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Intercalação hipotática temporal entre sujeito e verbo em língua portuguesa e a (re)construção referencial

Temporal hypotactic intercalation between subject and verb in portuguese language and the referential (re)construction

RESUMO

As cláusulas temporais que se intercalam entre sujeito e verbo têm função de orientação referencial, segundo Cavalcante (2020), embora o autor não a tenha especificado com detalhes. Nesse sentido, a partir de um diálogo entre o Funcionalismo linguístico e a Linguística Textual (NEVES, 2004; BRAGA; PAIVA, 2017), objetivamos verificar o modo como as temporais intercaladas entre sujeito e verbo servem à referenciação (MONDADA; DUBOIS, 2019 [1995]). O corpus desta investigação é composto de textos formais compilados pelo grupo de pesquisa NUPACT-UFJF. Após coleta de cláusulas temporais prototípicas, introduzidas pelo conector “quando”, localizamos 439 dados dessas cláusulas em distintas posições, entre as quais 75 eram intercaladas. Entre as intercaladas, apenas 9 tokens representavam o type sujeito-cláusula temporal-verbo, cujo referente sujeito é analisado sob a ótica dos processos referenciais (CAVALCANTE; MARTINS, 2020) e pelos parâmetros “definitude” (NEVES, 2013), “estatuto informacional” (PRINCE, 1992), “acessibilidade anafórica” e “persistência catafórica” (GIVÓN, 1995). Os resultados mostram que as temporais intercaladas podem servir a várias funções no processo de referenciação, dentro da função mais geral de (re)construção referencial: (i) focalizar determinado recorte na linha evolutiva temporal da existência de um referente, (ii) restringir um referente, (iii) recategorizar um referente, (iv) especificar um referente, (v) construir uma avaliação de um referente, (vi) retomar anaforicamente um referente, (vii) promover a topicalização de um referente, (viii) facilitar a referenciação tópica e (ix) explicitar uma mudança de perspectiva tópica. Confirma-se, portanto, a assunção de que os usos intercalados servem à (re)construção referencial nos textos e podem também contribuir para o dinamismo tópico das enunciações.

Palavras-chave:
Cláusulas Hipotáticas Temporais; Referenciação; Intercalação; Descontinuidade; Deslocamento

ABSTRACT

Temporal clauses that are interspersed between subject and verb have a referential orientation function, according to Cavalcante (2020), although the author has not specified it in detail. In this sense, from a dialogue between Functionalism in linguistics and Textual Linguistics (NEVES, 2004; BRAGA; PAIVA, 2017), we aim to verify how the temporals interspersed between subject and verb serve the referenciation (MONDADA; DUBOIS, 2019 [1995]). The corpus of this investigation is composed of formal texts compiled by the NUPACT-UFJF research group. After collecting prototypical temporal clauses, introduced by the connector when, we located 439 data from these clauses in different positions, among which 75 were intercalated. Among the interspersed, only 9 tokens represent the subject-temporal clause-verb type, whose referent subject is analyzed from the perspective of referential processes (CAVALCANTE; MARTINS, 2020) and by the parameters of definiteness (NEVES, 2013), informational status (PRINCE, 1992), anaphoric accessibility and cataphoric persistence (GIVÓN, 1995). The results show that the interspersed temporals can serve several functions in the referential process: (i) focus a certain cut in the temporal evolutionary line of the existence of a referent, (ii) restrict a referent, (iii) recategorize a referent, (iv) specify a referent, (v) build an evaluation of a referent, (vi) anaphorically resuming a referent, (vii) promote the topicalization of a referent, (viii) facilitate topical referenciation, and (ix) explaining a change in topical perspective. Therefore, the assumption that the interspersed uses serve the referential construction in the texts and can also contribute to the topical dynamism of the utterances is confirmed.

Keywords:
Temporal Hypotactic Clauses; Referenciation; Intercalation; Discontinuity; Displacement

Introdução

As teorias que lidam com os usos linguísticos compartilham do pressuposto de que é na interação que a língua revela sua instrumentalidade e que as coordenadas discursivas também precisam ser analisadas para além da materialidade linguística. Entre essas correntes, o Funcionalismo e a Linguística de Texto podem, cada uma a seu modo, fornecer contribuições para a análise dos textos em situações efetivas de comunicação. Por isso,

defendemos que um diálogo entre as duas pode trazer contribuições para ambas e que a incorporação de variáveis textuais é crucial para a explicação de uma vasta gama de fenômenos linguísticos. Embora possam partir de pontos distintos - a estrutura linguística, no caso das diferentes abordagens funcionalistas; o texto, no caso da Linguística Textual -, essas correntes inevitavelmente se encontram, quando buscam não apenas descrever, mas, principalmente, explicar a forma e o uso da língua tanto na sua modalidade falada como na escrita (BRAGA; PAIVA, 2017BRAGA, Maria Luiza; PAIVA, Maria da Conceição de. Linguística textual e sintaxe. In: SOUZA, Edson Rosa Francisco de; PENHAVEL, Eduardo; CINTRA, Marcos Rogério. (orgs.). Linguística Textual: interfaces e delimitações - Homenagem a Ingedore Grünfeld Villaça Koch. São Paulo: Cortez, 2017. p. 189-210., p. 190).

Entre os fenômenos que podem contribuir para a eficácia dos propósitos comunicativos está a intercalação, especificamente, as cláusulas intercaladas, que, embora interrompam a ordem canônica da cláusula nuclear que escopam, atuam na construção discursiva.

Em Cavalcante (2020CAVALCANTE, Sávio André de Souza. Efeitos prototípicos da intercalação de Cláusulas Hipotáticas Circunstanciais Temporais no Espanhol mexicano oral. 2020. 214 f. Tese (Doutorado em Linguística) - Centro de Humanidades, Programa de pós-graduação em Linguística, Universidade Federal Ceará, Fortaleza, 2020. Disponível em: Disponível em: http://repositorio.ufc.br/bitstream/riufc/51477/1/2020_tese_sascavalcante.pdf . Acesso em: 26 ago. 2021.
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), propõe-se que as intercaladas constituem uma categoria de protótipos e que cada locus da intercalação é moldado segundo pressões de cunho pragmático. Entre os types intercalados que o autor descreve estão as intercaladas entre sujeito e verbo, que, segundo o pesquisador, atuam na orientação referencial. No entanto, não há um detalhamento sobre essa função nos textos, motivo pelo qual defendemos um refinamento da exposição sobre a articulação entre os usos intercalados e sua função no processo da referenciação.

Embora nosso foco seja um fenômeno sintático específico - a intercalação de cláusulas temporais -, estamos cientes de que o processo da referenciação não se encerra na identificação de expressões referenciais, mas “podem se evidenciar nos textos por diferentes sistemas semióticos” (CAVALCANTE; MARTINS, 2020CAVALCANTE, Sávio André de Souza. Efeitos prototípicos da intercalação de Cláusulas Hipotáticas Circunstanciais Temporais no Espanhol mexicano oral. 2020. 214 f. Tese (Doutorado em Linguística) - Centro de Humanidades, Programa de pós-graduação em Linguística, Universidade Federal Ceará, Fortaleza, 2020. Disponível em: Disponível em: http://repositorio.ufc.br/bitstream/riufc/51477/1/2020_tese_sascavalcante.pdf . Acesso em: 26 ago. 2021.
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, p. 245) e pelo “entorno sociocognitivo” (LIMA; FELTES, 2013LIMA, Silvana Maria Calixto de; FELTES, Heloísa Pedroso de Moraes. A construção de referentes no texto/discurso: um processo de múltiplas âncoras. In: CAVALCANTE, Mônica Magalhães; LIMA, Silvana Maria Calixto de. (orgs.). Referenciação: teoria e prática. São Paulo: Cortez , 2013. p. 30-58., p. 37). Para tanto, os referentes precisam ser identificáveis e acessíveis (NEVES, 2004NEVES, Maria Helena de Moura. Funcionalismo e linguística do texto. Revista do GEL, v. 1, p. 71-89, 2004. Disponível em: Disponível em: https://revistadogel.emnuvens.com.br/rg/article/view/292 . Acesso em: 12 set. 2021.
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), não necessariamente na materialidade textual. Para ilustrar a discussão, vejamos o texto a seguir:

(01)

Polícia usa homens à paisana para identificar grupos que abusam de mulheres no metrô

Dezesseis homens foram detidos neste ano por atentado violento ao pudor e um foi enquadrado por estupro nas linhas de trens e metrô de São Paulo

Por: Eduardo Gonçalves 19/03/2014 às 18:45

Na maior cidade do país, não basta ter de enfrentar diariamente o drama de vagões e plataformas de trens e metrô superlotados, com riscos de furtos e uma malha de trilhos deficitária. As mulheres, agora, têm de conviver com um estúpido grupo que se articula pelas redes sociais para incentivar o assédio sexual. São os autointitulados “Encoxadores”, que gravam pelo celular passageiras sofrendo abusos nos trens e compartilham as imagens nas redes sociais - a página no Facebook tinha 12.000 seguidores até ser tirada do ar.

Nesta terça-feira, a Polícia Civil informou que infiltrou homens à paisana para tentar identificar os depravados nas estações de trens do Metrô e da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM). Neste ano, a polícia prendeu dezessete homens que assediaram mulheres em vagões. Mas, depois de detidos, a punição - quando ocorre - é branda: a ocorrência é registrada como atentado violento ao pudor e o infrator é liberado. No pior dos cenários, um juiz acata a denúncia no futuro e impõe uma pena como pagamento de cestas básicas ou prestação de serviços comunitários. “Se dependesse da polícia, eles ficariam presos, mas é o juiz quem decide”, afirmou o delegado Osvaldo Nico Gonçalves, da Divisão Especial de Atendimento ao Turista (Deatur), à qual se subordina a Delegacia de Polícia do Metropolitano (Delpom). (Corpus NUPACT - Revista Veja - 19/03/2014, negrito dos autores, itálico nosso).

No trecho “a punição - quando ocorre - é branda”, verifica-se uma cláusula1 1 Consideramos cláusula, no sentido de Thompson e Couper-Kuhlen (2005), como a expressão formada por predicado e os sintagmas que o acompanham. nuclear interrompida por uma cláusula temporal. Essa ruptura acontece na fronteira entre sujeito e verbo, e não é aleatória: serve para imprimir uma restrição ao referente “punição”. Esse referente, definido, inferível (PRINCE, 1992PRINCE, Ellen. The ZPG letter: subjects, definiteness, and information status. In: THOMPSON, Sandra; MANN, William (eds.). Discourse Description: diverse analyses of a fund raising text. Philadelphia: John Benjamins, 1992. p. 295-325.) e dotado de alta topicalidade (GIVÓN, 1995GIVÓN, Talmy. Functionalism and grammar. Philadelphia: J. Benjamins, 1995.), ativado pelo frame dos itens “prendeu” (em “a polícia prendeu”), “detidos” (em “foram detidos” e “depois de detidos”) e “enquadrado” (em “foi enquadrado”), é uma anáfora associativa, cuja elaboração evolui, entre outros meios, por novas retomadas anafóricas (elipse do sujeito em “quando ocorre”) e por uma expressão referencial definida (KOCH, 2015KOCH, Ingedore Villaça. Introdução à Linguística Textual - Trajetória e grandes temas. 2. ed. São Paulo: Contexto , 2015.) (“branda”).

