Open-access Vivências de cuidados da mulher mastectomizada: uma pesquisa bibliográfica

Vivências de la mujer mastectomizada: una investigación bibliográfica

The experience of mastectomized woman: a bibliographic research

Resumos

Com o objetivo de conhecer a produção científica acerca do cuidado à mulher mastectomizada, enfocando os sentimentos manifestados, as dificuldades enfrentadas e as estratégias de cuidado adotadas pela enfermagem, realizou-se uma pesquisa bibliográfica com 23 artigos publicados, a partir de 1990, em periódicos nacionais. A partir da metododologia proposta por Salvador, os principais sentimentos identificados nas mulheres foram o medo, a rejeição, a culpa e a perda; dentre as dificuldades, destacam-se a aceitação da auto-imagem, o enfrentamento do preconceito e dos efeitos colaterais do tratamento quimioterápico, sobretudo a alopécia, a dor e as dificuldades físicas. Como principal estratégia de cuidado, foram identificadas as atividades grupais, visando promover a auto-estima da mulher mastectomizada e contribuir para sua qualidade de vida.

Mastectomia; Neoplasias mamárias; Cuidados de enfermagem


Con el objetivo de conocer la producción científica acerca del cuidado a la mujer mastectomizada, enfocado los sentimientos manifestados, las dificuldades enfrentadas y las estrategias del cuidado adoptado por el grupo de enfermeros se realizo uma pesquisa bibliografica con 23 articulos publicados, a partir de 1990, en períodos nacionales. A partir de la metadologia propuesta por Salvador, los principales sentimientos identificados en las mujeres fueran, el miedo, el rechazo, la culpa, y la perdida, entre las dificultades se destacan la aceptacion del auto-imagen, el enfrentamiento del rechazo y de los efectos colaterales del tratamiento quimioterápico, sobre todo la perdida del cabello, el dolor y las dificultades físicas. Como principal estrategia de atención, fueran identificadas las actividades grupales, intentando promover el auto-estima de la mujer mastectomizada y contribuir para su calidad de vida.

Mastectomía; Neoplasias de la mama; Atención de enfermería


This study aimed at knowing the scientific production concerning the care to the mastectomized woman, focusing the revealed feelings, the difficulties faced and the care strategies adopted by the nursing, a bibliographical search was carried out with 23 published articles since 1990, in national periodics. Using the proposed methodology by Salvador, the main women's feelings identified was fear, rejection, guilty and loss; amongst the difficulties, stand out the auto-image acceptance, the confrontation of the prejudice and the collateral effect of chemotherapeutic treatment, specially the alopecia, the pain and the physical difficulties. As main care strategy, it was identified the group activities, aiming at promotin the mastectomized woman self-steem and to contribute for her quality of life.

Mastectomy; Breast neoplasms; Nursing care


REVISÃO

Vivências de cuidados da mulher mastectomizada: uma pesquisa bibliográfica

The experience of mastectomized woman: a bibliographic research

Vivências de la mujer mastectomizada: una investigación bibliográfica

Sandrine Gonçales PereiraI; Daniele Portella RosenheinII; Michele Salum BulhosaIII; Valéria Lerch LunardiIV; Wilson Danilo Lunardi FilhoV

IEnfermeira. Ex-bolsista PIBIC/CNPq. Membro do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Enfermagem e Saúde - NEPES da Fundação Universidade Federal do Rio Grande, Rio Grande, RS

IIAcadêmica de Enfermagem - FURG. Bolsista PIBIC/CNPq. Membro do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Enfermagem e Saúde - NEPES, Rio Grande, RS

IIIEnfermeira. Aluna do Curso de Mestrado em Enfermagem - FURG. Membro do NEPES/FURG, Rio Grande, RS

IVDoutora em Enfermagem. Docente do Departamento de Enfermagem - FURG. Membro do NEPES/FURG, Rio Grande, RS

VDoutor em Enfermagem. Docente do Departamento de Enfermagem - FURG. Membro do NEPES/FURG e do Grupo de Estudos em Organização e Trabalho em Enfermagem e Saúde - GEPOTES/FURG, Rio Grande, RS

