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Malformações do sistema nervoso central: análise de 157 necrópsias pediátricas

Malformations of the central nervous system: analysis of 157 pediatric autopsies

Resumos

As malformações do sistema nervoso central (SNC) têm sido relatadas como de alta prevalência, acometendo 5 a 10 crianças para 1000 nascidos vivos. Estudamos a frequência das malformações do SNC em 5837 necrópsias pediátricas realizadas no Serviço de Anatomia Patológica do Hospital de Clínicas-UFPR, entre 1960 e 1995. Encontraram-se 157 malformações do SNC, correspondendo a 2,69% das necrópsias. As malformações mais comuns foram os defeitos do tubo neural (61%), incluindo 47 anencefalias e 45 casos classificados no grupo das mieloencefaloceles. As anomalias da vesícula prosencefálica foram responsáveis por 8% das malformações encefálicas, havendo sete casos de holoprosencefalia. Em 3%, as alterações ocorreram na fossa posterior, com três malformações de Arnold-Chiari. No presente estudo, os índices de mortalidade por malformações do SNC foram mais altos no período neonatal.

malformação; sistema nervoso central; necrópsia


The malformations of the central nervous system affect about 5 to 10 children per 1000 births. We studied the central nervous system malformations in 5837 pediatric autopsies performed in the Sector of Anatomic Pathology, Hospital de Clínicas-UFPR, between 1960 and 1995. There were 157 central nervous system malformations (2.69%), the commonest were neural tube defects (61%): 47 cases of anencephaly and 45 cases classified in the group of myeloencephaloceles. The anomalies of the prosencephalic evagination corresponded to 8% of all central nervous system malformations, with seven cases of holoprosencephaly. Posterior fossa malformations occurred in 3%, with three cases of Arnold-Chiari. In the present study, the mortality rate due to central nervous system malformations was higher in the neonatal period.

