Acessibilidade / Reportar erro

Mate (chimarrão) é consumido em alta temperatura por população sob risco para o carcinoma epidermóide de esôfago

High temperature "matè" infusion drinking in a population at risk for squamous cell carcinoma of the esophagus in southern Brazil

Resumos

Introdução -- O mate, ou chimarrão, uma infusão popular de uma erva (Ilex paraguayensis) bebida em grandes volumes, é um conhecido fator de risco para carcinoma epidermóide de esôfago e há suspeitas de que a água quente utilizada para o consumo possa ser fator importante na carcinogênese. Métodos - Pesquisou-se a temperatura em que a infusão é ingerida por uma amostragem da população sob risco para carcinoma epidermóide de esôfago. Realizaram-se entrevistas com indivíduos consumidores de mate na área urbana de Taquara, RS, com relação aos hábitos de ingestão de mate, e a temperatura do mate foi medida através de termômetros de precisão. A percepção da temperatura, estimada pelos usuários, foi também registrada. Resultados - Em 36 residências, 107 pessoas estavam ingerindo mate. A maioria bebia a infusão diariamente (97,2%) e o consumo médio diário foi de 1.265 mL por usuário (desvio padrão de 1.132 mL, variando de 250 a 6.000 mL). A temperatura medida era igual ou superior a 60 º C em 72% das residências, com média de 63,4 º C (51-78 º C) e mediana de 64,4 º C. Conclusão - Neste estudo foi possível evidenciar que o mate é consumido em grandes volumes e alta temperatura e que os usuários não foram capazes de estimar corretamente a temperatura do mate consumido. A temperatura elevada do mate consumido nessa população pode estar contribuindo à carcinogênese esofágica.

Neoplasia esofágicas; Carcinoma de células escamosas; Mate


"Matè", a popular hot infusion of a herb (Ilex paraguayensis) drunk in large volumes, is a known risk factor for squamous cell carcinoma of the esophagus and there is a suspicion that high temperature of boiled water used for the infusion may contribute for carcinogenesis. Methods - We measured the temperature of "matè" infusion drank by a sample of the population at risk for this carcinoma in Taquara, southern Brazil. We interviewed inhabitants for drinking habits and the temperature of the infusion was measured with high precision thermometers. Temperature of the infusion was asked to consumers and their estimate compared to our measurements. We considered 60 ºC or higher as "hot". Results - In 36 residencies, 107 individuals were drinking "matè". Most individuals drunk it daily (97,2%), and the medium daily volume was 1,265 ml (SD ± 1,132 mL) ranging from 250 to 6,000 mL. The measured temperature was 60ºC or higher in 72% of residencies with medium of 63.4 ºC (51-78 ºC) and median 64.4 ºC. Conclusion - In this study, "matè" was consumpted in large volumes at high temperature and individuals did not estimate correctly the temperature of infusion. High temperatures of "matè" may contribute to carcinogenesis in this population.

