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Medicamentos de dispensação excepcional: histórico e gastos do Ministério da Saúde do Brasil

Medicamentos de Dispensación Excepcional: historia y gastos del Ministerio de la Salud de Brasil

Resumos

OBJETIVO: Descrever aspectos técnicos do Programa de Medicamentos de Dispensação em Caráter Excepcional do Ministério de Saúde do Brasil, especialmente em relação aos gastos com os medicamentos distribuídos. MÉTODOS: Os aspectos técnicos foram obtidos por meio de consulta a todas as portarias que regulamentaram o Programa. Gastos no período de 2000 a 2007 foram obtidos do Sistema de Informações Ambulatoriais do Sistema Único de Saúde. Foram analisados os medicamentos dispensados de 1993 a 2009, quantidades e valor de cada procedimento informados nas autorizações de procedimentos de alta complexidade para cada estado. RESULTADOS: O Programa mudou, com aumento do número de fármacos e apresentações farmacêuticas distribuídas e de doenças contempladas. Eram distribuídos 15 fármacos em 31 diferentes apresentações farmacêuticas em 1993, passando para 109 fármacos em 243 apresentações em 2009. Os gastos totais do Ministério da Saúde com medicamentos somaram, em 2007, R$ 1.410.181.600,74, quase o dobro do valor gasto em 2000: R$ 684.975.404,43. Algumas das doenças que representaram maiores gastos nesse período foram: insuficiência renal crônica, transplante e hepatite C. CONCLUSÕES: O Programa de Medicamentos de Dispensação em Caráter Excepcional está em constante transformação, visando aprimorar os instrumentos e estratégias que assegurem e ampliem o acesso da população aos medicamentos. Devem-se buscar alternativas para reduzir o impacto financeiro do Programa para que não haja prejuízos às outras áreas do sistema de saúde, dado o custo elevado das novas tecnologias.

Medicamentos Excepcionais; Portarias; Gastos em Saúde; Política Nacional de Medicamentos


OBJETIVO: Describir aspectos técnicos del Programa de Medicamentos de Dispensación en Carácter Excepcional del Ministerio de Salud de Brasil, especialmente con relación a los gastos con los medicamentos distribuidos. MÉTODOS: Los aspectos técnicos fueron obtenidos por medio de consulta a todas los reglamentos que rigen el Programa. Gastos en el período de 2000 a 2007 fueron obtenidos del Sistema de Informaciones Ambulatorias del Sistema Único de Salud. Se analizaron los medicamentos dispensados de 1993 a 2009, cantidades y valor de cada procedimiento, informado en las autorizaciones de procedimientos de alta complejidad para cada estado. RESULTADOS: El Programa cambió, con aumento del número de fármacos y presentaciones farmacéuticas distribuidas y de enfermedades contempladas. Eran distribuidos 15 fármacos en 31 diferentes presentaciones farmacéuticas en 1993, pasando para 109 fármacos en 243 presentaciones en 2009. Los gastos totales del Ministerio de Salud con medicamentos sumaron, en 2007, R$ 1.410.181.600,74, casi el doble del valor gastado en el año 2000: R$ 684.975.404,43. Algunas enfermedades que representaron mayor gastos en ese período fueron: insuficiencia renal crónica, trasplante y hepatitis C. CONCLUSIONES: El Programa de Medicamentos de Dispensación en Carácter Excepcional está en constante transformación, buscando mejorar los instrumentos y estrategias que aseguren y amplíen el acceso de la población a los medicamentos. Se deben buscar alternativas para reducir el impacto financiero del Programa para que no exista prejuicio hacia las otras áreas del sistema de salud, dado el costo elevado de las nuevas tecnologías.

