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Idade como fator de risco independente para cefaléias secundárias

Age as an independent risk factor for secondary headaches

Resumos

OBJETIVO: Verificar se a idade é um fator de risco para cefaléias secundárias independente do tempo de evolução da queixa de dor de cabeça. MÉTODO: Foram selecionados 1131 pacientes com queixa principal de cefaléia. A proporção de cefaléias secundárias foi avaliada e comparada entre pacientes jovens e idosos em geral; entre indivíduos com cefaléia de início antes e após os 60 anos; e entre jovens e idosos com cefaléia de início há menos de um ano. RESULTADOS: Os idosos em geral e os indivíduos com cefaléia de início após os 60 anos apresentaram maior proporção de cefaléias secundárias que os jovens e aqueles com início da dor antes dos 60 anos. Idosos com cefaléia de início recente apresentaram proporção maior de cefaléias secundárias do que os jovens com mesmo tempo de evolução da dor. CONCLUSÃO: A idade é um fator de risco independente do tempo de evolução para cefaléias secundárias.

cefaléia; adulto; idoso


OBJECTIVE: To verify if the age is a risk factor for secondary headaches, regardless the time interval since the onset of the headache complaint. METHOD: 1131 patients were selected, with the main complaint of headache. The ratio of secondary headaches was evaluated and compared between young and elderly patients in general; between individuals with headache starting before and after 60 years of age; and between young and elderly subjects with headache having started for less than one year. RESULTS: Elderly patients in general and individuals with headache having started after 60 years of age presented a higher ratio of secondary headaches than the young subjects and the ones whose pain started before 60 years of age. Elderly subjects with headache of recent start presented a higher ratio of secondary headaches than young individuals with the same time of pain evolution. CONCLUSION: Age is an independent risk factor for secondary headaches, regardless the time interval since the onset of the complaint.

headache; adult; aged


Idade como fator de risco independente para cefaléias secundárias

Age as an independent risk factor for secondary headaches

Jano Alves de SouzaI; Pedro Ferreira Moreira FilhoII; Carla da Cunha JevouxIII; Sérgio AlbertinoIV; Elder Machado SarmentoV, Cláudio Manoel BritoV

Setor de Investigação de Cefaléia da Universidade Federal Fluminense Niterói RJ, Brasil (UFF)

IDoutor em Neurologia pela UFF

IIDoutor em Neurologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Professor Adjunto IV da UFF

IIIDoutoranda em Neurologia pela UFF

IVProfessor Adjunto de Otorrinolaringologia da UFF

VMestrando em Neurologia pela UFF

Endereço para correspondência Endereço para correspondência Dr. Jano Alves de Souza Rua Otávio Carneiro 143/609 24230-190 Niterói RJ - Brasil E-mail: janoasouza@terra.com.br

RESUMO

OBJETIVO: Verificar se a idade é um fator de risco para cefaléias secundárias independente do tempo de evolução da queixa de dor de cabeça.

MÉTODO: Foram selecionados 1131 pacientes com queixa principal de cefaléia. A proporção de cefaléias secundárias foi avaliada e comparada entre pacientes jovens e idosos em geral; entre indivíduos com cefaléia de início antes e após os 60 anos; e entre jovens e idosos com cefaléia de início há menos de um ano.

RESULTADOS: Os idosos em geral e os indivíduos com cefaléia de início após os 60 anos apresentaram maior proporção de cefaléias secundárias que os jovens e aqueles com início da dor antes dos 60 anos. Idosos com cefaléia de início recente apresentaram proporção maior de cefaléias secundárias do que os jovens com mesmo tempo de evolução da dor.

CONCLUSÃO: A idade é um fator de risco independente do tempo de evolução para cefaléias secundárias.

Palavras-chave: cefaléia, adulto, idoso.

ABSTRACT

OBJECTIVE: To verify if the age is a risk factor for secondary headaches, regardless the time interval since the onset of the headache complaint.

METHOD: 1131 patients were selected, with the main complaint of headache. The ratio of secondary headaches was evaluated and compared between young and elderly patients in general; between individuals with headache starting before and after 60 years of age; and between young and elderly subjects with headache having started for less than one year.