malformation; central nervous system; autopsy


MALFORMAÇÕES DO SISTEMA NERVOSO CENTRAL

ANÁLISE DE 157 NECRÓPSIAS PEDIÁTRICAS

LÚCIA DE NORONHA 1 1 Professora Assistente, Departamento de Patologia Médica, Universidade Federal do Paraná (UFPR); 2 Acadêmica de Medicina e Estagiária da Unidade de Patologia Pediátrica e Perinatal, Serviço de Anatomia Patológica, Hospital de Clínicas (HC), UFPR; 3 Professor Asssistente, Chefe do Departamento de Patologia Médica, UFPR; 4 Professora Visitante, Departamento de Patologia Médica, UFPR; 5 Professora Aposentada, UFPR; homenagem póstuma; 6 Professor Titular, Departamento de Patologia Médica, Chefe do Serviço de Anatomia Patológica, HC, UFPR. Aceite: 29-maio-2000. , FABIOLA MEDEIROS 2 1 Professora Assistente, Departamento de Patologia Médica, Universidade Federal do Paraná (UFPR); 2 Acadêmica de Medicina e Estagiária da Unidade de Patologia Pediátrica e Perinatal, Serviço de Anatomia Patológica, Hospital de Clínicas (HC), UFPR; 3 Professor Asssistente, Chefe do Departamento de Patologia Médica, UFPR; 4 Professora Visitante, Departamento de Patologia Médica, UFPR; 5 Professora Aposentada, UFPR; homenagem póstuma; 6 Professor Titular, Departamento de Patologia Médica, Chefe do Serviço de Anatomia Patológica, HC, UFPR. Aceite: 29-maio-2000. , VANESSA DELLO MÔNACO MARTINS 2 1 Professora Assistente, Departamento de Patologia Médica, Universidade Federal do Paraná (UFPR); 2 Acadêmica de Medicina e Estagiária da Unidade de Patologia Pediátrica e Perinatal, Serviço de Anatomia Patológica, Hospital de Clínicas (HC), UFPR; 3 Professor Asssistente, Chefe do Departamento de Patologia Médica, UFPR; 4 Professora Visitante, Departamento de Patologia Médica, UFPR; 5 Professora Aposentada, UFPR; homenagem póstuma; 6 Professor Titular, Departamento de Patologia Médica, Chefe do Serviço de Anatomia Patológica, HC, UFPR. Aceite: 29-maio-2000. , GILBERTO ANTUNES SAMPAIO 3 1 Professora Assistente, Departamento de Patologia Médica, Universidade Federal do Paraná (UFPR); 2 Acadêmica de Medicina e Estagiária da Unidade de Patologia Pediátrica e Perinatal, Serviço de Anatomia Patológica, Hospital de Clínicas (HC), UFPR; 3 Professor Asssistente, Chefe do Departamento de Patologia Médica, UFPR; 4 Professora Visitante, Departamento de Patologia Médica, UFPR; 5 Professora Aposentada, UFPR; homenagem póstuma; 6 Professor Titular, Departamento de Patologia Médica, Chefe do Serviço de Anatomia Patológica, HC, UFPR. Aceite: 29-maio-2000. , MARIA JOSÉ SERAPIÃO 4 1 Professora Assistente, Departamento de Patologia Médica, Universidade Federal do Paraná (UFPR); 2 Acadêmica de Medicina e Estagiária da Unidade de Patologia Pediátrica e Perinatal, Serviço de Anatomia Patológica, Hospital de Clínicas (HC), UFPR; 3 Professor Asssistente, Chefe do Departamento de Patologia Médica, UFPR; 4 Professora Visitante, Departamento de Patologia Médica, UFPR; 5 Professora Aposentada, UFPR; homenagem póstuma; 6 Professor Titular, Departamento de Patologia Médica, Chefe do Serviço de Anatomia Patológica, HC, UFPR. Aceite: 29-maio-2000. , GILDA KASTIN 5 1 Professora Assistente, Departamento de Patologia Médica, Universidade Federal do Paraná (UFPR); 2 Acadêmica de Medicina e Estagiária da Unidade de Patologia Pediátrica e Perinatal, Serviço de Anatomia Patológica, Hospital de Clínicas (HC), UFPR; 3 Professor Asssistente, Chefe do Departamento de Patologia Médica, UFPR; 4 Professora Visitante, Departamento de Patologia Médica, UFPR; 5 Professora Aposentada, UFPR; homenagem póstuma; 6 Professor Titular, Departamento de Patologia Médica, Chefe do Serviço de Anatomia Patológica, HC, UFPR. Aceite: 29-maio-2000. , LUIZ FERNANDO BLEGGI TORRES 6 1 Professora Assistente, Departamento de Patologia Médica, Universidade Federal do Paraná (UFPR); 2 Acadêmica de Medicina e Estagiária da Unidade de Patologia Pediátrica e Perinatal, Serviço de Anatomia Patológica, Hospital de Clínicas (HC), UFPR; 3 Professor Asssistente, Chefe do Departamento de Patologia Médica, UFPR; 4 Professora Visitante, Departamento de Patologia Médica, UFPR; 5 Professora Aposentada, UFPR; homenagem póstuma; 6 Professor Titular, Departamento de Patologia Médica, Chefe do Serviço de Anatomia Patológica, HC, UFPR. Aceite: 29-maio-2000.

RESUMO - As malformações do sistema nervoso central (SNC) têm sido relatadas como de alta prevalência, acometendo 5 a 10 crianças para 1000 nascidos vivos. Estudamos a frequência das malformações do SNC em 5837 necrópsias pediátricas realizadas no Serviço de Anatomia Patológica do Hospital de Clínicas-UFPR, entre 1960 e 1995. Encontraram-se 157 malformações do SNC, correspondendo a 2,69% das necrópsias. As malformações mais comuns foram os defeitos do tubo neural (61%), incluindo 47 anencefalias e 45 casos classificados no grupo das mieloencefaloceles. As anomalias da vesícula prosencefálica foram responsáveis por 8% das malformações encefálicas, havendo sete casos de holoprosencefalia. Em 3%, as alterações ocorreram na fossa posterior, com três malformações de Arnold-Chiari. No presente estudo, os índices de mortalidade por malformações do SNC foram mais altos no período neonatal.

PALAVRAS-CHAVE: malformação, sistema nervoso central, necrópsia.

