Resumos
Este artigo testa duas versões do modelo de passeio aleatório para os preços de carteiras de ações no mercado brasileiro. Evidências contrárias a tal modelo foram observadas nos horizontes diário e semanal, caracterizados por persistência. As evidências foram mais fracas em períodos mais recentes. Foram também encontradas sazonalidades diárias, incluindo o efeito segunda-feira, e mensais. Adicionalmente, foi observado um padrão de assimetria de autocorrelações cruzadas de primeira ordem entre os retornos de carteiras de firmas agrupadas segundo seu tamanho, indicando, no caso de retornos diários e semanais, que retornos de firmas grandes ajudam a prever retornos de firmas pequenas. Evidências de não-linearidades nos retornos foram observadas em diversos horizontes de tempo.
passeio aleatório; eficiência; sazonalidade; não linearidade; anomalia
This paper tests two versions of the random walk model for portfolios of Brazilian stocks. It found evidence of persistency in daily and weekly returns, rejecting the random walk models. Those evidences were weaker in recent periods. The paper also found a Monday effect, and other seasonality effects for monthly returns. Additionally there were asymmetric first-order cross-correlations on portfolios ranked by size, with large firm returns predicting small firm returns. Nonlinearities in returns were also detected at several time horizons.
A aleatoriedade do passeio na Bovespa: testando a eficiência do mercado acionário brasileiro* * Os autores agradecem os comentários do editor e pareceristas. ** O autor agradece o apoio do Pronex e do CNPq. *** O autor agradece o apoio do CNPq.
Ricardo TorresI; Marco BonomoII, ** * Os autores agradecem os comentários do editor e pareceristas. ** O autor agradece o apoio do Pronex e do CNPq. *** O autor agradece o apoio do CNPq. ; Cristiano FernandesIII, *** * Os autores agradecem os comentários do editor e pareceristas. ** O autor agradece o apoio do Pronex e do CNPq. *** O autor agradece o apoio do CNPq.
IMestre em economia pela PUC-Rio e consultor
IIEPGE/FGV
IIIDepartamento de Engenharia Elétrica, PUC-Rio
Sumário: 1. Introdução; 2. Dados; 3. Testes e resultados para retornos de curto prazo; 4. Retornos de médio a longo prazo; 5. Conclusão.
Este artigo testa duas versões do modelo de passeio aleatório para os preços de carteiras de ações no mercado brasileiro. Evidências contrárias a tal modelo foram observadas nos horizontes diário e semanal, caracterizados por persistência. As evidências foram mais fracas em períodos mais recentes. Foram também encontradas sazonalidades diárias, incluindo o efeito segunda-feira, e mensais. Adicionalmente, foi observado um padrão de assimetria de autocorrelações cruzadas de primeira ordem entre os retornos de carteiras de firmas agrupadas segundo seu tamanho, indicando, no caso de retornos diários e semanais, que retornos de firmas grandes ajudam a prever retornos de firmas pequenas. Evidências de não-linearidades nos retornos foram observadas em diversos horizontes de tempo.
Palavras-chave: passeio aleatório; eficiência; sazonalidade; não linearidade; anomalia.
Códigos JEL: C12; C22 e G14.
ABSTRACT
This paper tests two versions of the random walk model for portfolios of Brazilian stocks. It found evidence of persistency in daily and weekly returns, rejecting the random walk models. Those evidences were weaker in recent periods. The paper also found a Monday effect, and other seasonality effects for monthly returns. Additionally there were asymmetric first-order cross-correlations on portfolios ranked by size, with large firm returns predicting small firm returns. Nonlinearities in returns were also detected at several time horizons.
1. Introdução
Uma das principais discussões na área de finanças refere-se à hipótese da eficiência do mercado de capitais. De acordo com esta hipótese, o sistema de preços deve refletir todo o conjunto de informação disponível aos seus agentes. Na taxonomia proposta por Fama (1970), um mercado será dito eficiente na forma fraca quando for impossível obter retornos anormais para qualquer ativo do mercado utilizando-se informações acerca de seus retornos passados. Se o nível de retorno considerado normal for constante, esta definição implicará em um passeio aleatório para o (log do) preço de um ativo.
Observe que uma possível confirmação do modelo do passeio aleatório implicaria que as complexas técnicas de análise gráfica e os modelos econométricos de previsão univariada de preços de ativos consistiriam em esforço inútil na busca de lucros extraordinários. De fato, estas implicações não são exclusivas do modelo de passeio aleatório, mas são consequências da eficiência da forma fraca do mercado. Em qualquer mercado eficiente da forma fraca, qualquer estratégia de trading baseada em informações passadas não geraria lucros extraordinários, uma vez que o preço de todos os ativos refletiriam as informações disponíveis no mercado.
Uma boa quantidade de trabalhos empíricos norte-americanos voltou-se à questão dos testes do modelo de passeio aleatório. Embora os testes iniciais não fossem capazes de rejeitar tal hipótese, testes univariados mais potentes desenvolvidos posteriormente que analisam retornos em diversos horizontes de tempo, apontaram no sentido da rejeição do modelo, com evidências de persistência nos retornos de curto prazo, e de reversão à média nos horizontes de longo prazo.1 1 Lo e Mackinlay (1988) e Conrad e Kaul (1988) encontram evidências de persistência nos retornos semanais. Fama e French (1988) encontram reversão à média da ordem de -32%, -36% e -34% em retornos de três, quatro e cinco anos respectivamente, com dados norte-americanos no período de 1926-85. Seus resultados são confirmados por Poterba e Summers (1988). As evidências dos últimos são questionadas por alguns autores. Tais evidências apontavam no sentido de que os mercados não seriam eficientes na forma fraca, conforme a taxonomia de eficiência de Fama.2 2 Summers (1988) argumenta que, embora os testes iniciais não rejeitassem a hipótese do passeio aleatório, tal fato não deveria ser tomado como evidência a favor da hipótese de eficiência do mercado. O autor apresenta um modelo no qual o mercado é fortemente ineficiente, de forma que os preços de ativos mantenham-se persistentemente distintos de seus valores fundamentais em horizontes de longo prazo, mas cujos desvios não sejam captados nos testes tradicionais.
Se, a partir do trabalho de Fama (1970), o modelo de passeio aleatório passou a ser amplamente considerado como sinônimo de eficiência, a elaboração de modelos de equilíbrio com retornos esperados variantes ao longo do tempo representou uma grande mudança no pensamento acadêmico sobre a questão. O modelo de Lucas (1978) compatibiliza a possibilidade de previsibilidade intertemporal dos retornos com a existência de um mercado eficiente, em um contexto de expectativas racionais. A intuição básica do modelo é a de que o retorno de um ativo depende de sua covariância com estado de consumo agregado, o qual, variando intertemporalmente, é capaz de gerar autocorrelações não nulas nos retornos esperados e, como consequência, nos retornos realizados. O artigo de Fama e French (1988) levanta a possibilidade teórica de reversão à média nos retornos de longo prazo. Cechetti, Lam e Mark (1990) vão além ao reproduzirem a autocorrelação negativa dos retornos de longo prazo das ações norte-americanas com um modelo eficiente, calibrado para os dados da economia norte-americana.3 3 Bonomo e Garcia (1994) mostram que a especificação do processo de dotação de Cechetti, Lam e Mark é inadequada.
Uma vez que o teste de eficiência de mercado é um teste conjunto, pressupondo um modelo específico de equilíbrio de retornos, sua rejeição gera uma dicotomia, abrindo espaço para duas possíveis interpretações: a primeira é a de que o mercado realmente não é eficiente e o modelo de equilíbrio é correto, e a segunda é a de que o mercado é eficiente e o modelo de equilíbrio de retornos é mal-especificado. Para ambas as interpretações o conhecimento dos fatos estilizados relativos à previsibilidade de retornos é de extrema relevância para o desenvolvimento da investigação acadêmica.
Este artigo objetiva contribuir para a caracterização dos fatos estilizados de retornos do mercado de ações brasileiro. Na caracterização da distribuição dos retornos em log, são aplicados os testes de Jarque Bera e regressão dos quantis superiores nos quantis inferiores, bem como avaliado o índice de cauda. Na avaliação da hipótese de passeio aleatório são empregados testes de razão de variância e de autocorrelação. Matrizes de autocorrelações cruzadas e sua assimetria são investigadas em portfólios de firmas agrupadas por tamanho. Investigamos a existência de sazonalidade determinista nos retornos através de regressões com variáveis dummy. Finalmente, empregamos os testes de McLeod-Li (1983) e Hsieh (1989) para avaliar possíveis não-linearidades nos dois primeiros momentos dos retornos. Os testes são feitos com retornos de diversos horizontes de tempo.
