Resumos
OBJETIVO: Analisar a evolução a longo prazo de pacientes submetidos a valvoplastia mitral percutânea por balão com a técnica do balão de Inoue versus a técnica do balão único Balt, identificando os fatores que predisseram óbito e eventos maiores (óbito, nova valvoplastia mitral por balão ou cirurgia valvar mitral). MÉTODOS: O período de seguimento, nos grupos do balão único e do balão de Inoue, foi de 54 ± 31 (1 a 126) meses e de 34 ± 26 (2 a 105) meses, respectivamente (p < 0,0001). O balão único Balt foi usado em 254 (84,1%) pacientes e o balão de Inoue, em 48 (15,9%). RESULTADOS: Foram encontrados os seguintes dados, respectivamente, no grupo do balão de Inoue e do balão único: idade, 36,9 ± 10,4 (19 a 63) anos e 38,0 ± 12,6 (13 a 83) anos (p = 0,5769); escore ecocardiográfico, 7,5 ± 1,3 pontos e 7,2 ± 1,5 pontos (p = 0,1307); sexo feminino, 72,9% e 87,4% (p = 0,0097); fibrilação atrial, 10,4% e 16,1% (p = 0,4275); mortalidade no seguimento, 2,1% e 4,3% (0,6984); e eventos maiores, 8,3% e 17,7% (p = 0,1642). Não houve, na análise univariada e nas curvas de Kaplan-Meier, diferença entre as técnicas de Inoue e do balão único Balt para sobrevida e sobrevida livre de eventos maiores. Na análise multivariada, idade > 50 anos e escore ecocardiográfico > 8 predisseram, independentemente, óbito, e escore ecocardiográfico > 8 e área valvar mitral pós-procedimento < 1,50 cm² predisseram eventos maiores. CONCLUSÃO: Não houve diferença na evolução a longo prazo dos pacientes submetidos a técnica de Inoue versus a do balão único. Predisseram óbito e/ou eventos maiores: idade > 50 anos, escore ecocardiográfico > 8 e área valvar mitral pós-procedimento < 1,50 cm².
Estenose da valva mitral; dilatação com balão; febre reumática
OBJECTIVE: To analyze the long term evolution of patients undergoing percutaneous balloon mitral valvoplasty comparing the Inoue and Balt single balloon methods, and to identify predictors of death and major events (death, repeat balloon mitral valvoplasty or mitral valve surgery). METHODS: The follow-up for the single and Inoue balloon groups were 54 ± 31 (1 to 126) months and 34 ± 26 (2 to 105) months, respectively (p < 0.0001). The Balt single balloon was used in 254 (84.1%) patients and the Inoue balloon in 48 (15.9%). RESULTS: The following data were found for the Inoue and single balloon groups, respectively: age, 36.9 ± 10.4 (19 to 63) years and 38.0 ± 12.6 (13 to 83) years (p = 0.5769); echocardiographic score, 7.5 ± 1.3 points and 7.2 ± 1.5 points (p = 0.1307); female gender, 72.9% and 87.4% (p = 0.0097); atrial fibrillation, 10.4% and 16.1% (p = 0.4275); mortality during follow-up, 2.1% and 4.3% (0.6984); and major events, 8.3% and 17.7% (p = 0.1642). Univariate and Kaplan-Meier curve analyses revealed no differences between the Inoue and Balt single balloon techniques in relation to survival and major event free survival. In the multivariate analysis, age > 50 years and an echocardiographic score > 8 were independent predictors of death; and an echocardiographic score > 8 and post operative mitral valve area < 1.50 cm² were predictors for major events. CONCLUSION: No differences were found in the long term evolution of patients undergoing the Inoue versus the single balloon technique. Predictors of death and/or major events were: age > 50 years, echocardiographic score > 8 and mitral valve area < 1.50 cm² after the procedure.