A estratégia de intercalação temporal em “quando ocorre”, similar à relativização (no momento em que ocorre), com matizes de condicionalidade (se ocorre) e de concessividade (embora ocorra), pressupõe duas categorias de referentes: o das punições efetivas e o das punições que não se efetivam (as chamadas “injustiças”). A cláusula temporal em destaque restringe o referente, associa-o à primeira categoria e recorta determinado marco temporal em sua evolução.

Uma vez restringido temporalmente o referente, a ele é predicada uma característica: a punição (embora tenha ocorrido) é branda, interpretação confirmada pelo que segue: “o infrator é liberado” e “um juiz (...) impõe uma pena como pagamento de cestas básicas ou prestação de serviços comunitários”. Essas proposições que seguem à menção ao referente funcionam como anáforas encapsuladoras prospectivas (KOCH, 2015KOCH, Ingedore Villaça. Introdução à Linguística Textual - Trajetória e grandes temas. 2. ed. São Paulo: Contexto , 2015.) da nominalização “punição”. A intercalação após o sujeito sentencial, iconicamente (GIVÓN, 1995GIVÓN, Talmy. Functionalism and grammar. Philadelphia: J. Benjamins, 1995., 2001GIVÓN, Talmy. Syntax: an introduction - volume I. Amsterdam: J. Benjamins, 2001.) situada junto a um termo de caráter nominal, restringe-lhe o significado, contribuindo para sua (re)construção referencial.

Dadas essas considerações, este trabalho objetiva analisar as cláusulas intercaladas temporais entre sujeito e verbo e verificar sua função na referenciação (MONDADA; DUBOIS, 2019MONDADA, Lorenza; DUBOIS, Danièle. Construção dos objetos de discurso e categorização: uma abordagem dos processos referenciais. In: CAVALCANTE, Mônica Magalhães; RODRIGUES, Bernardete Biasi; CIULLA, Alena. (org.). Referenciação. São Paulo: Contexto , 2019. p. 17-52. (Título original: Construction des objets de discours et catégorisation: une approche des processus de référenciation. 1995). [1995MONDADA, Lorenza; DUBOIS, Danièle. Construção dos objetos de discurso e categorização: uma abordagem dos processos referenciais. In: CAVALCANTE, Mônica Magalhães; RODRIGUES, Bernardete Biasi; CIULLA, Alena. (org.). Referenciação. São Paulo: Contexto , 2019. p. 17-52. (Título original: Construction des objets de discours et catégorisation: une approche des processus de référenciation. 1995).]), considerando processos de introdução e retomada referencial (anáforas) e os parâmetros definitude (NEVES, 2013NEVES, Maria Helena de Moura. Texto e gramática. São Paulo: Editora Contexto, 2013.), estatuto informacional (PRINCE, 1992PRINCE, Ellen. The ZPG letter: subjects, definiteness, and information status. In: THOMPSON, Sandra; MANN, William (eds.). Discourse Description: diverse analyses of a fund raising text. Philadelphia: John Benjamins, 1992. p. 295-325.), acessibilidade anafórica e persistência tópica (GIVÓN, 1995GIVÓN, Talmy. Functionalism and grammar. Philadelphia: J. Benjamins, 1995.).

Para tanto, na próxima seção, apresentaremos a definição de cláusula temporal e de intercalação que seguimos. Além disso, delimitaremos a visão de referenciação adotada neste trabalho, especificando os processos referenciais e os fatores analíticos que circundam o fenômeno: definitude, estatuto informacional, acessibilidade anafórica e persistência tópica. Em seguida, apresentamos a metodologia e a análise/discussão dos resultados. O texto encerra-se com as considerações finais e as referências.

Cláusulas temporais e a intercalação

As denominadas “orações temporais” são reconhecidas na tradição gramatical como aquelas que “exprimem o ‘tempo’ de ocorrência do que se enuncia na respectiva oração principal” (LUFT, 2002LUFT, Celso Pedro. Moderna gramática brasileira. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Globo, 2002., p. 89). Iniciadas por uma conjunção subordinativa temporal (CUNHA; CINTRA, 2008CUNHA, Celso; CINTRA, Lindley. Nova gramática do português contemporâneo. 5. ed. Rio de Janeiro: Lexicon, 2008.), seu papel é “trazer à cena um acontecimento ocorrido antes de outro, depois de outro, ou ao mesmo tempo que outro” (ROCHA LIMA, 1988ROCHA LIMA, Carlos Henrique da. Gramática normativa da língua portuguesa. 29. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1988., p. 257, itálico do autor). Na perspectiva funcionalista, as temporais podem servir à hipotaxe, à parataxe e ao encaixamento (LIMA-HERNANDES, 2004LIMA-HERNANDES, Maria Célia. Estágios de gramaticalização da noção de tempo - processos de combinação de orações. Veredas - Rev. Est. Ling., Juiz de Fora, v. 8, n. 1-2, p. 183-194, jan./dez. 2004. Disponível em: Disponível em: https://www.ufjf.br/revistaveredas/files/2009/12/cap12.pdf . Acesso em: 13 jul. 2020.
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; CAVALCANTE; COAN, 2021CAVALCANTE, Sávio André de Souza; COAN, Márluce. Um mapeamento funcional das cláusulas temporais: variação, processamento e codificação. InterteXto, v. 14, n. 1, p. 117-145, set. 2021. Disponível em: Disponível em: http://seer.uftm.edu.br/revistaeletronica/index.php/intertexto/article/view/4834 . Acesso em: 12 set. 2021.
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).

O rol de conjunções temporais inclui “quando, antes que, depois que, até que, logo que, sempre que, assim que, desde que, todas as vezes que, cada vez que, apenas, mal, que [= desde que], etc.” (CUNHA; CINTRA, 2008CUNHA, Celso; CINTRA, Lindley. Nova gramática do português contemporâneo. 5. ed. Rio de Janeiro: Lexicon, 2008., p. 601). Entre essas conjunções, “a mais geral das partículas é quando, com a qual se exprime, de maneira mais ou menos vaga, a ocasião em que se passa um fato” (ROCHA LIMA, 1988ROCHA LIMA, Carlos Henrique da. Gramática normativa da língua portuguesa. 29. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1988., p. 257, itálico do autor), apresentando, geralmente, um significado menos específico que o das demais conjunções (NEVES, 2018NEVES, Maria Helena de Moura. A gramática do português revelada em textos. São Paulo: Editora Unesp, 2018.). Pelo fato de o quando também funcionar como pronome relativo, sugere-se uma aproximação entre temporais e adjetivas (NEVES, 2018NEVES, Maria Helena de Moura. A gramática do português revelada em textos. São Paulo: Editora Unesp, 2018.).

Funcionando como pronome relativo, o quando pode ou não ter antecedente expresso. No primeiro caso, funciona como adjunto adnominal de um antecedente com valor temporal e adquire contornos de adjetivo, enquanto, no segundo caso, com valor nominal, encerra em si mesmo o antecedente (quando = o momento (em) que) (NEVES, 2018NEVES, Maria Helena de Moura. A gramática do português revelada em textos. São Paulo: Editora Unesp, 2018.). No entanto, os usos de quando, associados a um termo nominal, nem sempre exigem que esse antecedente tenha valor temporal:

(02)

EXAME - Que papel o Brasil deveria ter nessa situação?

Moisés Naím - Um papel de solidariedade com aqueles que estão querendo a democracia. As ruas da Venezuela têm hoje milhares de mulheres que são como Dilma Rousseff quando tinha seus 20 anos. Ela sabe o que é repressão do governo militar, o que é tortura e lutou sempre contra isso. (Corpus NUPACT - Revista Exame - 05/03/2014, negrito nosso).

No exemplo apresentado, há uma restrição de determinado tempo na linha evolutiva do referente Dilma Rousseff: sua juventude. A cláusula temporal, ao tomar como escopo um termo de valor nominal, restringe determinado momento da linha temporal em que se encontra o referente-alvo. Nesses usos muito próximos à relativização, Lima-Hernandes (2004LIMA-HERNANDES, Maria Célia. Estágios de gramaticalização da noção de tempo - processos de combinação de orações. Veredas - Rev. Est. Ling., Juiz de Fora, v. 8, n. 1-2, p. 183-194, jan./dez. 2004. Disponível em: Disponível em: https://www.ufjf.br/revistaveredas/files/2009/12/cap12.pdf . Acesso em: 13 jul. 2020.
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) distingue uma função determinativa (restrição) e uma função apositiva (especificação). Um dos mecanismos que permitem a antecipação de informações dessa natureza para junto dos referentes é a intercalação.

Quando se fala em intercalação, é necessário lembrar que, por motivos relacionados às pressões do uso, a estrutura canônica SVO(C) é interrompida, havendo descontinuidade (GARCÍA VELASCO, 2011GARCÍA VELASCO, Daniel. Discontinuity and displacement in a functional theory of grammar. In: IBÁÑEZ IBÁÑEZ, José R.; FERNÁNDEZ SÁNCHEZ, José Francisco (eds.). A view from the south: contemporary english and american studies. Almería: AEDEAN / U de Almería; Ministerio de Ciencia e Innovación, 2011. p. 412-420. ). No caso das temporais, cujo escopo canônico é o verbo, sua intercalação mais à esquerda da sentença implica em antecipação de informação, que, por ser indispensável à continuidade do fluxo discursivo, não pode ser posta ao final.

Uma vez que os estudos mostram uma função de guia/orientação inerente às temporais (DECAT, 2001DECAT, Maria Beatriz Nascimento. A articulação hipotática adverbial no português em uso. In: DECAT, Maria Beatriz Nascimento et al. (org.). Aspectos da gramática do português: uma abordagem funcionalista. Campinas: Mercado de Letras, 2001. p. 103-166. 5 v.), seu deslocamento implica que essa informação é necessária para o entendimento do que será narrado na sequência. No caso das intercaladas entre sujeito e verbo, que assumem função de orientação referencial (CAVALCANTE, 2020CAVALCANTE, Sávio André de Souza. Efeitos prototípicos da intercalação de Cláusulas Hipotáticas Circunstanciais Temporais no Espanhol mexicano oral. 2020. 214 f. Tese (Doutorado em Linguística) - Centro de Humanidades, Programa de pós-graduação em Linguística, Universidade Federal Ceará, Fortaleza, 2020. Disponível em: Disponível em: http://repositorio.ufc.br/bitstream/riufc/51477/1/2020_tese_sascavalcante.pdf . Acesso em: 26 ago. 2021.
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), há também um arranjo em função de pressões relativas à iconicidade (GIVÓN, 1995GIVÓN, Talmy. Functionalism and grammar. Philadelphia: J. Benjamins, 1995., 2001GIVÓN, Talmy. Syntax: an introduction - volume I. Amsterdam: J. Benjamins, 2001.), já que, nesses casos, a temporal atua na modificação nominal e, portanto, fica disposta espacialmente junto ao termo que modifica. Tendo em vista a rede referencial dos textos, essa configuração sintática contribui para a (re)construção do referente-alvo, cuja restrição/especificação antecipada é necessária para o desenvolvimento do texto. Vejamos, na próxima seção, a visão de referenciação adotada neste trabalho.

