Determinantes sociais de saúde e vulnerabilidades às infecções sexualmente transmissíveis em adolescentes

RESUMO

Objetivo:

Verificar a associação entre os determinantes sociais de saúde e a vulnerabilidade dos adolescentes às Infecções Sexualmente Transmissíveis (ISTs).

Método:

Estudo transversal, realizado com 287 escolares de 11 a 17 anos, na periferia de Fortaleza, Ceará, Brasil, de agosto a setembro de 2016. Foram utilizados dois instrumentos, um destinado aos determinantes sociais de saúde e o outro à investigação da vulnerabilidade às ISTs. A magnitude das associações foi expressa através da razão de chances e intervalo de confiança, considerando-se nível de significância de 5%. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética da Universidade Federal do Ceará.

Resultados:

212 (73,9%) adolescentes foram considerados mais vulneráveis, com uma pontuação ≥ 4 escores. O determinante social intermediário “moradia (casa própria)” obteve associação significativa com a vulnerabilidade às ISTs (p de 0,022; IC 1,1 a 3,3; OR 1,9).

Conclusão:

O determinante social intermediário “tipo de moradia” influencia na vulnerabilidade às ISTs.

Descritores:
Adolescente; Determinantes Sociais de Saúde; Sexualidade; Vulnerabilidade em Saúde; Serviços de Enfermagem Escolar

ABSTRACT

Objective:

To verify the association between social determinants of health and the vulnerability of adolescents to Sexually Transmitted Infections (STIs).

Method:

Cross-sectional study, performed with 287 students aged 11 to 17 years, in the outskirts of Fortaleza, Ceará, Brazil, from August do September 2016. Two instruments were used, one destined to social determinants of health and another to investigating the vulnerability to STIs. The magnitude of associations was expressed through odds ratio and interval of confidence, considering a 5% significance level. This research was approved by the Research Ethics Committee of the Federal University of Ceará.

Results:

212 (73.9%) adolescents were considered more vulnerable, with a score ≥ 4. The intermediate social determinant “housing (home ownership)” obtained significant association with with the vulnerability to STIs (p of 0.022; CI 1.1 to 3.3; OR 1.9).

Conclusion:

The intermediate social determinant “type of housing” influences the vulnerability to STAs.

Descriptors:
Adolescent; Social Determinants of Health; Sexuality; Vulnerable Populations; School Nursing

RESUMEN

Objetivo:

Comprobar si hay una asociación entre los determinantes sociales de la salud y la vulnerabilidad de los adolescentes a las Infecciones Sexualmente Transmisibles (IST).

Método:

Estudio transversal, realizado de agosto a septiembre de 2016 con 287 estudiantes de 11 a 17 años, en la periferia de Fortaleza, Ceará, Brasil. Se utilizaron dos instrumentos: el primer estaba destinado a los determinantes sociales de la salud y segundo al estudio de la vulnerabilidad a las IST. La magnitud de las asociaciones se calculó mediante la razón de posibilidades e intervalo de confianza, considerando el nivel de significancia del 5%. La investigación fue aprobada por el Comité de Ética de la Universidad Federal de Ceará.

Resultados:

Se consideraron más vulnerables a 212 (un 73,9%) adolescentes, con una calificación ≥ 4 puntuaciones. El determinante social intermedio “vivienda (casa propia)” obtuvo una asociación significativa con la vulnerabilidad a las IST (p de 0,022; IC 1,1 a 3,3; OR 1,9).

Conclusión:

El determinante social intermedio “tipo de vivienda” influye en la vulnerabilidad a las IST.

Descriptores:
Adolescente; Determinantes Sociales de la Salud; Sexualidad; Vulnerabilidad en Salud; Servicios de Enfermería Escolar

INTRODUÇÃO

A adolescência é um período de transição para a vida adulta que consiste em muitas mudanças, tanto a nível biológico quanto cognitivo, emocional e social, com a adoção de novas práticas e comportamentos. Tais mudanças trazem uma condição intrínseca que torna os adolescentes suscetíveis a diversas situações de vulnerabilidade⁽¹⁾.

A relação sexual aumenta significativamente a vulnerabilidade às Infecções Sexualmente Transmissíveis (ISTs) na adolescência, sendo essa prevalência de 7,4% em adolescentes do sexo masculino e 7,5% do sexo feminino, nos períodos de 2007 a 2013 na Coreia do Sul, país considerado desenvolvido em relação ao Brasil⁽²⁾.