Mitral valve stenosis; balloon dilatation; rheumatic fever
ARTIGO ORIGINAL
Comparação da evolução a longo prazo da valvoplastia mitral percutânea por balão com a técnica de inoue versus a do balão único. Análise dos fatores de risco para óbito e eventos maiores
Ivana Picone Borges; Edison Carvalho Sandoval Peixoto; Rodrigo Trajano Sandoval Peixoto; Paulo Sergio de Oliveira; Mario Salles Netto; Ricardo Trajano Sandoval Peixoto; Marta Labrunie; Pierre Labrunie; Ronaldo de Amorim Villela; Aristarco Gonçalves Siqueira-Filho
Cinecor 4º Centenário - Universidade Federal Fluminense - Universidade Federal do Rio de Janeiro - Rio de Janeiro - Niterói, RJ - Brasil
Correspondência Correspondência: Edison Carvalho Sandoval Peixoto Av. Epitácio Pessoa, 4986/301 22471-003 - Rio de Janeiro, RJ - Brasil E-mail: e.sandoval.p@cardiol.br, e.sandoval.p@openlink.com.br
RESUMO
OBJETIVO: Analisar a evolução a longo prazo de pacientes submetidos a valvoplastia mitral percutânea por balão com a técnica do balão de Inoue versus a técnica do balão único Balt, identificando os fatores que predisseram óbito e eventos maiores (óbito, nova valvoplastia mitral por balão ou cirurgia valvar mitral).
MÉTODOS: O período de seguimento, nos grupos do balão único e do balão de Inoue, foi de 54 ± 31 (1 a 126) meses e de 34 ± 26 (2 a 105) meses, respectivamente (p < 0,0001). O balão único Balt foi usado em 254 (84,1%) pacientes e o balão de Inoue, em 48 (15,9%).
RESULTADOS: Foram encontrados os seguintes dados, respectivamente, no grupo do balão de Inoue e do balão único: idade, 36,9 ± 10,4 (19 a 63) anos e 38,0 ± 12,6 (13 a 83) anos (p = 0,5769); escore ecocardiográfico, 7,5 ± 1,3 pontos e 7,2 ± 1,5 pontos (p = 0,1307); sexo feminino, 72,9% e 87,4% (p = 0,0097); fibrilação atrial, 10,4% e 16,1% (p = 0,4275); mortalidade no seguimento, 2,1% e 4,3% (0,6984); e eventos maiores, 8,3% e 17,7% (p = 0,1642). Não houve, na análise univariada e nas curvas de Kaplan-Meier, diferença entre as técnicas de Inoue e do balão único Balt para sobrevida e sobrevida livre de eventos maiores. Na análise multivariada, idade > 50 anos e escore ecocardiográfico > 8 predisseram, independentemente, óbito, e escore ecocardiográfico > 8 e área valvar mitral pós-procedimento < 1,50 cm2 predisseram eventos maiores.
CONCLUSÃO: Não houve diferença na evolução a longo prazo dos pacientes submetidos a técnica de Inoue versus a do balão único. Predisseram óbito e/ou eventos maiores: idade > 50 anos, escore ecocardiográfico > 8 e área valvar mitral pós-procedimento < 1,50 cm2.
Palavras-chave: Estenose da valva mitral, dilatação com balão, febre reumática.
Introdução
Está estabelecido que área valvar mitral semelhante pós-valvoplastia por balão pode ser obtida com qualquer das técnicas de balão em uso1-4, estando em torno de 2 cm2.
Os resultados imediatos com o balão único estão descritos como semelhantes aos do balão de Inoue1 e de custo muito menor4. Existem outras alternativas de técnica de balão de menor custo5 em comparação à técnica de Inoue, que, embora mundialmente utilizada, tem custo elevado, o que levou à introdução do valvulótomo de Cribier, dispositivo metálico hoje em desuso, para diminuir o gasto com o procedimento.
