Open-access Gestão do cuidado no enfrentamento da COVID-19 em hospital de ensino

RESUMO

Objetivo:   relatar a experiência de implementação de estratégias de gestão do cuidado no enfrentamento à pandemia de COVID-19 em hospital de Ensino

Método:   trata-se de relato de experiência dos gestores que atuam no maior hospital público do Paraná, tendo como funções a Chefia de Divisão de Gestão do Cuidado, Chefia de Setor de Gestão das Linhas de Cuidado, Chefia da Unidade de Infectologia e equipe de apoio.

Resultados:   as estratégias de gestão do cuidado foram estruturadas a partir da dinâmica de atendimento, estrutura física, recursos humanos, segurança do profissional e do usuário.

Considerações finais:   a preparação para uma pandemia envolve medidas que incluem modificação de infraestrutura e processos, gerenciamento de funcionários e usuários, estratégias de prevenção de infecções e recomendações clínicas. Essas medidas são necessárias para otimizar a qualidade dos cuidados prestados aos usuários com COVID-19 e reduzir o risco de transmissão viral a outros usuários ou profissionais de saúde.

Descritores: Betacoronavirus; Infecções por Coronavirus; Assistência à Saúde; Administração de Serviços de Saúde; Gestão em Saúde

ABSTRACT

Objective:   to report the experience of implementing care management strategies in coping with the COVID-19 pandemic in a teaching hospital.

Method:   this is an experience report of the managers who work at the largest public hospital in Paraná with functions as Head of the Care Management Division, Head of the Care Lines Management Sector, Head of the Infectiology Unit and support team.

Results:   care management strategies were structured based on the service dynamics; physical structure; human Resources; professional and user safety.

Final considerations:   preparing for a pandemic involves measures that include modifying infrastructure and processes, managing employees and users, infection prevention strategies, and clinical recommendations. These measures are necessary to optimize the quality of care provided to users with COVID-19 and to reduce the risk of viral transmission to other users or health professionals.

Descriptors: Betacoronavirus; Coronavirus infections; Health Assistance; Health Services Administration; Health Management

RESUMEN

Objetivo:  reportar la experiencia de implementar estrategias de gestión de la atención en el afrontamiento de la pandemia de COVID-19 en un hospital docente

Método:  este es un reporte de experiencia de los gerentes que laboran en el hospital público más grande de Paraná, con el Jefe de División de Gestión Asistencial, Jefe del Sector Gestión de las Líneas de Atención, Jefe de la Unidad de Enfermedades Infecciosas y equipo de apoyo.

Resultados:  las estrategias de gestión del cuidado se estructuraron con base en la dinámica del cuidado, la estructura física, los recursos humanos, la seguridad del profesional y del usuario.

Consideraciones finales:  la preparación para una pandemia implica medidas que incluyen la modificación de la infraestructura y los procesos, la gestión de empleados y usuarios, estrategias de prevención de infecciones y recomendaciones clínicas. Estas medidas son necesarias para optimizar la calidad de la atención brindada a los usuarios con COVID-19 y para reducir el riesgo de transmisión viral a otros usuarios o profesionales de la salud.

Descriptores: Betacoronavirus; Infecciones por Coronavirus; Prestación de Atención de Salud; Administración de los Servicios de Salud; Gestión en Salud

INTRODUÇÃO

As infecções respiratórias agudas virais são as principais causas de morbimortalidade em todo o mundo. A detecção e a disseminação de qualquer patógeno respiratório são acompanhadas de incertezas acerca de suas características epidemiológicas, clínicas e virológicas e, em particular, a respeito da gravidade dos casos determinada pela capacidade de disseminação na população e da sua virulência. Esses aspectos não são diferentes na doença ocasionada pelo novo coronavírus SARS-CoV-2, denominada como COVID-19, detectada, pela primeira vez, na cidade de Wuhan (China) em dezembro de 2019. Trata-se de uma infecção do trato respiratório causada por um vírus emergente, cujo sequenciamento genético indica ser um betacoronavírus, com uma alta similaridade (79%) com o SARS-CoV1.

Após os relatos iniciais dessa doença, o número de pessoas infectadas aumentou exponencialmente com a disseminação do vírus por todos os continentes. Em 11 de março de 2020, a COVID-19 foi caracterizada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como uma pandemia2.