Referenciação

Em Mondada e Dubois (2019MONDADA, Lorenza; DUBOIS, Danièle. Construção dos objetos de discurso e categorização: uma abordagem dos processos referenciais. In: CAVALCANTE, Mônica Magalhães; RODRIGUES, Bernardete Biasi; CIULLA, Alena. (org.). Referenciação. São Paulo: Contexto , 2019. p. 17-52. (Título original: Construction des objets de discours et catégorisation: une approche des processus de référenciation. 1995). [1995MONDADA, Lorenza; DUBOIS, Danièle. Construção dos objetos de discurso e categorização: uma abordagem dos processos referenciais. In: CAVALCANTE, Mônica Magalhães; RODRIGUES, Bernardete Biasi; CIULLA, Alena. (org.). Referenciação. São Paulo: Contexto , 2019. p. 17-52. (Título original: Construction des objets de discours et catégorisation: une approche des processus de référenciation. 1995).]), propõe-se o processo de referenciação, ao invés da referência. No lugar de uma concepção que sugere que os objetos do mundo são representados pela linguagem, mas existem independentemente dela, a referenciação “implica uma visão dinâmica que leva em conta não somente o sujeito ‘encarnado’, mas ainda um sujeito sócio-cognitivo mediante uma relação indireta entre os discursos e o mundo” (MONDADA; DUBOIS, 2019MONDADA, Lorenza; DUBOIS, Danièle. Construção dos objetos de discurso e categorização: uma abordagem dos processos referenciais. In: CAVALCANTE, Mônica Magalhães; RODRIGUES, Bernardete Biasi; CIULLA, Alena. (org.). Referenciação. São Paulo: Contexto , 2019. p. 17-52. (Título original: Construction des objets de discours et catégorisation: une approche des processus de référenciation. 1995).[1995MONDADA, Lorenza; DUBOIS, Danièle. Construção dos objetos de discurso e categorização: uma abordagem dos processos referenciais. In: CAVALCANTE, Mônica Magalhães; RODRIGUES, Bernardete Biasi; CIULLA, Alena. (org.). Referenciação. São Paulo: Contexto , 2019. p. 17-52. (Título original: Construction des objets de discours et catégorisation: une approche des processus de référenciation. 1995).], p. 20). A referenciação, portanto, é uma (re)elaboração da realidade, é negociada entre os interlocutores e é sócio-cognitiva (CAVALCANTE, 2017CAVALCANTE, Mônica Magalhães. Os sentidos do texto. São Paulo: Contexto, 2017.; CAVALCANTE; CUSTÓDIO FILHO; BRITO, 2014CAVALCANTE, Mônica Magalhães; CUSTÓDIO FILHO, Valdinar; BRITO, Mariza Angélica Paiva. Coerência, referenciação e ensino. São Paulo: Cortez , 2014.). Sendo assim, os textos erigem ‘objetos de discurso’, produtos culturais da atividade cognitiva e interativa dos seres humanos (APOTHÉLOZ; REICHLER-BÉGUELIN, 1995APOTHÉLOZ, Denis; REICHLER-BÉGUELIN, Marie-José. Construction de la reference et strategies de designation. TRANEL (TRavaux NEuchâtelois de Linguistique), v. 23, p. 227-271, 1995. Disponível em: Disponível em: http://www.unine.ch/files/live/sites/tranel/files/Tranel/23/Apothéloz et Reichler-Béguelin_227-271.pdf . Acesso em: 12 set. 2021.
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).

O referente, portanto, “é um objeto, uma entidade, uma representação construída a partir do texto e percebida, na maioria das vezes, a partir do uso de expressões referenciais” (CAVALCANTE, 2017CAVALCANTE, Mônica Magalhães. Os sentidos do texto. São Paulo: Contexto, 2017., p. 98). A expressão referencial, nessa visão, “é uma estrutura linguística utilizada para manifestar formalmente, na superfície do texto (ou seja, no cotexto), a representação de um referente” (CAVALCANTE; CUSTÓDIO FILHO; BRITO, 2014CAVALCANTE, Mônica Magalhães; CUSTÓDIO FILHO, Valdinar; BRITO, Mariza Angélica Paiva. Coerência, referenciação e ensino. São Paulo: Cortez , 2014., p. 28). Essas expressões referenciais podem, nos textos, assumir a forma de pronomes, expressões nominais definidas e indefinidas (KOCH, 2015KOCH, Ingedore Villaça. Introdução à Linguística Textual - Trajetória e grandes temas. 2. ed. São Paulo: Contexto , 2015.).

Considerar a referenciação pressupõe uma construção textual dos objetos do mundo, não dados aprioristicamente, mas com elaboração que depende das coordenadas discursivas. Nesse sentido, Mondada e Dubois (2019MONDADA, Lorenza; DUBOIS, Danièle. Construção dos objetos de discurso e categorização: uma abordagem dos processos referenciais. In: CAVALCANTE, Mônica Magalhães; RODRIGUES, Bernardete Biasi; CIULLA, Alena. (org.). Referenciação. São Paulo: Contexto , 2019. p. 17-52. (Título original: Construction des objets de discours et catégorisation: une approche des processus de référenciation. 1995). [1995MONDADA, Lorenza; DUBOIS, Danièle. Construção dos objetos de discurso e categorização: uma abordagem dos processos referenciais. In: CAVALCANTE, Mônica Magalhães; RODRIGUES, Bernardete Biasi; CIULLA, Alena. (org.). Referenciação. São Paulo: Contexto , 2019. p. 17-52. (Título original: Construction des objets de discours et catégorisation: une approche des processus de référenciation. 1995).]) afirmam que há uma inerente instabilidade dos objetos de discurso, tendo em vista que o processo da categorização é dinâmico. No entanto, também explicam que há procedimentos dos quais se valem os enunciadores para promover um efeito estabilizador. A anáfora, por exemplo, pode ser vista “como um modo de estabilizar ou de focalizar uma denominação particular, excluindo para isso outras possibilidades, mesmo se elas estiverem potencialmente disponíveis no texto” (MONDADA; DUBOIS, 2019MONDADA, Lorenza; DUBOIS, Danièle. Construção dos objetos de discurso e categorização: uma abordagem dos processos referenciais. In: CAVALCANTE, Mônica Magalhães; RODRIGUES, Bernardete Biasi; CIULLA, Alena. (org.). Referenciação. São Paulo: Contexto , 2019. p. 17-52. (Título original: Construction des objets de discours et catégorisation: une approche des processus de référenciation. 1995). [1995MONDADA, Lorenza; DUBOIS, Danièle. Construção dos objetos de discurso e categorização: uma abordagem dos processos referenciais. In: CAVALCANTE, Mônica Magalhães; RODRIGUES, Bernardete Biasi; CIULLA, Alena. (org.). Referenciação. São Paulo: Contexto , 2019. p. 17-52. (Título original: Construction des objets de discours et catégorisation: une approche des processus de référenciation. 1995).], p. 43).

Como “o processo de referenciação diz respeito à atividade de construção de referentes (ou objetos de discurso)” (CAVALCANTE, 2017CAVALCANTE, Mônica Magalhães. Os sentidos do texto. São Paulo: Contexto, 2017., p. 98, negrito nosso) e como “a tendência dos referentes retomados, nas anáforas, é evoluir durante o desenvolvimento do texto” (CAVALCANTE; CUSTÓDIO FILHO; BRITO, 2014CAVALCANTE, Mônica Magalhães; CUSTÓDIO FILHO, Valdinar; BRITO, Mariza Angélica Paiva. Coerência, referenciação e ensino. São Paulo: Cortez , 2014., p. 63), defendemos que a intercalação de cláusulas temporais pode ser usada a serviço desse processo, à medida que pode promover a antecipação de informações necessárias à (re)construção de determinado objeto de discurso, já que frequentemente funcionam como guia/orientação (DECAT, 2001DECAT, Maria Beatriz Nascimento. A articulação hipotática adverbial no português em uso. In: DECAT, Maria Beatriz Nascimento et al. (org.). Aspectos da gramática do português: uma abordagem funcionalista. Campinas: Mercado de Letras, 2001. p. 103-166. 5 v.; CAVALCANTE, 2020CAVALCANTE, Sávio André de Souza. Efeitos prototípicos da intercalação de Cláusulas Hipotáticas Circunstanciais Temporais no Espanhol mexicano oral. 2020. 214 f. Tese (Doutorado em Linguística) - Centro de Humanidades, Programa de pós-graduação em Linguística, Universidade Federal Ceará, Fortaleza, 2020. Disponível em: Disponível em: http://repositorio.ufc.br/bitstream/riufc/51477/1/2020_tese_sascavalcante.pdf . Acesso em: 26 ago. 2021.
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; CAVALCANTE; COAN, 2021CAVALCANTE, Sávio André de Souza; COAN, Márluce. Um mapeamento funcional das cláusulas temporais: variação, processamento e codificação. InterteXto, v. 14, n. 1, p. 117-145, set. 2021. Disponível em: Disponível em: http://seer.uftm.edu.br/revistaeletronica/index.php/intertexto/article/view/4834 . Acesso em: 12 set. 2021.
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).

Essa hipótese é fundada no fato de que as expressões referenciais definidas podem assumir a configuração em que um nome vem acompanhado de um modificador (adjetivo, sintagma preposicional ou oração relativa) (KOCH, 2015KOCH, Ingedore Villaça. Introdução à Linguística Textual - Trajetória e grandes temas. 2. ed. São Paulo: Contexto , 2015.) e na assunção de que as temporais podem assemelhar-se às adjetivas (NEVES, 2018NEVES, Maria Helena de Moura. A gramática do português revelada em textos. São Paulo: Editora Unesp, 2018.). Além disso, afirma Koch (2015KOCH, Ingedore Villaça. Introdução à Linguística Textual - Trajetória e grandes temas. 2. ed. São Paulo: Contexto , 2015.) que as descrições definidas ressaltam/enfatizam aspectos (qualidades, propriedades) que caracterizam os referentes. Por isso, acreditamos que as temporais intercaladas restringem circunstancialmente um momento em que se situa o referente, atuando também na modificação nominal (LIMA-HERNANDES, 2004LIMA-HERNANDES, Maria Célia. Estágios de gramaticalização da noção de tempo - processos de combinação de orações. Veredas - Rev. Est. Ling., Juiz de Fora, v. 8, n. 1-2, p. 183-194, jan./dez. 2004. Disponível em: Disponível em: https://www.ufjf.br/revistaveredas/files/2009/12/cap12.pdf . Acesso em: 13 jul. 2020.
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; CAVALCANTE; COAN, 2021CAVALCANTE, Sávio André de Souza; COAN, Márluce. Um mapeamento funcional das cláusulas temporais: variação, processamento e codificação. InterteXto, v. 14, n. 1, p. 117-145, set. 2021. Disponível em: Disponível em: http://seer.uftm.edu.br/revistaeletronica/index.php/intertexto/article/view/4834 . Acesso em: 12 set. 2021.
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).