RESUMO

Com o objetivo de conhecer a produção científica acerca do cuidado à mulher mastectomizada, enfocando os sentimentos manifestados, as dificuldades enfrentadas e as estratégias de cuidado adotadas pela enfermagem, realizou-se uma pesquisa bibliográfica com 23 artigos publicados, a partir de 1990, em periódicos nacionais. A partir da metododologia proposta por Salvador, os principais sentimentos identificados nas mulheres foram o medo, a rejeição, a culpa e a perda; dentre as dificuldades, destacam-se a aceitação da auto-imagem, o enfrentamento do preconceito e dos efeitos colaterais do tratamento quimioterápico, sobretudo a alopécia, a dor e as dificuldades físicas. Como principal estratégia de cuidado, foram identificadas as atividades grupais, visando promover a auto-estima da mulher mastectomizada e contribuir para sua qualidade de vida.

Descritores: Mastectomia; Neoplasias mamárias; Cuidados de enfermagem.

ABSTRACT

This study aimed at knowing the scientific production concerning the care to the mastectomized woman, focusing the revealed feelings, the difficulties faced and the care strategies adopted by the nursing, a bibliographical search was carried out with 23 published articles since 1990, in national periodics. Using the proposed methodology by Salvador, the main women's feelings identified was fear, rejection, guilty and loss; amongst the difficulties, stand out the auto-image acceptance, the confrontation of the prejudice and the collateral effect of chemotherapeutic treatment, specially the alopecia, the pain and the physical difficulties. As main care strategy, it was identified the group activities, aiming at promotin the mastectomized woman self-steem and to contribute for her quality of life.

Descriptors: Mastectomy; Breast neoplasms; Nursing care.

RESUMEN

Con el objetivo de conocer la producción científica acerca del cuidado a la mujer mastectomizada, enfocado los sentimientos manifestados, las dificuldades enfrentadas y las estrategias del cuidado adoptado por el grupo de enfermeros se realizo uma pesquisa bibliografica con 23 articulos publicados, a partir de 1990, en períodos nacionales. A partir de la metadologia propuesta por Salvador, los principales sentimientos identificados en las mujeres fueran, el miedo, el rechazo, la culpa, y la perdida, entre las dificultades se destacan la aceptacion del auto-imagen, el enfrentamiento del rechazo y de los efectos colaterales del tratamiento quimioterápico, sobre todo la perdida del cabello, el dolor y las dificultades físicas. Como principal estrategia de atención, fueran identificadas las actividades grupales, intentando promover el auto-estima de la mujer mastectomizada y contribuir para su calidad de vida.

Descriptores: Mastectomía; Neoplasias de la mama; Atención de enfermería.

1. INTRODUÇÃO

O câncer é a segunda causa de morte por doença no Brasil, sendo a Região Sul a que apresenta maior incidência. Dentre os cânceres, o câncer de mama é a maior causa de mortes entre as mulheres. Estimativas apontam que, em 2005, seriam descobertos, no Rio Grande do Sul, cerca de 91,43 casos de câncer de mama por 100.000 mulheres(1).

Esse grande número de mulheres com diagnóstico de câncer de mama exige dos profissionais de saúde e, dentre estes, os de enfermagem, valorizar esta problemática, identificando ações de prevenção, educação e cuidado. Não há uma causa única e específica de câncer de mama, mas sim uma série de eventos genéticos, hormonais e, possivelmente, ambientais que podem contribuir para o seu desenvolvimento. Os cânceres de mama podem ocorrer em qualquer parte da mama, mas a maioria surge no quadrante superior externo, onde há maior parte do tecido mamário. Em geral, as lesões são insensíveis, fixas e rijas com bordas irregulares(2).

Por sua vez, as mamas são vistas como símbolo da metamorfose feminina. Assim, o enfrentamento de uma enfermidade nessa parte do corpo feminino impõe a vivência de vários estágios, pois a mulher com suspeita de câncer de mama enfrenta diferentes momentos, que vão desde a expectativa e o medo de estar com a doença e o recebimento do diagnóstico até a procura por serviços que ofereçam condições de reabilitação física, social e emocional, no caso de sua confirmação(3-5).

