério proposto pela OMS,1616. World Health Organization, United Nations Children’s Fund. Recommendations for data collection, analysis and reporting on anthropometric indicators in children under 5 years old [Internet]. Geneva: World Health Organization; 2019 [citado 2023 Jun 7]. 145 p. Available from: Available from: https://www.who.int/publications/i/item/9789241515559 .
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a prevalência de peso baixo para a idade é considerada alta no patamar de 10%, valor cujas comunidades de pescadores artesanais ultrapassaram em 43,0% (14,3%). Na zona costeira da cidade de Salvador, a precarização do setor pesqueiro foi investigada em comunidades de pescadores artesanais e marisqueiros em 2020, havendo-se percebido menor grau de segurança alimentar e suporte social, além de piores expectativas quanto ao recebimento de benefícios assistenciais e à cooperação com outros setores da sociedade.2727. Reis-Filho J, Quinto D. The COVID-19, social isolation, artisanal fishery and food security: How these issues are related and how important is the sovereignty of fishing workers in the face of the dystopian scenario. Scielo Prepr. 2020;1-26.

Comunidades ciganas, caiçaras e faxinalenses apresentaram os maiores percentuais de obesidade entre os adultos. Questões relacionadas à alta prevalência de obesidade em comunidades ciganas foram observadas na Eslováquia, cuja prevalência de obesidade em adultos foi 29% maior quando comparada à da população adulta geral. Esse fenômeno foi explicado por hábitos alimentares relacionados a maior ingestão calórica, em um contexto de baixo acesso a serviços de saúde.1010. Macejova Z, Kristian P, Janicko M, Halanova M, Drazilova S, Antolova D, et al. The Roma population living in segregated settlements in eastern Slovakia has a higher prevalence of metabolic syndrome, kidney disease, viral hepatitis b and e, and some parasitic diseases compared to the majority population. Int J Environ Res Public Health. 2020;17(9):3112. doi: 10.3390/ijerph17093112.
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Com relação aos povos caiçaras, representantes destas comunidades relatam a influência da especulação imobiliária em seus modos de vida e em seus territórios, ocasionando prejuízos às tradições, e êxodos populacionais,2828. Versolato F, Gomes MJM. Direito dos povos e comunidades tradicionais em territórios protegidos [Internet]. São Paulo: Instituto Pólis; >. 2016 [citado em 2023 Set 9]. 82 p. Disponível em: Disponível em: https://polis.org.br/wp-content/uploads/2020/03/cad_06.pdf .
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fatores que podem se refletir no consumo de alimentos com maior grau de processamento, dada a maior disponibilidade desses produtos em ambientes alimentares urbanos.2929. Downs SM, Ahmed S, Fanzo J, Herforth A. food environment typology: advancing an expanded definition, framework, and methodological approach for improved characterization of wild, cultivated, and built food environments toward sustainable diets. Foods. 2020;9(4):532. doi: 10.3390/foods9040532.
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No âmbito internacional, o conceito brasileiro de povos e comunidades tradicionais33. Brasil. Casa Civil. Decreto nº 6.040, de 7 de fevereiro de 2007. Institui a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais. Diário Oficial da União, Brasília (DF), 2007 Fev 8, Seção 1:316. encontra paralelo semântico na expressão peasants and other people working in rural areas, aplicada na Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Camponeses e Outras Pessoas que Trabalham em Áreas Rurais,3030. United Nations. United Nations Declaration on the Rights of Peasants and Other People Working in Rural Areas [Internet]. Conference Report; 2018 Oct 8 [cited 2023 Set 9]; Human Rights Council - Thirty-ninth session 2018 10-28 September. Available from: https://www.fao.org/family-farming/detail/en/c/1197482/.
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documento no qual também é mencionada a preocupação com o fato de esses povos sofrerem desproporcionalmente, com a pobreza, a fome e a subnutrição; nesse sentido, a Declaração propõe medidas para assegurar o direito desses povos a alimentação e soberania alimentar, enfatizando o combate à desnutrição infantil, a determinação de seus sistemas alimentares e a restrição ao uso de produtos agrícolas nocivos à saúde.

As limitações deste estudo podem ser enquadradas em duas categorias: a generalização dos resultados para além das respectivas populações de estudo; e o grau de precisão dos indicadores antropométricos utilizados. Tendo em vista a possibilidade de haver maior presença de indivíduos que buscaram benefícios assistenciais nessa população, e considerando-se as heterogeneidades entre as regiões brasileiras, no tocante aos recursos humanos e materiais dos serviços de saúde, não se devem estender generalizações dos resultados do presente estudo para indivíduos pertencentes aos povos e comunidades tradicionais que não utilizariam o Sisvan. Igualmente importante é ressaltar o caráter dos indicadores utilizados, aproximações de fenômenos complexos relativos à subnutrição e excesso de peso, voltados ao pensamento populacional e que, portanto, devem ser compreendidos com as ressalvas clínicas necessárias, agregando entendimentos antropológicos e genéticos.

Ao descrever a distribuição dos indicadores antropométricos e das prevalências de baixo peso e obesidade, confirma-se a importância do Sisvan para o monitoramento da situação nutricional dos povos e comunidades tradicionais, alguns dos grupos mais vulneráveis à insegurança alimentar no Brasil. Os achados evidenciam diferenças significativas em indicadores do estado nutricional nas comunidades observadas, demonstrando a necessidade de serem realizadas pesquisas específicas, no contexto de cada povo, subsidiando intervenções que visem reduzir ou eliminar iniquidades vivenciadas no âmbito da alimentação e nutrição.

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  • FINANCIAMENTO

    O estudo foi financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (CNPq/MCTI), e pelo Departamento de Ciência e Tecnologia, da Secretaria de Ciência, Tecnologia, Inovação e Insumos Estratégicos em Saúde, do Ministério da Saúde (Decit/SCTIE/MS), por meio do Edital MS-SCTIE-Decit/CNPq nº 26/2019, além da Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição do Departamento de Promoção da Saúde, da Secretaria de Atenção Primária à Saúde do Ministério da Saúde (CGAN/DEPROS/SAPS/MS) - Processo nº 442852/2019-3.

Figura suplementar 1

- Análise da qualidade dos dados de brasileiros pertencentes a povos e comunidades tradicionais registrados no Sisvan, Brasil, 2019

Figura suplementar 1
- Análise da qualidade dos dados de brasileiros pertencentes a povos e comunidades tradicionais registrados no Sisvan, Brasil, 2019

Figura suplementar 2
- Distribuição da frequência de peso, altura, IMC e escores Z de brasileiros pertencentes a povos e comunidades tradicionais registrados no Sisvan, Brasil, 2019

Tabela suplementar
1 - Prevalências de indicadores antropométricos de brasileiros pertencentes a povos e comunidades tradicionais registrados no Sisvan, segundo grupo de pertencimento e etário (n = 13.944), Brasil, 2019

Editado por

Editora associada:

Doroteia Aparecida Höfelmann - https://orcid.org/0000-0003-1046-3319

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    18 Dez 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    07 Jul 2023
  • Aceito
    17 Out 2023
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