Segundo Neves (2013NEVES, Maria Helena de Moura. Texto e gramática. São Paulo: Editora Contexto, 2013.), a referência e a referenciação estão contidas na propriedade da referencialidade2 2 “Ou seja, a capacidade de referenciar” (NEVES, 2013, p. 148). , que implica identificabilidade e acessibilidade, ao passo que a referenciação implica definitude. Segundo a autora, “dizem os estudos de LT que uma referenciação textual é bem-sucedida quando o ouvinte consegue identificar o referente do discurso no ponto em que essa operação lhe é solicitada, e tal identificação ocorre quando o falante a deixou acessível” (NEVES, 2004NEVES, Maria Helena de Moura. Funcionalismo e linguística do texto. Revista do GEL, v. 1, p. 71-89, 2004. Disponível em: Disponível em: https://revistadogel.emnuvens.com.br/rg/article/view/292 . Acesso em: 12 set. 2021.
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, p. 78). Além disso, a autora destaca que identificabilidade e acessibilidade estão relacionadas à distribuição da informação (continuum entre informação dada e nova). Portanto, a análise aqui proposta considerará, na análise das introduções e retomadas referenciais, os parâmetros definitude (NEVES, 2013NEVES, Maria Helena de Moura. Texto e gramática. São Paulo: Editora Contexto, 2013.), estatuto informacional (PRINCE, 1992PRINCE, Ellen. The ZPG letter: subjects, definiteness, and information status. In: THOMPSON, Sandra; MANN, William (eds.). Discourse Description: diverse analyses of a fund raising text. Philadelphia: John Benjamins, 1992. p. 295-325.), acessibilidade anafórica e persistência tópica (GIVÓN, 1995GIVÓN, Talmy. Functionalism and grammar. Philadelphia: J. Benjamins, 1995.).

Para Cavalcante e Martins (2020CAVALCANTE, Sávio André de Souza. Efeitos prototípicos da intercalação de Cláusulas Hipotáticas Circunstanciais Temporais no Espanhol mexicano oral. 2020. 214 f. Tese (Doutorado em Linguística) - Centro de Humanidades, Programa de pós-graduação em Linguística, Universidade Federal Ceará, Fortaleza, 2020. Disponível em: Disponível em: http://repositorio.ufc.br/bitstream/riufc/51477/1/2020_tese_sascavalcante.pdf . Acesso em: 26 ago. 2021.
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), a introdução referencial diz respeito à instauração de um referente, e a anáfora/recategorização diz respeito “à retomada de referente, sempre evoluindo, recategorizando-se” (CAVALCANTE; MARTINS, 2020CAVALCANTE, Sávio André de Souza. Efeitos prototípicos da intercalação de Cláusulas Hipotáticas Circunstanciais Temporais no Espanhol mexicano oral. 2020. 214 f. Tese (Doutorado em Linguística) - Centro de Humanidades, Programa de pós-graduação em Linguística, Universidade Federal Ceará, Fortaleza, 2020. Disponível em: Disponível em: http://repositorio.ufc.br/bitstream/riufc/51477/1/2020_tese_sascavalcante.pdf . Acesso em: 26 ago. 2021.
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, p. 244). Nessa visão, a anáfora pode ser direta (marcada por correferencialidade), indireta (sem correferencialidade, com referente novo ativado por pistas contextuais) ou encapsuladora (referente sintetizado, apresentado difusamente por proposições).

No que diz respeito à definitude, observamos se o referente na posição de sujeito anterior a uma intercalada é, segundo o que propõe Neves (2013NEVES, Maria Helena de Moura. Texto e gramática. São Paulo: Editora Contexto, 2013.), definido (expresso por sintagmas nominais definidos, por pronomes pessoais dêiticos, por dêiticos espaciais, por possessivos, etc.) ou indefinido (sintagmas com artigo ou pronome indefinido).

No que tange ao estatuto informacional, operamos com a tipologia de Prince (1992PRINCE, Ellen. The ZPG letter: subjects, definiteness, and information status. In: THOMPSON, Sandra; MANN, William (eds.). Discourse Description: diverse analyses of a fund raising text. Philadelphia: John Benjamins, 1992. p. 295-325.). Nessa obra, a pesquisadora apresenta três vieses relacionados às noções de dado/novo: (i) as construções de foco/pressuposição, (ii) a perspectiva do ouvinte, e (iii) a menção no discurso3 3 Nesse sentido, discurso é sinônimo de texto. . Além disso, rediscute a questão dos itens inferíveis.

Em relação às construções de foco/pressuposição, vejamos os enunciados abaixo:

(03)

It’s John I like. (É do John que eu gosto) (PRINCE, 1992PRINCE, Ellen. The ZPG letter: subjects, definiteness, and information status. In: THOMPSON, Sandra; MANN, William (eds.). Discourse Description: diverse analyses of a fund raising text. Philadelphia: John Benjamins, 1992. p. 295-325., p. 300, itálico da autora, tradução nossa).

(04)

What he ate was a/the banana. (O que ele comeu foi (uma) banana) (PRINCE, 1992PRINCE, Ellen. The ZPG letter: subjects, definiteness, and information status. In: THOMPSON, Sandra; MANN, William (eds.). Discourse Description: diverse analyses of a fund raising text. Philadelphia: John Benjamins, 1992. p. 295-325., p. 300, itálico da autora, tradução nossa).

Segundo Prince (1992PRINCE, Ellen. The ZPG letter: subjects, definiteness, and information status. In: THOMPSON, Sandra; MANN, William (eds.). Discourse Description: diverse analyses of a fund raising text. Philadelphia: John Benjamins, 1992. p. 295-325.), essas construções estruturam a proposição veiculada em duas partes, uma proposição aberta (Eu gosto de X), e uma instanciação da variável na proposição aberta (X = João). Assim, a proposição aberta é geralmente tratada como informação dada, e o foco seria a informação nova. Prince (1992PRINCE, Ellen. The ZPG letter: subjects, definiteness, and information status. In: THOMPSON, Sandra; MANN, William (eds.). Discourse Description: diverse analyses of a fund raising text. Philadelphia: John Benjamins, 1992. p. 295-325.) ainda mostra que tais construções de foco/pressuposição são marcadas por ênfase na entonação ou por estruturas sintáticas (em combinação com entonação enfática): sentenças do tipo é...que4 4 It-clefts. , sentenças o que...5 5 Wh-clefts. , topicalização, movimento de foco etc.

Outro viés relacionado a dado/novo é a observação do ponto de vista do ouvinte e de suas crenças. No exemplo a seguir, o enunciador presume que seu colega já possui construída a entidade mental Sandy Thompson em seu repertório e que o companheiro crerá que essa entidade é o assunto em tela. Isto é, o falante toma essa entidade como dada, a partir da perspectiva do ouvinte:

(05)

I’m waiting for it to be noon so I call Sandy Thompson. (Estou esperando que dê meio-dia, então ligo para Sandy Thompson) (PRINCE, 1992PRINCE, Ellen. The ZPG letter: subjects, definiteness, and information status. In: THOMPSON, Sandra; MANN, William (eds.). Discourse Description: diverse analyses of a fund raising text. Philadelphia: John Benjamins, 1992. p. 295-325., p. 301, itálico da autora, tradução nossa).

Já a entidade someone in California (alguém na Califórnia), no trecho a seguir, é apresentada como nova, uma vez que o ouvinte não a tem construída em seu modelo mental:

(06)

I’m waiting for it to be noon so I call someone in California. (Estou esperando que dê meio-dia, então eu ligo para alguém na Califórnia) (PRINCE, 1992PRINCE, Ellen. The ZPG letter: subjects, definiteness, and information status. In: THOMPSON, Sandra; MANN, William (eds.). Discourse Description: diverse analyses of a fund raising text. Philadelphia: John Benjamins, 1992. p. 295-325., p. 301, itálico da autora, tradução nossa).

Desse modo, a informação someone in California (alguém na Califórnia) é rotulada como nova na perspectiva do ouvinte. Já a informação Sandy Thompson é rotulada como dada na perspectiva do ouvinte. Em relação à definitude, Prince (1992PRINCE, Ellen. The ZPG letter: subjects, definiteness, and information status. In: THOMPSON, Sandra; MANN, William (eds.). Discourse Description: diverse analyses of a fund raising text. Philadelphia: John Benjamins, 1992. p. 295-325.) mostra que entidades novas na perspectiva do ouvinte são comumente indefinidas, enquanto informações dadas na perspectiva do ouvinte apresentam-se, geralmente, como definidas.

Outro desdobramento do trabalho de Prince (1992PRINCE, Ellen. The ZPG letter: subjects, definiteness, and information status. In: THOMPSON, Sandra; MANN, William (eds.). Discourse Description: diverse analyses of a fund raising text. Philadelphia: John Benjamins, 1992. p. 295-325.) são as entidades consideradas dadas/novas de acordo com a menção no discurso. Segundo a autora, um sintagma nominal pode fazer referência a uma entidade já mencionada em uma determinada situação discursiva. A título de exemplo, a pesquisadora mostra que, se os termos Sandy Thompson e someone in California fossem enunciados pela primeira vez em uma conversa, evocariam entidades novas no modelo discursivo. Essa classificação funciona independentemente de que, como vimos, Sandy Thompson seja dada na perspectiva do ouvinte, e someone in California seja informação nova na perspectiva do ouvinte. Prince (1992PRINCE, Ellen. The ZPG letter: subjects, definiteness, and information status. In: THOMPSON, Sandra; MANN, William (eds.). Discourse Description: diverse analyses of a fund raising text. Philadelphia: John Benjamins, 1992. p. 295-325.) também explica que não há marcação específica quanto à definitude para determinar se uma entidade é dada/nova no modelo discursivo. Um sintagma nominal definido pode ser inferido como novo no discurso, mas, se ele não tem marcas de definitude, não há como prever se já foi ou não utilizado no mesmo discurso. Uma exceção seria o caso dos pronomes, que representam a saliência das entidades, que presumimos como dadas no discurso. Contudo, enquanto o uso de um pronome implica que a entidade é dada no discurso, não há implicações de que uma entidade com esse status seja representada por um pronome.

Outro tipo de entidade considerada por Prince (1992PRINCE, Ellen. The ZPG letter: subjects, definiteness, and information status. In: THOMPSON, Sandra; MANN, William (eds.). Discourse Description: diverse analyses of a fund raising text. Philadelphia: John Benjamins, 1992. p. 295-325.) são as inferíveis. Essas entidades estão relacionadas ao modelo discursivo discutido anteriormente e são aquelas cuja existência o falante supõe que o ouvinte pode inferir, com base nas crenças de ambos e habilidade de raciocínio. Vejamos:

(07)

He passed by the Bastille and the door was painted purple. (Ele passou pela Bastilha e a porta estava pintada de roxo.) (PRINCE, 1992PRINCE, Ellen. The ZPG letter: subjects, definiteness, and information status. In: THOMPSON, Sandra; MANN, William (eds.). Discourse Description: diverse analyses of a fund raising text. Philadelphia: John Benjamins, 1992. p. 295-325., p. 305, itálico da autora, tradução nossa).

No trecho, o referente the door (a porta) é classificado como inferível, já que o falante pode supor que, geralmente/possivelmente, as construções têm portas. Essa entidade tem como gatilho outra entidade, já mencionada no discurso, The Bastille. Há também entidades cujo gatilho está dentro do próprio sintagma nominal:

(08)

The pages of that book I bought feel out. (As páginas daquele livro que comprei caem.) (PRINCE, 1992PRINCE, Ellen. The ZPG letter: subjects, definiteness, and information status. In: THOMPSON, Sandra; MANN, William (eds.). Discourse Description: diverse analyses of a fund raising text. Philadelphia: John Benjamins, 1992. p. 295-325., p. 307, itálico da autora, tradução nossa).