Atualmente, o Brasil compreende mais de 40% das novas infecções por ISTs, sendo os adolescentes e jovens de 15 a 19 anos os mais acometidos, correspondendo a um aumento de 53%, comparado ao período de 2004 a 2013⁽³⁾.

A “vulnerabilidade” e o “ser vulnerável” arraiga concepções de uma maior suscetibilidade do indivíduo em relação aos danos e aos agravos à saúde⁽⁴⁾. As vulnerabilidades associadas aos determinantes sociais de saúde podem pôr em risco a saúde dos adolescentes. Assim, alguns dados, como nível de escolaridade, cor/etnia, condições socioeconômicas, estrutura familiar, grupos sociais e questões de gênero, podem influenciar significativamente o início precoce da vida sexual em adolescentes, tornando-os suscetíveis às ISTs^(5-7).

O início precoce das relações sexuais expõe os adolescentes a um longo período de atividade sexual e maior número de parceiros⁽⁸⁾. Em uma cidade do Sul do Brasil, a exemplo, adolescentes do sexo masculino com a primeira relação até os 14 anos referem uma maior quantidade de parceiros, enquanto 30% das adolescentes do sexo feminino na mesma faixa etária não haviam feito uso de métodos contraceptivos e 17,9% não haviam utilizado preservativo durante a última relação sexual⁽⁹⁾. Esse início precoce sujeita o adolescente a um comportamento de risco, como o não uso do preservativo, gerando desfechos indesejados como as ISTs e uma gravidez não planejada⁽¹⁰⁾.

Os Determinantes Sociais de Saúde (DSS), por sua vez, são um conjunto de fatores que caracterizam as particularidades dos indivíduos e refletem sua inserção no tempo-espaço. Eles constituem uma rede complexa de fatores que ameaçam, promovem ou protegem a saúde. Esses fatores se inter-relacionam e condicionam o processo saúde-doença na especificidade do indivíduo e na abrangência do modo de vida coletivo. Estes podem ser agrupados em categorias ou camadas, o que facilita a seleção de intervenções adequadas e a formulação de políticas de saúde⁽¹¹⁾.

As camadas estão dispostas de maneira hierárquica, em que os determinantes individuais ficam na camada mais próxima e que se referem às características intrínsecas ao sujeito, como sexo, idade, fatores genéticos, dentre outros. A segunda camada corresponde ao comportamento e ao estilo de vida. A terceira camada, às redes sociais e comunitárias as quais o indivíduo dispõe. A quarta camada, aos fatores relacionados às condições de vida e de trabalho. E a quinta e última camada contém os macrodeterminantes com as condições estruturais do ambiente no qual o indivíduo se insere, como características socioeconômicas, culturais e de desenvolvimento⁽¹¹⁾.

Os DSS relacionam-se ainda aos fatores sociais, econômicos, culturais, étnicos/raciais, psicológicos e comportamentais que influenciam a ocorrência de problemas de saúde e seus fatores de risco na população⁽¹²⁾.

Assim, considerando a adolescência um período de maior vulnerabilidade às mudanças no ciclo de vida, infere-se que os subsídios dessa investigação auxiliem o enfermeiro em ações eficazes, tendo por base a identificação de determinantes de saúde que possam potencializar a vulnerabilidade às ISTs na adolescência.

OBJETIVO

Verificar a associação entre os determinantes sociais de saúde e a vulnerabilidade dos adolescentes às ISTs, tendo como referencial teórico o Modelo de Determinação Social de Saúde (MDSS).

MÉTODO

Aspectos éticos

A pesquisa seguiu as observâncias éticas, de acordo com a Resolução nº 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde e foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Ceará (UFC).

Desenho, local e período

Trata-se de um estudo transversal que avaliou a vulnerabilidade às ISTs em adolescentes de uma escola pública localizada em um bairro com baixo Índice de Desenvolvimento Humano com renda média de R$ 349,75, ocupando a 15ª posição no ranking da população extremamente pobre da rede municipal de Fortaleza, no Ceará⁽¹³⁾, no período de agosto a outubro de 2016.