Medicamentos Excepcionales; Porterías; Gastos en Salud; Política Nacional de Medicamentos


OBJECTIVE: To describe the technical aspects of the Exceptional Circumstance Drug Dispensing Program of the Brazilian Ministry of Health, especially with respect to the cost of dispensed medication. METHODS: Technical information was obtained from the ordinances that regulate the Program. Expenditure from 2000 to 2007 was obtained from the Sistema Único de Saúde's (Unified Healthcare System) Outpatient Information System. All drugs dispensed between 1993 and 2009 and the amount and cost of each procedure were evaluated, based on information from the high-complexity procedure authorization of each of the country's states. RESULTS: The Program changed with the increase in the number of pharmacological agents and presentations distributed by, and the number of diseases contemplated in the program. In 1993, the program distributed 15 pharmacological agents in 31 distinct presentations. This number increased to 109 agents in 243 presentations in 2009. Total Ministry of Health expenditure with medications was R$1,410,181,600.74 in 2007, almost twice the amount spent in 2000, R$684,975,404.43. Diseases whose expenditure increased in the period included chronic renal insufficiency, transplantation, and hepatitis C. CONCLUSIONS: The Exceptional Circumstance Drug Dispensing Program is in constant transformation, aimed at building instruments and strategies that can ensure and expand access to medication among the population. Alternatives should be sought to decrease the financial impact of the Program to a level that does not impact other sectors of the health care system, given the high cost associated with novel interventions.

Exceptional Drugs; Ordinances; Health Expenditures; National Drug Policy


ARTIGOS ORIGINAIS

Medicamentos de dispensação excepcional: histórico e gastos do Ministério da Saúde do Brasil

Medicamentos de Dispensación Excepcional: historia y gastos del Ministerio de la Salud de Brasil

Claudia Mezleveckas CariasI; Fabíola Sulpino VieiraII; Carlos V GiordanoIII; Paola ZucchiIII

IMestrado Profissional em Economia da Saúde. Centro Paulista de Economia da Saúde (CPES). Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). São Paulo, SP, Brasil

IIMinistério da Saúde. Brasília, DF, Brasil

IIIGrupo Interdepartamental de Economia da Saúde. CPES-Unifesp. São Paulo, SP, Brasil

Correspondência | Correspondence Correspondência | Correspondence: Paola Zucchi R. Botucatu, 685 - Vila Clementino 04023062 São Paulo, SP, Brasil E-mail: pzucchi@cpes.org.br

RESUMO

OBJETIVO: Descrever aspectos técnicos do Programa de Medicamentos de Dispensação em Caráter Excepcional do Ministério de Saúde do Brasil, especialmente em relação aos gastos com os medicamentos distribuídos.

MÉTODOS: Os aspectos técnicos foram obtidos por meio de consulta a todas as portarias que regulamentaram o Programa. Gastos no período de 2000 a 2007 foram obtidos do Sistema de Informações Ambulatoriais do Sistema Único de Saúde. Foram analisados os medicamentos dispensados de 1993 a 2009, quantidades e valor de cada procedimento informados nas autorizações de procedimentos de alta complexidade para cada estado.

RESULTADOS: O Programa mudou, com aumento do número de fármacos e apresentações farmacêuticas distribuídas e de doenças contempladas. Eram distribuídos 15 fármacos em 31 diferentes apresentações farmacêuticas em 1993, passando para 109 fármacos em 243 apresentações em 2009. Os gastos totais do Ministério da Saúde com medicamentos somaram, em 2007, R$ 1.410.181.600,74, quase o dobro do valor gasto em 2000: R$ 684.975.404,43. Algumas das doenças que representaram maiores gastos nesse período foram: insuficiência renal crônica, transplante e hepatite C.

CONCLUSÕES: O Programa de Medicamentos de Dispensação em Caráter Excepcional está em constante transformação, visando aprimorar os instrumentos e estratégias que assegurem e ampliem o acesso da população aos medicamentos. Devem-se buscar alternativas para reduzir o impacto financeiro do Programa para que não haja prejuízos às outras áreas do sistema de saúde, dado o custo elevado das novas tecnologias.

Descritores: Medicamentos Excepcionais. Portarias. Gastos em Saúde. Política Nacional de Medicamentos.

RESUMEN

OBJETIVO: Describir aspectos técnicos del Programa de Medicamentos de Dispensación en Carácter Excepcional del Ministerio de Salud de Brasil, especialmente con relación a los gastos con los medicamentos distribuidos.