O diagnóstico de câncer de mama e a possibilidade de mastectomia geram muitas incertezas, medos e ansiedades. Estudos apontam para uma "seqüela psicológica", a qual pode ser mais grave que a própria deformidade deixada pela mastectomia(6). Portanto, sistematizar o conhecimento produzido acerca do cuidado destas mulheres pode contribuir para a instrumentalização de profissionais que atuam nessa área.

O câncer de mama é provavelmente o mais temido pelas mulheres, devido à sua alta freqüência e, sobretudo, pelos seus efeitos psicológicos. A sociedade atribui uma importância fundamental às mamas femininas e, nos últimos tempos, isso vem estimulando a vaidade da mulher, como forma de valorizar sua beleza, visto que as normas sociais parecem determinar que a mulher necessita ter mamas belas e cabelos longos para a construção da sua feminilidade(7).

Cada vez que lemos ou ouvimos falar sobre o problema do câncer de mama, vivenciamos uma mistura de sentimentos e emoções, principalmente, se o fato está ligado a pessoas famosas em nosso meio ou a alguém próximo de nós (8). A transformação causada pelo câncer pode ser dolorosa, pois corrói tecidos, mas, principalmente, corrompe valores e crenças, carregando ainda consigo preconceito, discriminação e solidão(5,8).

A mastectomia é um dos tratamentos prováveis para a maioria das mulheres com câncer de mama. Ao submeter-se à retirada da mama ou parte dela, certamente, a mulher estará passando por uma grande mudança, vivenciando, assim, um comprometimento físico, emocional e social(9). A cirurgia e sua associação a outros tratamentos para o câncer podem interromper os hábitos de vida da mulher, provocando alterações nas suas relações familiares e sociais, quase sempre provenientes, também, de sentimentos de impotência e de frustração sobre algo que foge ao seu controle, como o próprio temor da doença(10,11).

Nesse sentido, os profissionais da saúde, sobretudo os de enfermagem, precisam investir esforços na prevenção do câncer de mama, orientando e auxiliando a mulher na realização do auto-exame das mamas, bem como, quando se dá a descoberta do nódulo e durante todo o tratamento, oferecendo-lhe assistência e apoio. Tal assistência requer estar voltada não apenas ao cuidado físico, mas, principalmente, para o cuidado emocional e cultural da mulher, buscando, assim, reduzir sua ansiedade e oferecer maior segurança e conforto, tendo em vista que cada mulher é um ser com sentimentos, costumes e vontades diferentes(12,13).

Assim, tivemos como objetivo geral conhecer a produção cientifica da enfermagem brasileira, a partir de 1990, acerca do cuidado à mulher mastectomizada, e, como objetivos específicos, conhecer as dificuldades e os sentimentos enfrentados pela mulher mastectomizada e conhecer como os profissionais de saúde, especificamente os de enfermagem, vêm construindo estratégias para melhor cuidá-la.

2. CAMINHO METODOLÓGICO

Para realizar este estudo, foi utilizado o método de pesquisa bibliográfica, o qual consiste no exame da bibliografia, para o levantamento e análise do que já foi produzido sobre o assunto que assumimos como tema de pesquisa científica(14). Tal método foi realizado em duas fases: a coleta de fontes bibliográficas, na qual foi feito o levantamento da bibliografia existente e, logo após, a coleta de informações, na qual foi realizado o levantamento dos dados, fatos e informações contidas na bibliografia selecionada.

Para o levantamento da bibliografia, foram selecionados artigos publicados em periódicos nacionais, a partir de 1990, devido ao aumento na taxa de mortalidade por câncer de mama, entre os anos de 1979 e 2000. Logo, buscamos a bibliografia dos últimos dez anos desse período e dos cinco anos subseqüentes, ou seja, de 1990 a 2004, verificando se as estratégias de cuidado estão sendo efetivas para diminuir a mortalidade por câncer de mama(12). A busca pelos textos foi realizada a partir das seguintes palavras-chave: mulher, câncer de mama, sentimentos, mastectomia, cuidado, de forma predominantemente manual e na base de dados Scielo.