Entre os resultados encontrados destaca-se uma previsibilidade de retornos diários e semanais com alta significância estatística e caracterizada pela persistência. Sazonalidades típicas, como o efeito segunda-feira, e atípicas foram observadas em retornos diários e mensais. Adicionalmente, foi encontrado um padrão de assimetria de autocorrelações cruzadas de primeira ordem entre os retornos de carteiras de firmas agrupadas segundo seu tamanho, indicando, no caso de retornos diários e semanais, que retornos de firmas grandes ajudam a prever retornos de firmas pequenas. Evidências de não-linearidades nos retornos foram encontradas em diversos horizontes de tempo.
Alguns estudos brasileiros levantam evidências de previsibilidade de retornos. Brito e Manazes (1981) realizaram testes de autocorrelação serial com dados diários de ações no período de 1973 a 1980. Os autores encontraram predominância de reversão à média nos retornos de ações nos testes realizados aos níveis de 1% e 5% em uma fração significativa das ações testadas. Cabe observar que a reversão à média encontrada neste caso pode ser fruto de um problema de liquidez, pois a amostra do estudo considerou relevante qualquer ação que possuísse ao menos 45 observações de retorno (30 pares de observações para as autocorrelações de 15a ordem).
Correa e Pereira (1997) discutiram a previsibilidade e não-linearidade do Ibovespa. O teste de McLeod-Li (1983) apresentou indícios de não-linearidade nos retornos diários e o teste de Hsieh (1989) rejeitou a hipótese de linearidade na média. Adicionalmente, os autores verificaram um ganho de previsibilidade na consideração do efeito do dia da semana, em função da tendência de os retornos serem ligeiramente menores na segunda-feira, tal qual observado nos estudos norte-americanos. Finalmente, os autores verificaram que modelos não-lineares como o GARCH (1,1) ou o TAR (threshold autoregression) geraram melhores previsões de retornos em relação a modelos lineares.
Lemgruger, Becker e Chaves (2000) investigaram a sazonalidade de dias da semana utilizando dados de 1983 a 1987, tendo observado que o retorno de segunda-feira é significativamente menor do que o de quarta, quinta e sexta-feiras, mas não é significativamente diferente do de terça-feira.4 4 Eles também testam e rejeitam a hipótese de que o retornos médio por dia de calendário é constante.
O restante do artigo está organizado como segue. Na seção 2 são descritos os procedimentos metodológicos relativos à seleção da amostra. Na seção 3 são apresentados os testes propostos, seguidos de seus resultados para retornos de curto prazo (diários e semanais).5 5 Para uma explicação mais detalhada sobre os testes empregados, o leitor deve consultar Torres, Bonomo & Fernandes (2000). Esta referência faz parte dos Ensaios Econômicos da EPGE, que estão disponíveis para consulta pela Internet no endereço www.fgv.br/epge/home/publi/ensaios. Na seção 4 são apresentados os resultados para retornos de médio a longo prazo (a partir de um mês). A seção 5 conclui o artigo.
2. Dados
Na realização dos testes previstos neste artigo, foram utilizadas tanto ações agrupadas em carteiras, quanto ações individuais. As séries de preços diários das ações estendem-se de 4 de março de 1986 a 15 de abril de 1998, tendo sido obtidas com a Economática. O índice Ibovespa também foi utilizado no artigo pela maior extensão de sua série, permitindo a análise a partir do horizonte mensal desde 1970. A participação de cada ação neste índice tem relação direta com a sua representatividade no mercado a vista, calculada com base em um índice de negociabilidade. As séries de preços de ações são corrigidas para proventos.
2.1 Carteiras agregadas
Dois métodos distintos de cálculo de carteiras agregadas foram adotados em face da constatação da literatura norte-americana de que a evidência quanto à previsibilidade é sensível à sua metodologia de especificação. O primeiro destes métodos estabelece uma ponderação igual às ações das empresas que compõem a carteira. O segundo método estabelece uma ponderação de cada ação proporcional ao valor da empresa na carteira de mercado. A ponderação em cada ano foi determinada com base no valor de mercado da empresa ao final do respectivo ano. As carteiras serão chamadas de EW e VW deste ponto em diante, conforme sua metodologia de cálculo obedeça ao primeiro ou ao segundo método, respectivamente.
A seleção das ações que fazem parte das carteiras EW e VW ocorreu da seguinte maneira: o sistema da Economática no início de 1998 possuía dados de 377 ações; destas, foram selecionadas 91 ações com séries de preços desde março de 1986; havendo duas classes de ações para a mesma empresa, como ordinárias e preferenciais, optou-se pela classe mais líquida; adicionalmente, foram eliminadas as ações com probabilidade diária de não transacionar superior a 35%; assim foi montada a carteira EW, com 66 ações. Devido à falta de dados sobre a quantidade de ações emitidas por quatro destas empresas, as mesmas foram excluídas da carteira VW, que ficou com 62 ações.6 6 A lista de ações que compõem as respectivas carteiras, as ponderações das ações na carteira VW, a quantidade total de ações por proporção de dias não transacionados, e a proporção de dias não transacionados de cada ativo podem ser encontrados no apêndice de Torres, Bonomo & Fernandes (2000).
2.2 Carteiras agrupadas por tamanho da firma
A evidência norte-americana de que a previsibilidade do retorno de uma carteira varia conforme o tamanho de suas firmas motivou a montagem de carteiras com firmas de tamanhos distintos. As 62 ações da carteira VW foram ordenadas por tamanho, sendo agrupadas a cada ano em quintis. Cinco carteiras com igual ponderação foram então formadas com base em cada quintil: Port1, com 13 firmas; Port2, Port3 e Port4, com 12 firmas cada, e Port5, com 13 firmas, em ordem crescente de tamanho.
2.3 Retornos reais
Na análise dos retornos reais o deflator adotado foi o índice geral de preços - disponibilidade interna (IGP-DI) da Fundação Getúlio Vargas, o que se estende pelo período integral da amostra. Tal índice possui período de coleta do primeiro ao último dia do mês. Assim, sua taxa reflete aproximadamente a inflação mensal centrada no meio do mês. Conseqüentemente, a taxa de inflação mensal centrada no final do mês foi calculada como a média geométrica da taxa do índice do próprio mês e do mês seguinte. As taxas de inflação em horizontes de tempo superiores ao mensal foram calculadas através da composição das taxas de inflação mensais centradas.7 7 Uma vez que a série do índice é de periodicidade mensal e uma medida de inflação diária é necessária para o cálculo de retornos reais diários e semanais, utilizamos o seguinte algoritmo de construção de taxas de inflação diárias: para cada mês, calculamos a taxa diária equivalente à inflação do mês, utilizando para isto o número de dias úteis do mês; atribuimos esta taxa a um dia central, onde a posição do centro varia conforme o número de dias úteis; assim, determinamos a taxa de inflação média diária relativa ao centro do mês, para cada mês; calculamos as taxas de inflação diária dos dias localizados entre os centros de cada mês como uma média geométrica ponderada com base na distância do dia aos respectivos centros; avaliamos tal distância com base no número de dias úteis existentes entre os centros; calculamos a taxa de inflação semanal através da composição das taxas de inflação diária.