MÉTODOS: Los aspectos técnicos fueron obtenidos por medio de consulta a todas los reglamentos que rigen el Programa. Gastos en el período de 2000 a 2007 fueron obtenidos del Sistema de Informaciones Ambulatorias del Sistema Único de Salud. Se analizaron los medicamentos dispensados de 1993 a 2009, cantidades y valor de cada procedimiento, informado en las autorizaciones de procedimientos de alta complejidad para cada estado.

RESULTADOS: El Programa cambió, con aumento del número de fármacos y presentaciones farmacéuticas distribuidas y de enfermedades contempladas. Eran distribuidos 15 fármacos en 31 diferentes presentaciones farmacéuticas en 1993, pasando para 109 fármacos en 243 presentaciones en 2009. Los gastos totales del Ministerio de Salud con medicamentos sumaron, en 2007, R$ 1.410.181.600,74, casi el doble del valor gastado en el año 2000: R$ 684.975.404,43. Algunas enfermedades que representaron mayor gastos en ese período fueron: insuficiencia renal crónica, trasplante y hepatitis C.

CONCLUSIONES: El Programa de Medicamentos de Dispensación en Carácter Excepcional está en constante transformación, buscando mejorar los instrumentos y estrategias que aseguren y amplíen el acceso de la población a los medicamentos. Se deben buscar alternativas para reducir el impacto financiero del Programa para que no exista prejuicio hacia las otras áreas del sistema de salud, dado el costo elevado de las nuevas tecnologías.

Descriptores: Medicamentos Excepcionales. Porterías. Gastos en Salud. Política Nacional de Medicamentos.

INTRODUÇÃO

A assistência farmacêutica integra a atenção à saúde, é determinante para sua resolubilidade e envolve a alocação de grandes volumes de recursos públicos.ª a Conselho Ncionl de Secretários de Súde. Assistênci Frmcêutic no SUS. Brsíli(DF); 2007. Por esse motivo, ampliar o acesso da população aos medicamentos constitui grande desafio ao poder público.1

Em muitos países, os gastos com aquisição de medicamentos têm aumentado bastante em relação ao gasto total com saúde nos últimos anos. No Reino Unido, o gasto com medicamentos na atenção primária cresceu 10% entre 2001 e 2002.3 No Canadá, estimou-se crescimento de 6% em 2006, chegando a US$ 25 bilhões.2 O governo dos Estados Unidos estimou que o gasto com medicamentos aumentaria de US$ 184 bilhões em 2003 para US$ 519 bilhões em 2013.4

No Brasil, os gastos do Ministério da Saúde com aquisição de medicamentos aumentaram 123,9% entre 2002 e 2006, enquanto o aumento do gasto total na área de Saúde no Brasil foi de 9,6% no mesmo período.b b Vieira FS, Mendes ACR. Evolução dos gastos do Ministério da Saúde com medicamentos. Brasília(DF): Ministério da Saúde; 2007.

O financiamento federal da aquisição de medicamentos está atualmente regulamentado pela Portaria GM nº 204, de 29 de janeiro de 2007, que organizou e categorizou os recursos para a compra desses produtos no Bloco de Financiamento da Assistência Farmacêutica. Esse bloco foi dividido em três componentes: básico, estratégico e de medicamentos de dispensação excepcional,c c Silva RCS. Mediamentos exepionais no âmbito da assistênia farmaêutia no Brasil. [dissertação de mestrado]. Rio de Janeiro: Esola Naional de Saúde Públia Sérgio Aroua da Fioruz; 2000. mais recentemente denominado componente especializado da assistência farmacêutica.d Diario Oficial Uniao. d Ministério da Saúde. Portaria 2.981, de 26 de novembro de 2009. Aprova o componente especializado da assistência farmacêutica. 30 nov 2009;Seção1:725.

Esse último componente despendeu, em 2003, recursos da ordem de R$ 516 milhões e, em 2006, foi responsável pelo gasto de R$ 1,3 bilhão a preços de 2003, perfazendo aumento real de 159% no período, o que o torna, atualmente, um dos grandes componentes no aumento dos gastos com medicamentos do Ministério da Saúde.5,ª a Conselho Ncionl de Secretários de Súde. Assistênci Frmcêutic no SUS. Brsíli(DF); 2007.