RESULTS: Elderly patients in general and individuals with headache having started after 60 years of age presented a higher ratio of secondary headaches than the young subjects and the ones whose pain started before 60 years of age. Elderly subjects with headache of recent start presented a higher ratio of secondary headaches than young individuals with the same time of pain evolution.

CONCLUSION: Age is an independent risk factor for secondary headaches, regardless the time interval since the onset of the complaint.

Key words: headache, adult, aged.

Os estudos demográficos revelam redução das taxas de natalidade e de mortalidade e aumento da expectativa de vida no Brasil, nas últimas décadas. Como conseqüência disso a população brasileira está envelhecendo1-4. Os idosos constituem, na atualidade, importante parcela de todos os atendimentos médicos no Brasil5 e isso tem implicações na prática clínica6. Necessário, portanto, conhecer as peculiaridades das manifestações das doenças nesse grupo etário. Ao contrário do que acontece com a maioria das queixas, a incidência e a prevalência da cefaléia diminuem com o envelhecimento; mesmo assim, cerca de 6,5% dos homens e 13,9% das mulheres com mais de 65 anos referem esse sintoma de forma recorrente7.

Verificamos na prática profissional que a proporção de cefaléias secundárias em geral e de cefaléias secundárias a causas potencialmente graves aumenta com o envelhecimento, o que tem sido relatado por diversos autores com base na experiência clínica8-11. Apesar disso, poucos estudos foram realizados, até hoje, com o objetivo de estabelecer a freqüência relativa das diversas formas de cefaléia entre os idosos. Serratrice, Serbanesco e Sambuc12 selecionaram pacientes idosos internados num hospital por doenças clínicas e cirúrgicas e os avaliaram quanto à ocorrência de cefaléia e as circunstâncias de sua manifestação. Esse estudo foi realizado antes da publicação da Classificação e Critérios Diagnósticos da Sociedade Internacional de Cefaléia (International Headache Society - IHS) de 198813 e a pesquisa foi feita com o auxílio de um questionário auto-aplicável, tendo havido grande número de formulários desprezados por problemas de preenchimento. Solomon, Kunkel e Frame14 analisaram os registros informatizados de um ano de atendimento na Cleveland Clinic Foundation (EUA) e selecionaram os pacientes com diagnóstico de cefaléia ou de arterite de células gigantes, a fim de comparar a freqüência das diversas formas de cefaléia em idosos e jovens. A pesquisa foi realizada numa época em que os critérios da IHS13 ainda não eram amplamente utilizados e os prontuários foram preenchidos por não especialistas, reduzindo a precisão do diagnóstico. Além disso, em cerca de 26% dos registros de pacientes com cefaléia o diagnóstico não foi mencionado. Pascual e Berciano15 analisaram retrospectivamente os prontuários de 15 anos de pacientes que procuraram um serviço neurológico com queixa principal de cefaléia e compararam aqueles em que a dor havia iniciado após os 65 anos com todos os demais atendidos pelo mesmo motivo e identificaram uma proporção maior de cefaléias secundárias e secundárias a causas graves nos pacientes cuja queixa de cefaléia se iniciou após os 65 anos. Nesse trabalho, um número não relatado de prontuários foi desprezado pela impossibilidade de fornecer o diagnóstico. Além disso, os autores não levaram em consideração o tempo de existência da queixa ao comparar os dois grupos, o que pode ter sobrecarregado o conjunto em que a cefaléia se iniciou após os 65 anos de dores de instalação recente e, portanto, de cefaléias secundárias e com causas graves. Até o momento, nenhuma pesquisa foi realizada prospectivamente e utilizando critérios diagnósticos universalmente aceitos para as diversas formas de cefaléia, o que nos motivou a fazer o presente estudo.

Nosso objetivo neste estudo foi verificar se a idade é um fator de risco independente do tempo de evolução da queixa de dor de cabeça para o diagnóstico de cefaléias secundárias e cefaléias secundárias a causas potencialmente graves.

