Resumos
FUNDAMENTO: O envelhecimento fisiológico leva a uma disfunção autonômica cardíaca que está associada ao surgimento e ao agravamento de doenças cardiovasculares e a um maior risco de morte. Atualmente, o exercício físico é apontado como uma estratégia cardioprotetora, sendo necessários mais estudos do seu benefício na função autonômica cardíaca. OBJETIVO: Avaliar o controle autonômico da frequência cardíaca em voluntários jovens e de meia-idade com diferentes níveis de aptidão aeróbica. MÉTODOS: Participaram do estudo 68 voluntários, estratificados quanto à idade e ao nível de aptidão aeróbica. Com base na aptidão aeróbica avaliada pelo teste de esforço submáximo, os sujeitos foram separados em dois grupos, aptidão boa e aptidão deficiente. A avaliação do controle autonômico cardíaco se deu a partir de medidas da variabilidade da frequência cardíaca em repouso e a recuperação da frequência cardíaca pós-esforço. Para comparação das variáveis investigadas, utilizou-se a análise de variância bifatorial. RESULTADOS: A variabilidade da frequência cardíaca é significativamente menor nos voluntários de meia-idade do que nos jovens, independentemente do nível de aptidão aeróbica (p < 0,01). Melhores níveis de aptidão aeróbica nos voluntários de meia-idade estão associados à reentrada vagal pós-esforço mais precoce - taxa de declínio da FC após 1min30s: 39,6% aptidão aeróbica boa vs. 28,4% deficiente (p < 0,01). CONCLUSÃO: Melhores níveis de aptidão aeróbica atuam beneficamente no controle autonômico da frequência cardíaca pós-esforço, preservando a velocidade de reentrada vagal em voluntários de meia-idade. No entanto, não atenua a redução da variabilidade da frequência cardíaca decorrente do processo natural de envelhecimento.
Sistema nervoso autônomo; frequência cardíaca; aptidão física; exercício; meia idade; adulto jovem
BACKGROUND: Physiological aging leads to cardiac autonomic dysfunction, which is associated with the onset and worsening of cardiovascular disease and an increased risk of death. Currently, physical exercise is considered a cardioprotective strategy and more research is needed on its benefit on cardiac autonomic function. OBJECTIVE: To evaluate the autonomic control of heart rate in healthy young and middle-aged volunteers with different levels of aerobic fitness. METHODS: The study included 68 volunteers, stratified for age and level of aerobic fitness. Based on aerobic fitness assessed by the submaximal exercise test, subjects were separated into two groups, good fitness and poor fitness. Assessment of cardiac autonomic control was performed based on measurements of heart rate variability at rest and heart rate recovery post-exercise. Analysis of variance with two factors was used to compare the variables investigated. RESULTS: The heart rate variability is significantly lower in middle-aged volunteers than in young individuals, regardless of the aerobic fitness level (p <0.01). Higher levels of aerobic fitness in middle-aged volunteers are associated with earlier post-effort vagal reentry - rate of HR decline after 1min30s: 39.6% good aerobic fitness vs. poor 28.4% (p < 0.01). CONCLUSION: Better levels of aerobic fitness act beneficially on the autonomic control of post-exercise heart rate, preserving the vagal reentry velocity in healthy middle-aged volunteers. However, it does not attenuate the decrease in heart rate variability due to the natural aging process.
Autonomic nervous system; heart rate; physical fitness; exercise; middle aged; young adult
Efeitos da idade e da aptidão aeróbica na recuperação da frequência cardíaca em homens adultos
Gabriela Alves TrevizaniI,III; Paulo Roberto Benchimol-BarbosaII,III; Jurandir NadalI,III
IPrograma de Engenharia Biomédica, COPPE/UFRJ
IIHospital Universitário Pedro Ernesto, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, RJ
IIINúcleo Interdisciplinar de Pesquisa em Modulação Autonômica Cardíaca e Envelhecimento, Universidade Federal de Juiz de Fora, MG, Brasil
Correspondência Correspondência: Jurandir Nadal Programa de Engenharia Biomédica COPPE/UFRJ Caixa Postal 68510 CEP 21941-972, Rio de Janeiro, RJ - Brasil E-mail: jn@peb.ufrj.br
RESUMO
FUNDAMENTO: O envelhecimento fisiológico leva a uma disfunção autonômica cardíaca que está associada ao surgimento e ao agravamento de doenças cardiovasculares e a um maior risco de morte. Atualmente, o exercício físico é apontado como uma estratégia cardioprotetora, sendo necessários mais estudos do seu benefício na função autonômica cardíaca.