Nesse contexto, o presente artigo descreve os aspectos técnicos do Programa de Medicamentos de Dispensação em Caráter Excepcional desde sua criação, em 1982, abordando especialmente a evolução do gasto do Ministério da Saúde com esse programa.

MÉTODOS

O histórico do Programa de Medicamentos de Dispensação em Caráter Excepcional é descrito a partir da análise de portarias ministeriais publicadas desde 1982. Paralelamente, realizou-se levantamento bibliográfico de artigos sobre o tema.

A análise de custos iniciou-se em 2000, ano em que foi possível encontrar dados completos sobre o repasse financeiro do Ministério da Saúde às Secretarias Estaduais de Saúde para cobertura do Programa. Desse ano em diante o número de fármacos e apresentações farmacêuticas fornecidos gratuitamente pelo Ministério da Saúde também aumentou significativamente.

A análise dos gastos no período de 2000 a 2007 baseou-se nos dados extraídos do Sistema de Informações Ambulatoriais do Sistema Único de Saúde (SIA/SUS), do Ministério da Saúde. Foi utilizada a produção ambulatorial informada pelos estados brasileiros ao Ministério da Saúde, dada como "Valor aprovado por ano/competência segundo procedimento após 10/1999". O item "Valor aprovado" revela a quantia repassada pelo Ministério da Saúde, segundo os gastos com medicamentos do Programa informados pelos estados, por meio do registro de Autorizações de Procedimento de Alta Complexidade (Apac).

Os dados segundo Unidade Federativa foram compilados em planilhas eletrônicas para análise exploratória e, para possibilitar a comparação interanual, todos os valores foram atualizados a preços de 2007, conforme o Índice Geral de Preços - "Disponibilidade interna" da Fundação Getúlio Vargas.

Dados demográficos extraídos do sítio do Datasus foram utilizados para análise do gasto per capita, comparando-se a população de cada estado e região com valores gastos com medicamentos do programa.

Os repasses do Ministério da Saúde também foram analisados para verificar o valor pago para cada medicamento do programa, calculando-se, dessa forma, o gasto aproximado com algumas das doenças atendidas e a distribuição percentual desses valores. Para isso, foram somados os valores gastos com todos os medicamentos para cada doença, com base em dados do SIA/SUS. Paralelamente, foi calculado o valor percentual gasto em relação ao gasto total com medicamentos do programa.

RESULTADOS

O Programa de Medicamentos de Dispensação em Caráter Excepcional teve início em 1982 e fornece medicamentos para o tratamento de doenças específicas, que atingem número limitado de pacientes. Na maioria das vezes, tais drogas são utilizadas por períodos prolongados.e e Ministério da Saúd. Mdicamntos d Dispnsação Excpcional. Brasília (DF); 2008[citado 2008 out 06]. Disponívl m: http://portal.saude.gov.br/portal/saude/profissional/area.cfm?id_area=1000

Até 1993, o programa fornecia medicamentos a pacientes transplantados e renais crônicos. A partir desse ano, os moldes atuais começam a ser adotados, com uma lista de 15 fármacos, em 31 apresentações farmacêuticas.c c Silva RCS. Mediamentos exepionais no âmbito da assistênia farmaêutia no Brasil. [dissertação de mestrado]. Rio de Janeiro: Esola Naional de Saúde Públia Sérgio Aroua da Fioruz; 2000.

Em 1996, a Portaria SAS/MS n° 204 estabeleceu medidas para maior controle dos gastos por parte do Ministério da Saúde. Essa portaria criou códigos na tabela SIA/SUS que permitiram a informatização do processo de dispensação de medicamentos, estabeleceu um formulário para solicitação de medicamentos excepcionais e atualizou a relação de medicamentos distribuídos gratuitamente no âmbito do referido programa.ª a Conselho Ncionl de Secretários de Súde. Assistênci Frmcêutic no SUS. Brsíli(DF); 2007.