MÉTODO

Foram selecionados prospectivamente 1131 pacientes consecutivos atendidos numa clínica neurológica privada, no período de 01 de janeiro de 1997 a 31 de dezembro de 2001, de conformidade com os seguintes critérios:

Critérios de inclusão: 1) Idade mínima de 18 anos; 2) Ter procurado o serviço pela primeira vez no período de seleção; 3) Ter procurado o serviço com queixa principal de cefaléia ou apresentando aura de migrânea sem cefaléia, com qualquer tempo de duração.

Critérios de exclusão: 1) Abandono do seguimento pelo paciente antes do estabelecimento do diagnóstico; 2) Demência, atestada por pontuação menor que 24 no Mini Exame do Estado Mental16.

Os pacientes foram entrevistados pessoalmente pelos autores com o auxílio de um questionário padrão o qual permite que, numa primeira fase, o paciente se expresse livremente sobre a cefaléia e, posteriormente, informe de forma dirigida os dados relevantes para o diagnóstico não referidos ou incompletamente relatados na fase inicial.

Todos os pacientes foram submetidos a exame neurológico padrão e a avaliação das funções cognitivas através do Mini Exame do Estado Mental16.

Exames complementares como hemograma, tomografia computadorizada (TC) do crânio, ressonância magnética (RM) encefálica, exame do líquido cefalorraquiano (LCR), biópsia da artéria temporal, entre outros, foram solicitados, de acordo com a necessidade, nas seguintes situações: 1) nas cefaléias de início recente (ocorrendo há menos de um ano); 2) nas cefaléias que sofreram modificações recentemente (menos de um ano); 3) quando identificados sintomas ou sinais sugestivos de cefaléia secundária; 4) nas cefaléias inclassificáveis ou; 5) naquelas com características atípicas.

Durante todo o acompanhamento, os pacientes receberam ao final de cada consulta um Diário da Cefaléia. Ao retornar para cada entrevista subseqüente, os diários foram analisados pelo autor em conjunto com o paciente.

O diagnóstico da modalidade de cefaléia foi obtido de cada paciente com base na anamnese, exame físico geral e neurológico, exames complementares e análise dos diários da cefaléia, sendo permitido mais de um diagnóstico para um mesmo indivíduo. Os critérios diagnósticos utilizados foram, em sua maioria, os da IHS de 198813. Para o diagnóstico de formas de cefaléia não incluídas nessa classificação, foram utilizados os seguintes critérios: 1) Cefaléia crônica diária - Critérios de Silberstein et al17; 2) Cefaléia hípnica - Critérios expostos por Lance e Goadsby18; 3) Cefaléia cervicogênica - Critérios de Sjaastad, Fredriksen e Pfaffenrath19.

Para a análise dos resultados, os 1131 pacientes selecionados foram divididos como descrito a seguir. 1) De acordo com a idade, em dois grupos: jovens (18 a 59 anos; n=892) e idosos (60 anos ou mais; n=239); 2) De acordo com a época do início da queixa de cefaléia, em: cefaléia de início antes dos 60 anos (n=983) e após os 60 anos (n=148); 3) De acordo com o tempo decorrido desde o início da queixa de cefaléia, os pacientes jovens e idosos foram divididos, ainda, em: mais do que um ano e menos do que um ano. A proporção de pacientes com cefaléias secundárias e cefaléias secundárias a causas potencialmente graves foi verificada em cada grupo e os resultados comparados.

A análise estatística foi realizada pelo teste do qui quadrado ou pelo teste exato de Fisher, para comparação de proporções entre grupos. O nível de significância adotado foi 5%. Nas associações significativas foram fornecidos pelo programa a razão de chance (RC) e seu respectivo intervalo de confiança de 95% (IC 95%).

RESULTADOS

Os 1131 pacientes que preencheram os critérios adotados para a presente pesquisa compunham-se de 83% (n=934) de mulheres e 17% (n=197) de homens e corresponderam a 41,3% de todos os atendimentos realizados na clínica no período de seleção. A razão entre os sexos feminino e masculino na amostra foi 4,7:1. Trinta e cinco pacientes com queixa principal de cefaléia não foram incluídos na pesquisa pelo abandono do seguimento antes que um diagnóstico fosse possível e nove outros por apresentarem demência por causas não relacionadas com a cefaléia.