A partir do proposto por Salvador(15), foi feita uma leitura exploratória, verificando se existiam ou não informações a respeito do tema proposto e de acordo com os objetivos do estudo. Nessa leitura, foram selecionados 23 artigos. Logo após, foi realizada uma leitura seletiva, a partir da qual foi determinado o material que seria utilizado na pesquisa, selecionando as informações pertinentes de acordo, novamente, com os objetivos do estudo. Nessa fase, foram selecionados 17 dos 23 artigos que abordavam o tema da pesquisa.

Dos artigos selecionados, foi realizada uma leitura crítica, com a necessária imparcialidade e objetividade, buscando respostas aos objetivos da pesquisa e, em seguida, uma leitura interpretativa, na qual foram relacionadas as informações e idéias dos autores com os problemas para os quais se buscavam soluções. Após a realização das leituras, foi elaborado um texto de análise dos dados apresentado a seguir, a partir dos objetivos propostos, configurando-se como: Sentimentos que o câncer de mama desperta na mulher; Dificuldades pós mastectomia; Estratégias de cuidado à mulher mastectomizada.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

3. 1 Sentimentos que o Câncer de Mama desperta na mulher

O câncer de mama é visto pela mulher como uma doença ameaçadora, devastadora, horrível, apavorante, perigosa, triste, preocupante e incontrolável. Ao ser diagnosticado, causa um inquestionável impacto tanto físico quanto emocional para a mulher. Isso, talvez, porque é cultural que a mulher precisa ter mamas saudáveis e que qualquer anormalidade poderá ser um fator de discriminação e de sua desvalorização(7,16).

Dentre os tratamentos mais comuns para o câncer de mama, está a mastectomia, a qual desperta uma diversificada gama de sentimentos. Assim, ao enfrentá-la, a mulher percebe e tem sua integridade ameaçada e vivencia períodos de tensão e de incertezas, que se manifestam desde a identificação de um nódulo ao diagnóstico do câncer de mama e indicação de cirurgia para a realização de uma possível mastectomia(10).

Os sentimentos que mais comumente são despertados em uma mulher ao ser mastectomizada são o medo, a rejeição, a culpa e a perda(7,16). O medo parece resultar de várias preocupações, mas o mais marcante parece ser o medo da morte. Outro medo que a mulher expressa, ao ser mastectomizada, é o da rejeição social. Esse medo parece fazer com que a própria mulher rejeite seu corpo, logo após a mastectomia(16).

A perda da mama pode levar ao sentimento de mutilação ou até mesmo de castração, significando a perda da feminilidade; é como se as mulheres estivessem perdendo um ente querido. Diante de tal perda, muitas vezes, sentem-se culpadas, atribuindo o aparecimento do câncer ao estilo de vida que levavam e à influência do meio cultural em que se inserem, tais como: hábitos alimentares, falta de cuidado com o corpo, estresse, herança familiar, repressão de sentimentos e trauma físico(3,7,16).

Na visão de um grupo de mulheres mastectomizadas, os hábitos alimentares representam uma das causas do aparecimento do câncer de mama, já que associam a ingestão de comidas gordurosas e alimentos contaminados por agrotóxicos e hormônios ao aparecimento de doenças como o câncer. Outro agente causador do câncer de mama, segundo elas, é a falta de cuidado com o próprio corpo, ou seja, as mulheres culpam-se por não terem adotado medidas preventivas.

A presença do estresse associada à herança familiar é, também, na concepção dessas mulheres, um contribuinte para o surgimento do câncer de mama, assim como a preocupação com a família e a repressão de sentimentos. Grande parte das portadoras de câncer de mama reconhecem que não tem o hábito de expressar seus sentimentos, de desabafar, preocupando-se apenas com o marido e os filhos, esquecendo-se de si mesmas. Outras, ainda, associam o aparecimento do câncer a algum trauma físico vivenciado previamente(3).