Em julho de 1999, a Portaria Conjunta SE/SAS/MS n° 14 regulamentou o financiamento e a distribuição dos recursos para aquisição de medicamentos do Programa, e um mês depois a Portaria SAS/MS n° 409 implantou a sistemática de Apac para o ressarcimento de todos os medicamentos contemplados pelo programa. Assim, a fim de viabilizar a implementação do controle da dispensação por meio das Apac, o Ministério da Saúde estabeleceu os códigos referentes aos medicamentos, o controle individualizado dos usuários por meio do Cadastro Nacional de Pessoa Física (CPF), o uso da Classificação Internacional de Doenças (CID) e definiu as quantidades máximas de medicamentos por solicitação, entre outras medidas.ª a Conselho Ncionl de Secretários de Súde. Assistênci Frmcêutic no SUS. Brsíli(DF); 2007.

Até então, não existiam normas específicas para a inclusão ou exclusão de medicamentos a serem fornecidos pelo programa, nem tampouco a explicitação de critérios técnicos utilizados. Todas as inclusões de medicamentos eram feitas com base em pareceres técnicos elaborados por consultores contratados pelo Ministério da Saúde. Nesse período, grupos de portadores de doenças - talvez por terem maior consciência política, informação ou por solidariedade - mobilizaram-se para inclusão e manutenção na lista de medicamentos de seus interesses. Assim, o processo de seleção dos medicamentos do programa foi concluído por pressão desses grupos, que contavam com apoio de grupos de interesses corporativos e outros grupos sociais.c c Silva RCS. Mediamentos exepionais no âmbito da assistênia farmaêutia no Brasil. [dissertação de mestrado]. Rio de Janeiro: Esola Naional de Saúde Públia Sérgio Aroua da Fioruz; 2000.

Em outubro de 1999, a Portaria GM/MS nº 1.310 criou a Comissão de Assessoria Farmacêutica vinculada à Secretaria de Assistência à Saúde (SAS), com representantes dessa secretaria, da Secretaria de Políticas de Saúde, da Secretaria Executiva do Ministério da Saúde, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, do Conselho Nacional de Secretários de Saúde e do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde. A Comissão tinha como finalidade estabelecer critérios técnicos para seleção, inclusão, exclusão e substituição de medicamentos excepcionais da tabela SIA/SUS.ª a Conselho Ncionl de Secretários de Súde. Assistênci Frmcêutic no SUS. Brsíli(DF); 2007.

Três anos mais tarde, a Portaria GM/MS n° 1.318 incluiu 64 fármacos em 155 apresentações farmacêuticas, modificando completamente o cenário desse Programa.ª a Conselho Ncionl de Secretários de Súde. Assistênci Frmcêutic no SUS. Brsíli(DF); 2007.

Completando esse quadro de mudanças, o Ministério da Saúde divulgou protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas entre 2001 e 2002 com o objetivo de estabelecer os critérios de diagnóstico de cada doença, critérios de inclusão e exclusão de pacientes ao tratamento, as doses corretas dos medicamentos indicados, bem como os mecanismos de controle, acompanhamento e avaliação. Na ocasião, 30 doenças foram contempladas.ª a Conselho Ncionl de Secretários de Súde. Assistênci Frmcêutic no SUS. Brsíli(DF); 2007.

A Portaria GM/MS nº 2.577, de 27 de outubro de 2006, regulamentou o Programa de Medicamentos de Dispensação em Caráter Excepcional, definindo, entre outros, a lista de medicamentos, as doenças para as quais sua prescrição é autorizada, conforme a CID-10, e as normas de acesso ao Programa. Outra pequena alteração foi a inclusão de novos medicamentos e novas doenças a serem atendidas pelo Programa, realizada em setembro de 2008, modificando o anexo da Portaria 2.577, por meio da publicação da Portaria GM/MS n° 1.869.

Em novembro de 2009, a Portaria GM/MS n° 2.981d Diario Oficial Uniao. d Ministério da Saúde. Portaria 2.981, de 26 de novembro de 2009. Aprova o componente especializado da assistência farmacêutica. 30 nov 2009;Seção1:725. constituiu outro marco importante, pois alterou a definição e denominação do programa, que passou a ser tratado como Componente Especializado da Assistência Farmacêutica. A referida portaria definiu o programa como estratégia de acesso a medicamentos no âmbito do Sistema Único de Saúde, caracterizado pela busca da integralidade do tratamento medicamentoso na assistência ambulatorial, cujas linhas de cuidado foram definidas em protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas publicados pelo Ministério da Saúde.d Diario Oficial Uniao. d Ministério da Saúde. Portaria 2.981, de 26 de novembro de 2009. Aprova o componente especializado da assistência farmacêutica. 30 nov 2009;Seção1:725.