Esophageal neoplasms; Carcinoma, squamous cell; Mate


ARTIGO ORIGINAL / ORIGINAL ARTICLE

MATE (CHIMARRÃO) É CONSUMIDO EM ALTA TEMPERATURA POR POPULAÇÃO SOB RISCO PARA O CARCINOMA EPIDERMÓIDE DE ESÔFAGO

Sérgio Gabriel Silva de BARROS* Trabalho realizado pelo Grupo de Estudos e Pesquisa em Câncer de Esôfago (GEPECE) do Hospital de Clínicas de Porto Alegre e da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. , Eduardo Sörensen GHISOLFI** Trabalho realizado pelo Grupo de Estudos e Pesquisa em Câncer de Esôfago (GEPECE) do Hospital de Clínicas de Porto Alegre e da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. , Letícia Perondi LUZ** Trabalho realizado pelo Grupo de Estudos e Pesquisa em Câncer de Esôfago (GEPECE) do Hospital de Clínicas de Porto Alegre e da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. , Gabriel Guinsburg BARLEM** Trabalho realizado pelo Grupo de Estudos e Pesquisa em Câncer de Esôfago (GEPECE) do Hospital de Clínicas de Porto Alegre e da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. , Roberta Machado VIDAL** Trabalho realizado pelo Grupo de Estudos e Pesquisa em Câncer de Esôfago (GEPECE) do Hospital de Clínicas de Porto Alegre e da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. , Fernando Herz WOLFF** Trabalho realizado pelo Grupo de Estudos e Pesquisa em Câncer de Esôfago (GEPECE) do Hospital de Clínicas de Porto Alegre e da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. , Valentino Antônio MAGNO** Trabalho realizado pelo Grupo de Estudos e Pesquisa em Câncer de Esôfago (GEPECE) do Hospital de Clínicas de Porto Alegre e da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. , Helenice Pankowski BREYER*** Trabalho realizado pelo Grupo de Estudos e Pesquisa em Câncer de Esôfago (GEPECE) do Hospital de Clínicas de Porto Alegre e da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. , Judite DIETZ**** Trabalho realizado pelo Grupo de Estudos e Pesquisa em Câncer de Esôfago (GEPECE) do Hospital de Clínicas de Porto Alegre e da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. , Antonio Carlos GRÜBER*** Trabalho realizado pelo Grupo de Estudos e Pesquisa em Câncer de Esôfago (GEPECE) do Hospital de Clínicas de Porto Alegre e da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. , Cleber Dario Pinto KRUEL***** Trabalho realizado pelo Grupo de Estudos e Pesquisa em Câncer de Esôfago (GEPECE) do Hospital de Clínicas de Porto Alegre e da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. e João Carlos PROLLA****** Trabalho realizado pelo Grupo de Estudos e Pesquisa em Câncer de Esôfago (GEPECE) do Hospital de Clínicas de Porto Alegre e da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

RESUMO ¾ Introdução ¾ O mate, ou chimarrão, uma infusão popular de uma erva (Ilex paraguayensis) bebida em grandes volumes, é um conhecido fator de risco para carcinoma epidermóide de esôfago e há suspeitas de que a água quente utilizada para o consumo possa ser fator importante na carcinogênese. Métodos - Pesquisou-se a temperatura em que a infusão é ingerida por uma amostragem da população sob risco para carcinoma epidermóide de esôfago. Realizaram-se entrevistas com indivíduos consumidores de mate na área urbana de Taquara, RS, com relação aos hábitos de ingestão de mate, e a temperatura do mate foi medida através de termômetros de precisão. A percepção da temperatura, estimada pelos usuários, foi também registrada. Resultados - Em 36 residências, 107 pessoas estavam ingerindo mate. A maioria bebia a infusão diariamente (97,2%) e o consumo médio diário foi de 1.265 mL por usuário (desvio padrão de 1.132 mL, variando de 250 a 6.000 mL). A temperatura medida era igual ou superior a 60 o C em 72% das residências, com média de 63,4 o C (51-78 o C) e mediana de 64,4 o C. Conclusão - Neste estudo foi possível evidenciar que o mate é consumido em grandes volumes e alta temperatura e que os usuários não foram capazes de estimar corretamente a temperatura do mate consumido. A temperatura elevada do mate consumido nessa população pode estar contribuindo à carcinogênese esofágica.

DESCRITORES ¾ Neoplasia esofágicas. Carcinoma de células escamosas. Mate.

INTRODUÇÃO

Câncer de esôfago é uma das 10 neoplasias mais comuns, contudo a sua incidência apresenta uma acentuada variação geográfica(12, 14). No Rio Grande do Sul a incidência de câncer de esôfago está em torno de 14,3/100.000 entre os homens e 4,2/100.000 entre as mulheres, mas essas cifras são mais elevadas em certas regiões, como a micro região Colonial Encosta da Serra Geral, onde se localiza a cidade de Taquara(11, 13, 16, 18, 19), apresentando níveis mais altos do que São Paulo, um Estado com características socioeconômicas e demográficas similares. Enquanto na maior parte da Europa e América do Norte as taxas de incidência são menores do que 6/100.000 entre os homens e 3/100.000 entre as mulheres, há regiões no Irã e na China com taxas maiores do que 100/100.000 para ambos os sexos(2, 3, 4, 5, 18, 21).