OBJETIVO: Avaliar o controle autonômico da frequência cardíaca em voluntários jovens e de meia-idade com diferentes níveis de aptidão aeróbica.
MÉTODOS: Participaram do estudo 68 voluntários, estratificados quanto à idade e ao nível de aptidão aeróbica. Com base na aptidão aeróbica avaliada pelo teste de esforço submáximo, os sujeitos foram separados em dois grupos, aptidão boa e aptidão deficiente. A avaliação do controle autonômico cardíaco se deu a partir de medidas da variabilidade da frequência cardíaca em repouso e a recuperação da frequência cardíaca pós-esforço. Para comparação das variáveis investigadas, utilizou-se a análise de variância bifatorial.
RESULTADOS: A variabilidade da frequência cardíaca é significativamente menor nos voluntários de meia-idade do que nos jovens, independentemente do nível de aptidão aeróbica (p < 0,01). Melhores níveis de aptidão aeróbica nos voluntários de meia-idade estão associados à reentrada vagal pós-esforço mais precoce - taxa de declínio da FC após 1min30s: 39,6% aptidão aeróbica boa vs. 28,4% deficiente (p < 0,01).
CONCLUSÃO: Melhores níveis de aptidão aeróbica atuam beneficamente no controle autonômico da frequência cardíaca pós-esforço, preservando a velocidade de reentrada vagal em voluntários de meia-idade. No entanto, não atenua a redução da variabilidade da frequência cardíaca decorrente do processo natural de envelhecimento. (Arq Bras Cardiol. 2012; [online].ahead print, PP.0-0)
Palavras-chave: Sistema nervoso autônomo; frequência cardíaca; aptidão física; exercício; meia idade; adulto jovem.
Introdução
A variabilidade da frequência cardíaca (VFC) é uma ferramenta não invasiva utilizada para análise da modulação autonômica cardíaca, sendo um indicador funcional do sistema nervoso autonômico1. Estudos mostram que há redução da VFC com o avançar da idade2-6 e que esta redução está associada ao surgimento ou agravamento de doenças cardiovasculares, aumentando o risco de morte por todas as causas7-11.
Não obstante, o papel cardioprotetor do exercício físico é um consenso na literatura, sendo considerado importante na preservação da saúde em todas as faixas de idade. Entretanto, seu efeito sobre VFC após programas de treinamento aeróbico e a correlação positiva esperada entre maiores de níveis de aptidão aeróbica e VFC ainda é controversa. Estudos mostram que indivíduos idosos praticantes de atividade física por vários anos possuem maiores índices de VFC do que sedentários12-14. Por outro lado, há evidências de que programas de treinamento aeróbico não exercem influência significativa nos índices da VFC em indivíduos de meia-idade5,15-17.
Outra medida de avaliação da função autonômica cardíaca é a recuperação da frequência cardíaca (RFC) pós-esforço, definida como a taxa de declínio da FC após a interrupção do esforço18. Existem relatos na literatura de que indivíduos de meia-idade e idosos apresentam retardo na recuperação da FC após teste de esforço se comparado a jovens19,20 e que medidas de RFC estão diretamente relacionadas ao nível de aptidão aeróbica21,22. Além disso, indivíduos saudáveis treinados apresentam RFC pós-esforço mais rápida do que controles sedentários20,23,24.
Nesse contexto, o objetivo do presente estudo foi avaliar a função autonômica cardíaca, empregando a análise da VFC de repouso e da RFC após teste de esforço submáximo em voluntários jovens e de meia-idade saudáveis.