População e amostra: critérios de inclusão e exclusão

A população do estudo foi constituída por 546 adolescentes. A composição amostral foi de 297, com uma perda de 3,4%, ficando assim a amostra intencional de 287 escolares.

Os critérios de elegibilidade foram: faixa etária de 11 a 17 anos, que compreende as subfases do período da adolescência: adolescência inicial (de 11 a 14 anos) e adolescência média (15 a 17 anos)⁽¹⁴⁾; e estar cursando o ensino fundamental. Aqueles com problemas cognitivos, que os impossibilitavam de responder aos instrumentos adequadamente, foram excluídos.

Protocolo do estudo

A coleta de dados ocorreu por meio do uso de dois instrumentos autoaplicáveis, com duração média de 45 minutos, em sala reservada, nos turnos manhã e tarde, garantindo-se a privacidade do adolescente. O primeiro instrumento é um questionário composto pelos determinantes sociais de saúde, sendo os determinantes individuais: idade, sexo, cor/etnia; determinantes proximais: religião, status de relacionamento, influência das redes sociais, número de pessoas no domicílio; e determinantes intermediários: escolaridade, moradia e renda familiar.

O segundo instrumento é um questionário que faz parte do Programa Saúde e Prevenção nas Escolas do Ministério da Saúde⁽¹⁵⁾ e tem como objetivo avaliar a vulnerabilidade às ISTs/HIV/aids. É composto por 11 questões de múltipla escolha e respostas divididas em cores. Foi realizada uma adaptação no instrumento com relação à atribuição das respostas em que, ao invés de cores, optou-se por enumerá-las de 0 a 2, sendo 0 para respostas verdes, 1 para respostas amarelas e 2 para respostas azuis, com vista a otimizar a quantificação dos resultados, podendo a soma das respostas variar de 0 a 22 pontos. Utilizou-se como ponto de corte a pontuação 4, em que os sujeitos cujo escore total foi inferior a 4 (escore < 4) foram considerados menos vulneráveis, e aqueles cujo escore total foi superior ou igual 4 (escore ≥ 4), mais vulneráveis. Após a adaptação, o questionário foi validado por dois experts da área e posteriormente testado previamente em adolescentes não incluídos na amostra.

Ressalta-se que o Programa Saúde e Prevenção nas Escolas é uma das ações do Programa Saúde na Escola, que tem como finalidade desenvolver ações de promoção da saúde sexual e reprodutiva de adolescentes e jovens, articulando os setores de saúde e educação para reduzir as ISTs/HIV/aids e os índices de evasão escolar causados pela gravidez na adolescência na população de 10 a 24 anos⁽¹⁶⁾.

Análise dos resultados e estatística

Os dados foram analisados por meio do software IBM SPSS (versão 23). Foram calculadas frequências absoluta e relativa para variáveis qualitativas, bem como média e desvio padrão para quantitativas, e o teste qui-quadrado foi utilizado para verificar o nível de associação entre as variáveis. A magnitude das associações foi expressa por meio da razão de chances e respectivos intervalos de confiança. Para todos os procedimentos inferenciais utilizados, foi adotado um nível de significância de 5%, considerando estatisticamente significante p<0,05.

RESULTADOS

A amostra foi constituída por 287 adolescentes, sendo 191 (66,6%) do sexo masculino, 163 (58,8%) entre 15 e 17 anos, 80 (27,9%) de cor branca, 178 (38%) com mais de 12 anos de estudo, 271 (94,4%) praticante de alguma religião, 175 (61%) namorando ou em união estável, 159 (55,4%) residindo em casa alugada, 234 (81,6%) morando com duas a cinco pessoas, e 87 (30,3%) com uma renda de até dois salários mínimos.

Os adolescentes foram avaliados quanto à presença de vulnerabilidade às ISTs, sendo 212 (73,9%) adolescentes considerados mais vulneráveis, com uma pontuação ≥ 4 escores (Tabela 1).