A etiologia de câncer esofágico nas regiões de mais alta incidência não são elucidadas. Nas regiões de incidência mais baixa e intermediária, estudos têm mostrado que o uso de álcool, tabagismo e o baixo nível socioeconômico são os principais fatores de risco envolvidos, enquanto o consumo de vegetais verdes e frutas parece exercer algum fator protetor(2, 3, 4, 9, 16).

O uso de mate, ou chimarrão, como também é conhecida esta bebida, uma infusão quente, feita com folhas secas e picadas de Ilex paraguayensis, tem sido implicada como possível causa de câncer esofágico na América do Sul, onde elevadas taxas de incidência são observadas numa área que inclui o sul do Brasil, Uruguai e nordeste da Argentina. A população mais antiga dessa região, a indígena, transmitiu o hábito de beber mate aos colonizadores da região por volta do século XVI, que o modificaram, passando a utilizar água quente, costume que, por sua vez, transmitiram aos seus descendentes e aos imigrantes que hoje ocupam a região(20). O mate é bebido através de um tubo metálico (bomba) que traz o líquido quente diretamente à parte posterior da língua e orofaringe, de onde é prontamente deglutido.

Este hábito é comum em áreas com maior incidência de câncer esofágico e não é comum nas outras áreas com menor incidência(11). Freqüentemente, grande quantidade de mate pode ser ingerido por um indivíduo nessas áreas de maior risco, às vezes mais do que 1 litro/dia. Essa correlação ecológica e as evidências levantadas por estudos de caso-controle, levaram à hipótese de que o mate seja um fator de risco para o carcinoma epidermóide nessas áreas(11, 15). Um estudo de caso-controle, ajustado para os demais fatores conhecidos, mostrou associação do carcinoma epidermóide de esôfago (CEE) com o álcool, o tabaco e consumo de carne. Entretanto, um aumento de risco relativamente pequeno foi associado à ingestão de mate - razão de chances entre 0,87 e 2,50 com intervalo de confiança de 90%(11). Noutro estudo(18), mostrou-se um risco relativo 12,2 vezes maior para os bebedores de mais de 2,5 litros de mate por dia, quando ajustado para os demais fatores.

Há dois possíveis mecanismos pelos quais o mate pode elevar o risco para câncer de esôfago. O extrato da planta pode conter substâncias carcinogênicas ou promotoras, entretanto até agora não há comprovação da ação carcinogênica dos extratos, em água e em álcool, de Ilex paraguayensis. A outra possibilidade é que a injúria térmica potencializa a ação de outros carcinógenos ingeridos(18). Nesse aspecto, vários estudos epidemiológicos foram realizados no Paraguai(15), no Japão(17), no Irã(6), na extinta União Soviética(7) e em Porto Rico(10), sugerindo associação entre a ingestão de bebidas quentes e o desenvolvimento de câncer esofágico(18). Concomitantemente, experimentos com animais sugerem que a água com temperatura superior a 60 oC pode potencializar o efeito de carcinógenos em contato com a mucosa esofágica. Estudos demonstram que ratos quando submetidos a alimentação oral crônica com água quente e N-metil-N'-nitrosoguanidina (MNNG), desenvolvem mais neoplasias de esôfago do que os grupos controles de animais que recebem água quente cronicamente, ou só MNNG(8). Desta forma, suspeita-se que o mate não contenha agentes carcinógenos específicos, mas que a alta temperatura em que é bebido possa potencializar a carcinogênese, especialmente quando associada ao álcool e ao tabaco.