Malformations of the central nervous system: analysis of 157 pediatric autopsies

ABSTRACT - The malformations of the central nervous system affect about 5 to 10 children per 1000 births. We studied the central nervous system malformations in 5837 pediatric autopsies performed in the Sector of Anatomic Pathology, Hospital de Clínicas-UFPR, between 1960 and 1995. There were 157 central nervous system malformations (2.69%), the commonest were neural tube defects (61%): 47 cases of anencephaly and 45 cases classified in the group of myeloencephaloceles. The anomalies of the prosencephalic evagination corresponded to 8% of all central nervous system malformations, with seven cases of holoprosencephaly. Posterior fossa malformations occurred in 3%, with three cases of Arnold-Chiari. In the present study, the mortality rate due to central nervous system malformations was higher in the neonatal period.

KEY WORDS: malformation, central nervous system, autopsy.

As malformações do sistema nervoso central (SNC) têm alta prevalência, atingindo de 5 a 10 para 1000 nascidos vivos1. O encéfalo é afetado com maior frequência que os outros órgãos durante a vida intra-uterina devido à sua formação complexa e prolongada, tornando-se suscetível a anomalias de desenvolvimento por um longo período, que vai da 3ª a 16ª semana2.

O objetivo deste estudo é determinar a frequência das malformações do SNC nas necrópsias pediátricas realizadas no Serviço de Anatomia Patológica do Hospital de Clínicas de Curitiba no período de 1960 a 1995. Ênfase é dada na relação da malformação com a causa do óbito e na classificação das sequências malformativas.

MÉTODO

Casuística

Utilizou-se como fonte de dados o Banco de Necrópsias da Unidade de Patologia Perinatal e Pediátrica do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná em Curitiba, com 5743 necrópsias realizadas no período de 1960 a 1995.

A faixa etária variou entre 20 semanas de gestação a 14 anos de idade. Os pedidos de necrópsia encontravam-se preenchidos com dados como identificação, datas de internação e óbito e história clínica completa.

Método

Em todos os casos procedeu-se ao estudo necroscópico completo com exame externo detalhado e medidas antropométricas. O exame interno foi realizado com a evisceração do bloco de necrópsia. Todos os órgãos e sistemas foram dissecados, sendo colhidas amostras para a análise microscópica e elaboração do laudo final correlacionando-se aspectos morfológicos e clínicos 3.

As crianças foram classificadas em grupos etários:

- natimortos: aqueles que tiveram morte intra-uterina;

- neomortos: aqueles que nasceram vivos e foram a óbito em qualquer período até o 28o dia de vida, prematuros ou não;

- lactentes: crianças que foram a óbito no período compreendido entre o 29o dia de vida e 11 meses de idade;

- pré-escolares: crianças que foram a óbito entre 1 ano a 6 anos e 11 meses de idade;

- escolares: crianças que foram a óbito entre 7 a 14 anos e 11 meses de idade;

As malformações foram classificadas segundo o desenvolvimento embrionário do sistema nervoso central 2,4,5:

- defeitos do tubo neural: anencefalia, grupo das mieloencefaloceles (encefalocele, mielocele, meningocele e espinha bífida) e inencefalia;

- defeitos da vesícula prosencefálica: holoprosencefalia, agenesia de corpo caloso ou de septo pelúcido e arrinencefalia;

- malformações de tronco e cerebelo: malformações de Arnold Chiari e Dandy-Waker;

- falhas na neurogênese: macrocefalia, microcefalia e micropoligiria;

- hidrocefalia congênita: neste estudo consideraram-se apenas as hidrocefalias resultantes da estenose congênita do aqueduto de Sylvius e aquelas de causa indeterminada; foram excluídas as hidrocefalias relacionadas a infecções ou hemorragias do SNC;

A relação da malformação com o óbito foi caracterizada em três graus após a análise dos dados clínicos e dos dados obtidos nas necrópsias:

Grau I - Malformação do SNC diretamente relacionada com o óbito: a malformação do SNC teve atuação significativa no processo do óbito, podendo ou não estar associada a alterações sistêmicas ou maternas.