Métodos
População do estudo
Foram recrutados 68 voluntários com idade variando de 20 a 60 anos, do sexo masculino, sadios e não fumantes. Devido à distribuição da faixa etária da amostra, optou-se por estudar, primordialmente, 50 desses voluntários distribuídos em dois grupos: jovens (20-30 anos) e meia-idade (40-60 anos). Sendo assim, foram investigados quatro grupos experimentais: jovens com aptidão aeróbica boa (JAB; n = 11; idade = 24,7 ± 2,8), jovens com aptidão aeróbica deficiente (JAD; n = 12; idade = 24,9 ± 2,3), meia-idade com aptidão aeróbica boa (MIAB; n = 13; idade = 47,3 ± 6,6) e meia-idade com aptidão aeróbica deficiente (MIAD; n = 14; idade = 48,0 ± 5,4). Os 18 voluntários restantes, com idades entre 31 e 39 anos, foram considerados apenas para a análise de regressão múltipla, descrita na subseção de análise estatística. Todos os voluntários foram recrutados considerando-se os seguintes critérios de exclusão: i) estar fazendo uso de medicação e ii) apresentar sinais ou sintomas de patologias cardiovasculares detectados pela avaliação clínica.
Aspectos de natureza ética
O protocolo experimental foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Instituto Nacional de Cardiologia. Todos os voluntários foram esclarecidos e orientados a respeito da participação no estudo e assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.
Avaliação dos voluntários
Todos os voluntários foram submetidos à avaliação, composta por: i) anamnese (dados pessoais, investigação dos hábitos de vida e de atividade física, história de doenças pregressas e de fatores de risco para doenças do sistema cardiovascular) e ii) exame físico (inspeção geral, verificação da estatura e massa corporal total, avaliação osteomiarticular global, aferição da frequência cardíaca e respiratória e da pressão arterial sistólica e diastólica de repouso).
Protocolo experimental
Aquisição e processamento do sinal eletrocardiográfico (ECG)
Os sinais de ECG foram captados em ambiente próprio, com temperatura controlada e baixo nível de ruído, sempre no período da tarde, entre 14 h e 17 h. Para a realização do protocolo experimental, os voluntários foram previamente orientados aos seguintes procedimentos: i) não ingerir bebidas alcoólicas ou cafeinadas por 24 h, ii) ter uma boa noite de sono, iii) não se exercitar por 24 h e iv) evitar a ingestão de alimentos por pelo menos duas horas antes da realização do teste.
Para aquisição do sinal de ECG foram colocados três pares de eletrodos cutâneos para obtenção das derivações X, Y e Z de Frank modificadas8. Após a colocação dos eletrodos, os voluntários permaneceram em repouso, na posição supina, durante um período mínimo de 10 min para estabilização da FC antes do início da coleta do sinal de ECG para análise da VFC. A coleta do sinal foi realizada com respiração espontânea durante os primeiros 15 minutos. Em seguida, os voluntários foram orientados a respirar de acordo com o ritmo determinado pelo avaliador, durante cinco minutos, sendo que a inspiração durou dois segundos e a expiração três segundos. Assim, o ritmo respiratório foi controlado (RC) a uma frequência de 12 incursões respiratórias por minuto (irpm), correspondentes a 0,2 Hz para que se tivesse uma relação 2:3 entre a inspiração e a expiração.
O processamento do sinal eletrocardiográfico para análise da modulação autonômica da frequência cardíaca foi realizado da seguinte maneira: a partir do sinal eletrocardiográfico digitalizado, efetuou-se a detecção automática das ondas R. A seguir, foram calculados os valores dos intervalos entre as ondas R do ECG (IRR) para construção do tacograma. O sinal foi processado para exclusão de batimentos prematuros e artefatos e dos batimentos imediatamente anterior e posterior, e para obtenção dos valores de IRR normais (INN) que foram utilizados na construção do tacograma considerado para análise. Seguindo as recomendações das Sociedades Americana e Europeia de Cardiologia1, no tocante à duração dos sinais eletrocardiográficos de curta duração, utilizou-se os cinco primeiros minutos ininterruptos do sinal sem a presença de artefatos e extrassístoles.