O padrão de ingestão de mate em Pelotas, RS, onde há um risco moderadamente alto para câncer esofágico, foi verificado em estudo anterior(19), concluindo-se que essa bebida é ali ingerida em temperaturas da ordem de 69,5 oC, num volume médio de 1800 mL por usuário por dia.

O presente trabalho tem por objetivo determinar a temperatura em que o mate é efetivamente consumido por uma população sob risco para o câncer de esôfago, numa outra área do Estado, com maior incidência de câncer esofágico(13) e onde se desenvolve um projeto de rastreamento (diagnóstico precoce) populacional em câncer de esôfago(1), para definir o padrão de consumo desta bebida quente naquela população.

Secundariamente, procuramos estabelecer uma relação entre a estimativa, ou percepção, da temperatura do mate pelos consumidores e a temperatura medida.

MATERIAIS E MÉTODOS

Foi escolhida a localidade de Taquara, na micro região 309 - Colonial Encosta da Serra Geral, que tem média de mortalidade de 16,44/100.000 entre 1970 e 1989, para o sexo masculino, com tendência crescente ao longo do tempo, sendo uma das regiões de maior incidência no Rio Grande do Sul(13, 16). Na sede deste município, realizaram-se visitas domiciliares numa área compreendendo 10 quarteirões no entorno do Posto de Saúde local, em zona urbana. As residências eram visitadas por uma dupla de pesquisadores treinados que inquiriam, utilizando um questionário estruturado, sobre o consumo de mate naquele momento. Quando os moradores estivessem consumindo mate, procedia-se a um pequeno questionário sobre os hábitos de sua ingestão. O questionário era aplicado a todos indivíduos, em cada residência visitada, e interrogava-se sobre a freqüência do hábito, a quantidade usualmente bebida e a percepção da temperatura do mate ¾ se frio, morno, quente ou muito quente (Anexo 1 Anexo 1 ). Durante a entrevista solicitou-se o consentimento para medir a temperatura da água utilizada no recipiente (cuia), imediatamente antes da sua ingestão. A temperatura foi aferida por termômetros de precisão (marca Incoterm, fabricação nacional, modelo 1017A) e a leitura efetuada independentemente por cada pesquisador da dupla e, em seguida, confrontados os dados para evitar possíveis erros de aferição. Padronizou-se a aferição pela imersão da porção termo-sensível do instrumento até que o nível da água atingisse a marca de 0 oC no termômetro, o que corresponde a uma profundidade aproximada de cerca de 2,5 cm abaixo da superfície, sem que a ponteira do termômetro atingisse a erva ou o fundo da cuia, permanecendo totalmente em contato com a água quente. Padronizou-se o tempo de 20 segundos após a imersão para a leitura, tempo plenamente suficiente para a estabilização da leitura. A temperatura estimada foi posteriormente correlacionada com a temperatura medida, estratificada em três categorias (Tabela 1). Arbitrariamente, consideramos a temperatura de 60 oC ou maior como quente.

Trata-se de estudo descritivo e para tanto utilizou-se estatística descritiva (média, mediana, desvio padrão, percentis). Para comparação da estimativa de temperatura pelos próprios usuários com a medida objetiva, utilizamos os testes de Bartlett e de Kruskal-Wallis.

RESULTADOS

Na área abordada, dentre 100 logradouros visitados, encontramos 36 onde estava se consumindo mate no momento, compreendendo 107 indivíduos (em média 2,9 pessoas bebiam mate em cada local visitado), e 36 responderam ao nosso questionário, sendo que 58,3 % eram do sexo feminino. A idade média dos mesmos foi de 52,08 anos (variando entre 26 e 77 anos, com desvio-padrão de 14,21).

Quanto à freqüência do hábito, 35 pessoas responderam "diariamente" e apenas uma pessoa respondeu à opção "até três dias por semana". Ninguém respondeu às opções que declaravam freqüências menores (Figura 1).