Para os testes propostos foram geradas séries de retornos em três freqüências, acumulados posteriormente em diversos multiperíodos. Foram considerados retornos de curto prazo aqueles relativos às freqüências diária8 8 Com exceção do caso da análise de sazonalidades diárias, foram eliminados todos os dias não-úteis da série de preços (sábados, domingos e feriados). Toda vez que a ação não tenha sido negociada no dia t, seu último preço de fechamento foi repetido, de modo que a mesma tenha apresentado retorno nominal 0 neste dia. Uma vez tendo sido calculados os fatores de retorno nominal de todas as ações, foram formadas as séries de retornos das carteiras citadas anteriormente. e semanal9 9 Os fatores de retorno semanal das carteiras foram calculados conforme o procedimento de Campbell, Lo e MacKinlay (1997).Uma série que acumula as taxas de retorno diárias para cada carteira foi inicialmente formada. A partir dela construiu-se um índice com observações semanais.As observações semanais foram calculadas com base na terça-feira de uma semana à terça-feira da semana seguinte.Sempre que a terça-feira fosse feriado, utilizou-se o valor da série acumulada na quarta-feira.Caso esta também tivesse sido feriado, utilizou-se o valor da série acumulada na segunda-feira.Se segunda, terça, e quarta-feiras fossem todas feriados, então desconsiderou-se esta observação semanal. Os fatores de retorno semanal foram então calculados como a razão entre as observações da semana corrente e da semana anterior.Este mesmo procedimento foi adotado para a determinação das séries dos deflatores semanais. A análise em multiperíodos das razões de variância estendeu-se até a 16aordem neste caso. Os retornos de médio a longo prazo são gerados na freqüência mensal,10 10 Os fatores de retorno mensal foram calculados a partir das séries que acumulam os fatores de retorno diários para cada carteira.O fator de retorno mensal de uma carteira é dado pela razão entre as observações da série de fator de retorno diário acumulado relativa ao último dia útil do mês corrente e ao último dia útil do mês anterior. e acumulados em multiperíodos até o intervalo de 96 meses. Os testes nos intervalos mais longos têm sua potência comprometida em função do tamanho reduzido da amostra de apenas 28 observações anuais não sobrepostas no período integral.11 11 O ganho de potência gerado pelo uso de observações sobrepostas é discutido em Richardson & Smith (1991). As séries de retorno são construídas tomando-se o logaritmo natural ao retorno bruto.
A tabela 1 apresenta as características do comportamento dos retornos reais em nível das carteiras Ibovespa, EW e VW, e a variação do índice IGP-DI.
A análise da tabela permite observar que as rentabilidades das carteiras consideradas são bastante diferenciadas. Em primeiro lugar, o universo de ações contempladas pelas carteiras EW e VW é distinto daquele contemplado pelo índice Ibovespa. Conforme mencionado, os dois primeiros incorporaram todas as ações da base de dados da Economática que possuíam dados diários no período de 4 de março de 1986 até 15 de abril de 1998 sujeitas à mencionada restrição de liquidez. Uma vez definidas tais ações, estas carteiras mantiveram suas quantidades de ações fixas no período analisado. Como entraram apenas ações de empresas que não faliram durante o período considerado, deve-se esperar que tais carteiras apresentem um viés de sobrevivência. Por este motivo, espera-se que as carteiras construídas tenham retorno superior ao Ibovespa. Este possui um universo de ações móvel, eliminando ações que passem a apresentar baixa negociabilidade. Adicionalmente, os retornos da carteira VW são sensíveis a poucos ativos que possuem alta ponderação na carteira de mercado, tais como Petrobrás PN, Banco do Brasil PN, Vale do Rio doce PN e, no período mais recente, Telesp PN, e tendem a dar peso crescente às ações vencedoras, o que explica o seu maior descolamento.
3. Testes e Resultados para Retornos de Curto Prazo
Por questões metodológicas a apresentação dos resultados será dividida em duas partes: a relativa aos retornos de curto prazo e a relativa aos retornos de médio a longo prazo. Nesta seção apresentamos os testes mencionados na introdução e analisamos os resultados de curto prazo.
O período de análise dos retornos estende-se de 4 de março de 1986 a 15 de abril de 1998, contando com 2974 observações de retornos diários e 610 observações de retorno semanal. Três subperíodos foram também analisados, a fim de se testar a robustez ao período de amostragem. O primeiro destes estende-se de 4 de março de 1986 a 13 de março de 1990, o segundo de 20 de março de 1990 a 29 de julho de 1994, e o último subperíodo de 1 de agosto de 1994 a 15 de abril de 1998. A redução drástica das taxas de inflação e a forte presença de investidores estrangeiros no mercado doméstico são características institucionais mais relevantes do terceiro subperíodo. Exceto quando explicitamente mencionado de outra forma, a análise que se segue refere-se ao período integral.
3.1 Características da distribuição dos retornos
As características da distribuição dos retornos são avaliadas nesta subseção utilizando-se três testes: o teste de Jarque-Bera, a regressão dos quantis e o índice de cauda.
O teste de Jarque-Bera (Jarque & Bera, 1987) é o mais conhecido para a hipótese de normalidade, baseando-se nos coeficientes de assimetria (S) e curtose (K) da distribuição dos retornos. Se a estatística de teste JB > (2), a hipótese nula de normalidade da distribuição dos retornos não é aceita ao nível de significância a.
A regressão dos quantis é um procedimento heurístico que investiga a simetria da distribuição dos retornos, baseando-se na comparação das distância dos quantis Qa e Q1-a em relação à mediana da distribuição. Se a distribuição é simétrica, tais distâncias devem ser iguais. Sejam r(1), r(2),...,r(T) as estatísticas de ordem dos retornos da amostra e m a sua mediana, ui = m - ri e vi = r(Ti+1)-m, onde i = 1,2,...,[T/2], [z] denotando maior inteiro menor ou igual a [z]. Estimamos a regressão v = b1 + b2.u + e. Se a distribuição for simétrica, então não devemos rejeitar as hipóteses b1 = 0 e b2 = 1.
O índice de cauda é uma medida não-paramétrica utilizada para a avaliação tanto da curtose quanto da assimetria da distribuição, baseando-se na comparação das distâncias interquartílicas da distribuição empírica e da distribuição normal. Se a distribuição dos dados for normal, então TL = TR = 1. Se a distribuição for leptocúrtica, possuindo caudas mais pesadas do que a normal, então TL > 1 ou TR > 1. Se a distribuição for simétrica, então TL = TR.
A tabela 2 apresenta estatísticas relativas à distribuição dos retornos das carteiras EW e VW analisados nos horizontes diário e semanal. Reportamos na tabela os estimadores amostrais dos coeficientes de assimetria e curtose, a estatística de Jarque-Bera (JB) e as estimativas dos coeficientes b1 e b2 da regressão dos quantis. Os índices de cauda TL e TR são reportados para os correspondentes valores de a. Como convenção, os níveis de significância marginal das respectivas estatísticas de teste serão sempre reportados entre parênteses ao longo do artigo.
Os resultados revelam a não-normalidade nas séries de retorno de curto prazo. Em todos os casos, os coeficientes de curtose dos retornos ficam entre 7 e 8, sendo bem superiores aos da distribuição normal. As caudas das distribuições são mais pesadas do que as da distribuição normal, atribuindo maior probabilidade a valores extremos. As distribuições também não são simétricas, sendo a assimetria positiva nos retornos diários e negativa nos semanais.12 12 O padrão dos retornos nominais diários encontrado difere tanto do norte-americano quanto daquele observado no Ibovespa, para os quais a assimetria é negativa, sendo da ordem de -0,36 no período integral. A negatividade da última também é confirmada por Correa e Pereira (1997) em uma amostra com 650 retornos nominais diários, de 17-4-1991 a 29-11-1993. Adicionalmente, em ambos os casos há indícios de assimetria na cauda da distribuição, pois o índice de cauda à direita tende a ser um pouco superior em relação à esquerda, revelando a maior probabilidade de valores extremos positivos do que negativos nos retornos de curto prazo. A estatística de Jarque Bera rejeita a hipótese de normalidade em todos os casos, revelando a possibilidade de que modelos não lineares possam ser mais adequados para descrever o comportamento dos retornos.13 13 Uma ressalva em relação aos testes de Jarque Bera, de autocorrelação cruzada dos retornos e de McLeod-Li refere-se à ausência de correção para uma possível heterocedasticidade nos retornos, tal qual feito por White (1980). Deve-se observar, contudo, que se a rejeiçãoà hipótese nula for muito forte, a correção para heterocedasticidade deve afetar muito pouco a conclusão do teste.
3.2 Testes para a hipótese de passeio aleatório
Seja Pt o preço do ativo no tempo t. O retorno Rt do ativo no tempo t é definido como a razão entre o preço deste ativo entre t e t 1, ou seja, Rt º Pt/Pt-1. Utilizando letras minúsculas para denotar o logaritmo da variável, tal que x º ln(X), considere a relação:
Tal relação implica que rt = pt pt1 = m + et. O sistema de classificação da hipótese de passeio aleatório proposto por Campbell, Lo e MacKinlay (1997), doravante CLM, depende das hipóteses feitas sobre a distribuição dos choques et.