Assim, percebemos que é inquestionável a diversidade de sentimentos em uma mulher que descobre o câncer de mama e que enfrentará uma mastectomia. Sentimentos como o medo, a insegurança, a culpa, dentre outros, muito possivelmente irão surgir e, cabe a nós, profissionais da saúde, estarmos preparados e sensíveis para reconhecê-los, de modo a ajudá-la a enfrentar sua realidade da maneira mais corajosa possível.

3.2 Dificuldades Pós-Matectomia

Muitas são as dificuldades enfrentadas pela mulher após a mastectomia, responsáveis, especialmente, pelo comprometimento da sua auto-imagem, decorrentes tanto da própria cirurgia e dos efeitos colaterais da quimioterapia adjuvante como do preconceito e da dor e das dificuldades físicas que acarreta. A análise desse material permitiu evidenciar a importância do trabalho da enfermagem nas vivências de cuidado da mulher mastectomizada, para amenizar essas dificuldades e fortalecê-la para o seu enfrentamento, de maneira menos traumática.

3.2.1 O comprometimento da auto-imagem

A primeira grande dificuldade a ser enfrentada pelas mulheres, após uma mastectomia, é sua própria aceitação, como de olhar-se no espelho e aceitar que seu corpo está diferente, sem uma parte, que culturalmente representa a feminilidade. A identificação da mutilação se dá pela percepção da assimetria do corpo e pela visibilidade da cirurgia, o que para muitas, é um momento agressivo à sua auto-imagem(9).

Para algumas mulheres, a mastectomia destrói a imagem corporal de maneira abrupta. Diante disso, muitas vezes, a preocupação maior é com a mutilação, já que a mama é um órgão que representa a maternidade, a estética e a sexualidade femininas, do que com a própria doença, já que a sociedade ainda parece impor que a morte é fato consumado para portadores de câncer. Para outras, a incorporação da modificação corporal se dá de forma contínua e gradativa e a imagem corporal e a auto-estima são construídas pelas experiências acumuladas ao longo da vida, o que demonstra a necessidade de um tempo para assimilar sua nova imagem corporal(5,9).

Após a realização da mastectomia, a mulher comumente encontra-se em um estado de fragilidade emocional e é justamente nesse momento que ela se depara com dificuldades que precisarão ser superadas para que possa viver o mais próximo possível do que possa reconhecer como normalidade(7).

3.2.2 O enfrentamento dos efeitos colaterais da quimioterapia

É cada vez mais comum a indicação de quimioterapia antineoplásica para o câncer de mama, por ser considerado uma doença sistêmica(7). A quimioterapia, então, principalmente por seus efeitos colaterais, é uma outra dificuldade que muitas mulheres mastectomizadas precisam enfrentar. A quimioterapia associada à mastectomia potencializa a possibilidade de sobrevida da mulher, porém pode comprometer sua qualidade de vida, uma vez que ela se sente amedrontada, abalada e insegura, diante da vivência de efeitos colaterais, os quais geralmente são agressivos tanto no plano físico quanto no psicológico(7,17).

Para algumas mulheres mastectomizadas, a alopécia, um dos efeitos colaterais do tratamento quimioterápico, pode trazer maior sofrimento do que a própria mastectomia já que, no contexto social, a perda do cabelo mostra o diferente, o não belo, a pessoa inquestionavelmente adoecida, reforçando o sentimento de compaixão sentido pelos outros e pela própria mulher(7), pois é cultural que o gênero feminino exiba cabelos longos e bonitos, fato que dificulta a aceitação da alopécia tanto pela mulher quanto pela sociedade.

Nesse sentido, os profissionais de saúde podem preparar a mulher para o tratamento quimioterápico e para o enfrentamento de seus efeitos colaterais, sobretudo a alopécia. Atualmente, é possível fazer perucas com o próprio cabelo, mas, para isso, a mulher precisa ser informada do tratamento quimioterápico e dessa possibilidade, antes da realização da mastectomia, para que possa se preparar antecipadamente para a perda do cabelo e possíveis cuidados. Além disso, é necessário reforçar constantemente que, após o tratamento, o cabelo retorna naturalmente(7).

