Open-access Impacto do Tabagismo Passivo na Resposta Pressórica à Epinefrina e Felipressina em Ratos Hipertensos 1K1C Tratados ou não com Atenolol

Resumo

Fundamento:  O tabagismo geralmente está associado à hipertensão e pode modificar a resposta vasoconstritora.

Objetivo:  O presente estudo teve como objetivo analisar e comparar a interação do tabagismo passivo e hipertensão sobre os efeitos da epinefrina e felipressina na pressão arterial após injeção intravascular.

Métodos:  Ratos Wistar machos de 45 dias tiveram a artéria renal principal esquerda parcialmente obstruída e o rim direito removido (modelo 1K1C). Os ratos foram colocados na câmara para exposição ao tabagismo passivo (10 cigarros) durante 10 minutos (6 dias por semana). Ratos hipertensos receberam atenolol (90 mg/kg/dia) por gavagem durante duas semanas. A resposta hipotensora e hipertensiva, a duração da resposta e a frequência cardíaca foram registradas a partir da medida dos valores diretos da pressão arterial. O nível de significância foi de 5%.

Resultados:  O tabagismo passivo aumentou a resposta hipertensiva máxima à epinefrina em ratos normotensos e ratos 1K1C tratados com atenolol e à felipressina apenas em ratos 1K1C tratados com atenolol; também reduziu a resposta hipotensiva à epinefrina. A epinefrina aumentou a frequência cardíaca em ratos fumantes passivos ou não-fumantes, normotensos e hipertensos. Comparando os dois vasoconstritores, a epinefrina apresentou maior resposta hipertensiva em fumantes normotensos, ratos 1K1C fumantes e não fumantes tratados com atenolol. No entanto, em ratos normotensos e não fumantes, a felipressina apresentou um efeito hipertensivo maior e mais prolongado.

Conclusões:  Nossos resultados sugerem que o tabagismo passivo pode reduzir a vasodilatação da epinefrina e aumentar a resposta hipertensiva quando comparado à felipressina. Portanto, a felipressina pode ser segura para pacientes hipertensos, com o objetivo de evitar a interação entre taquicardia e atenolol, mas para pacientes normotensos e não-fumantes, a epinefrina pode ser mais segura que a felipressina.

Palavras-chave: Tabagismo; Hipertensão; Ratos; Felipressina; Epinefrina; Atenolol; Poluição por Fumaça de Tabaco; Nicotina/efeitos adversos

Abstract

Background:  Cigarette smoking is usually associated with hypertension and may modify vasoconstrictor response.

Objective:  The present study aimed to analyze and compare the interaction of passive cigarette smoking and hypertension on epinephrine and felypressin blood pressure effects after intravascular injection.

Method:  45-day male Wistar rats had the main left renal artery partially constricted and the right kidney removed (1K1C model). Rats were placed in the chamber for exposition to passive cigarette smoking (10 cigarettes) during 10 min (6 days a week). Hypertensive rats received atenolol (90 mg/kg/day) by gavage for two weeks. Hypotensive and hypertensive response, response duration and heart rate were recorded from direct blood pressure values. The significance level was 5%.

Results:  Passive cigarette smoking increased maximal hypertensive response to epinephrine in normotensive and 1K1C-atenolol treated rats and to felypressin only in 1K1C-atenolol treated rats; it also reduced epinephrine hypotensive response. Epinephrine increased heart rate in normotensive and hypertensive passive smokers or non-smoker rats. Comparing the two vasoconstrictors, epinephrine showed greater hypertensive response in normotensive smokers, 1K1C-atenolol treated smokers and non-smokers. However, in normotensive-nonsmoker rats, felypressin showed a greater and longer hypertensive effect.

Conclusions:  Our results suggest that passive cigarette smoking may reduce epinephrine vasodilation and increase hypertensive response when compared to felypressin. Therefore, felypressin may be safe for hypertensive patients to avoid tachycardia and atenolol interaction, but for normotensive and non-smoker patients, epinephrine may be safer than felypressin.