O desenvolvimento de vacinas e terapias para a COVID-19 estão em andamento, no entanto ainda não há medidas terapêuticas e preventivas eficazes, sendo recomendadas, para o seu controle, as intervenções não farmacológicas, que incluem o isolamento de doentes e o distanciamento social. A ampla disseminação da doença tem gerado uma alta demanda por atendimento hospitalar em um curto período de tempo, sobrecarregando os serviços de saúde e levando mesmo os sistemas de saúde mais robustos ao colapso. Dessa forma, houve uma intensificação da pressão sobre a força de trabalho global em saúde, sobrecarregando o sistema de saúde e causando efeitos adversos nos profissionais de saúde, incluindo o risco de infecção3.

A COVID-19 tem causado impacto significativo para a economia mundial e para a organização de todos os sistemas de saúde. No contexto hospitalar, em situações de doenças emergentes de potencial pandêmico, há necessidade de estratégias para gerenciar espaço, equipe e suprimentos, a fim de proporcionar o melhor atendimento aos usuários. Além disso, é prioritária a implantação de medidas de prevenção da transmissão hospitalar4. Entretanto, esta pandemia não tem precedentes. Mundialmente, líderes governamentais e gestores de saúde estão adotando medidas de emergência para lidar com essa crise de saúde, ajustando a tomada de decisão em tempo real e buscando reparar os erros que estão ocorrendo em decorrência do escasso tempo para planejamento5.

Em todo o mundo, até a primeira quinzena do mês de agosto, foram registrados mais de 21.480.111 casos da doença e mais de 771.518 mortes. Tais números continuam aumentando diariamente, sendo que o Brasil alcançou 107.232 mortes6. Neste sentido, uma adequada gestão do cuidado entendida em uma perspectiva sistêmica, como o conjunto de serviços de saúde, com suas diferentes funções e diferentes graus de incorporação tecnológica e os fluxos que se estabelecem entre eles, faz-se necessária. Tais fluxos são definidos por protocolos controlados por centrais de vagas ou de marcação de consulta, sempre na perspectiva de garantir o acesso dos usuários às tecnologias de cuidado de que necessitam por meio da constituição e gestão de complexas “redes de cuidado” institucionais, operadas por intermédio de processos formais de referência e contrarreferência, que propiciam a circulação das pessoas por um conjunto articulado de serviços de saúde de complexidades diferentes e complementares entre si7.

Nesta época de pandemia, os hospitais de ensino foram requisitados pelos gestores para ofertar leitos de UTI e de enfermarias especializadas, e tiveram que, rapidamente, realizar a gestão do cuidado e reconfigurar sua estrutura para atender um perfil de usuário com uma doença desconhecida, contratar e treinar profissionais, atualizar sua carta de serviços, cancelar procedimentos eletivos, direcionar recursos financeiros e humanos, adequar estrutura física e processos de trabalho.

Frente a essa demanda, buscou-se fundamentação na literatura existente na experiência de outros hospitais e na expertise dos gestores para reorganizar a gestão do cuidado no enfrentamento da COVID-19 em um hospital de ensino do sul do país.

OBJETIVO

Relatar a experiência de implementação de estratégias de gestão do cuidado no enfrentamento à pandemia COVID-19 em hospital de ensino.

MÉTODOS

Trata-se de um relato de experiência dos gestores em saúde que atuam no maior hospital público do Paraná, tendo como funções a Chefia de Divisão de Gestão do Cuidado, Chefia de Setor de Gestão das Linhas de Cuidado, Chefia da Unidade de Infectologia e equipe de apoio.

Para elaborar as estratégias de gestão do cuidado para o enfrentamento da pandemia causada pela COVID-19, utilizaram-se as recomendações nacionais e internacionais para o enfrentamento da COVID 19, tais como as normativas da OMS, Ministério da Saúde, Agência Nacional de Vigilância Sanitária, Secretaria de Saúde do Estado do Paraná e Secretaria de Saúde da Prefeitura Municipal de Curitiba e a expertise pregressa em gestão.

Consideraram-se, ainda, os fluxos regulatórios e a pactualização com a Rede de Atenção à Saúde (financiamento, contratos, habilitação), bem como as evidências científicas no estabelecimento de protocolos internos para estruturação de comitê de crise, desenho de fluxos, estratégias de manejo clínico, capacitação/treinamento da equipe.