Tabela 1
Classificação dos adolescentes quanto à vulnerabilidade às IST/HIV/aids, Fortaleza, Ceará, Brasil, 2017

	n	%
Mais vulneráveis (≥ 4 escores)	212	73,9
Menos vulneráveis (< 4 escores)	75	26,1
Total	287	100

A Tabela 2 apresenta os resultados das análises univariadas entre as características dos adolescentes e a vulnerabilidade às ISTs. Houve associação estatisticamente significante em relação aos determinantes intermediários quanto à moradia. Observou-se que, dos adolescentes que residem em casa própria, 103 (80,5%) são mais vulneráveis às ISTs, enquanto dos que residem em casa alugada, 109 (68,6%) são menos vulneráveis, considerando o valor p de 0,022; IC entre 1,1 a 3,3; e OR 1,9.

Tabela 2
Análise dos determinantes sociais em relação à vulnerabilidade às infecções sexualmente transmissíveis, Fortaleza, Ceará, Brasil, 2017

Determinantes Sociais de Saúde	Vulnerabilidades às ISTs				Valor de p	OR (IC95%)
	Sim		Não
	n	%	n	%
Individuais
Sexo					0,244
Masculino	137	71,7	54	28,3		1,4 (0,8-2,5)
Feminino	75	78,1	21	21,9		1
Faixa etária					0,143
11 a 14	97	78,2	27	21,8		1,5 (0,9 -2,6)
15 a 17	115	70,6	48	29,4		1
Cor/etnia					0,354
Branca	56	70	24	30		1
Não branca	156	75,4	51	24,6		1,3 (0,7-2,3)
Proximais
Religião					0,916
Sim	200	73,8	71	26,2		1
Não	12	75	4	25		1,1 (0,3-3,4)
Status de relacionamento					0,941
Com parceiro*	129	73,7	46	26,3		1
Sem parceiro	83	74,1	29	25,9		1 (0,6-1,8)
Influência das redes sociais
Nº de pessoas no domicílio					0,098
2 a 5	168	71,8	66	28,2		1
6 ou mais	40	83,3	8	16,7		2 (0,9-4,4)
Intermediários
Escolaridade					0,492
11 anos de estudo	83	76,1	26	23,9		1,2(0,7-2,1)
12 anos de estudo	129	72,5	49	27,5		1
Moradia					0,022
Casa própria	103	80,5	25	19,5		1,9 (1,1-3,3)
Casa alugada	109	68,6	50	31,4		1
Renda*					0,443
Até 2 salários mínimos	141	69,1	63	30,9		1
Mais de 2 salários mínimos	14	77,8	4	22,2		1,6 (0,5-4,9)

• Nota: *Salário mínimo de R$ 880,00 de acordo com o Decreto n0 8.618, vigência de 2016; *Foi considerado pertencente à categoria “com parceiro” adolescentes que encontravam-se namorando ou em união estável.

Apesar de não apresentar associação estatisticamente significante entre os demais determinantes sociais e a vulnerabilidade às ISTs, é importante salientar que, em relação à razão de chances e aos determinantes sociais de saúde, adolescentes do sexo masculino com faixa etária entre 11 e 14 anos e de cor não branca possuem 1,4, 1,5 e 1,3, respectivamente, mais chances de serem vulneráveis às ISTs. Quanto aos determinantes proximais, adolescentes sem religião têm 1,1 mais chances de vulnerabilidade às ISTs.

No que diz respeito à influência das redes sociais, os que residem com seis ou mais pessoas no domicílio têm 2,0 vezes mais chances de serem vulneráveis. Quanto aos determinantes intermediários, os adolescentes com 11 anos de estudos têm 1,2 mais chances de vulnerabilidade às ISTs, enquanto os que residem em casa própria têm 1,9 chances a mais de serem suscetíveis às ISTs, e os que sobrevivem com uma renda familiar de mais de dois salários mínimos têm 1,6 mais chances de vulnerabilidade.

DISCUSSÃO

Os determinantes sociais de saúde são importantes para o processo saúde-doença nos mais diferentes grupos populacionais, em que modelos teórico-conceituais vêm sendo utilizados para o entendimento de suas implicações⁽¹⁷⁾.

Nessa perspectiva, o modelo de Determinação Social ressalta os fatores relacionados à saúde da população, sendo este dividido em níveis interligados, que perpassam desde os determinantes individuais não modificáveis e inerentes aos indivíduos até os macrodeterminantes, como os fatores sociais, ambientais e culturais, em que a influência que um exerce sobre o outro determina a saúde do indivíduo. De acordo com esse modelo, os determinantes individuais (idade, sexo, fatores genéticos, entre outros) influenciam diretamente nas condições de saúde⁽¹¹⁾. Diante disso, no presente estudo verificou-se uma maior prevalência de adolescentes do sexo masculino e com menor faixa etária, de 11 a 14 anos, quanto à vulnerabilidade às ISTs.

