SEÇÕES ESPECIAIS
SMALL BUSINESS ATRAVÉS DO PANÓPTICO
Acesso ao crédito no Brasil: evolução e perspectivas
Francisco Marcelo BaroneI; Emir SaderII
IDoutor em políticas públicas e formação humana pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (PPFH/Uerj). Coordenador do Programa de Estudos Avançados em Pequenos Negócios, Empreendedorismo, Acesso ao Crédito e Meios de Pagamentos (Small Business) da Escola Brasileira de Administração Pública e Empresas da Fundação Getulio Vargas (Ebape/FGV). Endereço: Praia de Botafogo, 190, sala 541 CEP 22250-900, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. E-mail: francisco. barone@fgv.br
IIDoutor em ciências políticas pela Universidade de São Paulo (USP). Coordenador-geral do Laboratório de Políticas Públicas (LPP) da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). Endereço: Rua São Francisco Xavier, 524, sala 12.111 CEP 20550-013, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. E-mail: emirsader@uol.com.br
Espaço dedica do à divulgação de estudos e pesquisas relacionados ao conceito de small business: micro, pequenas e médias empresas ( MPMEs ); empreendedorismo; jovens empresários; acesso ao crédito; microfinanças; meios de pagamento; incubadoras; e responsabilidade social.
Coordenação: Deborah Moraes Zouain* Francisco Marcelo Barone*
1. Microfinanças e microcrédito: conceitos introdutórios
Não existe consenso, na literatura específica, sobre os conceitos de microfinanças e microcrédito. Usualmente, define-se microfinanças como a oferta de serviços financeiros (crédito produtivo, crédito para consumo, poupança, seguro etc.) para a população de baixa renda que normalmente não tem acesso a esses serviços pelo sistema financeiro tradicional (BNDES, 2002; CGAP, 2007). Bouman (1989) trata microfinanças por pequenos empréstimos, com as parcelas pagas em curto espaço de tempo, destinados essencialmente à população pobre, que possui pouquíssimos ativos para oferecer como colateral (garantia).
Já o microcrédito pode ser definido como todos os serviços financeiros para microempreendedores, excluindo-se o crédito para consumo. O Microcredit Summit (2007) o define como pequenos empréstimos à população muito pobre, para trabalhar por conta própria, permitindo gerar renda para seu sustento e de suas famílias. Já o microcrédito produtivo orientado é um crédito produtivo popular, com foco no financiamento a microempreendedores de baixa renda, para aplicação em sua atividade profissional (Alves e Soares, 2004; BNDES, 2002).
Em termos gerais, o microcrédito produtivo orientado é um crédito especializado para um determinado segmento da economia: os micro e pequenos empreendimentos, formais e informais. Destina-se a negócios de pequeno porte, gerenciados por pessoas de baixa renda, e não se destina a financiar o consumo. Dessa maneira, o acesso a essa modalidade creditícia torna-se uma oportunidade para o desenvolvimento dos pequenos negócios, levando a uma melhoria da capacidade de consumo da unidade familiar por meio da geração de renda. Uma representação gráfica da estrutura das microfinanças no Brasil é apresentada na figura.
2. As microfinanças no governo de Luiz Inácio Lula da Silva
De acordo com Barone (2008), o primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2003-06) representou uma ruptura com o modelo político vigente no país dos últimos 20 anos. A partir de 2003, uma nova equipe de policy makers optou pela manutenção da política econômica do governo anterior, porém o conceito de acesso ao crédito passou a ser entendido como o conceito de microfinanças, em sentido mais amplo, principalmente com a bancarização das camadas mais baixas da população (base da pirâmide social) e a concessão de crédito indistintamente para consumo ou produção, pelo sistema financeiro nacional. Os bancos públicos Caixa Econômica Federal, por meio do Caixa Aqui, e o Banco do Brasil, por meio do Banco Popular do Brasil tiveram papel fundamental nesse processo, operando grande rede de correspondentes bancários, em padarias, mercados e farmácias, por meio de POS (point of sale).1
Incluir uma grande massa de pessoas no sistema financeiro nacional passou a ser a tônica principal das políticas públicas de acesso ao crédito nesse período. Nos oito anos do governo anterior (FHC), o microcrédito era entendido como um crédito produtivo, capaz de alavancar renda. Neste governo, o conceito de microcrédito foi expandido para crédito de pequeno valor, produtivo ou não, como já exposto anteriormente, capaz de gerar renda.