A sobrevida e a sobrevida livre de eventos maiores variam, entre os grupos estudados, em função das características clínicas e ecocardiográficas e do tempo de seguimento dos pacientes6-13. Há relatos, na literatura, de mortalidade durante a evolução de ausente a 18%.
O objetivo primário deste estudo foi analisar se o uso da técnica do balão único versus a do balão de Inoue, na valvoplastia mitral percutânea, leva a resultado semelhante ou se uma das técnicas em relação à outra é fator de risco para óbito e eventos na evolução a longo prazo. O objetivo secundário foi estudar, comparativamente, os resultados a longo prazo da valvoplastia mitral percutânea por balão com as técnicas de Inoue e do balão único, analisando os resultados da população total e identificando os fatores que predizem óbito e eventos maiores (óbito, nova valvoplastia mitral por balão e cirurgia valvar mitral).
Métodos
Foi realizado estudo prospectivo longitudinal, observacional no Cinecor 4º Centenário, de pacientes submetidos a valvoplastia mitral percutânea por balão pelas técnicas do balão de Inoue e do balão único. Foram excluídos os pacientes nos quais o procedimento não foi concluído, e aqueles em que o procedimento foi concluído, mas que não completaram um mês de evolução, por perda de seguimento ou por terem apresentado complicações ou insucesso seguido de eventos maiores que impedissem o seguimento além de um mês. O seguimento foi interrompido no caso de óbito, de nova valvoplastia mitral por balão ou de cirurgia valvar mitral.
Entre julho de 1987 e dezembro de 2004 foram realizados 518 procedimentos e não houve óbito per-procedimento. No período inicial da experiência (julho de 1987 a março de 1990), durante a curva de aprendizado do método, foram realizados 25 procedimentos, dos quais 16 não foram concluídos, pelo fato de o balão não ter sido posicionado dentro da valva mitral, seguido de sua dilatação. Esses foram, portanto, procedimentos incompletos, tendo sido registrado um óbito hospitalar. Nesse mesmo período, foram realizados nove procedimentos com colocação do balão dentro da valva mitral, seguido de sua dilatação. Em três procedimentos foi utilizado balão único Meditech de 20 mm de diâmetro, com registro de um óbito hospitalar, e em seis procedimentos foi utilizado duplo balão, totalizando, portanto, oito procedimentos com sucesso e sem complicação.
A partir de abril de 1990 até dezembro de 2004, houve um procedimento incompleto, no qual não se posicionou o balão dentro da valva mitral seguido de sua dilatação. Foram realizados, nesse período, outros 492 procedimentos, não tendo havido óbito no procedimento; balão único Balt foi utilizado em 403 procedimentos, com dois óbitos hospitalares e uma cirurgia de plastia mitral por insuficiência mitral grave per-procedimento, no período intra-hospitalar, com sucesso no reparo da valva mitral; e em 89 procedimentos foi utilizado balão de Inoue.
Foram seguidos, a longo prazo, 302 procedimentos dentre os realizados entre abril de 1990 e dezembro de 2004, com as técnicas de balão único e de Inoue. Foram utilizados balão único em 254 (84,1%) procedimentos, com diâmetros de 25 mm, 25 seguido de 30 mm e 30 mm, e balão de Inoue em 48 (15,9%) procedimentos, com diâmetros máximos no procedimento de 24 mm a 28 mm. O balão único de marca Balt, usado nos 254 procedimentos, foi usado com diâmetro máximo de 25 mm em cinco (2,0%) procedimentos e com diâmetro máximo de 30 mm em 249 (98,0%) procedimentos.
O balão único Balt foi usado, na quase totalidade, em pacientes provenientes do Sistema Único de Saúde, já que na maior parte do tempo o balão de Inoue não foi autorizado para reembolso. E, mesmo após a autorização, o valor do reembolso em geral não era aceito pelos fornecedores no Estado do Rio de Janeiro. O balão de Inoue foi utilizado na quase totalidade em pacientes provenientes do sistema privado de planos de saúde. Ocasionalmente, a escolha dependeu da disponibilidade de um ou de outro desses balões no mercado.