Subdividindo o total de pacientes com cefaléia selecionados (N = 1131) de acordo com a faixa etária, verificamos que 79% (n=892) correspondiam ao grupo dos jovens (18 a 59 anos) e 21% (n=239) ao grupo dos idosos (60 anos ou mais). A média de idade 39,7 anos entre os jovens e 69,7 anos entre os idosos. As mulheres corresponderam a 82% (n=734) dos jovens e a 84% (n = 200) dos idosos. A razão entre os sexos feminino e masculino foi 4,6:1 no grupo dos jovens e 5,1:1 entre os idosos.

Os diagnósticos obtidos em cada um dos dois grupos etários estudados (jovens e idosos) encontram-se expostos nas Tabelas 1 e 2.

As cefaléias primárias (grupos 1 a 4 da Classificação da SIC de 1988) 6 revelaram-se as formas mais freqüentes em ambos os grupos etários estudados, sendo o diagnóstico de 93,4% dos jovens e 72,4% dos idosos.

Sessenta e seis (27,6%) pacientes do grupo dos idosos (n=239) e 59 (6,6%) do grupo dos jovens (n=892) foram diagnosticados com alguma modalidade de cefaléia secundária (grupos 5 a 12 da Classificação da SIC de 1988)6. Essa diferença foi estatisticamente significativa (p < 0,0001; RC = 5,49; IC 95% 3,6-8,2), revelando que os idosos na nossa amostra apresentaram uma proporção maior de cefaléias secundárias do que os jovens.

A cefaléia cervicogênica foi a modalidade secundária mais freqüente nos dois grupos etários, porém, os idosos manifestaram cefaléia cervicogênica numa proporção significativamente maior do que os jovens (p < 0,0001; RC = 4,19; IC 95% 1,9-8,8). As demais formas de cefaléias secundárias foram representadas por número muito pequeno de pacientes para permitir análises estatísticas.

Vinte idosos (8,4%) e seis jovens (0,7%) receberam diagnósticos de cefaléias secundárias a causas potencialmente graves, a saber: trombose de seio venoso; hematoma subdural crônico (HSC); hemorragia subaracnoídea (HSA); hipertensão arterial sistêmica (HAS) grave; arterite de células gigantes (ACG) e neoplasias intracranianas. Os idosos revelaram cefaléias secundárias graves numa proporção significativamente maior do que os mais jovens (p < 0,0001; RC = 13,5; IC 95% 5,0-37,9). Mesmo quando eliminados da amostra os pacientes com migrânea, que, sabidamente, predomina em jovens, os idosos (n=185) continuaram a apresentar maior proporção de cefaléias graves do que os mais jovens (n=402) (p < 0,0001; RC = 8,00; IC 95% 2,9-22,6).

Dividindo-se o total da amostra (N=1131) de acordo com a época do início da cefaléia, verificamos que em 148 (13%) a dor havia iniciado após os 60 anos e em 983 (87%) a queixa precedia essa idade (por serem jovens, ou idosos com dor de cabeça remontando há vários anos). Os diagnósticos obtidos em cada um desses grupos encontram-se expostos nas Tabelas 3 e 4.

Entre os pacientes com o início da queixa após os 60 anos, as cefaléias primárias corresponderam a 59% (n=87), predominando sobre as secundárias. Entre os pacientes com cefaléia iniciada antes dos 60 anos as formas primárias totalizaram 93,5% (n = 919). A diferença entre os dois grupos não foi significativa.

As cefaléias secundárias corresponderam a 41% (n = 61) dos pacientes com cefaléia de início após os 60 anos e a apenas 6,5% (n = 64) dos pacientes com início antes dos 60 anos. Essa diferença foi estatisticamente significativa (p < 0,0001; RC = 10,07; IC 95% 6,5-15,5). Mesmo eliminando-se da amostra os pacientes com migrânea a diferença permaneceu significativa (p < 0,0001; RC = 6,92; IC 95% 4,4-10,8). A cefaléia cervicogênica foi a forma secundária mais comumente diagnosticada no grupo de início após os 60 anos (n=16; 11%). A análise estatística demonstrou ser essa modalidade mais freqüente nos pacientes com cefaléia de início após os 60 anos do que nos demais (p < 0,0001; RC = 3,60; IC 95% 1,8-7,0).