Grau II - Malformação SNC é parte integrante de um espectro de malformações múltiplas que causaram o óbito: a malformação do SNC fazia parte de uma síndrome congênita ou associava-se a malformações de outros órgãos que em conjunto causaram o óbito.

Grau III - Malformação SNC com pouca atuação no óbito: a malformação do SNC não influenciou de maneira significativa o óbito.

As malformações do SNC foram avaliadas em relação ao sexo, à faixa etária, ao desenvolvimento embrionário do SNC, à seqüência malformativa, à associação com malformações de outros órgãos ou síndromes congênitas e sua relação com o processo do óbito.

A análise estatística utilizou o teste do qui-quadrado e o nível de significância adotado foi 5%.

RESULTADOS

Das 5837 necrópsias avaliadas, foram evidenciadas 1202 maformações congênitas e entre estas 157 malformações do SNC. A frequência de malformações congênitas correspondeu a 20,59% no total de necrópsias. As malformações do SNC representaram 13,07% das malformações. A frequência das malformações do SNC foi 2,69% do total de necrópsias.

A Tabela 1 mostra a divisão em grupos etários, as malformações do SNC foram mais prevalentes entre os neomortos (p<0,05). A densidade de óbitos, definida como a concentração de necrópsias com malformação do SNC no período de tempo compreendido em cada grupo etário, foi maior nos neomortos, conforme se segue:

- natimortos: compreendem 280 dias, a densidade de 54 malformações do SNC corresponde a 0,193;

- neomortos: compreendem 28 dias, a densidade de 69 malformações do SNC corresponde a 2,464;

- lactentes, pré-escolares e escolares: compreendem 10.128 dias, a densidade de 34 malformações do SNC corresponde a 0,003.

A Tabela 2 evidencia a distribuição por sexo em cada grupo etário. O sexo feminino predominou entre as malformações do SNC com 54% dos casos (p<0,05).

A Tabela 3 mostra a distribuição das malformações classificadas segundo o desenvolvimento embrionário do SNC nos grupos etários. Os defeitos do tubo neural foram os mais freqüentes (61%), entre estes, a anencefalia (Fig 1). A hidrocefalia, isolada ou associada, constituiu o tipo de malformação mais observado (Fig 1).


As lesões pertencentes ao grupo das mieloencefaloceles compreendiam dez encefalomeningoceles, nove mielomeningoceles, cinco meningoceles, três espinhas bífidas e três raquisquises cranio-medulares. Em cinco casos a anencefalia estava associada com malformações do grupo das mieloencefaloceles.

Das 49 hidrocefalias, 30 (61,22%) ocorreram isoladamente, destas 21 correspondiam a hidrocefalias idiopáticas e nove resultaram da estenose congênita do aqueduto de Sylvius (Tabela 3, Fig 1). A associação de hidrocefalia com o grupo das mieloencefaloceles foi observada em 17 casos, nos quais a hidrocefalia foi classificada como defeito do tubo neural. Dois casos de hidrocefalias estavam relacionadas à agenesia do septo pelúcido, consideradas no grupo dos defeitos da vesícula prosencefálica.

Das cinco malformações de tronco e cerebelo, três constituíram malformações de Arnold-Chiari, um caso correspondia à malformação de Dandy-Walker. Em um caso a classificação não foi possível. As malformações de Arnold-Chiari associavam-se a mielomeningocele.

Das 157 malformações do SNC, 64 (40,76%) associavam-se a malformações de outros órgãos e sistemas, havendo 30 síndromes congênitas (Tabela 4).

A Tabela 5 demostra a relação da malformação do SNC com o processo de óbito nos grupos etários, constatando-se que na maioria dos casos estudados, a malformação do SNC relaciona-se diretamente com o óbito.

DISCUSSÃO

As malformações congênitas representam uma importante causa de morbimortalidade perinatal em todo o mundo. Na Índia, as malformações congênitas são responsáveis por 8% da mortalidade perinatal 6. Nesta casuística, em 70% dos casos a malformação do SNC estava diretamente relacionada ao óbito (Tabela 5). Com o controle de outros fatores ligados a mortalidade perinatal, como infecções intra-uterinas e afecções maternas, as malformações congênitas têm suscitado maior atenção, criando a necessidade de estudos mais abrangentes sobre malformações 7.