Corroborando tais dados, em estudo desenvolvido com 4.325 adolescentes em Pelotas, no Sul do Brasil, identificou-se que a prevalência do início da prática sexual até os 14 anos de idade é de 18,6%, sendo a maior prevalência entre os adolescentes do sexo masculino (20,9%) de baixa escolaridade e baixo nível socioeconômico, com mães de baixa escolaridade, e que tiveram filhos durante a adolescência⁽⁹⁾.

Os adolescentes do sexo masculino tornam-se mais vulneráveis às infecções devido à exposição mais intensa a pessoas de seu convívio com as quais não possuem, necessariamente, um vínculo amoroso^(18-20). Além disso, a prática sexual precoce no adolescente pode estar associada a comportamentos característicos dessa etapa da vida, como a busca de identidade, a curiosidade, a descoberta do novo, sentimentos de prazer e onipotência^(21-22). Estes resultam da interação entre determinantes individuais, proximais e intermediários, como as condições familiares e de vida, baixas condições socioeconômicas, violência, uso de álcool, tabagismo e outras drogas que são fatores de exposição às vulnerabilidades sexuais nos adolescentes^(20-21).

Ademais, observa-se que o início da prática sexual antes dos 15 anos está diretamente associado a uma maior exposição a outras situações de risco em saúde, como uso experimental de álcool, de cigarro, de drogas ilícitas, episódio de embriaguez e briga, tanto para o sexo feminino como masculino. Mais da metade dos jovens que experienciaram a primeira relação sexual antes dos 15 anos, por exemplo, utilizaram algum tipo de droga ilícita⁽⁹⁾.

Os determinantes sociais intermediários, que correspondem às condições de vida e de trabalho, à moradia precária e às baixas condições socioeconômicas, são considerados fatores importantes de exposição às ISTs^(23-24).

Nesse estudo, houve associação estatisticamente significante quanto à moradia, apontando que os adolescentes que residem em casa própria têm a chance 1,9 vez maior de estar em situação de vulnerabilidade às ISTs do que os adolescentes que residem em casa alugada.

É importante salientar que, embora os adolescentes que residem em casa própria nesse estudo sejam mais vulneráveis que os que residem em casa alugada, ambos residem em um bairro considerado extremamente pobre pelo fator “Renda” do Índice de Desenvolvimento Humano⁽¹³⁾, o que é uma situação de vulnerabilidade às ISTs⁽²⁵⁾.

Observou-se que os adolescentes que residem com seis ou mais pessoas têm 2,0 vezes mais chances de serem vulneráveis e aqueles com uma renda familiar de mais de dois salários têm 1,6 chances de serem vulneráveis às ISTs, embora exista uma relação entre a renda baixa e a vulnerabilidade do indivíduo^(26-27).

Com relação à escolaridade, que diz respeito aos determinantes intermediários, os adolescentes com menos de doze anos de estudo apresentaram maiores chances de suscetibilidade às ISTs, como pode ser corroborado em um estudo na Coreia do Sul, em 2015, em que os adolescentes do sexo masculino que iniciaram sua vida sexual no quinto ano de estudo apresentaram uma chance 6,32 vezes maior de contrair uma IST em relação àqueles do décimo segundo ano. Por sua vez, as adolescentes que iniciaram sua vida sexual no quinto ano apresentaram uma chance 3,98 vezes maior de contrair uma IST em relação às meninas do décimo segundo ano de estudo⁽⁴⁾.

A sexualidade do indivíduo é um processo em constante formação desde seu nascimento. Não obstante, na adolescência esta pode ser influenciada por diversos meios, entre esses, a escola, a família, os amigos, os ambientes aos quais esse indivíduo pertence e seus vínculos, que desenvolvem papel singular para sua construção⁽²⁸⁾.

Destaca-se a escola como um ambiente favorável para o desenvolvimento do adolescente, com oportunidades para cuidar-se e expressar seus problemas e anseios, pois esse local é um ambiente propício para atividades que podem agregar as demandas advindas dos próprios adolescentes, facilitando as discussões e as intervenções educativas quanto à prevenção às ISTs⁽²⁹⁾.