Para o estudo da VFC, no domínio do tempo, foram calculadas as variáveis extraídas dos tacogramas de INN e baseadas em relações estatísticas, dadas por (TASK FORCE, 1996):
a. SDNN - desvio-padrão dos intervalos INN;
b. RMSSD - raiz média quadrática das diferenças de batimentos sucessivos, dada por
na qual, n é o número total de intervalos INN no sinal analisado e a duração do i-ésimo intervalo é INNi;
A variável SDNN reflete a participação de todos os componentes rítmicos responsáveis pela variabilidade, sendo relacionada às contribuições de ambos os ramos do sistema nervoso autônomo, enquanto que a variável RMSSD reflete as contribuições de variações em altas frequências, as quais estão relacionadas à atuação vagal1.
Para investigação da VFC no domínio da frequência, cada tacograma de INN foi interpolado, por meio de spline linear, para obtenção de amostras igualmente espaçadas, e reamostrado com frequência de 2 Hz para ser utilizado no cálculo da estimativa da função densidade espectral de potência (PSD) pela transformada rápida de Fourier (FFT).
A partir da PSD foram consideradas duas bandas de frequência: baixa frequência (LF; 0,04-0,15 Hz), relacionada ao mecanismo barorreflexo; e alta frequência (HF; 0,15-0,4 Hz), relacionada à respiração e à atividade vagal25,26. Em seguida, foi estimada a relação LF/HF que caracteriza o balanço simpatovagal25.
Teste ergométrico submáximo
Classificação da aptidão aeróbica
Para classificação dos voluntários em relação ao nível de aptidão aeróbica submáxima, realizou-se o teste ergométrico submáximo (critério de interrupção do teste: atingir 85% da frequência cardíaca máxima predita para a idade (220 menos a idade)), com a utilização do protocolo de Bruce27. A partir do tempo total gasto na realização do teste ergométrico submáximo (Tempo TE), efetuou-se a análise descritiva dessa variável. A mediana do tempo TE entre todos os testes realizados, para cada faixa etária, foi usada para classificar a população em relação ao nível de aptidão aeróbica submáxima como descrito adiante. A escala de percepção subjetivo do esforço de Borg foi utilizada para monitorização do esforço a cada etapa do teste ergométrico. Além disso, no início e ao final de cada etapa do referido teste, aferia-se a frequência cardíaca (FC), pressão arterial sistólica (PAS) e diastólica (PAD). Quanto ao nível de aptidão aeróbica submáxima, a amostra foi qualitativamente classificada em: (a) aptidão aeróbica boa (AB): indivíduos que apresentaram tempo TE maior do que a mediana, estratificados por faixa etária; ou (b) aptidão aeróbica deficiente (AD): indivíduos que apresentaram tempo TE menor do que a mediana, estratificados por faixa etária.
Protocolo de recuperação pós-teste de esforço submáximo
Foi realizado de tal forma que a recuperação pós-esforço se desse de forma lenta, gradual, minimizando efeitos adversos, como desmaio, queda pressórica anormal entre outros. Com esse intuito foi dividido em três etapas sequenciais:
Etapa 1 - durante retirada gradual da inclinação da esteira, no decorrer de 1 min e 30 s, a velocidade era gradualmente diminuída até que atingisse 1,6 Km/h;
Etapa 2 - o voluntário caminhava a uma velocidade de 1,6 Km/h durante 1 min e 30 s adicionais;
Etapa 3 - o voluntário permanecia em pé sobre a esteira rolante por mais 2 min, encerrando o protocolo de recuperação pós-esforço.
A RFC foi definida como a diferença entre a FC pico e a FC atingida em cada etapa da recuperação definida acima normalizada pela FC pico e estudada em cada uma das seguintes fases:
Análise estatística
Em todos os testes estatísticos, o nível de significância foi estabelecido em α = 0,05. Os dados numéricos são apresentados no formato média ± desvio-padrão (DP). A apresentação visual dos resultados está no formato de gráfico boxplot.