As descrições de grandes séries de malformações compreendem a revisão de registros, investigações clínicas ou estudos de autópsias. Em vários países, como o Brasil, a revisão de registros é limitada pela notificação pouco criteriosa das doenças. Os resultados das autópsias refletem a prevalência das malformações com precisão semelhante às investigações clínicas. Entretanto, quando se trata de malformações do SNC, a autópsia fornece detalhes que estudos clínicos, mesmo utilizando métodos avançados de imagem, não poderiam proporcionar 8.

Frequência das malformações

Do total de necrópsias avaliadas, 20,59% apresentavam malformações congênitas e 2,69%, malformações do SNC. Estudos clínicos como o realizado por Verma et al. 7 encontram uma prevalência menor de malformações do SNC, correspondendo a 3,6% ao nascimento e primeira semana de vida. Neste estudo, as malformações do SNC foram o tipo mais comum de malformação, representaram 13,07% das malformações em geral, assemelhando-se aos dados relatados em investigações clínicas que variam de 13 a 35% 6,7,9. Odelowo et al. 8 afirmam que as malformações do SNC são as segundas mais frequentes, com 6,69% das malformações. Queisser et al. 10, utilizando métodos de diagnóstico pré-natal por imagem relatam que as malformações do SNC acometem 69% das crianças com anomalias do desenvolvimento.

Distribuição por faixa etária

As malformações do SNC foram mais frequentes entre os neomortos (p<0,05) conforme mostra a Tabela 1. Verma et al. 7 afirmam que as malformações do SNC são mais frequentes nos natimortos. No estudo realizado por Sobaniec et al. 11, os neomortos predominaram, representando 64% das crianças com malformações do SNC; entretanto estes autores não incluíram os natimortos.

A densidade de óbitos em cada grupo etário indica o período de desenvolvimento com maior mortalidade em decorrência das malformações do SNC. Há maior densidade no período perinatal (natimortos e neomortos), havendo poucos óbitos entre lactentes, escolares e pré-escolares. Comparados com os natimortos, os neomortos apresentam densidade maior (2,46), sugerindo que o ambiente intra-uterino pode desempenhar um papel protetor nas crianças com malformação do SNC, correspondendo o período neonatal ao de maior suscetibilidade ao óbito. Kalter 12 relata que a mortalidade no período neonatal por malformações congênitas corresponde ao dobro da observada nos natimortos.

A Tabela 3 relaciona a faixa etária com as malformações do SNC classificadas de acordo com o desenvolvimento embrionário, mostrando que os defeitos do tubo neural são mais frequentes entre os natimortos (81%), seguidos pelos neomortos (61%). A hidrocefalia como malformação isolada ocorre mais entre os lactentes, pré-escolares e escolares (44%), mas comparando-se natimortos e neomortos, são mais comuns nos primeiros (17%). Xiao et al. 13 estudaram apenas natimortos e neomortos, os defeitos do tubo neural predominaram nos natimortos (67%) em relação aos neomortos (33%), assim como a hidrocefalia com 80% e 20%, respectivamente.

Distribuição por sexo

O sexo feminino predominou entre as malformações do SNC com 54,14% dos casos (Tabela 2, p< 0,05). Sobaniec et al. 11 também encontraram malformações do SNC com maior frequência no sexo feminino (57%). Quando se analisa os grupos etários da Tabela 2, parece ocorrer inversão da maior frequência de malformações do SNC no sexo feminino entre natimortos e neomortos, para o sexo masculino entre lactentes pré-escolares e escolares. Entretanto, esta diferença não foi estatisticamente significativa, provavelmente resultado do pequeno número de casos de malformações nas idades mais avançadas.