O hospital de ensino aqui relatado tem como função a formação de recursos humanos em saúde, a assistência de nível terciário e a pesquisa na área da saúde. Atende à população de Curitiba, Região Metropolitana e outros estados por meio de uma contratualização de serviços e metas qualitativas, sendo seu atendimento 100% através do SUS. Integra a Universidade Federal do Paraná, e, desde outubro de 2014, aderiu à rede da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH) por meio de uma gestão compartilhada.

O hospital possui 650 leitos no cadastro nacional de estabelecimento de saúde, sendo 435 ativos destinados ao atendimento de nível terciário das mais diversas especialidades médicas. O início das estratégias de gestão do cuidado para o enfrentamento da COVID-19 ocorreu em meados de fevereiro de 2020, e o plano de reestruturação foi iniciado em 24 de março de 2020. Foi criado um gabinete de crise com médicos infectologistas, epidemiologistas, divisão de suprimentos, de gestão de cuidados, de apoio diagnóstico e a alta governança. Atualmente, o hospital contratualizou 76 leitos de terapia intensiva e 103 leitos de enfermaria destinadas à linha de cuidado para pessoas com COVID-19, cuja porta de entrada é regulada pelo complexo regulador da Secretaria Municipal de Saúde.

RESULTADOS

As estratégias de gestão do cuidado foram estruturadas a partir da dinâmica de atendimento, estrutura física, recursos humanos, segurança do profissional e segurança do usuário.

Dinâmica de atendimento

Primeiramente, com o aumento de casos confirmados no país, buscou-se reduzir o número de pessoas que circulam na instituição, considerando que, anteriormente à pandemia, aproximadamente 8.000 pessoas/dia acessavam as dependências do hospital. Desta forma, foram suspensas as atividades não essenciais recreativas, pedagógicas, de ensino, entre outras. Normatizou-se a suspensão de visitas e manutenção mínima dos acompanhantes previstos em lei.

Foram instaladas tendas de triagem nas portas de entradas do hospital, com monitoramento para a presença de sinais e sintomas respiratórios indicativos de casos suspeitos de COVID-19 em todas as pessoas que procuravam o hospital. Nesse local, frente à suspeita dessa infecção e à presença de sinais de gravidade, os usuários são encaminhados para a Unidade Referenciada (unidade de entrada de urgência e emergência). Caso os casos forem considerados como leve, são encaminhados para isolamento domiciliar com orientação de retorno se houver sinais de piora clínica.

Para a priorização da assistência, considerando que o hospital é referência para o encaminhamento de usuários com condições clínicas crônicas de difícil manejo, com clientela predominante idosa, foi necessário estratificar os procedimentos em eletivos, eletivos essenciais, urgências e emergências.

Desta forma, devido ao curto espaço de tempo e à finitude dos recursos, foi necessária a redução de 79% das consultas eletivas (passando de, aproximadamente, 35.000 consultas por mês para 7.350 consulta por mês), e ainda houve o bloqueio por tempo indeterminado de exames e procedimentos cirúrgicos eletivos. Para tal, as especialidades médicas triaram as agendas e prontuários buscando identificar os tipos de atendimento que deveriam permanecer e priorizando a manutenção dos atendimentos às linhas de cuidado oncológicas, hematológicas, transplantes, dor torácica, acidente vascular encefálico, gestação de risco habitual e alto risco.

As cirurgias eletivas e serviços de apoio diagnóstico e terapêuticos essenciais (aquelas que, mesmo eletivas, quando não realizadas em um período de 3 meses, podem causar sequelas e se tornarem em cirurgias de urgência ou até mesmo emergência) foram agendadas com um tempo cirúrgico maior para acomodar medidas adicionais de prevenção de infecções, como a testagem para detecção da COVID-19 previamente à internação.

Definida a nova carta de serviços e dimensionada a capacidade de atendimento para o período de emergência de saúde pública, fez-se necessário o bloqueio de 92 leitos entre clínicos e cirúrgicos de enfermarias e UTI. Esse bloqueio de leitos, somado ao aporte de recursos humanos, insumos e equipamentos disponíveis, proporcionou a reclassificação e abertura de novos de leitos, cuja contratualização com o gestor local chegou a 179 leitos (76 de UTI e 103 de enfermaria), 2 tendas de triagem e uma unidade referenciada (Pronto Atendimento regulado), exclusiva para usuários com sintomas respiratórios.