Diversas políticas públicas recomendam a integração entre escola e atenção básica para atuar conjuntamente na questão da educação sexual e da prevenção de ISTs entre adolescentes. Vários estudos no Brasil^(30-31) e em Portugal⁽³²⁾ demonstram ainda que, embora a legislação já inclua o caráter transversal da educação sexual, esse tema permanece pontual nas atividades curriculares.

Dessa forma, é importante o planejamento de atividades de educação em saúde com essa população, a fim de diminuir os riscos no período da adolescência, uma vez que fatores como sexo masculino, pais separados e/ou liberais, baixo nível de escolaridade, influência de pares e morar em grandes zonas urbanas influenciam na vulnerabilidade às ISTs⁽³³⁾.

Quanto aos determinantes distais de saúde, por sua vez, localizados na quinta camada e compostos pelas condições estruturais do ambiente no qual o indivíduo se insere, como características socioeconômicas, culturais e de desenvolvimento, demonstram uma correlação com a quarta camada dos determinantes sociais de saúde, correspondentes às condições de trabalho e estilo de vida⁽¹¹⁾.

Evidências apontam que circunstâncias sociais e econômicas originam condições de vida e de trabalho desiguais, porque sujeitam o indivíduo a um acesso diferenciado à habitação, ao consumo de alimentos, à educação, dentre outros aspectos, influenciando na constituição da renda, no comportamento e nos estilos de vida, favorecendo a exposição a diferentes vulnerabilidades⁽¹⁹⁾.

Limitações do estudo

Dentre as limitações da pesquisa, destacam-se as questões práticas durante sua operacionalização, como a realização em apenas uma escola, a demora dos alunos retornarem com o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido devidamente assinado pelos pais e/ou responsáveis e a perda de participantes ao longo da coleta.

Além disso, salienta-se que, embora a renda maior que dois salários mínimos tenha sido associada a uma maior vulnerabilidade às ISTs, no presente estudo, a investigação da renda per capita não constou como parte da coleta de dados, o que, em um estudo mais aprofundado, poderia demonstrar diferentes associações.

Contribuição para a área da Enfermagem e saúde pública

Espera-se que os resultados desse estudo contribuam para a atuação dos profissionais de um modo geral com esse público, não de forma segregada, mas com uma atenção mais integrada com estratégias de educação em saúde tanto no ambiente escolar, como na unidade primária de saúde, fortalecendo e direcionando o plano de cuidados de forma estratégica, considerando as peculiaridades, resguardando seus direitos, preservando sua identidade e promovendo sua saúde, principalmente quanto aos determinantes sociais.

CONCLUSÃO

O determinante social intermediário “tipo de moradia” influenciou diretamente a vulnerabilidade às ISTs nos adolescentes do presente estudo. Esses determinantes mostram a influência que os indivíduos sofrem com as condições sociais, ambientais e financeiras desfavoráveis, o que pode ser evidenciado com os resultados do estudo pelos adolescentes que sobrevivem com uma renda familiar de até dois salários mínimos, além de outros determinantes sociais que estão diretamente relacionados ao comportamento dos próprios adolescentes frente ao pensamento de não se sentirem vulneráveis, visto que acreditam não estarem expostos às situações de risco.

Além disso, observou-se que, dentre os adolescentes mais vulneráveis às ISTs, houve uma maior prevalência do sexo masculino, com idades entre 11 e 14 anos, com até 11 anos de estudo, de cor não branca, com parceiro, o que implica na necessidade de um olhar integral, diferenciado e multiprofissional a esse público.

Ademais, tendo em vista as próprias limitações do estudo e por tratar da investigação de uma localidade específica, sugere-se a realização de outras investigações que mensurem mais amplamente como os determinantes sociais de saúde influenciam na vulnerabilidade às ISTs desses adolescentes, uma vez que o entendimento sobre as vulnerabilidades dos adolescentes e seus fatores determinantes é fundamental para o fortalecimento de programas e políticas públicas de cuidado integral à saúde desse público.

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  21 Out 2019
• Data do Fascículo
  Nov-Dec 2019

Histórico

• Recebido
  09 Set 2018
• Aceito
  04 Mar 2019