Entre as medidas tomadas, destaca-se a edição, em junho de 2003, do "pacote do microcrédito", um conjunto de medidas que objetivavam ampliar a oferta de serviços financeiros às populações de baixa renda. Três foram os seus pilares: a massificação de contas simplificadas (bancarização); o estímulo à oferta de crédito por meio da destinação de parte dos recursos do recolhimento compulsório sobre os depósitos à vista e a formação de cooperativas de crédito de livre associação.
A evolução da legislação pertinente ao setor, editada a partir de 2003, pode ser resumida em:
▼ Lei no 10.735, de 11 de setembro de 2003, que estimula a bancarização para a população de baixa renda e a obrigatoriedade de direcionamento de 2% dos depósitos à vista, recolhidos compulsoriamente ao Banco Central, ao microcrédito.2
Essa lei estabeleceu uma forte regulamentação sobre os valores de crédito a serem concedidos e os prazos de parcelamento do crédito, além de fixar a taxa de juros e regulamentar a profissão de técnicos em crédito. Em seu art. 1o, a lei estabelece que o técnico em crédito, ou mais comumente conhecido como agente de crédito, "(...) é a pessoa treinada para efetuar o levantamento socioeconômico e prestar orientação educativa sobre planejamento do negócio para definição das necessidades de crédito e gestão, voltadas para o desenvolvimento do empreendimento" (Presidência da República, 2003). A regulamentação inadequada, aliada ao baixo know-how dos bancos na concessão de microcrédito produtivo orientado, reduziu significativamente o efeito desse crédito no mercado:
▼ Lei no 11.110, de 25 de abril de 2005, que permite às instituições de microcrédito usar as linhas de crédito do Funproger para microcrédito produtivo orientado.
Complementando o pacote e implementada através da Medida Provisória no 122, de 25 de junho de 2003 (regulamentada, posteriormente, pela Lei no 10.735, de 11 de setembro de 2003), foi conferido ao Conselho Monetário Nacional a "competência para regulamentar as aplicações dos bancos comerciais, dos bancos múltiplos com carteira comercial, da Caixa Econômica Federal, bem como das cooperativas de crédito de pequenos empresários, microempresários ou microempreendedores e de livre admissão de associados, em operações de microfinanças destinadas à população de baixa renda, baseadas em recursos oriundos dos depósitos à vista" (Alves e Soares, 2004:47).
A estrutura jurídico-regulatória existente foi insuficiente para o desenvolvimento das microfinanças no Brasil, especialmente no que se refere à oferta de microcrédito produtivo orientado. A Lei no 10.735, de 11 de setembro de 2003, estabeleceu uma forte regulamentação sobre os valores e prazos de parcelamentos dos créditos a serem concedidos, além de fixar as taxas de juros praticadas. A associação dessas duas características conduziu a uma estabilização do mercado de microcrédito produtivo orientado e a um crescimento da bancarização e do crédito popular, nas modalidades consumo e crédito consignado.
Bancarização
Embora o Brasil apresente um número expressivo de cidadãos sem acesso a conta bancária, a quantidade dessas contas tem crescido mais que a população. A rede bancária registrou, de 2001 a 2007, um aumento de 57,5% no número de contas correntes, evoluindo de 43,3 milhões para 62,8 milhões. No mesmo período, o número de contas poupança cresceu 39%, passando de 51,2 milhões, em 2001, para 71,2 milhões, em 2007, como pode ser observado na tabela 1 (Alves e Marques, 2006).
Nos valores evidenciados acima estão incluídos os correntistas, de todas as camadas sociais, que possuem uma ou mais contas em seu nome, podendo possuir também contas simplificadas. Tanto pesquisa qualitativa, patrocinada pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) e divulgada em 2002, quanto Mezzera e Guimarães (2003) indicam que, até entre os micro e pequenos empreendedores bancarizados, é comum a existência de mais de uma conta, em diferentes bancos.