É importante ressaltar que, além dos efeitos colaterais associados à quimioterapia, muitas mulheres encontram ainda outras dificuldades para sua realização. Mulheres desfavorecidas economicamente precisam enfrentar a burocracia para receber o tratamento adequado. Muitas vezes, faltam recursos para o transporte até o local do tratamento, o que se constitui em fator agravante para a situação de saúde em que se encontram.

3.2.3 O enfrentamento de preconceitos

O câncer de mama desperta diferentes reações e sentimentos nas pessoas, pois, culturalmente, é uma doença marcante que pode levar à morte, podendo amedrontar aqueles que se deparam com uma portadora dessa doença, possivelmente, explicando o afastamento das pessoas, como expressão da dificuldade de lidarem com uma situação de doença ameaçadora à vida(5,11).

O preconceito social é motivo de constrangimento para as mulheres mastectomizadas, dificultando, ainda mais, o enfrentamento desta vivência. Para elas, o conhecimento dos outros sobre seu diagnóstico atua como símbolo do estigma da doença, associado, ainda, à iminência da morte(11).

O preconceito enfrentado pelas mulheres mastectomizadas contribui para que elas sejam preconceituosas em relação ao seu próprio corpo, o que leva a outra dificuldade a ser enfrentada no pós-operatório: o retorno à vida sexual. A maioria delas tem vergonha de mostrar-se nua na frente de seus parceiros, pois a sensação é de que, na situação em que se encontram, são menos mulheres, preferindo, então, manter relações sexuais com um sutiã ou mesmo com uma camiseta(5,18).

É importante lembrar que alguns parceiros de mulheres mastectomizadas lhes dão apoio, não manifestando desconforto com a falta da mama, mesmo nas relações sexuais. Entretanto, alguns se afastam das mulheres, a partir do diagnóstico do câncer de mama, daí a insegurança que muitas delas sentem em relação ao seu presente e futuro com seus parceiros. Tal situação faz com que muitas mulheres, às vezes, ainda que com medo, optem pela reconstrução imediata da mama, seja para a simples satisfação do cônjuge, seja para evitar o olhar preconceituoso da sociedade, seja para reconhecer novamente sua feminilidade(19).

3.2.4 O enfrentamento da dor e das dificuldades físicas

A descoberta da necessidade de uma mastectomia é, geralmente, uma surpresa para a mulher, tanto que ela comumente não tem tempo de se preparar para enfrentar a situação. O preparo pré-operatório, tendo em vista a especificidade dessa doença e seus efeitos psicológicos, comumente, é bastante precário e a mulher vai para o centro cirúrgico sem saber o que irá acontecer consigo, se será retirado apenas o nódulo, uma área maior ou toda a sua mama; se precisará de tratamento posterior e quais cuidados precisará ter, ou seja, ela enfrenta a mastectomia sem o preparo bio-psico-sócio-espiritual necessário, que é fundamental para a diminuição de suas preocupações(5).

Assim, a falta de preparo para o enfrentamento da mastectomia contribui para o agravamento das dificuldades emocionais e sociais e, além dessas, ao sair do centro cirúrgico, ela precisa enfrentar, ainda, dificuldades físicas como a dor e as limitações decorrentes da própria cirurgia(20). A informação da mulher sobre seu diagnóstico e mastectomia, associada ao exercício do seu direito de participação na escolha do tratamento, é uma estratégia que vem reduzindo o grau de sua ansiedade, antes do enfrentamento do próprio procedimento(21,22).

Logo após uma mastectomia, a mulher tem algumas limitações e a necessidade de realizar exercícios com o membro superior homolateral à mama mastectomizada e, se esses cuidados não forem realizados corretamente, poderá surgir edema de braço ou linfedema, o que pode representar mais um incômodo físico e emocional para ela, já que lhe causa dano estético, vindo a ser foco de atenção e curiosidade de outras pessoas, além de provocar prejuízo funcional do membro afetado(20).