Em todos os pacientes foi realizado exame ecocardiográfico pré-valvoplastia mitral por balão e em 233 pacientes o exame foi realizado no final da evolução, sendo a área valvar mitral obtida por planimetria ou por pressure half-time. A morfologia valvar mitral foi avaliada pelo escore de Wilkins14. O grau de regurgitação mitral foi avaliado por ecocardiografia Doppler, de acordo com a extensão da regurgitação no átrio esquerdo, em discreto, moderado e grave. Regurgitação mitral pré-valvoplastia pré-intervenção, nova regurgitação mitral ou agravamento do grau de regurgitação mitral prévia per-procedimento foram quantificados angiograficamente pelo critério de Sellers e cols.15, sendo considerada grave a regurgitação de 3 ou 4+. O gradiente foi medido pela planimetria da área do gradiente, sendo estabelecida a área valvar mitral antes e após a dilatação, determinando-se o débito cardíaco por termodiluição e utilizando-se a fórmula de Gorlin e Gorlin16. No início e no final do procedimento, a área valvar mitral foi determinada pelo cálculo hemodinâmico16. O acompanhamento foi realizado por meio de contato telefônico ou por carta, com nova consulta quando necessário, avaliando-se a classe funcional pela classificação da New York Heart Association (NYHA), a mortalidade e a causa de óbito, as medicações em uso, e a realização de cirurgia de valva mitral ou de nova valvoplastia mitral por balão. A evolução clínica dos pacientes em estudo foi considerada a partir de um mês do procedimento.
Os pacientes foram divididos em dois grupos, conforme a técnica de balão utilizada: balão único ou balão de Inoue.
Sucesso foi definido como área valvar mitral > 1,50 cm2 após o procedimento, por meio de cálculo hemodinâmico, sem insuficiência mitral grave.
As comparações entre as variáveis contínuas foram realizadas com o teste t de Student, nos casos em que a distribuição era normal; caso contrário, foi utilizado o teste de Mann-Whitney. As comparações entre as variáveis categóricas foram realizadas pelo teste do qui-quadrado, pelo teste do qui-quadrado com correção de Yates e pelo teste exato de Fisher, conforme as freqüências do evento. O programa EPI INFO (versão 6, Centers for Disease Control and Prevention, Atlanta, EUA) foi utilizado para os cálculos e como banco de dados. Para a análise multivariada, foi utilizado o modelo de regressão de Cox por etapas para identificar os fatores independentes, que predisseram óbito e eventos maiores (óbito, nova valvoplastia mitral por balão e cirurgia valvar mitral) na evolução a longo prazo, usando-se o programa SPSS for Windows (versão 10.0, SPSS Inc., Chicago, Illinois, EUA). As variáveis que demonstraram probabilidade de erro igual ou inferior a 10% (p < 0,10), na análise univariada, foram submetidas a análise multivariada (forward conditional). Para as variáveis independentes para prever sobrevida ou sobrevida livre de eventos maiores, foram realizadas as curvas de Kaplan-Meier respectivas, asim como foi realizada a curva de Kaplan-Meier para as duas técnicas de balão.
As variáveis categóricas estudadas foram: idade (< 50 anos ou > 50 anos), sexo, comissurotomia mitral prévia, valvoplastia mitral prévia, ritmo (sinusal ou fibrilação atrial), escore ecocardiográfico (< 8 e > 8 pontos), diâmetro máximo do balão de dilatação (< 29 mm e > 29 mm), área efetiva de dilatação valvar mitral (< 6 cm2 e > 6 cm2), presença de insuficiência mitral pré-procedimento, área valvar mitral ecocardiográfica pré-procedimento (< 1 cm2 e > 1cm2), área valvar mitral calculada pela hemodinâmica pré-procedimento (< 1 cm2 e > 1 cm2), área valvar mitral calculada pela hemodinâmica pós-procedimento ou sucesso (< 1,5 cm2 e > 1,5 cm2), pressão arterial pulmonar média pré-valvoplastia mitral (< 40 mmHg e > 40 mmHg), pressão arterial pulmonar sistólica pré-valvoplastia mitral por balão (< 60 mmHg e > 60 mmHg), e tipo do balão de dilatação (balão de Inoue ou balão único Balt). As variáveis selecionadas para o modelo multivariado de sobrevida ou sobrevida livre de eventos foram aquelas com p < 0,10 na análise univariada.