As contas correntes simplificadas apresentam baixo custo (e baixo retorno) para o Sistema Financeiro Nacional. Nesse tipo de conta, os recursos devem ser movimentados prioritariamente por meio de cartão magnético, admitido, em caráter excepcional, o uso de cheque avulso no ato da solicitação de saque. De acordo com Alves e Soares (2004:76), as principais características das contas correntes simplificadas, diferenciando-as das contas de depósitos à vista convencionais, são:
▼ destinação unicamente a pessoas físicas não titulares de conta de depósitos à vista, na própria instituição financeira ou em outra;
▼ simplificação das exigências relacionadas à abertura de contas de depósitos, com destaque para a necessidade de apresentação, no caso desse tipo de conta, somente de documentos de identificação e de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF);
▼ fixação de limites, no valor de R$ 1.000, para o saldo que pode ser mantido na conta a qualquer tempo e para o somatório dos depósitos nela efetuados em cada mês, considerados todos os créditos a ela destinados, qualquer que seja a origem, natureza, finalidade ou forma de efetivação.
Microcrédito para consumo e microcrédito produtivo
Em 2003, foi editada a Resolução no 3.109, de 24 de julho, regulamentando a Lei no 10.735 e estabelecendo a aplicação de recursos correspondentes a 2% dos depósitos à vista, captados pelos bancos comerciais, Caixa Econômica Federal e cooperativas de crédito para operações de microcrédito. De acordo com essa resolução, os potenciais beneficiários dessas operações podem ser:
▼ pessoas físicas de baixa renda, caracterizadas como detentoras de contas especiais de depósitos criadas pela Resolução no 3.104, de 25 de junho de 2003, ou titulares de outras contas de depósitos que, em conjunto com as demais aplicações por eles mantidas na instituição financeira, apresentem saldo médio mensal inferior a R$ 1.000;
▼ pessoas enquadradas no art. 3o, inciso I, da Lei Complementar no 111, de 6 de julho de 2001, que dispõe sobre o Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza;
▼ pessoas físicas ou jurídicas microempreendedoras aptas a contratarem operações com sociedades de crédito ao microempreendedor (SCM), segundo as condições estabelecidas pela Resolução no 2.874, de 26 de julho de 2001.
Essas operações obedecem aos seguintes parâmetros financeiros:
▼ as taxas de juros efetivas não podem exceder 2% a.m.;
▼ o valor do crédito não pode ser superior a R$ 600, quando se tratar de pessoa física, e a R$ 1.000, quando se tratar de microempreendedor;
▼ o valor máximo para a taxa de abertura de crédito não pode ultrapassar 2% para pessoas físicas e 4% do valor do crédito concedido para os demais beneficiários;
▼ o prazo da operação não pode ser inferior a 120 dias, admitido prazo menor desde que a taxa de abertura de crédito seja reduzida proporcionalmente.
Alves e Soares (2004) destacam que os valores máximos dos créditos por cliente foram estabelecidos com vistas a otimizar o número de beneficiários vis-vis o volume de recursos passíveis de serem alocados para as operações de crédito, considerando-se ainda o nível de renda e a capacidade econômica do público-alvo. Com a fixação desses valores, pretendia-se que a capilaridade das operações produzisse reflexos positivos nas atividades econômicas, contribuindo, inclusive, para alcançar o propósito de gerar emprego e renda.
Passa-se de uma lógica pautada em privilegiar o crédito produtivo como mecanismo de geração de emprego e renda para os empreendedores de baixa renda (governo FHC), para outra, de crédito popular, incentivando maciçamente o consumo e, por conseqüência, gerando demanda na economia para crescimento do emprego e da renda, mas não necessariamente focada no desenvolvimento de micro e pequenas empresas (governo Lula). Na tabela 2 serão apresentadas algumas estatísticas comparativas recentes do microcrédito para consumo e para produção, ofertado a partir do recolhimento compulsório dos 2% dos depósitos à vista do Sistema Financeiro Nacional. A evolução do período de janeiro de 2004 a dezembro de 2007 mostra claramente a grande disparidade de oferta de microcrédito para consumo e para produção.