Prince (1992PRINCE, Ellen. The ZPG letter: subjects, definiteness, and information status. In: THOMPSON, Sandra; MANN, William (eds.). Discourse Description: diverse analyses of a fund raising text. Philadelphia: John Benjamins, 1992. p. 295-325.) reconhece a problemática em delimitar as entidades inferíveis, uma vez que os elementos ditos inferíveis são como entidades dadas na perspectiva do ouvinte e no texto, já que sua interpretação se ancora na existência de outra mencionada. Por outro lado, também é nova na perspectiva do ouvinte e no discurso, porque está sendo mencionada e ativada pela primeira vez. Assim, consoante à autora, ou se deve incluir os elementos inferíveis nas categorias binárias existentes (dado/novo) ou se cria um continuum, em que esse grupo está no meio. Tendo em vista a problemática dessas duas soluções, Prince (1992) explica que prefere simplesmente tratar essas entidades como uma terceira categoria.

Em relação aos parâmetros de acessibilidade anafórica (ou distância referencial) e persistência tópica (ou catafórica), valemo-nos da proposta de Givón (1995GIVÓN, Talmy. Functionalism and grammar. Philadelphia: J. Benjamins, 1995.). Em ambos os casos, mostra o autor que o referente pode apresentar graus de topicalidade/acessibilidade. Em refinamento da proposta, feito por Lima (2009LIMA, Maria Claudete. A não-atribuição de causalidade na Crônica Geral de Espanha de 1344. 2009. 471f. Tese (Doutorado em Linguística) - Centro de Humanidades, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2009.), a alta topicalidade pode ser medida pela acessibilidade do referente na cláusula precedente; a média topicalidade, pela acessibilidade na segunda cláusula precedente; a baixa topicalidade, pela acessibilidade na terceira cláusula precedente; e o caráter não tópico, pela não acessibilidade do referente em nenhuma das três cláusulas que o precedem.

No que diz respeito à persistência tópica, se o referente se mantém nas três cláusulas posteriores à sua primeira menção, possui alta persistência; se o referente se mantém nas duas cláusulas posteriores, possui média persistência; se o referente se mantém apenas na cláusula posterior, possui baixa persistência; e, se o referente não é ativado em nenhuma das três cláusulas posteriores, possui status de não persistência.

Lembramos que, por considerarmos a referenciação um fenômeno sócio-cognitivo, consideramos a ativação do referente não apenas explicitada por meio de anáforas correferenciais, mas também por associações e inferências ativadas por outros elementos no texto ou na situação comunicativa.

Metodologia

Tendo em vista a análise das cláusulas temporais intercaladas e sua função no processo de referenciação, esta pesquisa se caracteriza como descritivo-explicativa (GIL, 2008GIL, Antônio Carlos. Métodos e técnicas de pesquisa social. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2008.). Consoante à perspectiva indutiva (RICHARDSON, 2012RICHARDSON, Roberto Jarry. Pesquisa social - métodos e técnicas. 3. ed. rev. e ampl. São Paulo: Atlas , 2012.), consideramos que as funções das intercaladas aqui apresentadas podem ser observadas em outros corpora, com ressalvas às devidas restrições contextuais.

O corpus utilizado6 6 https://docs.google.com/document/d/1CZbVPSMo4HbLZRwKeA9j2H95ydOT84yl/edit?usp=drive_web&ouid=106282381456878579010&rtpof=true faz parte de outros corpora compilados pelo grupo de pesquisa NUPACT-UFJF7 7 https://www.ufjf.br/nupact/corpora/corpora-compilados/. . Dentre os corpora compilados pelo grupo, selecionamos o “corpus revistas formais 2014” (300.000 palavras), que é parte do “corpus 2014” (900.000 palavras), que, por sua vez, é parte do “corpus modalidade escrita” (2.700.000 palavras). Esse banco de dados foi escolhido tendo em vista os critérios de atualidade, extensão, organização e acesso integral aos textos. Como o banco de dados possui textos que ainda não receberam tratamento analítico, a pesquisa tem delineamento documental e bibliográfico (GIL, 2008GIL, Antônio Carlos. Métodos e técnicas de pesquisa social. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2008.), pois também recorreremos a estudos anteriores sobre os temas em foco.

No que diz respeito à subespecificação do corpus - os textos formais -, essa modalidade foi escolhida tendo em vista o fato de que, nessas situações mais monitoradas, as interrupções na sentença seriam evitadas, os casos em que há esse tipo de procedimento seriam mais marcados e, portanto, refletiriam funções textuais mais salientes. Nessa especificação do corpus, estão presentes textos8 8 “notícias, reportagens, entrevistas e artigos de opinião” (DALL’ORTO, 2018, p. 115). sobre temas variados9 9 “política, economia, educação, saúde, cultura, tecnologia e lazer” (DALL’ORTO, 2018, p. 115). nas revistas “Veja”, “Exame” e “Isto é”, consideradas, segundo Durço (2019DURÇO, Ana Paula Gonçalves. Mapeamento de microconstruções com “então”: uma proposta de rede construcional. 2019. 176 f. Tese (Doutorado em Linguística) - Programa de Pós-Graduação em Linguística, Universidade Federal de Juiz de Fora, Juiz de Fora, 2019.), as mais formais, tendo em vista seu alcance nacional e internacional.

Após ter acesso ao arquivo em formato .doc do corpus, interessamo-nos pelas cláusulas temporais introduzidas pelo conector prototípico quando (ROCHA LIMA, 1988ROCHA LIMA, Carlos Henrique da. Gramática normativa da língua portuguesa. 29. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1988.). Além de ser introdutor prototípico dessas cláusulas, é o que permite leituras anafóricas, já que funciona também como pronome relativo (NEVES, 2018NEVES, Maria Helena de Moura. A gramática do português revelada em textos. São Paulo: Editora Unesp, 2018.), importante indiciador dos processos referenciais.

No primeiro momento, coletamos todas as temporais e excluímos os dados de quando em contexto não oracional, chegando a um total de 439 cláusulas temporais. Em seguida, organizamos os dados em uma planilha eletrônica do software Excel e, por meio da função “filtro”, selecionamos apenas os dados de cláusulas intercaladas, o que nos permitiu acesso a 75 dados (17% entre todas as posições). Por fim, utilizando novamente a função “filtro”, especificamos apenas os dados de intercaladas entre sujeito e verbo, chegando a um total de 9 dados (0.02% de frequência token e 0.12% de frequência type)10 10 Frequência token é a frequência em relação a todos os dados (todas as temporais), e frequência type é a frequência em relação a um subgrupo (as intercaladas). Frequência type e token são sugeridas por Bybee (2007). Embora tenhamos observado os percentuais de uso das intercaladas, a fim de mapear a produtividade do fenômeno, esta análise é preponderantemente qualitativa. . Considerando a baixa frequência inerente às intercaladas, não é possível realizar uma análise quantitativa robusta, mas apenas uma análise qualitativa, descrevendo o comportamento de cada dado. Isso não implica que as funções aqui propostas não possam se repetir em um corpus maior.

Tendo os dados sido coletados, foram analisados segundo os parâmetros já descritos na seção de “fundamentação teórica” deste texto:

  • Processos referenciais (CAVALCANTE; MARTINS, 2020CAVALCANTE, Sávio André de Souza. Efeitos prototípicos da intercalação de Cláusulas Hipotáticas Circunstanciais Temporais no Espanhol mexicano oral. 2020. 214 f. Tese (Doutorado em Linguística) - Centro de Humanidades, Programa de pós-graduação em Linguística, Universidade Federal Ceará, Fortaleza, 2020. Disponível em: Disponível em: http://repositorio.ufc.br/bitstream/riufc/51477/1/2020_tese_sascavalcante.pdf . Acesso em: 26 ago. 2021.
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    ): introdução referencial (instauração de um referente); anáfora direta (referente correferencial ao anterior); anáfora indireta (sem correferencialidade, com referente novo ativado por pistas contextuais) ou anáfora encapsuladora (referente sintetizado, apresentado difusamente por proposições);

  • Definitude (NEVES, 2013NEVES, Maria Helena de Moura. Texto e gramática. São Paulo: Editora Contexto, 2013.): definido (expresso por sintagmas nominais definidos, por pronomes pessoais dêiticos, por dêiticos espaciais, por possessivos etc.) ou indefinido (sintagmas com artigo ou pronome indefinido);

  • Estatuto informacional (PRINCE, 1992PRINCE, Ellen. The ZPG letter: subjects, definiteness, and information status. In: THOMPSON, Sandra; MANN, William (eds.). Discourse Description: diverse analyses of a fund raising text. Philadelphia: John Benjamins, 1992. p. 295-325.): dado ou novo na perspectiva do interlocutor, dado ou novo quanto à menção no texto ou inferível;

  • Acessibilidade anafórica/distância referencial (GIVÓN, 1995GIVÓN, Talmy. Functionalism and grammar. Philadelphia: J. Benjamins, 1995.; LIMA, 2009LIMA, Maria Claudete. A não-atribuição de causalidade na Crônica Geral de Espanha de 1344. 2009. 471f. Tese (Doutorado em Linguística) - Centro de Humanidades, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2009.): alta topicalidade (acessibilidade do referente na cláusula precedente), média topicalidade (acessibilidade na segunda cláusula precedente), baixa topicalidade (acessibilidade na terceira cláusula precedente) ou não tópico (referente não acessível em nenhuma das três cláusulas que o precedem);

  • Persistência tópica/catafórica: alta (referente se mantém nas três cláusulas posteriores à sua primeira menção), média (referente se mantém nas duas cláusulas posteriores), baixa (referente se mantém apenas na cláusula posterior) ou não persistência (referente não ativado em nenhuma das três cláusulas posteriores).

Na próxima seção, apresentamos a análise das ocorrências localizadas e seu comportamento observado sob a ótica das teorias e das variáveis escolhidas. Embora não seja possível apresentar todas as ocorrências nem os textos completos, por questões de espaço, buscamos mostrar os dados mais significativos que fundamentam a ideia de que as intercaladas servem à (re)construção referencial. Por esse motivo, os dados não analisados podem figurar como exemplificações complementares.

Análise e discussão dos resultados

Nesta seção, analisamos os dados de cláusulas temporais com quando, intercaladas entre sujeito e verbo. Embora seja um fenômeno produtivo na (re)construção referencial, a intercalação, por representar rupturas na ordem canônica das sentenças, é fenômeno marcado, nos termos de Givón (1995GIVÓN, Talmy. Functionalism and grammar. Philadelphia: J. Benjamins, 1995., 2001GIVÓN, Talmy. Syntax: an introduction - volume I. Amsterdam: J. Benjamins, 2001.), pelas características de baixa frequência (9/439: 0.02% de frequência token e 9/75: 0.12% de frequência type) e alta complexidade estrutural. No que diz respeito à complexidade cognitiva, muitas vezes depreendida dos outros dois critérios, é um parâmetro sujeito à discussão: formas marcadas podem ser usadas para minorar os efeitos dos esforços de codificação (DUBOIS; VOTRE, 2012DUBOIS, Sylvie; VOTRE, Sebastião Josué. Análise modular e princípios subjacentes do funcionalismo linguístico. In: VOTRE, Sebastião Josué (org.). A construção da gramática. Niterói: Editora da UFF, 2012. p. 49-71.). Além disso, lembramos que posições menos frequentes, marcadas, servem a funções específicas (BRAGA; PAIVA, 2017BRAGA, Maria Luiza; PAIVA, Maria da Conceição de. Linguística textual e sintaxe. In: SOUZA, Edson Rosa Francisco de; PENHAVEL, Eduardo; CINTRA, Marcos Rogério. (orgs.). Linguística Textual: interfaces e delimitações - Homenagem a Ingedore Grünfeld Villaça Koch. São Paulo: Cortez, 2017. p. 189-210.). No caso das intercaladas entre sujeito e verbo, como vimos afirmando, essas estruturas são arranjadas a serviço da (re)construção referencial nos textos.