Resultados
As características clínicas e ecocardiográficas e o tempo de evolução estão apresentados na tabela 1. A classe funcional da NYHA nos grupos dos balões único e de Inoue pré-valvoplastia mitral por balão e no final da evolução está apresentada na tabela 2. As características hemodinâmicas, os resultados e as complicações dos procedimentos, e os achados de evolução, mortalidade e eventos maiores estão descritos na tabela 3. O resultado da análise multivariada, com as variáveis independentes para sobrevida e sobrevida livre de eventos maiores, está apresentado na tabela 4. Para as variáveis significativas na análise multivariada, para a sobrevida e para a sobrevida livre de eventos maiores foram realizadas as curvas de Kaplan-Meier (tab. 5). As curvas de sobrevida para idade, escore ecocardiográfico e técnica de balão utilizado (balão único Balt ou balão de Inoue) estão apresentadas nas figuras 1 a 3.
Discussão
No presente estudo, a técnica do balão único Balt foi comparada à técnica do balão de Inoue, não tendo sido registradas diferenças no que se refere a óbito e eventos maiores na evolução a longo prazo dos dois grupos. Os resultados imediatos das duas técnicas já haviam sido relatados1,4. Por meio de um modelo para análises univariada e multivariada, foi demonstrado que o tipo de balão usado não determinava diferença significativa na sobrevida e na sobrevida livre de eventos maiores.
Na literatura, foram observados estudos com diferentes períodos de seguimento, variando entre um ano e 12 anos de acompanhamento, após a realização da valvoplastia mitral por balão6,9,12,13,17-22.
A idade dos pacientes deste estudo submetidos a valvoplastia mitral por balão único foi de 38,1 ± 12,4 anos e no grupo do balão de Inoue foi de 36,9 ± 10,4 anos, sem diferença significativa, intermediária, quando comparada à de pacientes de países como Índia23, Tunísia3 e Egito24, mais jovens, e de pacientes da Europa8,19,25, dos Estados Unidos10,12,26 e do Japão20, com idade mais elevada.
O sexo feminino foi predominante em ambos os grupos estudados, o que condiz com a literatura3,12,18,20,22, com maior porcentual no grupo do balão único neste estudo.
A maior parte dos pacientes estudados estava em classes funcionais III e IV da NYHA, o que está de acordo com a literatura12,19, sendo o grupo do balão de Inoue menos sintomático pré-procedimento. No final da evolução, não havia diferença entre os grupos, estando 76,8% do total dos pacientes em classes funcionais I e II, dos quais 89,6% no grupo do balão de Inoue e 74,4% no grupo do balão único, embora o grupo do balão único tenha apresentado maior período de evolução. Atualmente, aceita-se a indicação de intervenção com classe funcional II da NYHA e, excepcionalmente, em classe funcional I para a realização de valvoplastia mitral por balão27, como no presente estudo, com excelentes resultados imediatos e a longo prazo28. As classes funcionais I e II, no final da evolução, variaram de 36% a 95%, em função das características da população e do tempo de evolução3,8,10.
A maioria dos pacientes deste estudo encontrava-se em ritmo sinusal no momento da indicação do procedimento, não havendo diferença entre os grupos. Farhat e cols.3 relataram 71% dos pacientes em ritmo sinusal no pré-procedimento, em população jovem. Populações mais velhas12 em geral apresentam escore ecocardiográfico maior e maior incidência de fibrilação atrial. Para alguns, a presença de fibrilação atrial é fator que prediz eventos no acompanhamento a longo prazo8,10,12,29,30, mas não para outros12,18,19,31,32.