Ao analisarmos a quantidade de mate ingerido obtivemos um consumo per capita médio de 1265 mL/dia, com desvio-padrão de 1132,24 ¾ o consumo per capita mínimo foi de 250 mL/dia e o máximo de 6000 mL/dia (Figura 2).


A temperatura medida mostrou as seguintes características: média de 63,4 °C ; mediana de 64,5 oC; moda de 65 oC; o valor mínimo foi 51 oC, o máximo foi 78 oC; os percentis 25o e 75o, respectivamente 58,5 oC e 68,5 oC; com desvio-padrão de 6,384 (Figura 3). Em temperatura superior a 60 oC estavam 72,22 % das aferições.


Quanto à percepção da temperatura do mate as respostas foram:

• 33,3 % n = 12 "morno";

• 61,1 % n = 22 "quente";

• 5,6 % n = 2 "muito quente";

• ninguém relatou tomar a bebida fria.

O teste de Bartlett mostrou que a variância dos três grupos em que se dividiu a noção subjetiva era homogênea com 95% de confiança porém, ao aplicarmos o teste de Kruskal-Wallis, não se obteve significância estatística (P = 0.35) para a correspondência entre a estimativa da temperatura e a temperatura medida (Tabela 1).

DISCUSSÃO

Os dados obtidos, embora com número reduzido de indivíduos, parecem-nos representativos da população escolhida, mostrando que o consumo do mate é um hábito diário nas residências visitadas e que o consumo per capita médio é elevado (1.265 mL/dia). Além disso, observamos que 72,22% da amostra estudada ingere o mate em temperatura superior a 60 oC, o que foi experimentalmente considerado como um fator promotor da carcinogênese esofágica. Esses valores são semelhantes aos encontrados no estudo em Pelotas(19). Cabe ressaltar que 50% dos consumidores que relataram ingerir a bebida em temperatura morna estavam, de fato, consumindo mate em temperatura superior a 60 oC.

Analisando o nosso estudo podemos identificar dois possíveis vieses capazes de induzir a erros nos resultados. O primeiro potencial viés reside no fato de que a região pesquisada se localiza no entorno do Posto de Saúde onde atua o GEPECE (Grupo de Estudo e Pesquisa em Câncer de Esôfago) há alguns anos, sendo possivelmente conhecida da população em geral, naquela região, muitos dos aspectos ligados ao câncer de esôfago, como, por exemplo, a idéia de que o mate quente possa ser fator de risco na gênese desta neoplasia. É possível que uma conduta auto-protetora nessa população possa ter induzido a um consumo menor e com temperatura mais baixa do que o da população em geral.

Outro possível viés é o fato de que as visitas foram efetuadas numa manhã de sábado, entre as 7:00 h e as 12:00 h, num período em que a temperatura ambiente, devido à estação do inverno, se manteve abaixo de 9 oC, durante a pesquisa, podendo influenciar a temperatura da infusão. No estudo em Pelotas, verificou-se que a média das temperaturas medidas no mate variava de acordo com a temperatura ambiente, subindo, a primeira, 0,34 oC para cada acréscimo de 1oC na ambiental(19).

Adicionalmente, vale registrar que na grande maioria das outras residências, em que não se fez a mensuração da temperatura por não se estar consumindo mate no momento da visita, o hábito também era diário. Percebemos que é costume beber mate naquela região ou cedo pela manhã, ou próximo ao meio-dia, sendo exceção a esta regra, os usuários em estabelecimentos comerciais, onde se bebe o mate durante toda a manhã.

CONCLUSÕES

Concluímos que a grande maioria dos usuários estava exposta ao uso crônico diário de mate quente, em temperatura geralmente superior a 60 oC e em grandes volumes, o que pode ser um fator contribuinte à carcinogênese esofágica nessa população. Não existiu boa correlação entre a temperatura estimada pelos usuários e a temperatura medida na infusão do mate.