Keywords: Tobacco Use Disorder; Hypertension; Rats; Felypressin; Atenolol; Epinephrine; Tobacco Smoke Pollution; Nicotine/adverse effects

Introdução

Drogas vasoconstritoras são essenciais para procedimentos odontológicos e médicos realizados sob anestesia local, uma vez que o anestésico local deve permanecer em contato com nervos sensíveis. Um único cartucho anestésico local administrado por via intravascular pode ser fatal.1 Portanto, os vasoconstritores também são utilizados para evitar sua absorção e efeitos adversos: convulsões, arritmia e parada cardíaca. Existem estudos indicando absorção de vasoconstritores e efeitos sistêmicos. A epinefrina pode ser detectada no plasma após a infiltração e pode aumentar a frequência cardíaca em indivíduos normais.2 Não há dados clínicos comparando a eficácia ou segurança da epinefrina e da felipressina, mas há evidências de que anestésicos locais isolados resultam em um controle da dor mais curto e de baixa qualidade.3

Os fármacos vasoconstritores apresentam efeitos sistêmicos que podem ser críticos em pacientes com doenças cardiovasculares: vasoconstrição coronariana, taquicardia, aumento da força de contração cardíaca etc. Esses efeitos estão relacionados à causa mais comum de morte no mundo moderno: ataque cardíaco, derrame e trombose; e os pacientes geralmente apresentam doenças multifatoriais. O tabagismo e a hipertensão estão incluídos no algoritmo do Programa Nacional de Educação em Colesterol para prever o risco de doenças cardiovasculares, tratando ambos como causas modificáveis de aterosclerose nos esforços de prevenção.4 A OMS estima que a prevalência global de adultos que fumam qualquer produto de tabaco é de 36% para homens adultos e 8% para mulheres adultas.5

O número de cigarros apresenta correlação positiva com valores mais altos da pressão arterial, mas não com a frequência cardíaca.6 A nicotina também afeta o sistema nervoso autônomo, com um efeito diferente dos cigarros.7 A liberação de catecolaminas e lipoproteínas ateroscleróticas estão aumentados nos níveis sanguíneos de pacientes fumantes. Portanto, as drogas vasoativas presentes alteram a resposta vascular de fumantes, uma vez que a via do óxido nítrico (NO) e os sistemas adrenérgicos e colinérgicos são afetados.8 Embora a epinefrina seja considerada a droga vasoconstritora mais segura para pacientes com doença cardiovascular pela American Dental Association,9 os pacientes em tratamento com betabloqueador que fumam cigarros devem ser tratados de maneira diferente.

A felipressina pode ser um vasoconstritor alternativo seguro nessas populações, uma vez que é um vasoconstritor não-adrenérgico. Não há relato de interação entre tabagismo e vasopressina. Um estudo anterior demonstrou efeito hipertensivo reduzido da felipressina em ratos tratados com atenolol.10 Para aumentar o conhecimento sobre a segurança da epinefrina e da felipressina, este estudo tentou testá-las com administração intravascular isolada para simular o erro máximo na anestesia local, fornecendo informações para a formulação de soluções anestésicas locais mais seguras. Portanto, o objetivo deste estudo foi avaliar e comparar os efeitos da injeção direta intravenosa de epinefrina e felipressina na pressão sanguínea de ratos fumantes ou não fumantes, normotensos, hipertensos, e hipertensos tratados com atenolol.

Métodos

Para o presente estudo, todas as regras para pesquisa com animais foram revisadas e aprovadas antes das experiências pelo comitê de ética institucional (protocolo nº 010/2010). Ratos machos Wistar pesando de 140 a 320 g, fornecidos pelo biotério da Faculdade de Odontologia de Bauru, foram utilizados em todos os grupos deste estudo.

O método experimental de hipertensão, medidas arteriais indiretas e diretas da PA foram realizadas conforme descrito anteriormente.10 Todos os ratos receberam dieta normal, acesso livre a água e alimentos e foram submetidos a 12 horas de ciclo claro/escuro. Ratos pesando de 110 a 150 g foram anestesiados com injeção de ketamina (50 mg/kg de peso, im, Dopalen® - Sespo Indústria e Comércio Ltda., Divisão Vetbrands de Saúde Animal - Jacareí, São Paulo, Brasil) mais xilazina (10 mg/kg de peso, im, Anasedan® - Sespo). A artéria renal esquerda foi isolada e um clipe de prata de 0,25 mm foi instalado ao seu redor, e o rim direito foi completamente removido. Foram injetados 40.000 UI de antibiótico para animais de pequeno porte (Fontoura Wyeth S.A. - São Bernardo do Campo, São Paulo, Brasil). Vale ressaltar que a cirurgia para implante dos clipes nas artérias renais foi realizada em 10 animais por grupo, ou seja, 120 ratos. No entanto, cada grupo foi constituído por 6 animais, já que parte dos ratos não apresentava pressão arterial sistólica acima de 150 mmHg. Portanto, 72 foi o número total de animais utilizados no estudo e não houve critérios para a definição desta amostra, sendo definida por conveniência.