A versão RW1 corresponde ao modelo do passeio aleatório original, previamente descrito. Estabelece que os choques et têm média 0, sendo independentes e identicamente distribuídos (IID) no tempo. A versão RW3 é menos restritiva e exige apenas que os choques et sejam não-correlacionados. Sob a validade da mesma, temos que retornos passados não têm relevância na previsão linear dos retornos esperados futuros. Contudo, além de incorporar a possibilidade de previsibilidade da variância, a versão RW3 admite a previsibilidade não-linear da média, dado que sob esta hipótese o retorno esperado não precisa ser constante.
Neste artigo realizamos testes para as hipóteses RW1 e RW3 baseadas nas seguintes estatísticas: autocorrelações de ordem k; razão de variância dos retornos em multiperíodos.14 14 Richardson e Smith (1994) analisam a potência de diversas estatísticas utilizadas nos testes do modelo de passeio aleatório (entre elas, a estatística J, de Jegadeesh, 1991), concluindo que não há um teste assintótico uniformemente mais potente. De maneira geral, contra a hipótese de reversão à média nos retornos de longo prazo, a razão de variância dos retornos em multiperíodos tende a ser mais potente que as demais. Para mais esclarecimentos, ver Torres, Bonomo & Fernandes (2000). A estatística (k) ajustada para viés proposta por Fuller (1976:256) será adotada na avaliação das autocorrelações de ordem k. A razão de variância de ordem (q) é definida como VR(q) º , onde rt(q) º rt + rt1 + ... + rtq+1. O teste de razão de variância explora o fato de que a variância dos incrementos do passeio aleatório é linear no intervalo de tempo analisado. Conseqüentemente, a variância do retorno anual deve ser 12 vezes a variância do retorno mensal, por exemplo. Assim, a razão de variância dos incrementos de um passeio aleatório deve ser igual à unidade. Para os testes de RW1 e RW3 usaremos a estatística de teste (q) apresentada por Lo e Mackinlay (1989) como um refinamento sobre o estimador usual da razão de variância. Ambas as estatísticas utilizam-se de dados sobrepostos de retornos em multiperíodos.
Na tabela 3 são apresentados os resultados dos testes mencionados para a hipótese de RW1. Ambos os testes apresentam evidências contra esta hipótese, sugerindo alguma persistência dos retornos de curto prazo.15 15 Uma vez que são apresentadas evidências de não-normalidade dos retornos, a hipótese de RW1 torna-se muito restritiva. De qualquer forma, os testes serão realizados sob tal hipótese, a fim de que seus resultados possam ser comparados com os da hipótese de RW3.
As autocorrelações de primeira ordem estimadas são positivas em ambos os horizontes, sendo mais fortes do que as de ordem superior em todos os casos, e maiores no horizonte diário do que no semanal. Nos retornos diários, as autocorrelações de segunda a quinta ordem são também todas positivas, e significativas ao nível de 5%. Nos retornos semanais, surgem autocorrelações negativas a partir da terceira ordem. Em ambos os horizontes de análise, a rejeição da hipótese de RW1 tende a ser mais forte nas carteiras com ponderação igual (EW) em relação às carteiras ponderadas por valor (VW), sugerindo que o tamanho da firma possa ser uma variável relevante na previsão de retornos. Tais resultados são coerentes com aqueles encontrados por CLM na análise de retornos diários e semanais, e por Lo e Mackinlay (1988) e Conrad e Kaul (1988) na análise de retornos semanais.16 16 No tratamento dos dados, a falta de liquidez dos ativos é capaz de gerar alguma autocorrelação positiva espúria, tendo sido Fisher (1966) o primeiro a levantar esta questão. Lo e Mackinlay (1990) sugerem um modelo para o tratamento deste problema, conhecido como nonsynchronous trading. Torres, Bonomo e Fernandes (2000) avaliam as autocorrelações de ordem k de uma carteira formada apenas por ativos extremamente líquidos. A probabilidade de cada um destes não transacionar é inferior a 10%, ficando a média da carteira em 3,41%. Embora as autocorrelações obtidas sejam um pouco mais baixas, os resultados continuam sugerindo forte rejeiçãoà hipótese de RW1. Adicionalmente, os autores analisam nesta nova carteira a sensibilidade das autocorrelaçõesà presença de observações outliers, tendo constatado que tais autocorrelações são pouco afetadas.
A análise das razões de variância na mesma tabela mostra que elas são fortemente significativas até a 16aordem nos retornos diários e até a quarta ordem nos semanais. Constata-se também que os valores estimados da razão de variância de ordem 2, subtraídos da unidade, são aproximadamente iguais aos das autocorrelações de primeira ordem, conforme esperado. A razão de variância de ordem 2 encontrada do retorno diário da carteira EW de 1,32, por exemplo, indica uma autocorrelação serial de primeira ordem de 32%, sendo coerente com a estimativa da autocorrelação de primeira ordem.17 17 Uma propriedade estatística interessante das razões de variância é que VR(2q)/VR(q) equivale à autocorrelação de primeira ordem de retornos formados em q períodos adicionada da unidade.
O padrão ascendente das razões de variância de ordem 2, 4, 8 e 16 dos retornos diários indica a existência de autocorrelação serial positiva dos retornos em multiperíodos de dois, quatro e oito dias. Nos retornos semanais, a seqüência de razões de variância inicialmente ascende e posteriormente descende, indicando a ocorrência de autocorrelação serial positiva dos retornos em multiperíodos de duas semanas, e negativa dos retornos em multiperíodos de 4 e 8 semanas. A razão VR(4)/VR(2) do retorno semanal da carteira EW, por exemplo, é dada por 1,33/1,21, indicando que a autocorrelação de primeira ordem do retorno em multiperíodos de duas semanas da carteira EW deve ser da ordem de 10%.
Na tabela 4 são reportados os resultados dos testes assintóticos de razão de variância sob RW3,18 18 Romano e Thombs (1996) discutem inferência sobre as autocorrelações de ordem k sob hipóteses menos restritivas de distribuição, como RW3. Isto não foi adotado, pois além de computacionalmente complexo, não gera ganhos de potência compensatórios sob a hipótese alternativa de reversão à média no longo prazo. utilizando estatística de teste assintoticamente consistente quando há heterocedasticidade.
As indicações de previsibilidade dos retornos diários até o horizonte de 16 dias e dos retornos semanais até o horizonte de quatro semanas permanecem fortes no período integral. A única mudança relevante refere-se à razão de variância de ordem 8 da carteira EW dos retornos semanais, que passa a ser significativa. A rejeição da hipótese nula permanece mais forte na carteira EW do que na VW. Conclui-se, portanto, que a indicação de previsibilidade dos retornos de curto prazo é robusta a mudanças na variância desses retornos.
Subperíodos
A tabela 5 apresenta os resultados dos testes de razão de variância para a hipótese de RW1, avaliados nos subperíodos previamente mencionados.
A análise revela que os dois primeiros subperíodos possuem um padrão bem semelhante ao do período integral. Nos retornos diários, a mudança mais relevante ocorre no último subperíodo da carteira VW, para o qual as razões de variância de ordem 8 e 16 tornam-se inferiores à unidade, embora não sejam significativamente diferentes de 1. Em linhas gerais, a evidência de previsibilidade tende a ser menor no período mais recente para ambas as carteiras neste horizonte. A maior previsibilidade da carteira EW em relação a VW é mantida em todos os casos. De maneira geral, pode-se considerar que o padrão de previsibilidade dos retornos diários é robusto ao período de amostragem. Nos retornos semanais, a mudança de padrão do último subperíodo é considerável. No terceiro subperíodo, a razão de variância de ordem 2 permanece superior à unidade para a carteira EW, mas reduz-se sensivelmente, deixando de ser significativa. Contudo, a razão de variância de ordem 4 mantém-se significativa. A seqüência de razões de variância torna-se ascendente, indicando autocorrelação serial positiva nos retornos em multiperíodos de duas, quatro e oito semanas para esta carteira. Já em relação à carteira VW, apenas a razão de variância de ordem 2 permanece significativa; porém, torna-se inferior à unidade, e passa a indicar reversão à média. Apesar do padrão não ser tão estável quanto na análise dos retornos diários, a evidência de que a previsibilidade dos retornos semanais tende a ser menor em períodos mais recentes é compatível com os resultados da análise norte-americana de CLM (1997).