A linha de cuidado inclui a triagem inicial, o atendimento em Unidades referenciadas, enfermarias e UTIs. A alta é contrarreferenciada pelo serviço de gestão de altas para acompanhamento no ambulatório destinado ao atendimento pós COVID-19.

Estrutura física

Para disponibilizar o número de leitos proposto, foram realizadas alterações na estrutura física da instituição. O objetivo foi otimizar e readequar a estrutura física existente para o atendimento ao usuário com COVID-19, com ênfase na segurança dos profissionais e dos usuários. Foi necessária revisão da disponibilidade de gazes medicinais; adequação da rede elétrica; aquisição de novos geradores para aporte ao elevado número de equipamentos, principalmente relacionados ao aumento de leitos de UTI; inclusão de visores de vidro nas portas das enfermarias para reduzir a frequência de entrada da equipe multiprofissional no quarto; fechamento e sinalização de locais de passagem de usuários COVID-19 com indicação em solo e bloqueios físicos restringindo o máximo a circulação de pessoas; reserva de elevadores exclusivo para funcionários e usuários com COVID-19; adequação e adição de pias para lavagens das mãos, ajuste de salas para paramentação, refeitório, alojamento de funcionários; revisão e ajuste de sistemas de ventilação; sinalização com placas e letreiros dos novos ambientes, fazendo distinção entre as áreas limpas, potencialmente contaminadas e contaminadas; entre outros.

Recursos humanos

Com relação aos recursos humanos, o objetivo foi realocar, com segurança, o número de profissionais existentes, além de planejar a força de trabalho quanti e qualitativamente e capacitar os diferentes grupos para as novas atividades necessárias. Para tal, foi realizado um mapeamento dos profissionais com interesse e competência para atuação nas áreas assistenciais destinadas especificamente à COVID-19 (triagem, UTI, enfermarias). Ainda, junto ao serviço de saúde ocupacional, estratificaram-se os servidores do grupo de risco como o previsto na Instrução Normativa nº 19, de 12 de março de 2020, que estabelece orientações aos órgãos e entidades do Sistema de Pessoal Civil da Administração Pública Federal (SIPEC) quanto às medidas de proteção para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente da COVID-19. Os servidores que não foram liberados para trabalho remoto foram alocados segundo suas competências para teleorientação de servidores, usuários e familiares. Devido ao absenteísmo da ordem de aproximadamente 20 a 30% da força de trabalho, foram contratados 300 funcionários temporários para as áreas relacionadas ao atendimento à COVID-19.

As capacitações para profissionais do quadro permanente e temporário foram sobre: a nova estrutura organizacional para o enfrentamento da COVID-19; paramentação adequada, tendo como base a NR32, que estabelece as medidas de proteção à segurança e à saúde dos trabalhadores com elaboração de vídeos institucionais; confecção de protocolos de manejo clinico de usuário com COVID-19 em cuidados intermediários e intensivos (suspeitos, confirmados e descartados); orientações técnicas que incluíram a coleta de amostras respiratórias, fluxos internos de referência e contrarreferência, acesso e ciência dos protocolos institucionais; estímulo à iniciativa, flexibilidade para inovação e mudança no processo de trabalho; conscientização dos profissionais para atuar em ambiente estressor; estímulo ao trabalho em equipe e à empatia entre os colegas, entre outros.

Com o objetivo de melhorar o canal de comunicação com os mais de 4.000 profissionais permanentes e 1.000 terceirizados, a unidade de comunicação fez a divulgação de boletim epidemiológico diário; atualizações por e-mail a todos os funcionários e publicações em boletim eletrônico na intranet; informes e avisos nos descansos de tela dos computadores; elaboração de vídeos institucionais nas redes sociais e painéis internos com fotos das equipes motivando os grupos e reconhecendo o trabalho dispendido; notícias e notas na redes sociais e imprensa. Recebeu, ainda, ampla divulgação o papel da ouvidoria para comunicação de preocupações e sugestões para a alta governança.