Em (09), no contexto de uma entrevista, o entrevistado é indagado sobre se uma população com senso crítico elevado pressionaria as empresas a organizar uma ouvidoria eficaz. Na resposta, a expressão definida “os diretores de várias companhias”, anafórica a “os principais executivos das empresas”, é momentaneamente não tópica, já que, entre essas duas menções, fala-se sobre o SAC das empresas. Embora não tópico, o referente “os diretores de várias companhias” persiste, em elipse, na cláusula intercalada “quando questionados11 11 Analisamos essa ocorrência como um caso de redução da construção passiva (BERTOQUE; CASSEB-GALVÃO, 2010), já que o auxiliar (quando são questionados) foi removido. a respeito de seus problemas de relacionamento com os clientes”.

(09)

(...)

2 - As manifestações de rua têm demonstrado que a sociedade brasileira não aceita mais passivamente a falta de atenção às suas principais demandas e expectativas. O senhor acha que o senso crítico da população atingiu um novo patamar? Acredita que vai forçar as empresas a organizar uma ouvidoria que funcione? Nathália Silva, de São Paulo

(...)

No caso das empresas, num contexto de livre mercado, temos mais chance de protestar. Se você compra um sapato e não gosta, passa a comprar de outra marca. Esse é o pior tipo de punição que uma empresa pode ter.

No entanto, mesmo que o mercado seja um perfeito elemento regulador, muitos dos principais executivos das empresas demoram a perceber a importância de um bom atendimento ao consumidor. É praticamente uma regra que esses serviços, geralmente conhecidos como SAC, não funcionem bem.

Os diretores de várias companhias, quando questionados a respeito de seus problemas de relacionamento com os clientes, dizem: “Já temos o SAC”. É verdade. Só que ele não funciona.

Conheço de perto o caso de uma varejista que está em meio a um grande projeto de melhoria de SAC, com resultados extraordinários. Mas, antes de chegar lá, foi preciso que houvesse uma crise. Os diretores tiveram de encarar o problema e agora estão motivados a atingir a satisfação do consumidor.

Por bem ou por mal, os executivos uma hora percebem que, ao melhorar o SAC, diminuem o número de reclamações, a quantidade de processos judiciais e o custo com atendimentos e com o retrabalho. Ao mesmo tempo, as vendas sobem.

Nesse sentido, a exemplo dos governantes, os diretores em geral só resolvem reagir ao grito. (...). (Corpus NUPACT - Revista Exame - 19/02/2014, negrito dos autores, itálico nosso).

Nessa situação, a linha temporal da existência do referente “os diretores de várias companhias” é recortada, porque o que se quer colocar em foco nesse trecho é a reação dos diretores em um momento específico do tempo. Nesse sentido, o referente sofre uma restrição, pois se está a tratar apenas do momento em que são questionados sobre problemas de relacionamento com os clientes, entre vários momentos de sua atuação profissional.

O referente, portanto, não é visto em sua totalidade, mas com um recorte temporal. E esse momento é exatamente o que diz respeito ao tópico pungente no texto: o atendimento ao cliente. A atuação da intercalada nesse momento é restringir um acontecimento na linha temporal da existência do referente, situando-o em relação ao tópico em desenvolvimento. Outras ocorrências no corpus em que há essa função restritiva temporal são:

(10)

(...)

O curador Miguel Conde, quando dizia “Naturalmente, convidei autores dos quais me sinto mais próximo”, era ao menos mais sincero que Werneck, que, em resposta à Folha, preferiu falar em “frustração natural das editoras” e “renovação da geração literária”. (...). (Corpus NUPACT - Revista Veja - 14/05/2014).

(11)

(...)

Se não tivesse mentido o tempo todo sobre a questão, não teria tomado como realidade o que era invenção - e estaria livre da tempestade de cobranças que hoje se arrisca a receber caso os problemas persistam.

A presidente, quando a taxa de juro estava na vizinhança dos 9%, disse que esse número era “inadmissível” para o Brasil e pressionou o Banco Central a reduzi-lo. (...). (Corpus NUPACT - Revista Exame - 19/02/2014).

Em ambos os casos, os referentes, já ativados no discurso, têm sua linha temporal delimitada, e por isso, são recategorizados. Como não é possível garantir o detalhamento de uma reação única dessas entidades ao longo de sua existência, eles são apresentados em apenas um recorte temporal. Uma vez que os processos referenciais são vistos “como estratégias argumentativas que buscam atender às tentativas de influência do locutor sobre o interlocutor” (CAVALCANTE; MARTINS, 2020CAVALCANTE, Sávio André de Souza. Efeitos prototípicos da intercalação de Cláusulas Hipotáticas Circunstanciais Temporais no Espanhol mexicano oral. 2020. 214 f. Tese (Doutorado em Linguística) - Centro de Humanidades, Programa de pós-graduação em Linguística, Universidade Federal Ceará, Fortaleza, 2020. Disponível em: Disponível em: http://repositorio.ufc.br/bitstream/riufc/51477/1/2020_tese_sascavalcante.pdf . Acesso em: 26 ago. 2021.
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, p. 245), o enunciador pode valer-se dessa estratégia para construir uma face positiva ou negativa do referente. Segundo Neves (2013NEVES, Maria Helena de Moura. Texto e gramática. São Paulo: Editora Contexto, 2013.), “tanto a categorização como a recategorização podem frequentemente salientar de modo avaliativo a predicação sobre o designado” (NEVES, 2013NEVES, Maria Helena de Moura. Texto e gramática. São Paulo: Editora Contexto, 2013., p. 118).

Em (10), por exemplo, o momento “quando dizia ‘Naturalmente, convidei autores dos quais me sinto mais próximo’” denota uma situação de sinceridade do “curador Miguel Conde”, positivamente avaliado. Já em (11), o jornalista apresenta exatamente o momento de problemas econômicos no país para sugerir que o referente “a presidente” mentia, avaliando-a negativamente. Como a referenciação é uma (re)elaboração da realidade, o enunciador pode apresentar exatamente o momento que mais lhe convém, na intenção de justificar que seus julgamentos pessoais sobre os referentes são verdadeiros.

No texto (12), que trata sobre a existência de saídas de emergências em casas noturnas, voltemos a atenção para o referente “um botão ao lado da porta que dá para a rua”:

(12)

Nada mudou

Um ano após a tragédia que matou 242 pessoas na boate Kiss e escancarou as condições precárias das casas noturnas brasileiras, ISTOÉ visita baladas do eixo Rio-São Paulo e constata que elas continuam perigosamente inseguras

Mariana Brugger, Raul Montenegro, Simone Felício e Wilson Aquino

(...)

Naquela madrugada de domingo em Santa Maria, a existência de uma única saída foi uma das causas apontadas por especialistas para o número de mortes. A maioria das casas noturnas visitadas possui problemas nas saídas de emergência. Na Ó do Borogodó, que emparedou um dos acessos à rua, instrumentos musicais bloqueavam outra porta da casa. De acordo com o proprietário Leonardo Gola, o prédio possui outros dois acessos que são suficientes. No pub Kia Ora, na zona oeste paulistana, uma delas leva à cozinha, que, por sua vez, termina numa passagem trancada. No Beco 203, na rua Augusta, centro de São Paulo, uma das saídas, ao lado do fumódromo, estava fechada no dia da visita. Os frequentadores também dariam com a cara na porta de emergência do Maavah, bar da zona leste paulistana que toca música sertaneja e pagode. ISTOÉ não conseguiu contato com Beco 203 e Maavah. O Kia Ora disse que um botão ao lado da porta que dá para a rua, quando pressionado, libera a passagem. No Rio, o caso mais grave foi o da 021 Club, na Barra, cuja entrada é cercada por grades de metal fixas, empecilho invencível para sair do lugar em caso de incêndio. Apesar das três saídas de emergência, não há sinalização, aponta Vinicius Cavalcante, diretor da Associação Brasileira de Profissionais de Segurança no Rio, que acompanhou a reportagem. Procurada, a casa não se pronunciou. No centro carioca, o Pampa Grill tinha mesas e uma porta de metal obstruindo saídas. (...). (Corpus NUPACT - Revista IstoÉ - 29/01/2014, negrito dos autores, itálico nosso).

Ao relatar uma análise sobre a existência (ou não) de saídas de emergência em casas noturnas do eixo Rio-São Paulo, a reportagem centra-se, em determinado momento, no referente “pub Kia Ora”. No período em destaque, uma cláusula encaixada informa a resposta dos responsáveis pelo bar quando indagados acerca de uma saída de emergência no local (que um botão ao lado da porta que dá para a rua, quando pressionado, libera a passagem). Essa cláusula é interrompida por uma temporal exatamente na fronteira entre sujeito e verbo.

O sujeito “um botão ao lado da porta que dá para a rua” introduz, no texto e na consciência do leitor, um referente ainda não mencionado no cotexto prévio, indefinido, não tópico e de baixa persistência, mas que, associativamente, relaciona-se à saída do local. Tendo em vista o alto grau de novidade do referente, é necessário ser apresentado com o máximo de informações possível, em uma espécie de gradação: o botão fica ao lado da porta, e a porta é a porta que dá para a rua.

Além desse detalhamento, que diz respeito à localização espacial do botão, há uma restrição temporal acerca do momento em que o botão libera a passagem da rua: quando pressionado. Nesse sentido, quando o falante percebe que está sendo pouco informativo, utiliza uma estrutura intercalada para restringir ou explicar a informação anterior (LIMA-HERNANDES, 2004LIMA-HERNANDES, Maria Célia. Estágios de gramaticalização da noção de tempo - processos de combinação de orações. Veredas - Rev. Est. Ling., Juiz de Fora, v. 8, n. 1-2, p. 183-194, jan./dez. 2004. Disponível em: Disponível em: https://www.ufjf.br/revistaveredas/files/2009/12/cap12.pdf . Acesso em: 13 jul. 2020.
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). Assim como em (09), a intercalação temporal serve para restringir determinado momento na linha temporal de existência do referente, relacionando ao tópico discursivo12 12 Diferentemente do tópico oracional, especificado na nota seguinte, o “tópico discursivo define-se como categoria abstrata e analítica, com a qual se opera na descrição da organização tópica de um texto” (JUBRAN, 2015, p. 87). Essa categoria “manifesta-se, na conversação, mediante enunciados formulados pelos interlocutores a respeito de um conjunto de referentes, concernentes entre si e em relevância num determinado ponto da mensagem” (JUBRAN, 2015, p. 87). principal do texto: as saídas de emergência em casas noturnas. Essa referenciação tópica é “aquela que cria e relaciona as entidades que entram na organização informativa” (NEVES, 2013NEVES, Maria Helena de Moura. Texto e gramática. São Paulo: Editora Contexto, 2013., p. 99).