Linfedema e dor podem aumentar as dificuldades na realização das tarefas rotineiras da mulher, o que pode contribuir para o agravamento de uma outra dificuldade pós mastectomia: ter que permanecer em casa, que contribui para o aumento da ansiedade e do sentimento de solidão, dificultando o tratamento. Quando ocorre o linfedema pós mastectomia, a mulher requer um tempo maior para retomar plenamente a realização de suas atividades diárias, seja no trabalho ou em casa. Além disso, muitas vezes, é necessário que ela mude seu estilo de roupas, podendo trazer perda do interesse com sua aparência e comprometimento ainda maior da sua auto-estima, prejudicando seu relacionamento interpessoal e sexual, podendo intensificar-se o desejo de morte(20,23).

3.3 Estratégias de cuidado à mulher mastectomizada

O cuidado de enfermagem à mulher necessita iniciar-se antes mesmo do aparecimento do câncer de mama, quando são promovidas atividades de promoção da saúde, prevenção, cura e reabilitação de doenças; na realização de consultas ginecológicas e no incentivo ao auto-exame. Ao ser diagnosticado o câncer de mama e a necessidade de uma mastectomia, o trabalho da enfermagem é muito mais de incentivo e de suporte emocional para a mulher e sua família do que propriamente curativo. Entretanto, percebe-se que pouco tem sido produzido a respeito das estratégias de cuidado adotadas pela enfermagem à mulher mastectomizada, as quais, sem dúvida alguma, contribuem para o sucesso do tratamento.

A principal estratégia de cuidado são as atividades grupais, com as quais se busca promover a auto-estima da mulher, contribuindo para sua qualidade de vida. Os grupos de apoio são uma estratégia inovadora que vem sendo construída e aprimorada a cada dia, sendo constituídos por uma equipe multiprofissional (enfermeiro, psicólogo, terapeuta ocupacional, etc) que planeja atividades, visando a promoção e reabilitação da saúde(13).

Nesses grupos, cada encontro tem um momento de educação em saúde, no qual são abordados assuntos que ofereçam informações clínicas sobre o câncer de mama e a mastectomia; espaço esse em que também se reforça a importância do auto-exame para a prevenção do câncer e de sua reincidência. Num outro momento, é trabalhada a reabilitação da mulher mastectomizada, realizando-se exercícios para o membro homolateral à mama afetada. Durante o encontro, também, são promovidas trocas de experiências entre as participantes, o que facilita o enfrentamento da situação de saúde-doença de cada uma e, por fim, são realizados exercícios de relaxamento e lazer(4).

Logo, se percebe que, nos grupos, a mulher é estimulada ao auto-cuidado; à troca de experiências; à realização de exercícios físicos e de reabilitação, tendo a oportunidade de expressar e, possivelmente, de sanar suas dúvidas com os profissionais que promovem palestras e oficinas, de acordo com os interesses do grande grupo(13). As mulheres compartilham suas experiências, percebendo que não estão sozinhas no enfrentamento do câncer de mama; falam da doença e da mastectomia sem medo da rejeição e do preconceito, surgindo daí, muitas vezes, verdadeiras amizades(24).

As ações de enfermagem têm fundamental importância nas atividades grupais com as mulheres mastectomizadas, no sentido de minimizar os conflitos identificados, incentivando o auto-cuidado e valorizando cada participante como um ser único, com seus medos e dúvidas. Assim, essa estratégia está apresentando resultados positivos, uma vez que as mulheres, nos grupos, são mais aceitas e fortemente estimuladas a enfrentarem as dificuldades do período pós-mastectomia, contribuindo para uma melhor qualidade de vida(24).

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por meio dessa pesquisa bibliográfica, foi percebido que a mulher, ao descobrir o câncer de mama e ao enfrentar uma mastectomia, apresenta uma mescla de sentimentos e emoções, tais como: o medo, a rejeição, a culpa e a perda, os quais, muitas vezes, podem não ser percebidos e valorizados pela equipe de enfermagem que trabalha com essas mulheres, ou por seus familiares, dificultando a realização do tratamento e o enfrentamento das vivências presentes.