Segurança do profissional e dos usuários

As principais ações estratégicas para minimizar o risco de contaminação dos profissionais e usuários foram: estabelecimento de triagem e coorte adequada (uso de protocolos e critérios epidemiológicos para alocar o usuário no leito compatível com sua condição clínica); estratificação do acesso (área limpa, contaminada e potencialmente contaminada) - com barreira física; divisão da equipe para o cuidado direto e cuidado de apoio; vigilância em relação a si e aos colegas nas atividades com potencial contaminação; diferenciação das equipes em times - de intubação, de resposta rápida; gestão de altas com monitoramento de casos e reforço da regulação de leitos. Para os Serviços de Emergência e de Apoio Diagnóstico, os profissionais foram capacitados para protocolos seguros e fluxos assistenciais.

Realizou-se orientação para o caso de viagens para áreas endêmicas, com afastamento de 14 dias para os profissionais que viajaram para essas áreas; monitoramento e direcionamento de profissionais sintomáticos; vigilância ativa do Serviço de Saúde Ocupacional e Segurança do Trabalho (SOST); identificação de profissionais que atuam em outras instituições de saúde em atendimento a usuários com COVID-19; estabelecimento de equipe de apoio psicológico junto ao serviço de psicologia e psiquiatria para os funcionários; fornecimento de refeições e lanches nas unidades para evitar deslocamentos e aglomerações; ajustes nos percentuais de pagamento por atuação em ambiente insalubre; provisão de ambiente de descanso interno na área hospitalar para preservar o distanciamento; separação de equipes de acordo com o grau de exposição.

Com relação aos profissionais, foram atendidos os sintomáticos e foi realizada testagem em massa dos profissionais (foram testados mais de 5.000 profissionais) com afastamento daqueles com doença ativa. Instituiu-se estratégia para adequação do processo de trabalho assistencial (enfermagem, médico, fisioterapia) visando à redução do tempo de permanência em contato com ambiente contaminado. Estabeleceram-se períodos para debriefing e descompressão, estudo de potenciais/ eventuais formas de contaminação e, finalmente, início do protocolo de vacinação anti-influenza voluntária.

A respeito da segurança dos usuários estabeleceu-se uma linha de cuidado para usuários COVID-19 desde a entrada até a pós-alta em ambulatórios específicos gerenciados pelo serviço de Gestão de altas. Também foi realizado a promoção do conhecimento relacionado à doença por meio de informação verídica, escuta ativa e empatia com usuários e familiares e incentivo do uso da assertividade nas relações entre profissionais e usuários; conscientização quanto aos efeitos do isolamento, envolvendo profissionais como terapeutas ocupacionais, pedagogos, psicólogos, uso de TVs e relógios nas enfermarias e de dispositivo para comunicação do usuário e família (visita virtual), estímulo ao usuário a respeito de atitudes otimistas para o enfrentamento da doença, recolhimento de doações para composição de kit de cuidado pessoal dada a ausência de visitas familiares (higiene bucal, pantufas e chinelos, roupões) e formação de equipe de informação a família (equipe de profissionais designada a manter a ligação entre as informações oferecidas pela equipe assistencial e dúvidas e orientações designadas às famílias).

DISCUSSÃO

A pandemia pelo SARS-CoV-2 se caracterizou por um desafio sem precedentes para a população mundial e para a saúde pública, mesmo em países de alta renda. Os desafios se devem ao desconhecimento da doença e todas as suas implicações como a escassez de insumos terapêuticos e de equipamentos de proteção individual, déficit de leitos hospitalares de urgência e uma carga de trabalho extenuante para os profissionais de saúde. Esses enfrentam uma alta taxa de contaminação, parecendo tender a desenvolver sintomas mais graves que a maioria da população, provavelmente pela exposição a maiores cargas virais presentes nos usuários com doença severa que se encontram hospitalizados e necessitam, portanto, que suas condições de trabalho sejam garantidas8.

A transmissão respiratória do vírus decorrente da exposição a gotículas, aerossóis e contato com um indivíduo infectado leva à necessidade de implementação de precauções aéreas e de contato, além de intensificação da higiene ambiental e práticas gerais de prevenção de infecções9-10. Além disso, o risco de transmissão por aerossóis durante alguns procedimentos específicos de manipulação de vias aéreas tem despertado a atenção para cuidados cada vez mais rigorosos nos procedimentos assistenciais aos usuários. Dessa forma, as medidas de prevenção e controle devem ser praticadas no atendimento do usuário em todas as etapas percorridas por ele desde sua admissão, triagem, espera, assistência, procedimentos realizados, até sua a sua alta/transferência ou óbito10. Tais medidas envolvem, assim, toda a equipe assistencial e administrativa do hospital.