Cerca de 13,5% (n=20) dos pacientes com queixa iniciada após os 60 anos apresentaram cefaléias secundárias a causas graves contra apenas 0,6% dos pacientes com cefaléia de início antes dos 60 anos.

Dos pacientes com cefaléia iniciada após os 60 anos (n=148), 89 (60%) apresentavam cefaléia há menos de um ano e 59 (40%) manifestavam essa queixa há mais de um ano. Cefaléias secundárias foram diagnosticadas em 53% (n=49) daqueles com cefaléia iniciada há menos de uma ano e em 24% (n=14) daqueles com cefaléia há mais de um ano. Essa diferença foi estatisticamente significativa (p < 0,0002; RC = 3,94; IC 95% 1,8-8,7), demonstrando que entre os idosos, a duração da queixa de dor menor do que um ano está relacionada com uma incidência maior de cefaléias secundárias.

Entre os pacientes jovens, 214 (22%) apresentavam queixa de cefaléia há menos de um ano; desses, 21% (n=45) manifestavam cefaléias secundárias. A diferença na proporção de cefaléias secundárias entre os grupos de idosos com cefaléia de início há menos de um ano e jovens com cefaléia com a mesma duração foi significativa (p < 0,0001; RC = 4,60; IC 95% 2,6-8,1). Isso demonstra que a idade é um fator de risco para cefaléias secundárias independente do tempo de evolução da queixa.

Vinte pacientes (22%) do grupo de idosos com cefaléia de início há menos de um ano e apenas seis (2,8%) do grupo de jovens com cefaléia com a mesma duração foram diagnosticados como sofredores de cefaléia secundária a causas potencialmente graves. Essa diferença atingiu significância estatística (p < 0,0001; RC = 10,0; IC 95% 3,6-29,2).

Os diagnósticos encontrados nos pacientes idosos e jovens com cefaléia de início há menos de um ano encontram-se expostos na Tabela 5. A análise dos idosos com cefaléia de início há menos de um ano (n=89) revelou o início da dor dentro de um a 30 dias antes da consulta em 22 (25%) pacientes; de 31 dias a 90 dias em 25 (28%), de 91 a 180 dias em 19 (21%) e de 6 meses a um ano em 24 (27%).

Cefaléias secundárias foram diagnosticadas com a seguinte freqüência nesses grupos: 1 a 30 dias (n=18; 82%); 31 a 90 dias (n=15; 60%); 91 a 180 dias (n=12; 63%); seis meses a um ano (n=6 ; 25%). Causas de cefaléia potencialmente graves foram identificadas em oito pacientes (36%) do grupo de 1 a 30 dias; oito do grupo de 31 a 90 dias (32%); quatro do grupo de 91 a 180 meses (21%) e em nenhum do grupo de seis meses a um ano.

DISCUSSÃO

A divisão em jovens e idosos é sempre arbitrária. Em nossa pesquisa, consideramos idosos os indivíduos com 60 anos ou mais, acompanhando o critério de Kalache, Veras e Ramos1. Outros estudos foram realizados com o objetivo de identificar as modalidades de cefaléia mais freqüentes nos idosos12,14,15. Nenhum deles, no entanto reuniu as características de ser prospectivo, utilizar critérios diagnósticos amplamente aceitos, os pacientes serem atendidos pessoalmente por especialista; e considerar o tempo de evolução da cefaléia. Dessa forma, o presente trabalho pode ser considerado inédito.

Utilizamos a Classificação e os Critérios Diagnósticos da IHS de 198813, uma vez que a análise dos nossos resultados precedeu a divulgação da nova classificação, em setembro de 2003. Isso não configura um problema já que o objetivo foi tão somente o de comparar a proporção de cefaléias secundárias em subgrupos de jovens e idosos.