Barros SGS de, Ghisolfi ES, Luz LP, Barlem GG, Vidal RM, Wolff FH, Magno VA, Breyer HP, Dietz J, Grüber AC, Kruel CDP, Prolla JC. High temperature "matè" infusion drinking in a population at risk for squamous cell carcinoma of the esophagus in southern Brazil. Arq Gastroenterol 2000;37(1):25-30.

ABSTRACT ¾ "Matè", a popular hot infusion of a herb (Ilex paraguayensis) drunk in large volumes, is a known risk factor for squamous cell carcinoma of the esophagus and there is a suspicion that high temperature of boiled water used for the infusion may contribute for carcinogenesis. Methods - We measured the temperature of "matè" infusion drank by a sample of the population at risk for this carcinoma in Taquara, southern Brazil. We interviewed inhabitants for drinking habits and the temperature of the infusion was measured with high precision thermometers. Temperature of the infusion was asked to consumers and their estimate compared to our measurements. We considered 60 oC or higher as "hot". Results - In 36 residencies, 107 individuals were drinking "matè". Most individuals drunk it daily (97,2%), and the medium daily volume was 1,265 ml (SD ± 1,132 mL) ranging from 250 to 6,000 mL. The measured temperature was 60 oC or higher in 72% of residencies with medium of 63.4 oC (51-78 oC) and median 64.4 oC. Conclusion - In this study, "matè" was consumpted in large volumes at high temperature and individuals did not estimate correctly the temperature of infusion. High temperatures of "matè" may contribute to carcinogenesis in this population.

HEADINGS ¾ Esophageal neoplasms. Carcinoma, squamous cell. Mate.

Recebido para publicação em 20/4/1999.

Aprovado para publicação em 18/6/1999.

* Professor Adjunto, Departamento de Medicina Interna. Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Medicina: Gastroenterologia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS. Médico do Serviço de Gastroenterologia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre.

** Graduandos da Faculdade de Medicina da UFRGS.

*** Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Medicina: Gastroenterologia, UFRGS.

**** Doutorandos do Programa de Pós-Graduação em Medicina: Gastroenterologia, UFRGS.

***** Professor Adjunto, Departamento de Cirurgia da Faculdade de Medicina da UFRGS.

****** Professor Titular, Departamento de Medicina Interna da Faculdade de Medicina da UFRGS.

Endereço para correspondência: Dr. Sérgio Gabriel S. de Barros - Rua Ramiro Barcelos, 910 - sala 603 - 90035-001 - Porto Alegre, RS. e-mail: ppgastro@vortex.ufrgs.br