Método de Tabagismo Passivo

O tabagismo passivo foi realizado com base em estudos prévios de indução de enfisema.11 Um dia após a indução da hipertensão, os ratos foram intoxicados 1 vez ao dia (10 cigarros por período de exposição) 6 dias por semana. O protocolo de exposição consistiu em confinar 10 ratos na câmara de inalação durante 10 minutos com ventilação por ar comprimido (10 L/min).

Medidas Indiretas e Diretas da Pressão Arterial

Os ratos 1K1C foram aquecidos em gaiolas individuais com resistência elétrica e manguitos pneumáticos foram instalados na cauda e conectados a um sistema digital para registro indireto da pressão arterial (Physiological Pressure Transducer, ADInstruments Pty. Ltd. - Dunedin, Otago, Nova Zelândia). Os ratos que apresentaram pressão arterial sistólica igual ou superior a 150 mmHg em medida indireta 15 dias após a cirurgia com clipe foram aceitos no grupo hipertenso ou tratados com atenolol (90 mg/kg/dia; Cristália Produtos Químicos e Farmacêuticos - Itapira, São Paulo, Brasil) administrado por gavagem em 1 mL por 2 semanas.

Todos os grupos tiveram a pressão arterial direta medida de 28 a 35 dias após a cirurgia com clipe, ou tempo equivalente no grupo controle: após anestesia com ketamina/xilazina, um cateter de polietileno PE-50 (Clay Adams - Franklin Lakes, Nova Jersey, EUA) com solução salina com a extremidade externa ocluída, foi implantado na artéria carótida esquerda e na veia jugular direita. O cateter arterial foi conectado a um transdutor de pressão acoplado ao sistema de registro invasivo da pressão arterial, utilizando o software apropriado (Physiological Pressure Transducer; PowerLab 4/30; Chart Pro - ADInstruments Pty. Ltd). Os experimentos de injeção intravenosa de drogas vasoconstritoras foram realizados com ratos anestesiados logo após o implante do cateter. Um esquema do experimento é detalhado na Figura 1.

Figura 1
Protocolo esquemático do estudo: ratos com 45 dias de idade foram submetidos a implante de clipe (indução de hipertensão 1K1C); no dia seguinte, os grupos de fumantes foram expostos à fumaça do cigarro; aos 60 dias de vida, a pressão arterial foi medida por meios indiretos e o tratamento com atenolol foi iniciado; aproximadamente aos 75 dias de vida foram realizados experimentos diretos de pressão arterial. Um exemplo do registro pulsátil após a administração de epinefrina detalha como os parâmetros foram calculados.

Curvas Dose-Resposta à Epinefrina e Felipressina

Epinefrina exógena (Adren® - Hipolabor Farmacêutica Ltda - Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil), diluída em solução salina, foi injetada em doses de 80, 160, 320, 640 e 1.280 ng em bolus através do cateter venoso para a obtenção das curvas dose-resposta. A felipressina isolada (Dentsply Farmacêutica, Catanduva, São Paulo, Brasil) foi utilizada em doses de 0,125, 0,25, 0,5, 1, 2 e 3 mUI. Injeções intravenosas em ordem aleatória foram realizadas após um intervalo de 3 minutos para cada resposta para estabilizar a pressão arterial. Os animais foram sacrificados com injeção intravenosa de doses excessivas do anestésico tiopental (Thiopentax®, Cristália - Produtos Químicos e Farmacêuticos). Os seguintes parâmetros foram analisados utilizando os valores de PAM (PAM = 1/3 da Pressão Sistólica + 2/3 da Pressão Diastólica): resposta hipotensiva mínima, resposta hipertensiva máxima e duração da resposta. A duração foi determinada utilizando alterações pressóricas globais, uma vez que a epinefrina apresenta uma resposta complexa à pressão arterial onde há um pico hipertensivo seguido de resposta hipotensora e normalização; estudos anteriores esclareceram esse padrão.10 A frequência cardíaca foi registrada 30s após a injeção, durante um minuto, para evitar viés causado por maior duração ou grandes alterações da pressão arterial, uma vez que o programa utilizou a pressão pulsátil para determinar esses parâmetros. Para comparar a epinefrina e a felipressina, foram utilizadas doses correspondentes a 1, 2, 4 e 8 cartuchos de anestésico local que seriam administrados aos ratos. Utilizou-se a seguinte fórmula: D = 18.000 (para epinefrina*) ou 54 mUI (para felipressina*) x 4.286 x 10-3 (uma correção de peso de humanos (70 kg) para ratos (300 g).