Com a nova portaria, as formas de acesso aos medicamentos e seu financiamento foram modificados, garantindo que a distribuição seja feita mediante a pactuação entre a União, Estados, Distrito Federal e municípios, com responsabilidades distintas. Dessa forma, passam a existir, dentro do programa, três grupos de medicamentos, de acordo com a responsabilidade de financiamento: grupo 1 - responsabilidade da União, grupo 2 - responsabilidade dos Estados e do Distrito Federal, grupo 3 - responsabilidade dos municípios e do Distrito Federal. Os medicamentos integrantes dos grupos 1 e 2 continuaram com dispensação por meio das Secretarias Estaduais de Saúde, enquanto aqueles pertencentes ao grupo 3 passaram a ser dispensados pelos municípios.d Diario Oficial Uniao. d Ministério da Saúde. Portaria 2.981, de 26 de novembro de 2009. Aprova o componente especializado da assistência farmacêutica. 30 nov 2009;Seção1:725.

Além disso, foram feitas inclusões e exclusões de medicamentos (Tabela 1) e doenças contempladas, foram divulgados novos formulários para solicitação dos medicamentos distribuídos pelas secretarias estaduais de saúde e vários dos protocolos existentes passaram por revisão.

Como conseqüência a todas essas modificações ao longo dos anos, doenças que antes não tinham tratamento disponibilizado pelo SUS passaram a ser contempladas por meio desse Programa. Assim, a cobertura de atendimento passou de três principais classes de doenças (transplantados, renais crônicos e portadores de nanismo hipofisário) para 288 doenças atendidas pelo Programa, conforme a CID-10.

Atualmente, a incorporação de novos medicamentos ao Programa deve utilizar os preceitos da medicina baseada em evidências. Assim, os solicitantes devem apresentar estudos que demonstrem a eficácia e segurança do medicamento, além de sua vantagem com relação à opção terapêutica disponibilizada (maior eficácia ou segurança ou menor custo), ou oferecer concorrência dentro de um mesmo subgrupo, como estratégia reguladora de mercado.e e Ministério da Saúd. Mdicamntos d Dispnsação Excpcional. Brasília (DF); 2008[citado 2008 out 06]. Disponívl m: http://portal.saude.gov.br/portal/saude/profissional/area.cfm?id_area=1000

Recursos gastos com o Programa

No período estudado, 2000 a 2007, o recurso destinado ao financiamento do programa era repassado pelo Ministério da Saúde aos Estados e ao Distrito Federal, com base na média dos valores aprovados em determinado período, a partir das informações das Apac.e e Ministério da Saúd. Mdicamntos d Dispnsação Excpcional. Brasília (DF); 2008[citado 2008 out 06]. Disponívl m: http://portal.saude.gov.br/portal/saude/profissional/area.cfm?id_area=1000

As secretarias estaduais de saúde têm cofinanciado o Programa de Medicamentos de Dispensação em Caráter Excepcional,2 porém, os dados que seguem não incluem os valores gastos pelos Estados. Apenas os valores aprovados pelo Ministério da Saúde para o financiamento do referido programa são exibidos. No período de 2000 a 2007, o Ministério da Saúde aumentou em aproximadamente 106% seus gastos com medicamentos desse programa (Tabela 2; Figura).


Em todas as regiões do País, o crescimento per capita foi menor que o do valor anual total gasto com medicamentos. A análise dos gastos anuais per capita, em cada região, mostra que, durante o período estudado, a região Sudeste sempre se manteve com o valor mais alto, com aumento de R$ 5,69, em 2000, para R$ 11,00 per capita em 2007. No mesmo período, a região Norte sempre se manteve com o menor valor per capita, passando de R$ 1,14, em 2000, para R$ 1,80 em 2007. Essas mesmas duas regiões (Sudeste e Norte) também apresentaram, durante todo o período estudado, respectivamente, o maior e o menor gasto anual total com medicamentos do Programa.