A tabela 6 apresenta os resultados dos testes de razão de variância para a hipótese de RW3, avaliados nos subperíodos previamente estabelecidos.
A análise dos retornos de curto prazo sob RW3 revela um padrão bem semelhante àquele encontrado sob RW1. Nos retornos diários, comparando-se os dois primeiros subperíodos e o período integral ao terceiro subperíodo, pode-se verificar que os níveis de significância marginal são maiores no último para ambas as carteiras, indicando menor previsibilidade. Nos retornos semanais, os níveis de significância marginal de ambos as carteiras aumentam em relação ao período integral em todos os subperíodos. Uma mudança refere-se à razão de variância de ordem 8 da carteira EW, que passa a ser significativa no segundo subperíodo. No último subperíodo, apenas esta razão de variância mantém-se significativa a 10%. A característica de redução da previsibilidade nos períodos mais recentes é mantida.
Ativos individuais
Estudos norte-americanos indicam que embora autocorrelações diferentes de 0 sejam observadas em carteiras diversificadas em determinados horizontes de tempo, na análise de ativos individuais essas autocorrelações são bem próximas de 0.19 19 Fisher (1966) constata que as autocorrelações de ativos agrupados em carteiras diversificadas são positivas e bem maiores do que aquelas observadas em ativos individuais no horizonte mensal. Fama e French (1988) encontram autocorrelações de ordem k corrigidas para viés bem próximas de 0 e simetricamente distribuídas nos retornos de multiperíodos de um a 10 anos, mas autocorrelações negativas nos retornos de carteiras no longo prazo. CLM encontram médias de razões de variância próximas à unidade nos ativos individuais em retornos semanais, e superiores à unidade em carteiras. A intuição é que ativos individuais estão mais sujeitos a riscos idiossincráticos, e por esta razão seu comportamento seria mais imprevisível. Este fato motiva a avaliação das razões de variância médias dos últimos. A significância da média cross-section da razão de variância dos ativos individuais não será avaliada, dadas as relações de dependência cross-section entre os ativos.
A tabela 7 apresenta as médias cross-section das razões de variância (q) dos ativos individuais e seus respectivos desvios-padrão.
A análise dos retornos diários do período integral revela que os ativos individuais também possuem razões de variância superiores à unidade até a ordem 16, embora em magnitude bem inferior àquelas observadas nas carteiras. A seqüência de razões de variância também é não-decrescente, indicando persistência dos retornos nos q dias. A análise dos retornos semanais revela que a razão de variância de ordem 2 é ligeiramente superior à unidade, e que as demais são inferiores e decrescentes, indicando uma reversão à média nas q semanas mais rápida do que aquela observada nas carteiras.
Carteiras agrupadas por tamanho
A constatação de que a rejeição às hipóteses de passeio aleatório tende ser mais forte nas carteiras EW do que nas VW leva à questão da relação entre o tamanho da firma e a previsibilidade.Conforme descrito na seção 2, cinco carteiras por tamanho foram formados a fim de se analisar as matrizes de autocorrelações cruzadas: Port1, Port2, Port3, Port4 e Port5, respectivamente do menor para o maior. Para os testes da hipótese de passeio aleatório, estas cinco carteiras foram reunidas em três:uma carteira de firmas pequenas, contendo apenas a Port1, com 13 firmas; uma carteira de firmas médias, com retorno dado pela média aritmética dos retornos das carteiras Port2, Port3 e Port4, englobando 36 firmas; e uma carteira de firmas grandes, idêntica à Port5, com 13 firmas. Testes de razão de variância para as hipóteses nulas de RW1 e RW3 foram, então, realizados. Os resultados encontram-se na tabela 8.
Em primeiro lugar, deve-se observar que embora as hipóteses de RW1 e RW3 sejam mais fortemente rejeitadas na carteira de firmas médias, tal rejeição pode estar relacionada ao maior número de firmas contidas no mesmo. Isto pode permitir uma melhor diversificação do risco idiossincrático das firmas, uma vez que a previsibilidade de ativos organizados em carteiras tende a ser maior do que a de ativos individuais, conforme observado. Sendo assim, a comparação mais cabível refere-se às firmas pequenas versus as firmas grandes. Neste caso, não há um padrão claro, pois embora a rejeição das hipóteses de RW1 e RW3 seja mais forte para a carteira de firmas grandes no horizonte diário, tal padrão é invertido no horizonte semanal. Este padrão dos retornos diários aparentemente não é coerente com a menor previsibilidade da carteira VW, no qual firmas maiores possuem maior ponderação.
3.3 Matrizes de autocorrelações cruzadas e sua assimetria
Outro padrão de previsibilidade de interesse analisado pelos estudos norte-americanos é aquele chamado de lead-and-lag, que estabelece que algumas carteiras apresentam uma tendência a seguir o comportamento de outras. Para avaliar tal padrão, torna-se interessante a construir matrizes de autocorrelações cruzadas entre estas carteiras. Uma vez que nos estudos do mercado norte-americano a variável tamanho mostrou-se relevante na previsão, tal padrão será avaliado com base em carteiras agrupadas por tamanho.
A tabela 9 mostra as matrizes estimadas de autocorrelações cruzadas de primeira ordem, (1), e de assimetria, (1) (1)' das carteiras ordenadas por tamanho Port1, Port2, Port3, Port4 e Port5 (em ordem crescente de tamanho), cujos retornos no tempo t são dados respectivamente por r1t, r2t, r3t, r4t, r5t. A matriz de assimetria revela a diferença de influência dos retornos defasados de firma grandes sobre pequenas (abaixo da diagonal principal) e vice-versa (acima da diagonal principal). Os desvios-padrão assintóticos das autocorrelações cruzadas sob a hipótese de RW1 são dados por 1/, sendo iguais a 1,8% e 4% para os retornos diários e semanais, respectivamente.20 20 Conforme mencionado, os vieses dos estimadores das autocorrelações cruzadas são da ordem de 0.03% e 0.16% e, portanto, irrelevantes nas conclusões.
Um padrão interessante pode ser notado na matriz (1): as autocorrelações abaixo da diagonal principal tendem a ser maiores do que aquelas acima. Por exemplo, enquanto a correlação do retorno semanal em t 1 da firma grande com o retorno em t da firma pequena é da ordem de 22%, a correlação do retorno em t 1 da firma pequena com o retorno em t da firma grande é da ordem de 0%. Tal padrão pode ser verificado mais adequadamente nas matrizes de assimetria (1) (1)', que são dominadas por valores positivos abaixo da diagonal principal e negativos acima. Estes resultados são coerentes com os observados por CLM . Autocorrelações fortemente significativas podem ser observadas nos dois horizontes. Este padrão sugere a possibilidade de uma estratégia que, em termos esperados, gere lucros extraordinários na ausência de custos de transação. Por exemplo, se o retorno de uma carteira de firmas grandes é alto no fechamento de determinado dia, então a compra de uma carteira de firmas pequenas no fechamento deste dia, e sua posterior venda no fechamento do dia seguinte, geraria lucros extraordinários em termos esperados. Observe que tal lucro extraordinário existiria mesmo que o retorno de cada carteira agrupada por tamanho fosse imprevisível com base nos seus retornos defasados.
3.4 Testes de sazonalidade
Em função da evidência norte-americana de sazonalidade em retornos diários, uma regressão com variáveis dummy foi montada a fim de avaliar tal efeito. Na avaliação do efeito dia da semana em conjunção com o efeito auto-regressivo, foi adotada a especificação:21 21 Uma vez que a série original de retornos diários era composta apenas por dias úteis, os feriados foram incluídos nesta série e considerados uma observação NA, visando manter a ordem dos dias da semana.
Havendo indicação de heterocedasticidade, a metodologia de White (1980) será adotada para obter uma estimativa consistente do estimador das variâncias dos coeficientes da regressão, na presença de heterocedasticidade de forma desconhecida.
A tabela 10 apresenta os resultados da regressão. Os respectivos níveis de significância marginal são informados ao lado, avaliados sob as hipóteses de homocedasticidade e heterocedasticidade.