As ações profissionais foram planejadas com foco na segurança do usuário e prevenção de infecções, que incluíram a redução de procedimentos geradores de aerossóis (isto é, manipulação das vias aéreas, ventilação da máscara facial, aspiração de vias aéreas abertas, tosse do usuário) na medida do possível4, incluindo equipamentos de proteção individual, como avental, luvas e um respirador N95, mais um protetor facial/óculos de proteção ou um respirador motorizado e purificador de ar (PAPR)9.

Embora os profissionais de saúde reconheçam que o risco ocupacional é parte da profissão escolhida, faz-se necessário desenvolver sistemas de apoio psicológico a esses, que, naturalmente, temem, frente ao risco, a transmissão da doença aos seus familiares, especialmente aqueles que convivem com indivíduos de alto risco, como idosos, imunocomprometidos ou com outras condições médicas crônicas3.

Nesse sentido, utilizaram-se como estratégias para a gestão do cuidado a capacitação, a estratificação dos profissionais que compunham grupo de risco para a COVID-19 e o acompanhamento psicológico para os profissionais da linha de frente de modo a ajudar a reduzir a ansiedade. Divulgação de orientações que visem diminuir transmissibilidade intradomiciliar3, que incluem informações sobre descontaminação da superfície da casa, incluindo produtos e técnicas eficazes, também foram uma estratégia para diminuir a ansiedade.

Todos os profissionais que trabalham no hospital, incluindo cuidadores, equipe de suporte, administração e equipes de preparação, devem estar capacitados e orientados quanto à necessidade de uma ação prolongada, até que consiga um controle desta pandemia, cabendo à liderança a função de enfatizar a importância do autocuidado como o centro da resposta. A comunicação transparente e ponderada pode contribuir para a confiança e um senso de controle. Os trabalhadores precisam descansar adequadamente e que sejam atendidos nas suas necessidades pessoais críticas e apoio emocional, contribuindo, assim, para manter o desempenho individual e da equipe a longo prazo3.

Além das estratégias utilizadas para o enfrentamento da pandemia de COVID-19, cabe aos gestores de saúde enfrentar em breve dois grandes problemas adicionais “colaterais”. O primeiro será o esgotamento físico e mental da força de trabalho em saúde, juntamente com a infraestrutura hospitalar desgastada. O segundo será o crescente “atraso” dos procedimentos de saúde, decorrente da suspensão da realização dos procedimentos eletivos aos usuários portadores de doenças crônicas. Além disso, as medidas de contenção (e progressivo de confinamento), agravadas pela recessão econômica, afetarão indubitavelmente a saúde mental (por exemplo, ansiedade, depressão) e a saúde física (por exemplo, ganho de peso, nutrição desequilibrada) da população, que dependerá mais de um sistema de saúde profundamente saturado5.

Limitações do estudo

Este estudo se limita a uma realidade local em constante mudança frente a uma pandemia sem precedente. Assim, a realidade aqui apresentada, mesmo baseada em protocolos e evidências científicas, parte das experiências em gestão das autoras e das realidades que se apresentam no cotidiano.

Contribuições para a área da enfermagem

O estudo contribui com a prática de enfermagem quando traz uma vivência e um registro histórico de uma instituição de grande porte, podendo ser utilizado como base para a tomada de decisão de gestores em saúde.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A preparação para uma pandemia envolve considerar os diferentes níveis na hierarquia de controles, bem como as diferentes fases da pandemia. Essas medidas incluem a modificação de infraestrutura e processos, gerenciamento de funcionários e usuários, estratégias de prevenção de infecções e recomendações clínicas. Pode ser um desafio alinhar os interesses e preocupações de todas as partes. No entanto, acreditamos que essas medidas de contenção são necessárias para otimizar a qualidade dos cuidados prestados aos usuários com COVID-19 e reduzir o risco de transmissão viral a outros usuários ou profissionais de saúde.

AGRADECIMENTO

Agradecemos a todos os profissionais que estão na linha de frente no combate à pandemia e nos solidarizamos com todos aqueles que perderam os seus pela COVID-19.

Referências bibliográficas

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Jun 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    25 Ago 2020
  • Aceito
    30 Out 2020
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