A valvoplastia mitral por balão proporciona queda imediata da pressão tanto pulmonar como de átrio esquerdo, conforme observado neste estudo e na literatura3,6,11,14,33, o que ocorreu igualmente nos dois grupos estudados.
Em ambos os grupos estudados, predominou escore ecocardiográfico < 8, como em outros estudos da literatura12,18,34,35, cuja evolução é mais favorável. Apesar de resultados menos satisfatórios, o grupo com escore ecocardiográfico > 8 também apresenta bons resultados e evolução aceitável13,18, sobretudo se o escore ecocardiográfico for < 1113. Nos grupos de balão único e de balão de Inoue, o escore ecocardiográfico apresentou médias semelhantes, apesar de maior porcentual de escore > 8 no grupo do balão de Inoue.
Neste estudo, a presença de insuficiência mitral pré-procedimento foi maior no grupo do balão único, porém não houve diferença quanto à ocorrência de insuficiência mitral grave pós-procedimento entre os pacientes dos grupos do balão único e de Inoue, que entraram na evolução a longo prazo, bem como no aparecimento de nova insuficiência mitral grave no final da evolução. A ocorrência de insuficiência mitral grave durante o procedimento predisse eventos na evolução a longo prazo, em outros estudos11-13,19,22,32,35, e a mesma pode ser prevista por um escore ecocardiográfico específico para predizer insuficiência mitral36. A insuficiência mitral pré-valvoplastia prediz menor sobrevida livre de eventos11. Kaul e cols.23 encontraram 3,3% de casos de insuficiência mitral grave no pós-imediato, dos quais 55% necessitaram de troca valvar urgente, e, no final do seguimento, observaram 8,4% de casos de insuficiência mitral grave, dos quais 37,7% necessitaram de cirurgia valvar mitral.
Neste estudo, a área valvar mitral foi semelhante entre os dois grupos no pré e pós-procedimento e no final da evolução. Está comprovado que se pode obter área valvar mitral pós-valvoplastia mitral percutânea por balão semelhante com qualquer uma das técnicas de balão em uso, desde que as áreas efetivas de dilatação dos balões sejam comparáveis1-5.
Ao final da evolução, foram encontrados 12 (4,0%) casos de óbito, 11 (4,3%) no grupo do balão único e um (2,1%) no grupo do balão de Inoue, sem diferença significativa. A mortalidade na literatura varia de nula37 a 18%12,18-20,26,38, em períodos de um a 10 anos, sendo maior em grupos com maior escore ecocardiográfico12,13, atingindo 17% a 18%9,18 em função de características desfavoráveis ou de seguimento mais longo. O período de seguimento do grupo do balão único (54 ± 31 meses) foi maior que o do grupo do balão de Inoue (34 ± 26 meses). Os métodos estáticos utilizados neste estudo fazem a correção para tempo de evolução.
No acompanhamento a longo prazo, a sobrevida encontrada variou muito (82% a 100%) em períodos de cinco a sete anos de acompanhamento,6,9,12,17,19,20,39. Os resultados de longo prazo são menos satisfatórios na Europa e nos Estados Unidos12,25, com pacientes mais velhos e anatomia valvar mitral mais alterada. A sobrevida neste estudo, no fim da evolução, foi de 95,7% no grupo do balão único e de 97,9% no grupo do balão de Inoue. A sobrevida livre de eventos maiores foi de 82,3% no grupo do balão único e de 91,7% no grupo do balão de Inoue, sendo encontrados, na literatura, porcentuais entre 16% e 90% em acompanhamento de quatro a 12 anos6-12,19,25,38,39, pela diversidade dos grupos de pacientes.