A análise da especificação revela a existência de um efeito sazonal na segunda-feira em ambos os portfólios. Um efeito sazonal também é observado em EW na sexta-feira. Tal evidência é coerente com o fato estilizado de que os retornos da segunda-feira tendem a ser menores do que aqueles dos demais dias da semana, observado por Cross (1973), French (1980) e Gibbons e Hess (1981) nos dados norte-americanos, e por Correa e Pereira (1997) nos dados brasileiros.
O teste ARCH-LM de heterocedasticidade condicional nos erros da regressão é também apresentado na tabela, rejeitando a hipótese nula do quadrado dos erros não serem auto-correlacionados. Conseqüentemente, a matriz de covariância do vetor de coeficientes foi estimada segundo a metodologia consistente à heterocedasticidade de White. Os níveis de significância marginal calculados com base em tal metodologia são reportados ao lado daqueles baseados na hipótese de homocedasticidade. A correção para heterocedasticidade não modifica as conclusões anteriores.
3.5 Testes de não linearidade
Teste BDS
O teste BDS (Brock, Dechert & Scheinkman, 1987) é adequado para investigar desvios da hipótese nula de independência e distribuição idêntica, tais como não-estacionariedade, não-linearidade e caos determinístico. A estatística de teste BDS é baseada na integral de correlação entre dois vetores de séries temporais, definida através da seguinte expressão:
onde T é o tamanho da série, = (xt ,xt+1,...,xt+m-1) e I(.) é a função indicadora. Os autores mostraram que, sob a hipótese nula de observações i.i.d., Cm(e) = (C1(e))m. A partir deste resultado define-se a estatística de teste BDS:
onde Vm é a expressão da variância, cuja fórmula pode ser encontrada em Cromwell e outros (1994:34). É possível mostrar que sob a hipótese de i.i.d. esta estatística tem distribuição assintótica normal padrão. Esta aproximação é adequada desde que T/m > 200. Brock, Hsieh e Le Baron (1990) recomendam usar e entre meia e duas vezes o desvio-padrão da série, e o parâmetro dimensional m, entre 2 e 10. A tabela 11 apresenta os resultados da aplicação do teste BDS aos retornos dos portfólios EW e VW observados à freqüência diária (2.996 observações) e semanal (613 observações).
Como pode-se observar, a hipótese nula de séries i.i.d. é fortemente rejeitada, ao nível de 1% ou bem menos para todos os tipos de carteira (EW e VW) e freqüências analisadas (diária e semanal). Os dados diários, que apresentam maior persistência na volatilidade, rejeitam mais fortemente a hipótese de independência. Dada a não-especificidade da hipótese alternativa no teste BDS, cabe investigar, através de testes mais específicos, as origens desta rejeição. Parte desta resposta está na informação contida na tabela 3, onde é possível observar a autocorrelação significativa para as séries investigadas, ou seja, a presença de dependência linear na média. Entretanto, será nos resultados dos testes subseqüentes (McLeod-Li e Hsieh) que ficará aparente que a rejeição da hipótese da distribuição independente e idêntica está mais fortemente associada à existência de dependência não-linear nas séries dos retornos de portfólios, em consonância com os fatos estilizados observados em séries de retornos financeiros nos diversos mercados mundiais.
Teste de McLeod-Li
O teste de McLeod-Li (1983) baseia-se análise do correlograma do quadrado de uma determinada variável. A hipótese nula de as primeiras k autocorrelações do quadrado dos retornos serem simultânemente zero pode ser testada utilizando a estatística de Ljung-Box, Qxx(k). A rejeição da hipótese nula indica a existência de dependência não linear nos retornos, que pode ocorrer na média e/ou na variância. A aceitação da hipótese nula não exclui a possibilidade de dependência não-linear de ordem superior à quadrática.
A tabela 12 apresenta os resultados do teste aplicado à série de quadrados dos retornos. A evidência revela a existência de dependência não linear na série dos retornos.
Teste de Hsieh
Para a realização do teste de Hsieh (1989), a dependência linear da variável testada deve ser inicialmente filtrada. A fim de detectar a existência de não-linearidade na média, o autor propõe um teste baseado no terceiro momento do processo {et}, definindo a estatística:
onde i,j representam as defasagens do processo {et}.
Se o processo é não-linear na média, então j(i,j) ¹ 0, para algum i,j > 0. Sendo assim, o teste estabelece como hipótese nula que j(i,j) = 0 para todo i,j > 0, o que ocorrerá quando o processo for i.i.d. ou não linear na variância.
A rejeição da hipótese nula significa que há possibilidade de que modelos não-lineares na média sejam úteis na previsão do comportamento dos retornos. Neste caso, pode ou não haver não-lineridade na variância. Se o teste de McLeod-Li indicar a existência de não-linearidade, a não rejeição da hipótese nula do teste de Hsieh indica que deve haver não-linearidade somente na variância do retorno. Observe que, caso não houvesse o processo de filtragem do resíduo mencionado, o teste de Hsieh poderia rejeitar a hipótese nula em função de dependência linear no distúrbio aleatório do modelo, o que seria indesejado.22 22 Avaliando a potência de seu teste, Hsieh mostra que, para determinadas combinações de (i,j) e especificações dos parâmetros dos modelos, seu teste rejeita fortemente os seguintes modelos não-lineares na média: MA não-linear, TAR e tent map . A potência é menor para o modelo híbrido ARCH-M. Os modelos lineares na média AR(1), MA(1) e ARCH são rejeitados com baixíssima probabilidade.
O teste de Hsieh foi aplicado à série de resíduos filtrados de dependência linear conforme a metodologia de Box, Jenkins e Reinsel (1994). Nos retornos diários foram incluídas variáveis dummies para os dias da semana. A autocorrelação serial dos distúrbios aleatórios et da regressão linear foi analisada e, uma vez aceitando-se a hipótese de autocorrelação nula, estes resíduos foram, então, utilizados no teste. O número de defasagens das especificações lineares dos processos de retornos foi de oito e dez defasagens no horizonte diário e de duas e três defasagens no horizonte semanal, para as carteiras EW e VW, respectivamente.
A tabela 13 apresenta as estatísticas (i,j) do teste de Hsieh. A análise da carteira EW não rejeita a possibilidade de os processos serem lineares na média. Uma vez que o teste de McLeod-Li indica a existência de não-linearidade, conclui-se que esta deve ocorrer na variância, e não na média. Em relação à carteira VW, (2,1), (3,1) e (4,1) são significativas no horizonte diário e (3,2) é significativa no horizonte semanal. Isto sugere a investigação de especificações não-lineares na média e na variância para a previsão de retornos desta carteira.
Embora não tenhamos realizado testes de não-linearidade específicos para a média condicional dos retornos, a evidência empírica acumulada indica que existe pouca evidência para creditarmos a rejeição do teste BDS à não linearidade na média. Vide, por exemplo, Hsieh (1993).
3.6 Sumário e comparação com resultados norte-americanos
Algumas das evidências encontradas corroboram qualitativamente os fatos estilizados norte-americanos de:
rejeição da hipótese de normalidade dos retornos em log;
evidências que levantam a possibilidade de que modelos não-lineares na média e/ou na variância sejam úteis na previsão de retornos;
rejeição às hipóteses de passeio aleatório RW1 (retornos independentes e identicamente distribuídos) e RW3 (retornos não-correlacionados), com indicação de previsibilidade linear de retornos;
redução da previsibilidade linear univariada no período mais recente;
razões de variância mais próximas à unidade para ativos individuais, indicando sua menor previsibilidade em relação às carteiras;
maior previsibilidade de carteiras de firmas pequenas em relação às de firmas grandes no horizonte semanal;
assimetria das autocorrelações cruzadas dos retornos semanais, com carteiras de firmas maiores explicando o comportamento dos retornos das carteiras de firmas menores;
tendência a que os retornos sejam significativamente menores na segunda-feira.
Algumas comparações podem ser estabelecidas entre os resultados encontrados na análise do mercado brasileiro entre 1986 e 1998 e aqueles encontrados para o mercado norte-americano no período de 1978 a 1994 (CLM). As evidências de previsibilidade linear geradas pelas autocorrelações dos retornos diários e semanais das carteira EW e VW são mais fortes no caso brasileiro do que no caso norte-americano. O mesmo pode ser dito em relação às razões de variância no horizonte semanal Em relação às carteiras agrupadas por tamanho das firmas, as razões de variância dos retornos semanais indicam maior previsibilidade da carteira de firmas pequenas no mercado norte-americano e maior previsibilidade das carteiras de firmas grandes no mercado brasileiro. A assimetria da matriz de autocorrelações dos retornos semanais das carteiras agrupados por tamanho das firmas pode ser considerada bem semelhante.