A análise de amostragem foi realizada sobre a variável RMSSD baseada no trabalho de Marocolo e cols.28, considerando uma diferença entre as médias dos grupos sedentário e ativo fisicamente de 34,4 ms, desvio-padrão de 28,8 ms em ambos os grupos e distribuição de indivíduos entre os grupos com relação 1:1, considerando valores de erros α = 0,05 e β = 0,1. O tamanho da amostra foi calculado com auxílio do softwareStatGraphics 5.1, resultando 10 sujeitos para cada faixa etária.
As variáveis analisadas foram: FC de repouso, FR de repouso, PAS, PAD, índice de massa corporal (IMC), percepção subjetiva do esforço na última etapa do TE submáximo (PSE), tempo TE, RFC nas etapas D1, D2 e R, e índices da VFC (SDNN, RMSSD, HF, LF, LF/HF) durante respiração espontânea e RC. Para tais variáveis, foi empregada a análise da variância bifatorial (ANOVA two-way) com os fatores faixa etária e aptidão aeróbica, seguida do pós-teste de Bonferroni. As variáveis da VFC foram transformadas em seus logaritmos naturais (LnT), com o objetivo de normalizar as funções de distribuição de probabilidade8.
Com o intuito de verificar a correlação entre os parâmetros da VFC e a variável idade realizou-se análise de correlação linear de Pearson.
A análise de regressão linear múltipla Stepwise foi realizada a fim de se obter quais são as variáveis fisiológicas (idade, FC, FR, PAS, PAD, RFC - D1, D2 e R, IMC, tempo TE) responsáveis por possíveis mudanças nos parâmetros de análise da VFC em homens saudáveis de 20 a 60 anos. Nesse caso específico, foram considerados os dados de 68 sujeitos, sendo acrescentados os dados dos 18 voluntários com faixa etária entre 31 e 39 anos.
Resultados
Características da amostra
As variáveis fisiológicas, IMC, PAS, PAD, FC de repouso, FR de repouso e PSE não foram significativamente diferentes entre os grupos estudados (Tabela 1).
No que diz respeito ao tempo total de duração do teste ergométrico (Tempo TE), a análise de variância indicou diferenças significativas (p < 0,0001) em função da faixa etária e da aptidão física (Tabela 1). Observou-se que o tempo TE foi significativamente menor (p < 0,0001) nos grupos AD se comparado aos indivíduos com AB, tanto em voluntários jovens quanto de meia-idade. Adicionalmente, o tempo TE foi significativamente menor (p < 0,001) nos voluntários de meia-idade em comparação aos jovens, para ambos os níveis de aptidão aeróbica (Tabela 1).
Efeito das faixas de idade e da aptidão aeróbica sobre VFC
Os parâmetros da VFC, tanto em respiração espontânea quanto em respiração controlada, foram significativamente mais baixos nos voluntários de meia-idade quando comparado aos voluntários jovens, exceto para a variável Ln(LF/HF) que reflete o balanço simpatovagal (Tabela 2). Não houve diferenças significativas entre os grupos quando analisada a aptidão aeróbica (Tabela 2).
Análise da recuperação da frequência cardíaca pós-teste
Considerando a RFC nas fases D1 e D2, observou-se diminuição significativa da RFC nos voluntários de meia-idade com aptidão aeróbica deficiente em comparação aos de aptidão aeróbica boa (p < 0,01; Gráficos 1a e 1b, respectivamente). Na fase R, não houve diferença significativa entre os grupos estudados, tanto em relação à idade quanto à aptidão aeróbica (Gráfico 1c).