Na análise univariada, não houve diferença quanto à técnica utilizada (balão único ou de Inoue) e essa variável não atingiu critério para entrada no modelo multivariado. Na análise multivariada, observou-se que apenas o escore ecocardiográfico > 8 e a idade > 50 anos foram fatores independentes, que predisseram óbito na evolução a longo prazo. Na literatura, maior idade dos pacientes, maior escore ecocardiográfico, classe funcional mais elevada no pré e no pós-procedimento, pressão arterial pulmonar sistólica e pressão diastólica final de ventrículo esquerdo elevadas, e ocorrência de insuficiência mitral grave durante o procedimento de valvoplastia por balão têm sido citados como variáveis independentes para predizer óbito12,13,38.
Pela análise multivariada, os fatores independentes que predisseram eventos na evolução a longo prazo neste estudo foram escore ecocardiográfico > 8 e insucesso no procedimento (área valvar mitral < 1,50 cm2). Na literatura, são encontrados como fatores independentes para eventos: menor área valvar mitral pós-procedimento8,13,19,22,25,40, fibrilação atrial prévia ao procedimento8,10,11,13,29,30, passado de comissurotomia mitral cirúrgica12,13,25,26,32 (apesar de o grupo com reestenose pós-plastia cirúrgica ou por balão ainda poder apresentar bons resultados e boa evolução34,41), presença de insuficiência valvar mitral grave pós-procedimento8,12,13,19,21,26,32,40 , classe funcional pré-procedimento elevada8,10,12, escore ecocardiográfico pré-procedimento elevado11,12,18,19,22, idade elevada8-12, anatomia valvar mitral desfavorável8-11,24, pressão arterial pulmonar média elevada pós-procedimento9,12,22, gradiente transvalvar mitral elevado pós-procedimento8,10,26,30, pressão de átrio esquerdo elevada após o procedimento ou átrio esquerdo aumentado18,26, sexo masculino18, índice cardiotorácico aumentado9,25 e presença de co-morbidades18.
Estudos e relatos de populações submetidas a valvoplastia mitral por balões únicos de grande diâmetro, de menor custo, e sua comparação com o balão de Inoue são raros1,4,5.
A perda de seguimento na evolução a longo prazo é uma das limitações do estudo; entretanto, a população estudada é elevada para esse tipo de procedimento, sendo a maior população relatada com uso da técnica do balão único de grande diâmetro. Outra limitação do estudo é o fato de não ser randomizado; entretanto, as variáveis estudadas (características clínicas, ecocardiográficas e hemodinâmicas) nos dois grupos não apresentaram, na quase totalidade, diferença estatisticamente significativa e, temporalmente, ambas as técnicas foram realizadas ao longo do período de estudo.
Conclusão
Não foi observada diferença no que se refere a resultados imediatos e evolução a longo prazo entre as técnicas do balão de Inoue e do balão único Balt de grande diâmetro, quer na análise univariada quer nas curvas de Kaplan-Meier para sobrevida e sobrevida livre de eventos. Na evolução a longo prazo, idade > 50 anos e escore ecocardiográfico > 8 foram variáveis independentes para predizer óbito, e escore ecocardiográfico > 8 e área valvar mitral pós-procedimento < 1,50 cm² foram variáveis independentes para predizer eventos maiores, ficando próximo ao significado o ritmo de fibrilação atrial.
Potencial Conflito de Interesses
Declaro não haver conflitos de interesses pertinentes.
Fontes de Financiamento
Esse estudo foi financiado com recursos próprios do investigador.
Vinculação Acadêmica à Pós-Graduação
Esse estudo é parte de tese de doutorado apresentada à Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Artigo recebido em 19/08/06; revisado recebido em 16/02/07; aceito em 13/03/07.
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Correspondência:
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
28 Ago 2007 -
Data do Fascículo
Jul 2007
Histórico
-
Recebido
19 Ago 2006 -
Aceito
13 Mar 2007