Outras evidências encontradas na análise do caso brasileiro são: o padrão de comportamento das autocorrelações cruzadas do horizonte diário é bem semelhante ao do semanal; no horizonte diário há uma inversão da evidência de previsibilidade das carteiras agrupadas por tamanho, com carteiras de firmas grandes apresentando maior previsibilidade que os de firmas pequenas.
4. Retornos de Médio a Longo Prazo
O período de análise dos retornos estende-se de janeiro de 1970 a março de 1998, contando com 339 observações não sobrepostas de retornos mensais e 28 de retornos anuais. A fim de se testar a robustez à amostragem, a amostra foi dividida em dois subperíodos: de janeiro de 1970 a fevereiro de 1986, e de março de 1986 a março de 1998. Uma vez que dados de retornos de ações foram obtidos apenas a partir de 1986, as carteiras EW e VW não foram construídas para o primeiro subperíodo. Assim, a análise desse subperíodo fica limitada ao Ibovespa.
4.1 Características da distribuição dos retornos
A tabela 14 é análoga à tabela 2, apresentando estatísticas relativas à distribuição dos do Ibovespa nos horizontes de médio prazo. São avaliados tanto o período integral, quanto o segundo subperíodo.
A análise do período integral rejeita a hipótese de normalidade dos retornos ao nível de significância de 10% em todos os horizontes de tempo, com exceção do quadrimestral. Em todos os casos os coeficientes de assimetria são negativos, e a análise da regressão dos quantis apresenta forte evidência para rejeição da hipótese de simetria. Os coeficientes de curtose são superiores a 3 em todos os casos. De maneira geral, os índices de cauda são superiores à unidade, às vezes mais pesados à esquerda, outras à direita. O padrão observado no segundo subperíodo é praticamente o mesmo, diferindo apenas nos horizontes quadrimestral e anual, nos quais o coeficiente de curtose é inferior, mas bem próximo a 3.
A tabela 15 faz as mesmas avaliações para as carteiras EW e VW no segundo subperíodo. A única diferença relevante encontrada na carteira EW em comparação ao Ibovespa refere-se à ausência de assimetria nos horizontes mensal e bimestral. Os testes com a carteira VW, por sua vez, indicam a aceitam da hipótese de normalidade dos retornos a partir do horizonte quadrimestral, com coeficientes de curtose bem próximos a 3, e rejeitam a hipótese de simetria ao nível de 10% pela regressão dos quantis, indicando assimetria negativa.
4.2 Testes para a hipótese de passeio aleatório
A tabela 16 apresenta os resultados dos testes de razão de variância sob RW1 com observações sobrepostas, calculados com base nos retornos mensais para o período integral e para os dois subperíodos estabelecidos. O intervalo de medida dos retornos em multiperíodos vai de dois a 96 meses. Conforme mencionado previamente, nas ordens mais altas da razão de variância a perda de potência do teste tende a ser considerável, devido ao baixo número de observações não-sobrepostas.
Em relação ao período integral, não há indicação de rejeição à hipótese de RW1. As razões de variância do Ibovespa sugerem autocorrelações de primeira ordem praticamente nula no horizonte mensal, positiva no horizonte semestral, e negativa nos horizontes bimestral, quadrimestral e de um, dois, três e quatro anos.
A autocorrelação mensal de primeira ordem próxima de 0 do período integral não é robusta à amostragem. No primeiro subperíodo, a razão de variância de ordem 2 revela uma autocorrelação mensal positiva da magnitude de 12%, significativa ao nível de 10%. Já no segundo subperíodo, as razões de variância de ordem 2 das três carteiras são inferiores à unidade, sendo inclusive significativa a 5% para a carteira VW. A autocorrelação negativa no horizonte quadrimestral é mantida para as carteiras EW e VW, mas torna-se próxima de 0 para o Ibovespa nos subperíodos. As autocorrelações negativas dos horizontes de dois e três anos tornam-se positivas nos demais subperíodos, e a do horizonte de quatro anos torna-se positiva no primeiro subperíodo. A autocorrelação positiva no horizonte semestral é mantida no segundo subperíodo, sendo próxima de 0 no primeiro.
As únicas autocorrelações de primeira ordem robustas à amostragem são as dos horizontes bimestral e anual, mantendo seu padrão negativo nas demais carteiras para os dois subperíodos. Pode-se notar que os níveis de significância marginal das razões de variância da carteira VW são ligeiramente menores em relação aos de EW, indicando uma rejeição à hipótese de previsibilidade mais fraca para a primeira. De maneira geral, as evidências de previsibilidade dos retornos de médio e longo prazos são estatisticamente mais fracas do que as dos retornos de curto prazo.
A tabela 17 apresenta os resultados dos testes assintóticos de razão de variância sob RW3, utilizando estatística de teste assintoticamente consistente à heterocedasticidade.
Comparando os resultados com os análogos sob a hipótese de RW1 (tabela 15), podemos observar que as razões de variância de ordem 2 a 4 da carteira VW, que já não eram robustas à amostragem, deixam de ser significativas. A única razão de variância significativa sob RW3 é a de ordem 2 do Ibovespa no primeiro subperíodo.
Ativos individuais
A tabela 18 apresenta as médias das razões de variância cross-section (q) dos ativos individuais e seus respectivos desvios-padrão reportados abaixo. A característica marcante é a semelhança do comportamento dos ativos individuais com a carteira EW na análise das razões de variância do mesmo subperíodo. Tais razões de variância são todas inferiores à unidade, variando de 0,84 a 0,40, indicando uma reversão à média nos ativos individuais, para a qual o nível de significância é desconhecido.
Carteiras agrupadas por tamanho
Devido à menor rejeição à hipótese de previsibilidade da carteira VW, as hipóteses de RW1 e RW3 foram avaliadas para as carteiras de firmas agrupadas por tamanho no segundo subperíodo. Os resultados dos testes de razão de variância são apresentados na tabela 19.
A contraposição dos resultados das firmas grandes e pequenas demonstra que as razões de variância dos multiperíodos de dois a seis meses das firmas grandes são significativas sob RW1, o que é aparentemente coerente com os resultados da carteira VW. Sob RW3, contudo, apenas a razão de variância de ordem 2 é significativa ao nível de aproximadamente 10%.
4.3 Matrizes de autocorrelações cruzadas e sua assimetria
A tabela 20 mostra as matrizes estimadas de autocorrelações cruzadas de primeira ordem (1) e de assimetria (1) (1)' das carteiras ordenadas por tamanho. Os desvios-padrão assintóticos das autocorrelações cruzadas sob a hipótese de RW1 são dados por 1/, sendo, portanto, iguais a 5,4% nos retornos mensais, 7,6% nos bimestrais, 9,4% nos trimestrais, 10,9% nos quadrimestrais, 13,3% nos semestrais e 18,8% nos anuais.23 23 Os respectivos viéses dos retornos mensais, bimestrais, trimestrais, quadrimestrais, semestrais e anuais são da ordem de 0,68%, 1,38%, 2,08%, 2,77%, 4,16%, 8,33%.
As matrizes de assimetria (1) (1)' dos retornos de médio prazo revelam o mesmo padrão observado nos retornos de curto prazo, ou seja, valores positivos abaixo da diagonal principal e negativos acima desta. Contudo, tal assimetria deve-se, neste caso, a uma razão inteiramente distinta daquela do retorno de curto prazo. Neste último, a assimetria era explicada pela dominância da forte autocorrelação positiva entre o retorno em t-1 das firmas maiores e o retorno em t das menores, em relaçãoà mais fraca autocorrelação positiva entre o retorno em t-1 das firmas menores e o retorno em t das maiores. No médio prazo, a assimetria é explicada pelas fortes autocorrelações negativas entre o retorno em t-1 das firmas pequenas com o retorno em t das maiores. Estas sugerem, por exemplo, que quando os retornos das firmas pequenas são bem positivos, as firmas grandes apresentarão maior tendência a ter retornos negativos no período seguinte. Autocorrelações significativas podem ser observadas em todos os horizontes, mesmo considerando-se a existência de um viés positivo.