Análise de correlação entre parâmetros da VFC e a variável idade
A análise da correlação linear de Pearson entre os parâmetros da VFC, em respiração espontânea e em respiração controlada, e a variável idade dos voluntários foi significativa para todos os parâmetros estudados. Houve correlação negativa entre a variável idade com Ln(SDNN), Ln(RMSSD), Ln(LF), Ln(HF) e correlação positiva com Ln(LF/HF). Desses parâmetros, o que apresentou maior correlação com a idade, tanto em respiração espontânea como em respiração controlada, foi Ln(HF) no domínio da frequência e Ln(RMSSD) no domínio do tempo, parâmetros estes representantes da modulação vagal cardíaca (Tabela 3).
Análise da regressão linear múltipla
Para análise da regressão múltipla, foi testada como variável dependente o Ln (RMSSD_E), por representar a variável no domínio do tempo com maior correlação com a idade e apresentar maior simplicidade no cálculo. Inicialmente, as seguintes variáveis independentes entraram no modelo de regressão múltipla: tempo de TE, PAS, IMC, FR, RFC (D1, D2 e R), FC de repouso e idade (20 a 60 anos).
Após análise das colinearidades e ajustes do modelo de regressão múltipla stepwise, as seguintes variáveis independentes permaneceram no modelo final: idade e FC de repouso (Tabela 4). O coeficiente de determinação foi R2 = 64,9% (p < 0,001).
A equação do modelo final ajustado foi a seguinte:
Ln(RMSSD_E) = 8,52 - (0,06 x FC de repouso) - (0,03 x Idade)
A análise da regressão múltipla mostra que a variável modulação vagal cardíaca representada pela variável Ln(RMSSD) em respiração espontânea (Ln(RMSSD_E)) foi explicada (aproximadamente 65%) pela FC de repouso e a idade (Tabela 4).
As variáveis independentes do modelo final de regressão múltipla, FC de repouso e idade, apresentaram associação negativa com a variável dependente Ln(RMSSD_E) (Gráficos 2 e 3).
Análise post hoc da potência estatística
A avaliação post hoc do poder do teste estatístico (1-β) foi realizada tomando por base a comparação das médias das variáveis RFC nas fases D1 e D2 entre os grupos voluntários de meia-idade com aptidão aeróbica boa versus os de aptidão aeróbica deficiente, consideração uma abordagem unicaudal. A análise evidenciou que com o tamanho da amostra utilizada no presente estudo para a análise da variável D1, o teste estatístico apresentou um poder de 95% e para a variável D2 de 90%. A variável LnRMSSD em respiração espontânea apresentou um poder de 95% na amostra recrutada quando comparado os indivíduos jovens versus os de meia-idade com aptidão aeróbica boa, assim como os indivíduos jovens versus os de meia-idade com aptidão aeróbica deficiente.
Discussão
A modulação autonômica da FC, medida por meio da VFC de repouso, foi significativamente menor nos voluntários de meia-idade em comparação com os jovens, caracterizando o efeito deletério do envelhecimento na função autonômica cardíaca. Esse achado foi similar a vários estudos descritos na literatura que avaliaram indivíduos saudáveis com faixas etárias parecidas às do presente trabalho2,4,6,15,29. Porém, melhores valores de aptidão aeróbica não foram eficazes em atenuar a redução da VFC com o avançar da idade.
Migliaro e cols.29 encontraram resultados semelhantes ao do presente trabalho, na medida em que não evidenciaram diferenças significativas na VFC de repouso entre jovens sedentários e não sedentários. Avaliando o efeito de um programa de treinamento aeróbico de curta duração com intensidade leve a moderada na VFC de indivíduos de meia-idade (40-60 anos), Silva15 não encontrou nenhuma mudança nos índices da VFC, apesar de ter evidenciado melhora na aptidão aeróbica. Por outro lado, De Meersman30 mostrou que indivíduos ativos fisicamente apresentam maior modulação vagal cardíaca do que sedentários, tanto em voluntários jovens como em indivíduos de meia-idade.