Estatística

Para todos os grupos, n = 6. Os resultados foram expressos como média ± desvio padrão (DP) para dados com distribuição normal de acordo com o teste de Kolmogorov-Smirnov. Nos casos em que a distribuição normal não ocorreu em um grupo ou mais, os dados foram apresentados como mediana ± intervalo interquartil.

Quando mais de uma resposta foi obtida do mesmo animal, foi utilizada a análise de variância de uma via para medidas repetidas (ANOVA de uma via para medidas repetidas). Para comparar curvas completas de dois ou mais grupos, foi utilizada a análise de variância de duas vias para medidas repetidas (ANOVA de duas vias para medidas repetidas). Quando houve diferença significativa entre as doses em cada curva ou em grupos independentes e distribuição normal, a comparação foi realizada pelo método de Holm-Sidak ou Tukey. Para resultados não paramétricos, foram utilizados os testes de Mann-Whitney e Kruskal-Wallis. O nível de significância neste estudo foi estabelecido em 5% (p < 0,05). Todos os testes foram realizados utilizando-se o software STATISTICA (StatSoft South América).

Resultados

Os valores básicos da pressão arterial durante os primeiros cinco minutos estão resumidos na Tabela 1, e foram usados como referência inicial. O atenolol reduziu de forma significativa a pressão arterial em animais hipertensos, cujos valores ainda eram significantemente mais altos do que nos animais controle.

Tabela 1
Valores basais

Resposta Hipertensiva Máxima

As curvas de resposta hipertensiva máxima para epinefrina e felipressina, em fumantes versus não fumantes, são mostradas na Figura 2. O fumo aumentou significativamente as respostas hipertensivas máximas à epinefrina em ratos normotensos e tratados com atenolol. O fumo aumentou de forma significativa a resposta hipertensiva máxima à felipressina apenas no grupo tratado com atenolol.

Figura 2
Curvas de resposta hipertensiva máxima após injeção intravenosa em bolus de epinefrina (A) ou felipressina (B) em ratos normotensos não-fumantes e normotensos fumantes, 1K1C hipertensos não-fumantes e 1K1C hipertensos fumantes, 1K1C não-fumantes tratados com atenolol e 1K1C fumantes tratados com atenolol. n = 6 para todos os grupos. Mediana (25º percentil-75º percentil). *p < 0,05 vs. grupos não fumantes.

Resposta Hipotensiva Mínima

A Figura 3 mostra as curvas de resposta hipotensiva mínima à epinefrina. O fumo reduziu significativamente a resposta hipotensiva em ratos normotensos (p < 0,05). Houve uma redução significativa na resposta ao vasodilatador no grupo 1K1C tratado com atenolol após a administração de epinefrina. A felipressina, como esperado, não apresentou resposta hipotensiva significativa nos três grupos estudados (Figura 3B).

Figura 3
Curvas de resposta hipotensiva mínima após injeção intravenosa em bolus de adrenalina em ratos controle não-fumantes e fumantes normotensos, 1K1C hipertensos não-fumantes e 1K1C hipertensos fumantes, 1K1C não fumantes tratados com atenolol e 1K1C fumantes tratados com atenolol. n = 6 Média ± desvio padrão. *p < 0,05 vs. grupos não fumantes.

Frequência Cardíaca

A epinefrina causou um aumento significativo da frequência cardíaca em ratos normotensos e hipertensos 1K1C quando comparados aos valores basais de cada grupo, mas o fumo não alterou esse efeito (Figura 4A). Os ratos 1K1C tratados com atenolol não apresentaram alterações nesse parâmetro, provavelmente devido ao efeito antagonista do atenolol nos receptores β1. A felipressina mostrou redução significativa da frequência cardíaca em ratos normotensos não fumantes quando comparados com os valores basais (Figura 4B). O fumo aumentou significativamente a frequência cardíaca apenas em doses de 1 e 2 mUI de felipressina, quando comparado ao controle normotenso não fumante.

Figura 4
Frequência cardíaca antes e depois da injeção via intravenosa em bolus de epinefrina (A) e felipressina (B) em ratos não-fumantes normotensos e fumantes normotensos, 1K1C hipertensos não-fumantes e 1K1C hipertensos fumantes, 1K1C não fumantes tratados com atenolol e 1K1C fumantes tratados com atenolol. n = 6 para todos os grupos. Mediana (25º percentil-75º percentil). *p < 0,05 vs. grupos não fumantes. ‡ p < 0,05 comparado aos valores basais.