4.4 Testes de sazonalidade
Na investigação da sazonalidade mensal em conjunção com o efeito auto-regressivo, a seguinte especificação foi adotada:
A tabela 21 apresenta os resultados da regressão. Os níveis de significância marginal correspondentes são reportados ao lado, avaliados sob a hipótese de homocedasticidade. Os coeficientes revelam a existência de sazonalidade mensal em novembro para os portfólios EW e VW. A sazonalidade mensal observada por Kleim (1983) e Roll (1983), que estabelece que no mercado norte-americano os retornos mensais de janeiro tendem a ser maiores que nos demais meses do ano, é verificada no portfólio ponderado por valor. Ainda são observadas sazonalidades em abril para EW e outubro para VW. A tabela também revela que não há um efeito ARCH na heterocedasticidade. Conclui-se, portanto, que a sazonalidade mensal é uma variável relevante na previsão do comportamento dos retornos.
4.5 Testes de não-linearidade
Tal qual realizamos nos portfólios com dados de retornos de curto prazo, poderíamos, em princípio, utilizar a estatística BDS para testar a presença de não-linearidades nos retornos de médio e longo prazos. Entretanto, a aproximação normal para a distribuição da estatística BDS só será adequada se T/m > 200. Claramente esta condição não é satisfeita no presente contexto, uma vez que T varia entre 28 (retornos anuais) e 339 observações (retornos mensais). A solução seria levantar o tamanho do teste BDS por bootstrap. Não seguiremos esta estratégia, pois, possívelmente, os benefícios auferidos pelo uso deste procedimento computacional intensivo são questionáveis: a evidência empírica internacional sugere que a não-linearidade dos retornos está geralmente associada à variância, cuja dependência pode ser capturada pelos testes de McLeod-Li e e de Hsieh, apresentados na seqüência.
Teste de McLeod-Li
A tabela 22 apresenta os resultados do teste aplicado à série de quadrados dos retornos do Ibovespa no período integral. A evidência revela a existência de dependência não-linear na série de retornos nos horizontes mensal a quadrimestral. Deve-se lembrar que a aceitabilidade da hipótese de que os retornos ao quadrado são descorrelatados nos horizontes semestral e anual não exclui a possibilidade de existência de correlação dos retornos em ordens superiores.
Teste de Hsieh
Tal qual na análise dos retornos diários, incorporamos variáveis dummy para os meses do ano. Utilizando a metodologia de Box, Jenkins e Reinsel (1994), obtivemos no período integral a séries de resíduos do Ibovespa filtrados de dependência linear, aos quais aplicamos o teste de Hsieh. As defasagens das especificações lineares dos processos de retornos foram nove no horizonte mensal, nove no bimestral, cinco no trimestral, quatro no quadrimestral, duas no semestral e uma no anual.
A tabela 23 apresenta as estatísticas (i,j) do teste de Hsieh. Em todos os horizontes houve rejeição da hipótese nula ao nível de 10%. Isto se dá em (3,2) e (4,1) no horizonte mensal, em (2,1) no bimestral, (3,2) no trimestral, (3,1) no quadrimestral, (3,2) no semestral e (3,2) no anual. A evidência dos dois testes tomada conjuntamente sugere a existência de não-lineares na média e na variância.
4.6 Sumário e comparação com resultados norte-americanos
Na análise dos retornos de médio prazo, as evidências de previsibilidade concentram-se nas sazonalidades observadas nos retornos mensais em outubro e novembro e na forte assimetria das autocorrelações cruzadas de primeira ordem. Ambas não são encontradas na análise norte-americana, de forma que a literatura ainda não apresenta interpretações para tais fatos. O ''efeito janeiro'' observado no mercado norte-americano não é confirmado no brasileiro. O fato estilizado de reversão à média no mercado norte-americano nos horizontes de longo prazo de três a cinco anos para carteiras EW não foi encontrado. Contudo, a potência dos testes foi comprometida nestes casos pela limitação da extensão da base de dados. A ausência de previsibilidade linear univariada nos horizontes de médio prazo é compatível com a evidência norte-americana. Os testes de não-linearidade revelam que modelos não lineares na média e/ou na variância podem ser úteis na previsão de retornos.
5. Conclusão
Pelo fato de o mercado acionário brasileiro ser emergente, poderíamos esperar que os indícios de sua ineficiência fossem maiores do que os do mercado americano. Esperaríamos também que a ineficiência fosse reduzida ao longo do tempo. As autocorrelações de primeira ordem altamente significativas para retornos diários e semanais, e declinantes no período recente, parecem, à primeira vista, confirmar esta expectativa. Mas a disciplina do ofício de economista nos obriga a, antes, examinar a hipótese de que esta evidência seja compatível com a eficiência de mercado.
Três interpretações podem tentar compatibilizar a evidência de previsibilidade com a hipótese de mercado eficiente:
os padrões de previsibilidade são compatíveis com retornos esperados variantes ao longo do tempo, dentro do contexto do modelo de equilíbrio intertemporal com expectativas racionais de Lucas (1978), também chamado de CCAPM (consumption capital asset pricing model);
os fatos estilizados não são robustos ao tratamento adequado dos dados, sendo derivados de problemas de microestrutura do mercado;
os lucros extraordinários derivados de estratégias que explorem os padrões de previsibilidade indicados seriam eliminados quando considerados os custos explícitos de transação, tais quais custos de corretagem e impostos.
Em relação à primeira destas possíveis explicações, cabe ressaltar que o CCAPM é adequado para explicar padrões de previsibilidade nos retornos a partir de variações do retorno esperado ao longo do ciclo econômico, tais quais as autocorrelações negativas no longo prazo encontradas para retornos norte-americanos. Entretanto, a previsibilidade encontrada foi de retornos diários e semanais. Não nos parece razoável atribuí-las a mudanças no retorno requerido resultantes de alterações percebidas na fase do ciclo econômico.
Quanto à segunda interpretação, cabem algumas observações. Em primeiro lugar, os modelos de microestrutura bid-ask-spread e nonsynchronous trading geram autocorrelações negativas nos ativos individuais nos retornos diários (CLM). Contudo, autocorrelações positivas foram encontradas. Em segundo lugar, embora o nonsynchronous trading possa gerar autocorrelações positivas nos retornos de curto prazo de carteiras, a evidência apontada por Torres, Bonomo e Fernandes (2000) sugere que este efeito não seja capaz de explicar as magnitudes de autocorrelações observadas. Em terceiro lugar, em relação às matrizes de assimetria das autocorrelações cruzadas, um modelo de nonsynchronous trading deveria ser aplicado para que um possível viés das autocorrelações cruzadas gerado pela falta de liquidez pudesse ser quantificado (CLM). Entretanto, dada a magnitude dos valores encontrados, é pouco provável que toda ela possa ser explicada por nonsynchronous trading.
Finalmente, a testabilidade da terceira interpretação requer a especificação de modelos de previsibilidade e sua sujeição a simulações na presença de custos explícitos de transação. De acordo com Cochrane (1999), a magnitude das autocorrelações de primeira ordem para retornos diários americanos (35% para a carteira EW) não é suficiente para gerar retornos extraordinários em estratégias que explorem estas correlações. As razões apontadas são os custos de transação, a pouca liquidez das ações pequenas e o alto custo das vendas a descoberto. No Brasil a magnitude é similar, e certamente os obstáculos apontados não são menores do que os norte-americanos, o que sugere a impossibilidade de se gerar retornos extraordinários no mercado brasileiro explorando-se estas autocorrelações, apesar de sua alta significância estatística. Neste sentido, a menor magnitude das autocorrelações no período mais recente pode tão-somente refletir a redução dos custos de transação. Por fim, em relação às sazonalidades encontradas, é provável que estratégias que as explorem encontrem os mesmos obstáculos, conforme reportado na literatura para o mercado americano.24 24 Lakonishok e Smidt (1988) e Roll (1983) argumentam que os aparentes lucros extraordinários derivados da exploração de sazonalidades no mercado norte-americano seriam eliminados quando levados em consideração tanto os custos de transação quanto o bid-ask-spread. De qualquer forma, uma avaliação de estratégias que explorem as previsibilidades reportadas, incorporando explicitamente os custos de transação do mercado brasileiro, seria um exercício interessante.
Artigo recebido em out.2000 e aprovado em jul.2001
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
27 Jun 2003 -
Data do Fascículo
2002
Histórico
-
Aceito
Jul 2001 -
Recebido
Out 2000