A RFC, no presente trabalho, foi menor nos voluntários de meia-idade com aptidão aeróbica deficiente, em comparação aos voluntários de aptidão aeróbica boa. Esses resultados corroboram os achados de Cole e cols.19 e Du e cols.23, na medida em que, no primeiro, os autores encontraram associação entre baixos valores de RFC nos voluntários com pior aptidão aeróbica e, no segundo, estudando mulheres maratonistas (32 a 42 anos), evidenciaram que a RFC é mais rápida em maratonistas do que no grupo controle sedentário.
Diversos autores evidenciaram o papel preditivo e prognóstico da resposta da FC após teste de exercício18,19,31,32. Ainda assim, poucas investigações foram realizadas com o intuito de compreender a interação entre medidas de RFC, aptidão aeróbica e mortalidade. Em um estudo pioneiro, KoKKinos e cols.33, avaliando a associação entre RFC (1º e 2º min de recuperação), aptidão aeróbica e risco de mortalidade por todas as causas em uma coorte de 5.974 homens com um período de seguimento de 6,2 anos, evidenciaram que, em indivíduos com baixa aptidão aeróbica e baixa RFC, o risco de mortalidade foi, aproximadamente, sete vezes maior se comparado a indivíduos com alta aptidão aeróbica e alta RFC. Os autores destacam que a aptidão aeróbica associada à RFC afeta de forma substancial a mortalidade. Esse estudo evidencia o impacto da aptidão aeróbica na RFC.
Os resultados que se referem à função autonômica cardíaca encontrados em nosso trabalho (VFC de repouso e RFC pós-esforço) foram discrepantes ao evidenciar que há redução da VFC com o envelhecimento, porém sem repercussão da aptidão aeróbica sobre seus valores. Por outro lado, a RFC não foi diferente nas faixas etárias estudadas, mesmo apresentando diferenças significativas em função da aptidão aeróbica.
A literatura atual vem evidenciado a não correlação entre medidas da VFC de repouso e RFC34-36. Ainda não se sabe ao certo o papel fisiológico dessas medidas no sistema nervoso autonômico. Acredita-se que o índices da VFC relacionados à atividade vagal reflitam a magnitude da modulação autonômica vagal, enquanto aqueles relacionados à RFC reflitam o tônus autonômico propriamente dito37. Mais estudos são necessários para elucidar tal questão.
A análise de regressão linear múltipla stepwise adotada no presente trabalho evidenciou que na amostra estudada, mudanças na função vagal cardíaca medida pelo índice Ln(RMSSD) é significativamente explicada por mudanças na FC de repouso e na idade, com pouca ou nenhuma participação da RFC e indistinta ao nível de aptidão aeróbica.
As informações descritas na literatura indicam que o envelhecimento fisiológico leva à redução da VFC. Entretanto, ainda não é totalmente claro o papel do treinamento físico e de melhores níveis de aptidão aeróbica nesse processo. O presente trabalho, baseado em um protocolo ajustado de recuperação pós-esforço submáximo, evidenciou que indivíduos de meia-idade com aptidão aeróbica boa apresentam recuperação da FC após exercício mais rápida do que indivíduos de meia-idade com aptidão aeróbica deficiente.
Conclusão
Melhores níveis de aptidão aeróbica atuam beneficamente no controle autonômico da frequência cardíaca pós-esforço, preservando a velocidade de reentrada vagal em voluntários de meia-idade. No entanto, tais níveis de aptidão parecem não atenuar a redução da variabilidade da frequência cardíaca de repouso decorrente do processo natural de envelhecimento na faixa etária analisada.
Potencial Conflito de Interesses
Declaro não haver conflito de interesses pertinentes.
Fontes de Financiamento
O presente estudo foi parcialmente financiado por CAPES e CNPq.
Vinculação Acadêmica
Este artigo é parte de tese de mestrado de Gabriela Alves Trevizani pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (Programa de Engenharia Biomédica/ COPPE).
Artigo recebido em 16/11/11; revisado em 23/11/11; aceito em 28/03/12.
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Correspondência:
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
26 Jul 2012 -
Data do Fascículo
Set 2012
Histórico
-
Recebido
16 Nov 2011 -
Aceito
28 Mar 2012 -
Revisado
23 Nov 2011