À diferença de (12), nem sempre as intercaladas temporais vão apresentar sujeito correferencial ao da nuclear. Nesses casos, sem retomá-lo anaforicamente em seu conteúdo referencial, a intercalada pode simplesmente ser “o agente que provoca o processo de topicalização” (SOUZA, 2001SOUZA, Maria Suely Crocci de. O papel discursivo e coesivo das orações temporais. In: NEVES, Maria Helena de Moura (org.). Descrição do Português: definindo rumos de pesquisa. São Paulo: Cultura Acadêmica Editora, 2001. p. 67-78.), como acontece em (13):

(13)

(...)

Previsões, naturalmente, são apenas isso - previsões, que valem tanto quanto os palpites dados sobre o desempenho da bolsa de valores ou sobre os finalistas da Copa do Mundo que vem aí. Mas, no caso, não se trata propriamente de uma previsão.

É mais um estado de ânimo construído em cima de realidades indiscutíveis do presente - e essas realidades não vão desaparecer no ar por um lance de ilusionismo, ou porque o governo quer que desapareçam.

O problema, quando se tenta ver alguma coisa no nevoeiro que está aí na frente, é que seriam indispensáveis, já agora, mudanças realmente sérias, coerentes e bem executadas na conduta econômica do governo - e não há nenhum sinal, pelo menos até hoje, de que qualquer coisa parecida com isso esteja para ocorrer.

Nem é preciso entrar nos intratáveis abismos estruturais, como a inépcia do Estado brasileiro para funcionar numa economia moderna, que impedem o país de crescer além dessas infames taxas a que tem crescido nos últimos anos. (...). (Corpus NUPACT - Revista Exame - 22/02/2014, itálico nosso).

Nessa situação, o referente “o problema”, com o recurso da intercalação, constitui-se tópico oracional13 13 Diferentemente do tópico discursivo, o tópico oracional é o elemento que gramaticaliza a propriedade de topicalidade, e está relacionado com o contexto discursivo no âmbito da cláusula (GIVÓN, 2001). . No entanto, sua suspensão momentânea indica um caso ambíguo, em que a função de recorte da linha temporal evolutiva do referente fica opaca em detrimento da explicitação uma mudança de perspectiva tópica: tudo o que é narrado antes de “o problema” diz respeito a uma realidade ilusória, de “previsões” e “palpites”. O conteúdo referencial da temporal intercalada “quando se tenta ver alguma coisa no nevoeiro que está aí na frente” é um chamamento do enunciador para que o leitor saia de uma visão ilusória e caminhe a uma visão prática de “mudanças realmente sérias, coerentes e bem executadas na conduta econômica do governo”. No entanto, o destaque dado ao referente “o problema” por meio de sua topicalização, mostra que essa visão prática é problemática.

Em (14), o referente sob análise, “a final de 1950”, é complemento do verbo perder. Juntos, esses elementos funcionam como cláusula reduzida com função de sujeito (perder a final de 1950 por 2 a 1 para o Uruguai) do verbo trazer (trouxe):

(14)

Maracanazo x Mineiraço

As lições de dois tristes momentos em que o Brasil foi anfitrião da Copa do Mundo, mobilizou e empolgou sua população e depois foi abalado pelo trauma de uma derrota em campo

Rodrigo Cardoso (rcardoso@istoe.com.br)

Os anos de 1950 e 2014 têm em seus registros duas tragédias brasileiras coletivas patrocinadas pelo futebol. Tanto em um como no outro, ser anfitrião em duas Copas do Mundo trouxe ao Brasil a euforia de um favoritismo que se transformou em pesadelo depois de dois reveses inesperados. Perder a final de 1950 por 2 a 1 para o Uruguai, quando se jogava pelo empate, trouxe a dor de uma derrota justa. A virada uruguaia a poucos minutos do fim imprimiu contornos de fatalidade àquele episódio conhecido como Maracanazo, que calou os 174 mil espectadores presentes no estádio carioca, segundo dados da Fifa, naquele 16 de julho de 1950. “O silêncio era tão grande que, se uma mosca estivesse voando por lá, ouviríamos o seu zumbido”, contou Alcides Ghiggia, uruguaio autor do gol que deu a vitória à Celeste. A possibilidade de acontecer algo semelhante, 64 anos depois, assombrava. Assim como causava euforia a chance de expurgar definitivamente essa mancha no país do futebol. Infelizmente, na semana passada, no Mineirão, o tal fantasma de 50 apareceu novamente e expulsou o anfitrião Brasil da parte boa da festa: a final. Mas o luto disseminado com a humilhante derrota de 7 a 1 para a Alemanha, em jogo válido pela semifinal, desta vez tem outra conotação. E está longe da fatalidade “seis minutos de pane geral” defendida pelo técnico Luiz Felipe Scolari e sua trupe da comissão técnica. O Mineiraço, como ficou conhecido o revés de 8 de julho de 2014, marca a indignação dos brasileiros com o futebol, que está no fundo do poço. Em campo, os jogadores não sabiam o que fazer, tal qual um exército sem general. Diante dessa constatação, a manifestação da depressão coletiva, em Belo Horizonte, desta vez, não foi o silêncio. (...). (Corpus NUPACT - Revista IstoÉ - 29/01/2014, negrito dos autores, itálico nosso).

Na situação em análise, a cláusula temporal intercalada contribui principalmente para a (re)construção referencial de “a final de 1950”. Esse referente é definido, tem acessibilidade alta, e é inferível, por ser anaforicamente associado e parte de “dois reveses inesperados”, “Duas Copas do Mundo” e “dois tristes momentos”, por exemplo. Além disso, persiste por meio de anáforas indiretas: “uma derrota justa”, “a virada uruguaia” etc. Nesse sentido, o referente “a final de 1950”, desde o começo do texto, já vem sendo apresentado como um momento triste, de derrota da seleção brasileira. Metonimicamente, os referentes “os anos de 1950” e “2014” também sofrem recategorização, sendo apresentados como anos tristes da história do futebol brasileiro.

Além de não ter por escopo todo o sujeito, outra diferença em relação aos exemplos apresentados até então é que a temporal não restringe determinado momento na linha temporal do referente, mas é uma recategorização, com função de especificação: ao invés de uma visão mais ‘neutra’ de “a final de um torneio em 1950”, o referente é reapresentado na linha temporal como o momento em que o Brasil precisava empatar o jogo. Nesse sentido, a cláusula funciona como estrutura oracional apositiva com quando, nos termos de Lima-Hernandes (2004), como neste outro exemplo do corpus:

(15)

(...)

O futuro do setor elétrico, desorganizado desde 2012, quando o governo propôs às geradoras antecipar a renovação de suas concessões como forma de baratear a conta de luz, permanece uma incógnita.

(...) (Corpus NUPACT - Revista Exame - 17/12/2014).

Em ambos os casos, a intercalada14 14 Embora haja a presença do termo “desorganizado desde 2012”, a intercalada em (15) é exemplo de descontinuidade entre sujeito e verbo. Não é sem motivo que, nesses casos, Cavalcante (2020) usa o símbolo (∆) para indicar a presença de material interveniente. Por isso, descreve as intercaladas entre sujeito e verbo utilizando o padrão Suj (∆) Temp (∆) N, em que “Suj” é o sujeito, “Temp” é a cláusula temporal, e “N” é a cláusula nuclear. É em tal procedimento que nos apoiamos. funciona como uma estratégia de recategorização do referente (a final de 1950 = o momento que se jogava pelo empate e 2012 = o momento que o governo propôs às geradoras antecipar a renovação de suas concessões como forma de baratear a conta de luz). São casos de ponto de incidência, já que há “função anafórica, retomando e especificando a informação anterior” (SOUZA, 2001SOUZA, Maria Suely Crocci de. O papel discursivo e coesivo das orações temporais. In: NEVES, Maria Helena de Moura (org.). Descrição do Português: definindo rumos de pesquisa. São Paulo: Cultura Acadêmica Editora, 2001. p. 67-78., p. 76).

Como “uma construção evolutiva de referentes” (CAVALCANTE; MARTINS, 2020CAVALCANTE, Mônica Magalhães; MARTINS, Mayara Arruda. Referenciação: em síntese. In: LIMA, Álisson Hudson Veras; SOARES, Maria Elias; CAVALCANTE, Sávio André de Souza (orgs.). Linguística geral: os conceitos que todos precisam conhecer - volume 2. São Paulo: Pimenta Cultural, 2020. p. 237-272. Disponível em: Disponível em: https://www.pimentacultural.com/linguistica-geral-2 . Acesso em: 13 set. 2021.
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), essas recategorizações, instauradas por meio de intercalações, fazem com que o referente-alvo da intercalada seja observado pela ótica da construção implementada pelo enunciador: em (14), por exemplo, o referente “a final de 1950” é interpretado como um momento que exigiu bastante esforço da seleção brasileira, porque os jogadores deveriam, no mínimo, terminar o jogo com empate.

Considerações finais

Com foco nas cláusulas temporais intercaladas entre sujeito e verbo, este trabalho ocupou-se em descrever essas estruturas e sua funcionalidade, relacionando-as ao processo de referenciação, num diálogo teórico entre o Funcionalismo linguístico e a Linguística Textual. Argumentamos em prol de uma construção discursiva da textualidade e da realidade. Na intenção de mostrar que o texto elabora e reelabora uma nova instância de realidade, concordamos com Koch (2015KOCH, Ingedore Villaça. Introdução à Linguística Textual - Trajetória e grandes temas. 2. ed. São Paulo: Contexto , 2015.), quando afirma que:

A referenciação constitui, assim, uma atividade discursiva. O sujeito, por ocasião da interação verbal, opera sobre o material linguístico que tem à sua disposição, operando escolhas significativas para representar estados de coisas, com vistas à concretização de sua proposta de sentido (...). Isto é, os processos de referenciação são escolhas do sujeito em função de um querer-dizer. Os objetos de discurso não se confundem com a realidade extralinguística, mas (re)constroem-na no próprio processo de interação. Ou seja: a realidade é construída, mantida e alterada não somente pela forma como nomeamos o mundo, mas, acima de tudo, pela forma como, sociocognitivamente, interagimos com ele: interpretamos e construímos nossos mundos por meio da interação com os entornos físico, social e cultural (KOCH, 2015KOCH, Ingedore Villaça. Introdução à Linguística Textual - Trajetória e grandes temas. 2. ed. São Paulo: Contexto , 2015., p. 67).