Foram identificadas inúmeras dificuldades enfrentadas pela mulher após a mastectomia, tais como o comprometimento da sua auto-imagem; os efeitos colaterais da quimioterapia adjuvante, destacando-se a alopécia; o preconceito; a dor e as dificuldades físicas, mostrando que o trabalho da enfermagem é de extrema importância para que essas vivências sejam amenizadas e enfrentadas da maneira menos traumática possível.

Não se tem como negar que o aumento da sobrevida de portadoras de câncer de mama é, hoje, uma realidade. Porém, ainda amedronta muitas mulheres, pois as constantes revisões a que ficam submetidas para avaliar a progressão da doença deixam-nas extremamente ansiosas, com dúvidas e incertezas sobre uma possível recorrência. Assim, o despertar de sentimentos de desesperança, revolta e desamparo e a sensação da proximidade da morte podem gerar acomodação e indiferença e algumas mulheres podem não desejar mais viver e desistir de lutar contra o câncer. Tal situação precisa levar os profissionais da saúde a buscar estratégias que maximizem as vivências de cuidados oferecidos, contribuindo para uma melhor qualidade de vida a essas mulheres(5,12).

Entretanto, pouco tem sido produzido a respeito das estratégias de cuidado adotadas pela enfermagem para o trabalho com a mulher mastectomizada, destacando-se as atividades grupais como a principal estratégia identificada. Na caracterização dos grupos, foi encontrado que existe um momento de educação em saúde, quando são abordados temas que oferecem informações clínicas sobre a doença. Contudo, compreendemos que os demais momentos apresentados na caracterização destes grupos também constituem espaços de educação em saúde (exercícios de reabilitação, troca de experiências e exercícios de relaxamento).

Pouco foi encontrado a respeito do trabalho realizado pela enfermagem no preparo dos parceiros sexuais dessas mulheres para o enfrentamento desta situação junto a elas, sem abandoná-las. Outra lacuna bibliográfica encontrada durante a realização desse estudo e que pode vir a ser objeto de novos estudos refere-se ao processo de reconstrução da mama, com a necessidade de respostas a algumas questões, tais como: Quando a mulher decide reconstruir sua mama? O que interfere nessa decisão? Qual a influência do parceiro sexual nessa decisão?

Diante do vivido pela mulher mastectomizada, a qual pode enfrentar, além do mal-estar físico, o drama psicológico e emocional de padecer dessa doença, a enfermagem, principalmente a enfermeira, tem uma importante missão, pois enfrenta o desafio, no cuidado prestado, de buscar minimizar o sofrimento da mulher. Seu trabalho requer valorizá-la e estimulá-la a transformar seu medo em força de sobrevivência, favorecendo sua adesão e participação no decorrer do tratamento, para obter maior sucesso. Assim, o cuidado à mulher mastectomizada é um desafio para a equipe de enfermagem, uma vez que sua sensibilidade, as ameaças à sua auto-estima, à sua sexualidade e à sua vida necessitam ser consideradas e valorizadas, pelos profissionais, durante todo o tratamento.

Portanto, a enfermagem necessita traçar um plano de cuidados à mulher, que ofereça suporte informativo com relação ao câncer, aos tratamentos recomendados e cuidados com o membro correspondente à mama afetada e que proporcione maior tranqüilidade e conforto; estimule a expressão de sentimentos e pensamentos aos outros; a ajude na construção de alternativas viáveis para minimizar a alteração na imagem corporal; a incentive na execução de atividades ocupacionais que reduzam a tensão emocional e encorajem a sua participação em grupos de auto-ajuda (25).

Submissão: 13/04/2006

Aprovação: 24/08/2006

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    31 Mar 2008
  • Data do Fascículo
    Dez 2006

Histórico

  • Aceito
    24 Ago 2006
  • Recebido
    13 Abr 2006
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