Duração da Resposta

A duração da resposta está descrita na Tabela 2. A felipressina apresentou uma duração significativamente maior das respostas de pressão arterial do que a epinefrina em todos os grupos estudados.

Tabela 2
Duração da resposta

Comparação entre Epinefrina e Felipressina

Ao comparar as respostas da felipressina à epinefrina em cada grupo, a felipressina apresentou efeito hipertensivo reduzido nos ratos fumantes normotensos, ratos fumantes 1K1C tratados com atenolol e em não-fumantes 1K1C tratados com atenolol (Figura 5). Nos ratos hipertensos fumantes e não fumantes, não houve diferença significativa entre os dois vasoconstritores. Em ratos normotensos não fumantes, a felipressina resultou em maior efeito hipertensivo em comparação com a epinefrina.

Figura 5
Comparação das curvas máximas de resposta hipertensiva após injeção intravenosa em bolus de epinefrina e felipressina em ratos não fumantes normotensos controles, ratos fumantes normotensos, 1K1C hipertensos não fumantes, 1K1C hipertensos fumantes, 1K1C não-fumantes tratados com atenolol e 1K1C fumantes tratados com atenolol. n = 6 para todos os grupos. Mediana (25º percentil-75º percentil). *p < 0,05 na comparação entre os medicamentos.

Discussão

Associamos o fumo à hipertensão e ao tratamento com atenolol na tentativa de reproduzir uma doença multifatorial. Com o objetivo de fornecer informações de segurança sobre o uso isolado de vasoconstritores administrados por via intravascular, os quais não podem ser testados em seres humanos, nosso estudo teve como finalidade testar se a epinefrina é contraindicada na população de fumantes e hipertensos e fornecer uma alternativa segura através da análise de efeitos sistêmicos. A epinefrina foi utilizada como vasoconstritor de escolha em pacientes hipertensos, segundo a American Heart Association (AHA),9 em comparação à felipressina, menos estudada e não relacionada ao sistema nervoso autônomo simpático.12

Nossos dados mostram que a epinefrina manteve as mesmas respostas à pressão arterial, em ratos fumantes hipertensos ou não-fumantes hipertensos sem tratamento com atenolol (Figuras 2A e 3), mas aumentou significativamente a frequência cardíaca (Figura 4A). Contudo, em ratos não-fumantes tratados com atenolol, a resposta da pressão arterial foi mais elevada em comparação com os fumantes. Considerando todos os dados sobre segurança da epinefrina em combinação com anestésico local na população hipertensa,13 nossos resultados sugerem que a resposta hipertensiva à epinefrina em ratos fumantes e não-fumantes hipertensos sem tratamento com atenolol permanece inalterada. Por outro lado, os ratos hipertensos, fumantes e tratados com atenolol, apresentaram medidas da pressão arterial significativamente maiores em comparação aos animais não tratados.

Ainda não está claro se o tabagismo aumenta os valores da pressão arterial, pois alguns estudos indicaram que o fumo pode potencializar um histórico familiar e aumentar os valores da pressão arterial sistólica, diastólica e média arterial.6 Em nosso estudo, os grupos de fumantes não apresentaram valores basais da pressão arterial aumentados em comparação com os não-fumantes (Tabela 1). A exposição ao fumo foi realizada durante 4 semanas, conforme o esperado, e esse tempo foi suficiente para alterar a resposta vasoconstritora. Os ratos foram submetidos à injeção intravascular de epinefrina ou felipressina sob anestesia com ketamina/xilazina; em um estudo anterior do nosso grupo discutiu-se que essa mistura reduzia a frequência cardíaca basal, mas não alterava as respostas da pressão arterial.10