Em nossa casuística, os idosos corresponderam a 21% do total de pacientes com cefaléia, o que contrasta com os achados de Solomon, Kunkel e Frame14 que encontraram apenas quatro por cento desse grupo etário em sua amostra.

Treze por cento dos nossos pacientes apresentaram início da cefaléia após os 60 anos, contrariando Pascual e Berciano15 que encontraram apenas 5,4% de pacientes cujo início da dor se deu após os 65 anos.

Nossos achados sugerem que os idosos em geral apresentam proporção significativamente maior de cefaléias secundárias e cefaléias secundárias a causas graves do que os jovens (p < 0,0001), confirmando o que é dito por diversos autores com base na experiência prática8-11.

Os pacientes com cefaléia de inicio após os 60 anos da nossa casuística apresentaram proporção de cefaléias secundárias significativamente maior (p < 0,0001) do que o grupo com queixa de dor iniciada antes dessa idade (respectivamente 41% e 6,5%). Esses resultados coincidem com os de Pascual e Berciano15 que encontraram valores ainda maiores de cefaléias secundárias (52%) entre indivíduos com início da queixa após os 65 anos. As cefaléias por causas potencialmente graves foram, igualmente, identificadas numa proporção maior de indivíduos cuja dor teve início após os 60 anos (13,5%) do que naqueles em que a queixa se iniciou antes dessa idade (0,7%), em nosso trabalho, o que, também, está de acordo com os resultados de Pascual e Berciano15.

Em nossa amostra, 53% dos idosos com cefaléia há menos de um ano apresentavam alguma modalidade secundária, contra apenas 24% daqueles idosos com queixa há mais de um ano. Essa diferença revelou-se significativa (p < 0,0002), confirmando que o menor tempo decorrido desde o início da queixa é um fator de risco para cefaléias secundárias entre os idosos.

Dentre os jovens da nossa amostra, 22% referiram cefaléia há menos de um ano, dos quais 21% apresentavam cefaléias secundárias. A diferença na proporção de cefaléias secundárias entre os grupos de idosos e jovens com cefaléia há menos de um ano foi significativa (p < 0,0001) demonstrando que os idosos com cefaléia de início recente apresentam mais cefaléias secundárias que os jovens com o mesmo tempo de início da queixa e que a idade é um fator de risco para o diagnóstico de cefaléias secundárias independente do curto espaço de tempo desde o início da queixa. O mesmo pode ser dito com relação às cefaléias secundárias a causas graves que, em nossa casuística revelou-se significativamente mais freqüente (p < 0,0001) entre os idosos com início da queixa há menos de um ano do que entre os jovens com o mesmo tempo de sintomatologia (22% versus 2,8%).

CONCLUSÕES

1) Os idosos em geral apresentam maior proporção de cefaléias secundárias e cefaléias secundárias a causas potencialmente graves do que os jovens. 2) Os pacientes com cefaléia de início tardio (após os 60 anos) apresentam maior proporção de cefaléias secundárias e cefaléias secundárias a causas potencialmente graves do que aqueles cuja dor teve início antes dos 60 anos. 3) Pacientes idosos com cefaléia de início recente (há menos de um ano) apresentam maior proporção de cefaléias secundárias e cefaléias secundárias a causas potencialmente graves do que os jovens com cefaléia de início dentro de igual tempo. 4) A idade é um fator de risco para o surgimento de cefaléias secundárias e cefaléias secundárias a causas graves independente do tempo de evolução da dor de cabeça.

Recebido 5 Fevereiro 2004, recebido na forma final 4 Junho 2004. Aceito 22 Julho 2004.

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  • Endereço para correspondência

    Dr. Jano Alves de Souza
    Rua Otávio Carneiro 143/609
    24230-190
    Niterói RJ - Brasil
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      25 Abr 2006
    • Data do Fascículo
      Dez 2004

    Histórico

    • Aceito
      22 Jul 2004
    • Revisado
      04 Jun 2004
    • Recebido
      05 Fev 2004
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