Baseando-se principalmente em Mondada e Dubois (2019MONDADA, Lorenza; DUBOIS, Danièle. Construção dos objetos de discurso e categorização: uma abordagem dos processos referenciais. In: CAVALCANTE, Mônica Magalhães; RODRIGUES, Bernardete Biasi; CIULLA, Alena. (org.). Referenciação. São Paulo: Contexto , 2019. p. 17-52. (Título original: Construction des objets de discours et catégorisation: une approche des processus de référenciation. 1995). [1995MONDADA, Lorenza; DUBOIS, Danièle. Construção dos objetos de discurso e categorização: uma abordagem dos processos referenciais. In: CAVALCANTE, Mônica Magalhães; RODRIGUES, Bernardete Biasi; CIULLA, Alena. (org.). Referenciação. São Paulo: Contexto , 2019. p. 17-52. (Título original: Construction des objets de discours et catégorisation: une approche des processus de référenciation. 1995).]), tomamos a referenciação a partir de “uma visão dinâmica que leva em conta não somente o sujeito ‘encarnado’, mas ainda um sujeito sócio-cognitivo mediante uma relação indireta entre os discursos e o mundo” (MONDADA; DUBOIS, 2019MONDADA, Lorenza; DUBOIS, Danièle. Construção dos objetos de discurso e categorização: uma abordagem dos processos referenciais. In: CAVALCANTE, Mônica Magalhães; RODRIGUES, Bernardete Biasi; CIULLA, Alena. (org.). Referenciação. São Paulo: Contexto , 2019. p. 17-52. (Título original: Construction des objets de discours et catégorisation: une approche des processus de référenciation. 1995). [1995MONDADA, Lorenza; DUBOIS, Danièle. Construção dos objetos de discurso e categorização: uma abordagem dos processos referenciais. In: CAVALCANTE, Mônica Magalhães; RODRIGUES, Bernardete Biasi; CIULLA, Alena. (org.). Referenciação. São Paulo: Contexto , 2019. p. 17-52. (Título original: Construction des objets de discours et catégorisation: une approche des processus de référenciation. 1995).], p. 20).

A partir da análise do corpus de textos formais compilados pelo grupo de pesquisa NUPACT-UFJF, localizamos 439 dados de cláusulas temporais, dentre os quais 75 eram casos de intercalação. Nesse subgrupo, restringimo-nos a observar 9 dados de intercaladas entre sujeito e verbo, analisados consoante aos processos referenciais (CAVALCANTE; MARTINS, 2020CAVALCANTE, Sávio André de Souza. Efeitos prototípicos da intercalação de Cláusulas Hipotáticas Circunstanciais Temporais no Espanhol mexicano oral. 2020. 214 f. Tese (Doutorado em Linguística) - Centro de Humanidades, Programa de pós-graduação em Linguística, Universidade Federal Ceará, Fortaleza, 2020. Disponível em: Disponível em: http://repositorio.ufc.br/bitstream/riufc/51477/1/2020_tese_sascavalcante.pdf . Acesso em: 26 ago. 2021.
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) e aos parâmetros definitude (NEVES, 2013NEVES, Maria Helena de Moura. Texto e gramática. São Paulo: Editora Contexto, 2013.), estatuto informacional (PRINCE, 1992PRINCE, Ellen. The ZPG letter: subjects, definiteness, and information status. In: THOMPSON, Sandra; MANN, William (eds.). Discourse Description: diverse analyses of a fund raising text. Philadelphia: John Benjamins, 1992. p. 295-325.), acessibilidade anafórica e persistência tópica (GIVÓN, 1995GIVÓN, Talmy. Functionalism and grammar. Philadelphia: J. Benjamins, 1995.).

Os resultados mostraram que as temporais intercaladas constituem padrão posicional mais marcado nesse contexto no que tange à baixa frequência (9/439: 0.02% de frequência token e 9/75: 0.12% de frequência type) e à alta complexidade estrutural. Quanto à complexidade cognitiva, com base em Dubois e Votre (2012DUBOIS, Sylvie; VOTRE, Sebastião Josué. Análise modular e princípios subjacentes do funcionalismo linguístico. In: VOTRE, Sebastião Josué (org.). A construção da gramática. Niterói: Editora da UFF, 2012. p. 49-71.), argumentamos que essas formas podem ser usadas para diminuir os esforços de codificação e que servem a funções específicas em contextos de uso mais monitorado da língua (BRAGA; PAIVA, 2017BRAGA, Maria Luiza; PAIVA, Maria da Conceição de. Linguística textual e sintaxe. In: SOUZA, Edson Rosa Francisco de; PENHAVEL, Eduardo; CINTRA, Marcos Rogério. (orgs.). Linguística Textual: interfaces e delimitações - Homenagem a Ingedore Grünfeld Villaça Koch. São Paulo: Cortez, 2017. p. 189-210.).

Ao longo da análise, mostramos que as temporais intercaladas podem servir a várias funções no processo de referenciação, todas relacionadas à (re)construção referencial: (i) focalizar determinado recorte na linha evolutiva temporal da existência de um referente, (ii) restringir um referente, (iii) recategorizar um referente, (iv) especificar um referente, (v) construir uma avaliação de um referente, (vi) retomar anaforicamente um referente, (vii) promover a topicalização de um referente, (viii) facilitar a referenciação tópica e (ix) explicitar uma mudança de perspectiva tópica.

Pautando-se nas funções textuais das cláusulas intercaladas, os trabalhos futuros podem centrar-se nos demais types de temporais intercaladas apresentados por Cavalcante (2020CAVALCANTE, Sávio André de Souza. Efeitos prototípicos da intercalação de Cláusulas Hipotáticas Circunstanciais Temporais no Espanhol mexicano oral. 2020. 214 f. Tese (Doutorado em Linguística) - Centro de Humanidades, Programa de pós-graduação em Linguística, Universidade Federal Ceará, Fortaleza, 2020. Disponível em: Disponível em: http://repositorio.ufc.br/bitstream/riufc/51477/1/2020_tese_sascavalcante.pdf . Acesso em: 26 ago. 2021.
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), propondo novas configurações e funções. Além disso, novas pesquisas podem observar as configurações intercaladas que representam outros valores além do temporal. Essas estruturas podem ser descritas à luz de outros fenômenos do universo textual: os gêneros e as sequências textuais, a intertextualidade, a argumentação, os posicionamentos discursivos etc.

REFERÊNCIAS

  • APOTHÉLOZ, Denis; REICHLER-BÉGUELIN, Marie-José. Construction de la reference et strategies de designation. TRANEL (TRavaux NEuchâtelois de Linguistique), v. 23, p. 227-271, 1995. Disponível em: Disponível em: http://www.unine.ch/files/live/sites/tranel/files/Tranel/23/Apothéloz et Reichler-Béguelin_227-271.pdf Acesso em: 12 set. 2021.
    » http://www.unine.ch/files/live/sites/tranel/files/Tranel/23/Apothéloz et Reichler-Béguelin_227-271.pdf
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    » https://www.researchgate.net/publication/242375001_The_clause_as_a_locus_of_grammar_and_interaction

Notas

  • 1
    Consideramos cláusula, no sentido de Thompson e Couper-Kuhlen (2005), como a expressão formada por predicado e os sintagmas que o acompanham.
  • 2
    “Ou seja, a capacidade de referenciar” (NEVES, 2013NEVES, Maria Helena de Moura. Texto e gramática. São Paulo: Editora Contexto, 2013., p. 148).
  • 3
    Nesse sentido, discurso é sinônimo de texto.
  • 4
    It-clefts.
  • 5
    Wh-clefts.
  • 6
  • 7
  • 8
    “notícias, reportagens, entrevistas e artigos de opinião” (DALL’ORTO, 2018DALL’ORTO, L. F. M. Construções avaliativas com “super”, “mega”, “hiper” e “ultra” na língua portuguesa - uma proposta de rede construcional a partir da Linguística Funcional Centrada no Uso. 2018. 225 f. Tese (Doutorado em Linguística) - Programa de Pós-Graduação em Linguística, Universidade Federal de Juiz de Fora, Juiz de Fora, 2018., p. 115).
  • 9
    “política, economia, educação, saúde, cultura, tecnologia e lazer” (DALL’ORTO, 2018DALL’ORTO, L. F. M. Construções avaliativas com “super”, “mega”, “hiper” e “ultra” na língua portuguesa - uma proposta de rede construcional a partir da Linguística Funcional Centrada no Uso. 2018. 225 f. Tese (Doutorado em Linguística) - Programa de Pós-Graduação em Linguística, Universidade Federal de Juiz de Fora, Juiz de Fora, 2018., p. 115).
  • 10
    Frequência token é a frequência em relação a todos os dados (todas as temporais), e frequência type é a frequência em relação a um subgrupo (as intercaladas). Frequência type e token são sugeridas por Bybee (2007BYBEE, Joan. Frequency of use and the organization of language. New York: Oxford University Press, 2007.). Embora tenhamos observado os percentuais de uso das intercaladas, a fim de mapear a produtividade do fenômeno, esta análise é preponderantemente qualitativa.
  • 11
    Analisamos essa ocorrência como um caso de redução da construção passiva (BERTOQUE; CASSEB-GALVÃO, 2010BERTOQUE, Lennie Aryete Dias Pereira; CASSEB-GALVÃO, Vânia Cristina. Construções de voz em títulos de notícias e em manchetes: contribuição para o ensino. Polifonia, Cuiabá, v. 17, n. 21, p. 53-84, jul./dez. 2010. Disponível em: Disponível em: https://periodicoscientificos.ufmt.br/ojs/index.php/polifonia/article/view/5 . Acesso em 14 set. 2021.
    https://periodicoscientificos.ufmt.br/oj...
    ), já que o auxiliar (quando são questionados) foi removido.
  • 12
    Diferentemente do tópico oracional, especificado na nota seguinte, o “tópico discursivo define-se como categoria abstrata e analítica, com a qual se opera na descrição da organização tópica de um texto” (JUBRAN, 2015JUBRAN, Clélia Cândida Abreu Spinardi. Tópico discursivo. In: JUBRAN, Clélia Cândida Abreu Spinardi (org.). A construção do texto falado. São Paulo: Contexto , 2015. p. 85-126., p. 87). Essa categoria “manifesta-se, na conversação, mediante enunciados formulados pelos interlocutores a respeito de um conjunto de referentes, concernentes entre si e em relevância num determinado ponto da mensagem” (JUBRAN, 2015JUBRAN, Clélia Cândida Abreu Spinardi. Tópico discursivo. In: JUBRAN, Clélia Cândida Abreu Spinardi (org.). A construção do texto falado. São Paulo: Contexto , 2015. p. 85-126., p. 87).
  • 13
    Diferentemente do tópico discursivo, o tópico oracional é o elemento que gramaticaliza a propriedade de topicalidade, e está relacionado com o contexto discursivo no âmbito da cláusula (GIVÓN, 2001GIVÓN, Talmy. Syntax: an introduction - volume I. Amsterdam: J. Benjamins, 2001.).
  • 14
    Embora haja a presença do termo “desorganizado desde 2012”, a intercalada em (15) é exemplo de descontinuidade entre sujeito e verbo. Não é sem motivo que, nesses casos, Cavalcante (2020CAVALCANTE, Sávio André de Souza. Efeitos prototípicos da intercalação de Cláusulas Hipotáticas Circunstanciais Temporais no Espanhol mexicano oral. 2020. 214 f. Tese (Doutorado em Linguística) - Centro de Humanidades, Programa de pós-graduação em Linguística, Universidade Federal Ceará, Fortaleza, 2020. Disponível em: Disponível em: http://repositorio.ufc.br/bitstream/riufc/51477/1/2020_tese_sascavalcante.pdf . Acesso em: 26 ago. 2021.
    http://repositorio.ufc.br/bitstream/riuf...
    ) usa o símbolo (∆) para indicar a presença de material interveniente. Por isso, descreve as intercaladas entre sujeito e verbo utilizando o padrão Suj (∆) Temp (∆) N, em que “Suj” é o sujeito, “Temp” é a cláusula temporal, e “N” é a cláusula nuclear. É em tal procedimento que nos apoiamos.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Maio 2023
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    16 Set 2021
  • Aceito
    10 Out 2021
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