De acordo com vários relatos da literatura, a maior prevalência no sexo feminino ocorre porque os defeitos de tubo neural, principalmente a anencefalia, que correspondem a maior parcela das malformações do SNC, são mais frequentes nas meninas 1,9,13,14. Neste estudo, 56% dos defeitos do tubo neural e 61% das anencefalias ocorreram no sexo feminino. Das anencefalias estudadas por Verma et al. 7 80% eram em meninas. Trimble & Baird 1 afirmam que entre os natimortos a anencefalia é 2,5 vezes mais frequente nas meninas.

Distribuição pelo desenvolvimento embrionário do SNC

Os defeitos do tubo neural foram os mais frequentes, correspondendo a 61% dos casos, seguidos da hidrocefalia congênita com 19% dos casos (Tabela 3). Nas malformações do SNC estudadas por Verma et al. 7 e Xiao et al. 13, os defeitos do tubo neural predominam com 63% e 73%, seguidos pela hidrocefalia em 30% e 25%, respectivamente. Himmetoglu et al. 9 relatam uma prevalência de 0,27% dos defeitos do tubo neural na população geral.

Observa-se na Tabela 3 que os defeitos do tubo neural predominaram entre os natimortos (p<0,01), e que a hidrocefalia congênita, ao contrário, é mais frequente no grupo dos lactentes, pré-escolares e escolares (p<0,01). Xiao et al. 13 estudaram natimortos e neomortos e relatam que tanto os defeitos do tubo neural como a hidrocefalia foram mais freqüentes nos natimortos, com 67,1% e 79,9%, respectivamente.

Koo e Chi 15 afirmam que 51% das hidrocefalias relacionam-se a malformações como estenose congênita do aqueduto de Sylvius e mieloceles, 28% decorrem de infecções, 8% resultam de hemorragias e 4% não têm causa definida. Nesta casuística, 28 casos de hidrocefalia (57%) correspondiam a malformações do SNC, 21 (43%) eram idiopáticas, sendo que as relacionadas a infecções ou hemorragias foram excluídas.

Associações e síndromes

Neste estudo, 40% das malformações do SNC estavam associadas a malformações de outros órgãos e sistemas (Tabela 4). Himmetoglu et al. 9, ao contrário, relatam que 89% das malformações do SNC eram isoladas, assim como 83% das malformações congênitas em geral. Mishira et al. 6, pesquisando malformações congênitas, encontraram em sua casuística 37% de anomalias múltiplas e 13% de malformações do SNC.

Considerações finais

O sistema nervoso central corresponde ao local de maior ocorrência de malformações congênitas com alto impacto de mortalidade. Estudos de autópsia sobre malformações fornecem números e porcentagens semelhantes à prevalência em estudos clínicos, mas com maiores detalhes segundo os tipos de malformações e a sua relação com a faixa etária e o sexo. Existe consenso quanto a maior prevalência das malformações do SNC no sexo feminino e a frequência elevada dos defeitos do tubo neural seguidos pelas hidrocefalias congênitas. Apesar das controvérsias da faixa etária em que as malformações do SNC são diagnosticadas, este estudo mostrou que o período neonatal corresponde à fase crítica, com maior densidade de óbitos.

Dra. Lúcia de Noronha - Unidade de Patologia Pediátrica e Perinatal, Serviço de Anatomia Patológica - Hospital de Clínicas - UFPR - Rua General Carneiro 181 - 80060-900 Curitiba PR - Brasil. Fax 041 264 1304. E-mail: luno@uol.com.br

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  • 1
    Professora Assistente, Departamento de Patologia Médica, Universidade Federal do Paraná (UFPR);
    2
    Acadêmica de Medicina e Estagiária da Unidade de Patologia Pediátrica e Perinatal, Serviço de Anatomia Patológica, Hospital de Clínicas (HC), UFPR;
    3
    Professor Asssistente, Chefe do Departamento de Patologia Médica, UFPR;
    4
    Professora Visitante, Departamento de Patologia Médica, UFPR;
    5
    Professora Aposentada, UFPR; homenagem póstuma;
    6
    Professor Titular, Departamento de Patologia Médica, Chefe do Serviço de Anatomia Patológica, HC, UFPR. Aceite: 29-maio-2000.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      06 Dez 2000
    • Data do Fascículo
      Set 2000

    Histórico

    • Aceito
      29 Maio 2000
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