  • 1. Barros SGS, Kruel CDP, Diehl AS, Dietz J, Grüber AC, Kruel IR, Prolla JC. Population screening for precursor lesions and early squamous cell cancer of the esophagus in southern Brazil: preliminary results. Gastroenterology 1997;12:A-536.
  • 2. Day N, Muñoz N, Ghadirian P. Epidemiology of esophageal cancer: a review. In: Correa P, Haenszel W, editors. Epidemiology of cancer of the digestive tract. The Hague: Martinus Nijhoff; 1982. p. 21-57.
  • 3. De Jong UW, Breslow N, Hong JGE, Sridharan M, Shanmugaratnan K. Aetiological factors in oesophageal cancer in Singapore Chinese. Int J Cancer 1974;13:291-303.
  • 4. De Stefani E, Muñoz N, Estève J, Vassalo A, Victora CG, Teuchmann S. Matè drinking, alcohol, tobacco, diet, and esophageal cancer in Uruguay. Cancer Res 1990;50:426-31.
  • 5. Ghadirian P. Thermal irritation and esophageal cancer in northern Iran. Cancer 1987;60:1909-14.
  • 6. IARC/Iran Study Group. Esophageal cancer studies in the Caspian litoral of Iran; results of population studies. A prodrome. J Natl Cancer Inst 1977;59:1127-38.
  • 7. Kolycheva NI. Epidemiology of esophageal cancer in the USSR. In: Levin D, ed. Cancer epidemiology in the USA and USSR. Joint USA/USSR. Monograph, 1980.
  • 8. Kruel CDP, Gurski R, Cavazzola LT, Kruel CRP, Madruga G, Sfair JA. Hot-water effect in the esophageal carcinogenesis experimental model in mice. In: Sixth World Congress of International Society for Diseases of the Esophagus, Milan, Italy. Abstract. 1995. p.199.
  • 9. Li JY, Taylor PR, Li B, Dawsey S, Wang GQ, Ershow AG, Guo W, Liu SF, Yang CS, Shen Q, Wang W, Mark SD, Zou XN, Greenwald P, Wu YP, Blot WJ. Nutrition intervention trials in Linxian, China: multiple vitamin/mineral supplementation, cancer incidence, and disease-specific mortality among adults with esophageal dysplasia. J Natl Cancer Inst 1993;85:1492-8.
  • 10. Martinez I. Factors associated with cancer of the esophagus, mouth and pharynx in Puerto Rico. J Natl Cancer Inst 1969;42:1069-94.
  • 11. Muñoz N, Victora CG, Crespi M, Saul C, Braga NM, Correa P. Hot matè drinking and precancerous lesions of the oesophagus: an endoscopic survey in southern Brazil. Int J Cancer 1987;39:708-9.
  • 12. Parkin DM, Pisani P, Ferlay J. Estimates of the worldwide incidence of eighteen major cancers in 1985. Int J Cancer 1993;54:594-606.
  • 13. Prolla JC, Dietz J, Da Costa LA. Diferenças geográficas na mortalidade por câncer de esôfago no Rio Grande do Sul. Rev Assoc Med Bras 1993;39:217-20.
  • 14. Ries LAG, Miller BA, Hankley BF, Kosary CL, Harras A, Edwards BK. SEER cancer statistics review, 1973-1991: tables and graphs. Bethesda, MD: National Cancer Institute, 1994. NIH Pub. No. 94-2789.
  • 15. Rolón PA, Castellsagué X, Benz M, Muñoz N. Hot and cold mate drinking and esophageal cancer in Paraguay. Cancer Epidemiol Biomarkers & Prev 1995;4:595-605.
  • 16. Secretaria da Saúde e Meio Ambiente do Estado do Rio Grande do Sul. Estatísticas de saúde e mortalidade: volume 18. Porto Alegre, 1992.
  • 17. Segi M. Tea-gruel as a possible factor for cancer of the esophagus. Gann 1975;66:199-202.
  • 18. Victora CG, Muñoz N, Day NE, Barcelos LB, Peccin DA, Braga NM. Hot beverages and oesophageal cancer in southern Brazil: a case-control study. Int J Cancer 1987;39:710-6.
  • 19. Victora CG, Muñoz N, Horta Bl, Ramos EO. Patterns of matè drinking in a brazilian city. Cancer Res 1990;50:7112-5.
  • 20. Winge H, Ferreira AG, Mariath JEA, Tarasconi LC. Erva mate: biologia e cultura no cone sul. Porto Alegre, Ed. da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 1995.
  • 21. Yu MC, Garabradt DH, Peters JM, Mack TM. Tobacco, alcohol, diet, occupation, and carcinoma of the esophagus. Cancer Res 1988;48:3843-8.

Anexo 1

  • Trabalho realizado pelo Grupo de Estudos e Pesquisa em Câncer de Esôfago (GEPECE) do Hospital de Clínicas de Porto Alegre e da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      11 Dez 2002
    • Data do Fascículo
      Jan 2000

    Histórico

    • Recebido
      20 Abr 1999
    • Aceito
      18 Jun 1999
    Instituto Brasileiro de Estudos e Pesquisas de Gastroenterologia e Outras Especialidades - IBEPEGE. Rua Dr. Seng, 320, 01331-020 São Paulo - SP Brasil, Tel./Fax: +55 11 3147-6227 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: secretariaarqgastr@hospitaligesp.com.br