O Estado de São Paulo sempre apresentou os maiores gastos com medicamentos desse Programa, aumentando de R$ 245,8 milhões em 2000 para R$ 645,6 milhões em 2007. Até 2004, o Estado brasileiro que apresentou os menores gastos foi Roraima, com R$ 5,4 mil gastos em 2000 e R$ 843,6 mil em 2007. De 2005 a 2007, o Amapá foi o Estado com menores gastos, atingindo R$ 634,4 mil no último ano estudado. A despeito desses resultados, Roraima exibiu o maior aumento relativo nos gastos com esses medicamentos; além disso, 15 unidades federativas registraram mais de 100% de aumento nos gastos com medicamentos do programa.

O Estado de São Paulo apresentou o maior gasto per capita, passando de R$ 6,68 em 2000 para R$ 15,50 em 2007. Roraima, Rondônia e Amapá, Estados da região Norte do País, concentraram os menores gastos per capita, que variaram de R$ 0,02 (Roraima, 2000) até R$ 1,00 (Amapá, 2007).

Os gastos per capita foram heterogêneos também na análise intra-regional. O Rio Grande do Sul apresentava gasto per capita próximo ao dos demais Estados dessa região (R$ 4,00), porém, no último ano estudado, seu gasto foi quase 50% inferior à média dos outros dois Estados naquele ano (R$ 8,65).

Na região Sudeste, o Rio de Janeiro sempre apresentou gasto per capita (R$ 3,82 em 2000 e R$ 4,30 em 2007) abaixo da média dos outros três Estados (R$ 5,15 e R$ 9,30, respectivamente).

Tabela 3

Situações semelhantes foram verificadas no Mato Grosso, que apresentou valor per capita de R$ 4,90, enquanto a média de gastos em sua região foi de R$ 7,60, e no Maranhão, com R$ 1,70 per capita, enquanto a média da região Nordeste foi de R$ 4,40.

Apesar do aumento no número de doenças atendidas, aquelas primeiramente atendidas pelo Programa continuam representando os maiores gastos: nos dois primeiros anos estudados (2000 e 2001), a insuficiência renal crônica (IRC) foi a doença para a qual mais se gastou na aquisição de medicamentos, e, a partir de 2002 até 2007, a aquisição dos medicamentos para prevenção a rejeição de órgãos pós-transplante ocupou o primeiro lugar nos gastos. IRC e transplante também representaram o maior percentual de gastos na maior parte do período estudado; apenas em 2004 a hepatite C aparece com o maior percentual dos gastos em relação ao total: 23,1% (Tabela 4).

DISCUSSÃO

O Programa de Medicamentos de Dispensação em Caráter Excepcional apresentou mudanças significativas em seus aspectos técnicos e administrativos.

O programa, pensado inicialmente para atender a parcela pequena e específica da população, acometida por doenças consideradas de caráter excepcional, esbarrou na evolução técnico-científica mundial ocorrida ao longo desses anos e transformou-se em porta de entrada dos novos medicamentos desenvolvidos para tratamento de doenças que, até então, não tinham cobertura pelo SUS. Isso pode ser observado por meio do número de fármacos e apresentações farmacêuticas distribuídos pelo Programa, que aumentaram aproximadamente oito vezes em nove anos.

Essa transformação beneficiou a população brasileira, que passou a ter acesso gratuito ao tratamento de doenças que oferecem alto risco à saúde. Para o aparato administrativo do Programa, essa mudança também foi benéfica, porque auxiliou na criação de regras para inclusão e distribuição dos medicamentos, oferecendo tanto ao Ministério da Saúde (fonte financiadora) como aos Estados (financiador e distribuidor) sistemas de controle de informação mais completos e seguros.