Crédito consignado
Outra modalidade de crédito popular bastante incentivada pelo governo Lula foi o crédito consignado. Basicamente, é um tipo de crédito oferecido para os empregados do setor formal e/ou aposentados e pensionistas do INSS, com baixas taxas de juros (bem menores que as praticadas para empréstimo pessoal no mercado), em que as prestações são descontadas diretamente de seus salários e/ou aposentadorias e pensões. O programa de empréstimos a aposentados e pensionistas do INSS, com consignação em folha de pagamento, foi autorizado pela Lei no 10.820, publicada no Diário Oficial da União em dezembro de 2003. As primeiras operações ocorreram em maio de 2004, com a participação da Caixa Econômica Federal.
Existem dois tipos de fonte garantidora do pagamento dessa modalidade creditícia: os recursos das aposentadorias e pensões, onde o pagamento é garantido pelo Instituto Nacional da Seguridade Social (INSS), que providencia o desconto das parcelas contratadas diretamente nos proventos de aposentados e pensionistas. Os bancos, para oferecerem esse produto, precisam firmar convênio com a Previdência Social. Em maio de 2006, havia 31 bancos e instituições financeiras conveniadas. A outra vem dos recursos das folhas de pagamento das empresas privadas, prefeituras ou governos estaduais. Esses são livres para entrar em acordo com bancos interessados em conceder o crédito consignado adotando, como garantia, as respectivas folhas de pagamento.
O problema mais comum decorrente desse tipo de empréstimo é o mau uso dos recursos, considerando-se a possibilidade de elevado endividamento pelas pessoas de baixa renda. Com o objetivo de minimizar esse problema, o governo federal estabeleceu como limite máximo de endividamento 30% do valor do salário, da aposentadoria ou pensão, incluído aí o limite do cartão de crédito fornecido por algumas instituições financeiras, com prazo máximo para quitação de até 72 meses.
Um fator que restringe o crédito consignado é a sua limitação à economia formal (aposentado, pensionistas, funcionários públicos e empregados do setor privado com carteira assinada), excluindo a grande maioria da população, que encontra-se na informalidade. O microcrédito produtivo orientado não faz a distinção entre formais e informais; pelo contrário, tende a beneficiar mais os excluídos da economia formal, potencializando seu aspecto socioeconômico inclusivo. A tabela 3 traz dados recentes do Banco Central do Brasil sobre o crédito consignado no período 2004-07.
Programa nacional de microcrédito produtivo orientado
A mais recente alteração institucional no setor de microfinanças brasileiro ocorreu com a criação do Programa Nacional de Microcrédito Produtivo Orientado (PNMPO), através da promulgação da Lei no 11.110, de 25 de abril de 2005. Essa lei posteriormente foi regulamentada pelas resoluções Codefat no 511, de 18 de outubro de 2006, e CMN no 3.422, de 30 de novembro de 2006, com a finalidade de precisar os parâmetros de acesso aos recursos proporcionados pelo PNMPO (Soares e Melo Sobrinho, 2007).
O Programa Nacional de Microcrédito Produtivo Orientado (PNMPO), coordenado e executado pelo Ministério do Trabalho e Emprego, incorpora tanto instituições que só podem trabalhar com microcrédito (Oscips e SCMs), quanto instituições habilitadas a outras operações financeiras (cooperativas de crédito singulares e instituições financeiras). Sua finalidade específica, estabelecida em lei, visa disponibilizar recursos para o microcrédito produtivo orientado. Todavia, na prática, o seu papel reside basicamente em funcionar como instituição articuladora entre as instituições de microcrédito produtivo orientado, os bancos e outros operadores de recursos públicos, prover apoio, fomento, disseminação e estruturação do setor de microfinanças. Nesse sentido, exerce outras funções que se sobrepõem às funções já exercidas pelo BNDES, duplicando estruturas institucionais e dividindo esforços. A tabela 4 mostra as instituições cadastradas no programa.
Até maio de 2007, o programa habilitou 231 instituições, entre Oscips, SCMs, instituições financeiras operadoras (IFOs) e cooperativas de crédito singulares. As instituições financeiras operadoras são os mais novos agentes do mercado de microfinanças e consistem em instituições financeiras que ofertam recursos para microcrédito produtivo, como o ABN Amro, através do Real Microfinanças e o Unibanco, com a Microinvest.