A fumaça e a nicotina podem agir de maneira diversa; a nicotina parece reduzir a pressão sanguínea quando administrada agudamente, enquanto os produtos do fumo estão associados a valores aumentados da pressão arterial.7 O fumo passivo reduz o relaxamento do endotélio dependente da acetilcolina quando comparado ao não fumante.14 Nossos dados mostram que as respostas hipertensivas à epinefrina aumentaram em ratos fumantes normotensos e hipertensos tratados com e atenolol quando comparados aos grupos não-fumantes (Figura 2) e quando comparados à felipressina (Figura 5). A pressão arterial é definida pelo débito cardíaco multiplicado pela resistência periférica vascular. A felipressina injetada por via intravenosa apresenta apenas efeito vasoconstritor, aumentando a resistência vascular e levando ao aumento dos valores pressóricos. A epinefrina, por outro lado, apresenta efeitos vasoconstritores e vasodilatadores, efeitos inotrópicos e cronotrópicos cardíacos, levando a respostas complexas da pressão arterial após injeção intravenosa. A vasodilatação reduz as respostas hipertensivas quando a pressão arterial global é medida, e ratos não-fumantes normotensos mostraram os maiores valores de resposta hipotensiva para as doses mais baixas de epinefrina (Figura 3), reduzindo a resposta hipertensiva quando comparada à felipressina (Figura 5). A felipressina apresenta menos efeitos cardíacos, mas reduziu significativamente a frequência cardíaca em ratos não-fumantes normotensos; tais resultados são consistentes com estudos anteriores em que essa resposta vasoconstritora estava associada à prilocaína,15 relacionada à constrição da artéria coronária e barorreflexo.

Há uma resposta cardiovascular complexa à nicotina, devido aos receptores ganglionares de nicotina que influenciam o sistema nervoso simpático e parassimpático autônomo. Essa resposta inclui aumento da liberação de catecolaminas e metabolismo lipídico alterado, o que explica o aumento do desenvolvimento de doenças cardiovasculares em fumantes.8 De acordo com o Terceiro Relatório do Programa Nacional de Educação em Colesterol (PNEC), o tabagismo tem impacto direto na formação de aterosclerose e aumenta o risco de doenças cardiovasculares.4 A associação entre hipertensão e tabagismo representa um caso delicado para o uso de vasoconstritores. A duração da resposta da felipressina foi significativamente maior que a da epinefrina em todos os grupos, o que era esperado, pois a meia-vida da vasopressina é de aproximadamente 17-35min,16 enquanto a epinefrina apresenta meia-vida curta devido ao metabolismo e à recaptação sináptica.

O tabagismo aumenta a rigidez dos vasos sanguíneos por diferentes vias, incluindo estresse oxidativo, aumento da produção de endotelina-1 e formação de células musculares lisas.17 O extrato de fumaça de cigarro sem nicotina, administrado por injeção subcutânea, induziu disfunção do endotélio, aumentu os valores da pressão arterial e reduziu a vasodilatação induzida por acetilcolina.18 Embora o componente químico responsável pela disfunção epitelial não esteja claro, o extrato de fumaça de cigarros reduz o relaxamento vascular, aumentando o estresse oxidativo e reduzindo a biodisponibilidade de NO.19 Os fumantes também apresentaram metabolismo lipoproteico alterado e níveis aumentados de lipoproteína de baixa densidade (LDL) oxidada, os quais podem contribuir para a vasoconstrição.

O tabagismo crônico prejudica a síntese de NO e aumenta a produção de espécies reativas de oxigênio, enquanto a administração de nicotina leva à hipertensão devido ao aumento do tônus ​​do sistema nervoso simpático.20,21 Nosso estudo mostrou uma resposta hipotensiva mínima reduzida significativa no grupo normotenso e fumante (Figura 3). Essa redução da vasodilatação provocada pela epinefrina pode estar relacionada ao aumento da camada muscular lisa promovida pela fumaça. O efeito da frequência cardíaca foi semelhante nos grupos de fumantes e não-fumantes.

Conclusão

As dosagens de epinefrina e felipressina corresponderam ao conteúdo de 0,5 a 16 cartuchos de anestésico local administrados em bolus por via intravascular em ratos hipertensos, mas não houve óbito. Nossos resultados apoiam a segurança vasoconstritora com problemas vasculares associados, e principalmente a felipressina parece ser um vasoconstritor promissor para pacientes fumantes, uma vez que não há interação com o sistema nervoso simpático.

  • Fontes de financiamento
    O presente estudo não teve fontes de financiamento externas.
  • Vinculação acadêmica
    Este artigo é parte de dissertação de Mestrado de Elizandra P. M. Almeida pela Faculdade de Odontologia de Bauru - Universidade de São Paulo.
  • Aprovação ética e consentimento informado
    Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética do Faculdade de Odontologia de Bauru - Universidade de São Paulo sob o número de protocolo 10/2010. Todos os procedimentos envolvidos nesse estudo estão de acordo com a Declaração de Helsinki de 1975, atualizada em 2013.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    20 Mar 2020
  • Data do Fascículo
    Fev 2020

Histórico

  • Recebido
    25 Jun 2018
  • Revisado
    18 Dez 2018
  • Aceito
    24 Abr 2019
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