No entanto, como toda nova tecnologia, os novos medicamentos chegam ao mercado com preços elevados e as inclusões no Programa tiveram grande impacto nos gastos do Ministério da Saúde, conforme mostra o presente estudo. Nesse sentido, há uma questão de grande importância a ser discutida e avaliada pelos gestores e pela equipe técnica: dentro de uma classe terapêutica, destinada para o tratamento de uma mesma doença, optar por qual medicamento será fornecido. Considerando os princípios de saúde pública de garantir o melhor atendimento para a maioria da população e considerando que os recursos destinados a esse fim são finitos, a avaliação bastante detalhada torna-se cada vez mais necessária. Alternativas custo-efetivas devem ser buscadas de modo a proporcionar maior racionalidade ao uso desses medicamentos. A escolha adequada de poucos e efetivos itens abre espaço para o fornecimento de outros medicamentos destinados ao tratamento de doenças que ainda não apresentam cobertura pelo SUS.

O Ministério da Saúde tem conseguido racionalizar o uso dessas novas tecnologias por meio da publicação dos Protocolos Clínicos de Diretrizes Terapêuticas. Porém, na atualidade, usuários do sistema, médicos, laboratórios farmacêuticos e Poder Judiciário exercem grande pressão para fornecimento dos medicamentos assim que eles surgem no mercado. A individualidade se sobrepõe à coletividade, o que dificulta a organização dos serviços.

Em relação à análise da inclusão versus exclusão de fármacos, observou-se que poucos medicamentos foram excluídos do Programa desde seu lançamento. Na área de medicamentos, assim como em diversas outras áreas de saúde no País, falta estrutura para o monitoramento do uso da nova tecnologia para avaliar a continuidade do uso ou seu abandono, mesmo sabendo-se que essa etapa é tão importante quanto a etapa de implantação, uma vez que evita a manutenção desnecessária de um item, abrindo espaço para inclusão de outros.

Avaliar a retirada de um item da lista de medicamentos fornecidos não significa, necessariamente, acabar com a distribuição desse item pelo SUS, mas adequar sua distribuição dentro dos níveis de atenção à saúde, e de acordo com a prevalência da doença para a qual ele é destinado. Foi isso que o Ministério da Saúde fez ao publicar a Portaria n° 2.981, que regulamenta o Programa: doenças que acometem grande parcela da população atualmente, como dislipidemia, hipotireoidismo e osteoporose, passaram a ter seu tratamento disponibilizado pela atenção básica.

Essa nova portaria trará também novo cenário de gastos com esse componente da assistência farmacêutica, uma vez que agora as três esferas de gestão (federal, estadual e municipal) têm sob suas responsabilidades o financiamento de grupos específicos de medicamentos.

Quanto às diferenças de repasses financeiros entre as regiões e estados do Brasil, é necessário explicar que o Ministério da Saúde não determina o valor do repasse. Este é pago de acordo com o que o Estado informa mediante Apac, ou seja, a demanda do cidadão é que determina o valor gasto com os medicamentos do Programa. Essa informação e os dados apresentados sugerem que, apesar do grande crescimento do Programa em todo o País, ainda existem diferenças na divulgação e no acesso a ele entre as regiões brasileiras e entre os próprios estados pertencentes a essas regiões.

Conclui-se que o Componente Especializado da Assistência Farmacêutica é peça de grande importância na saúde pública no Brasil, pois possibilita o acesso a medicamentos para tratamento de doenças de alta complexidade e ao mesmo tempo representa grande impacto financeiro no orçamento das esferas de gestão. Por esse motivo, deverá estar em constante transformação, buscando aprimorar os instrumentos e estratégias que assegurem e ampliem o acesso da população aos serviços de saúde. Além disso, deve buscar alternativas para reduzir o impacto financeiro com a aquisição dessa classe de medicamentos para que não haja prejuízos a outras áreas da saúde pública.

Recebido: 28/2/2010

Aprovado: 25/8/2010

Os autores declaram não haver conflito de interesses.

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  • Correspondência | Correspondence:
    Paola Zucchi
    R. Botucatu, 685 - Vila Clementino
    04023062 São Paulo, SP, Brasil
    E-mail:
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      04 Mar 2011
    • Data do Fascículo
      Abr 2011

    Histórico

    • Aceito
      25 Ago 2010
    • Recebido
      28 Fev 2010
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