3. Perspectivas para o acesso ao crédito
Muito ainda precisa ser feito em termos de crédito produtivo orientado, microcrédito, crédito para o consumo e bancarização no Brasil. Quando se verifica a oferta de microcrédito, o resultado é desanimador, mesmo com o crescimento expressivo do número de entidades operadoras pós-Real, que só atendem 1% da demanda estimada pela OIT, segundo Darcy e Soares (2004), e mais da metade desse número é de responsabilidade do Programa CrediAmigo do Banco do Nordeste. Em parte, essa situação explica a opção pela bancarização e o aumento da oferta de crédito por meio das instituições financeiras tradicionais (2% do compulsório sobre depósitos à vista), como política pública do governo do Partido dos Trabalhadores.
Independentemente da estratégia adotada pelo governo federal: incentivo ao crédito produtivo orientado através da sociedade civil organizada, iniciativa privada e programas de governo (de primeiro e segundo pisos, municipais, estaduais e federais); bancarização, por meio do aumento da oferta de produtos específicos destinados à população de baixa renda e o incremento da cobertura espacial, principalmente nos municípios não atendidos pelo sistema financeiro, via banco postal e correspondentes bancários e o estímulo à expansão da oferta de crédito, produtivo orientado ou não (2% do compulsório sobre depósitos à vista), os policy makers e a sociedade têm compreendido, em particular, nos últimos anos, que a guerra contra a pobreza não será vencida com ações paternalistas, clientelistas e assistencialistas, tradicionais na sociedade brasileira do século XX e, sim, com estratégias universais, quanto à finalidade, e focalizadas, no sentido de intervenção de um conjunto de agentes específicos, propiciando desenvolvimento local e inclusão, por meio do aumento sustentável da renda dos beneficiários.
As políticas públicas voltadas à inclusão social e combate à pobreza necessitam ter a compreensão do público-alvo a ser atingido: baixa renda, informal, com baixa escolaridade e que sobrevivem, em grande parte, por meio de atividades de subsistência. Assim, é importante se retomar o conceito de economia familiar (forma de produção cuja base é depreendida da mão-de-obra no próprio contexto familiar) e, através de ações integradas de acesso ao crédito, promover sua inclusão e desenvolvimento.
Inclusão desse público-alvo não significa expandir o crédito pessoal e para consumo, como vem sendo observado no governo Luiz Inácio Lula da Silva. A expansão do crédito para consumo os incluirá na sociedade de consumo, mas não trará a eles desenvolvimento. Partindo-se do aspecto da demanda econômica, no sentido keynesiano: o acesso ao crédito para consumo incentiva a população a consumir, amplia a demanda por bens e serviços e, por conseqüência, exige maior produção e investimentos das firmas, gerando novos empregos. Todavia, esse tipo de crédito não gerará empregos para a baixa renda pois, como citado, essa apresenta níveis muito baixos de escolarização e não se empregará nas firmas demandantes de mão-de-obra. Assim, se o público-alvo a ser incluído e a sofrer ações públicas de desenvolvimento for a baixa renda, são necessárias políticas públicas integradas de crédito para produção, de maneira a desenvolver seus negócios, e de outras ações, tais como capacitação, assistência técnica e acesso a mercados.
O avanço do microcrédito produtivo orientado somente ocorrerá a partir de uma reorganização institucional do setor de microfinanças. É preciso que haja uma instituição, coordenadora das políticas aplicadas às diferentes entidades que atuam no setor (Oscips, SCMs, ONGs, IFOs, cooperativas de crédito, bancos), e que seja capaz de integrar as ações de políticas públicas para essas entidades e dar um sentido comum de ação a todos os tipos de entidades. Essa instituição coordenadora pode ser única ou atuar de maneira compartilhada com outras do setor, desde que haja uma instituição coordenadora do sistema.
Essa mudança institucional passa por estabelecer regras mais claras no setor, apoio institucional para que haja uma modernização na metodologia de colocação de crédito, permitindo a massificação desse crédito produtivo e, por final, um banco de dados comum de todas as instituições do setor de microfinanças para permitir análises sobre a evolução do sistema e do acesso ao crédito produtivo. Na atualidade, o governo brasileiro não é sequer capaz de dizer com segurança qual o universo existente de instituições de microfinanças no país. Assim, diante da ausência de informações, torna-se quase impossível delinear uma política eficiente de acesso ao crédito para a base da pirâmide.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
09 Fev 2009 -
Data do Fascículo
Dez 2008