Resumos
O trauma crânio-encefálico contuso (TCEC) é freqüentemente seguido pela amnésia pós-traumática (APT), caracterizada como um estado transitório de confusão e desorientação. Sua duração tem sido utilizada para quantificar a gravidade do TCEC e prever distúrbios nas funções cognitivas, assim como para antever as alterações na capacidade funcional das vítimas pós-trauma. O Galveston Orientation Amnesia Test (GOAT) é o primeiro instrumento sistematizado criado e o mais amplamente utilizado para avaliar a APT. Este artigo apresenta esse instrumento, as bases conceituais para seu desenvolvimento e a adaptação e validação do GOAT para cultura brasileira. Além disso, descreve sua aplicação e comenta as restrições do seu uso. Resultados de pesquisas realizadas em nosso meio contribuíram para as evidências sobre a validade do GOAT. Também apontaram os indicadores do momento pós-trauma em que o GOAT deve ser aplicado e destacaram as dificuldades no uso desse instrumento.
Amnesia; Índices de Gravidade do Trauma; Traumatismos cranianos fechados; Estudos de validação
El trauma cráneo-encefálico contuso (TCEC) es frecuentemente seguido por la amnesia pos-traumática (APT), caracterizada como un estado transitorio de confusión y desorientación. Su duración ha sido utilizada para cuantificar la severidad del TCEC y prever alteraciones en las funciones cognitivas, tanto como para antever las dificultades en la capacidad funcional de las víctimas pos-trauma. El Galveston Orientation Amnésia Test (GOAT) es la primera encuesta sistematizada que fue creada y el mas ampliamente utilizada para evaluar la APT. Esta publicación presenta esta encuesta, las bases conceptuales para su desarrollo y la adaptación y validación del GOAT para la cultura brasileña. Además, describe su aplicación y limitaciones en el uso. Resultados de pesquisas brasileñas contribuyeron para las evidencias sobre la validad del GOAT. También apuntaron los indicadores del momento pos-trauma en que el GOAT debe ser aplicado y destacaron las dificultades en el uso de esa encuesta.
Amnesia; Índices de Gravedad del Trauma; Traumatismos cerrados de la cabeza; Estudios de validación
Closed head injury (CHI) is frequently followed by post-traumatic amnesia (PTA) and is characterized by a transitory state of confusion and disorientation. The PTA duration has been used to quantify the CHI severity and to predict disorders in cognitive functions, as well as to foresee any alteration in the functional capacity of post-trauma victims. The Galveston Orientation Amnesia Test (GOAT) is the first systematized instrument created, and the most broadly applied, to assess PTA. This article presents the GOAT, the conceptual basis for the development of the instrument, and its adaptation and validation to the Brazilian culture. In addition, the article describes the application of the instrument and makes comments on the restrictions of its use. Brazilian research results showed evidences of the GOAT's validity. They also point to the indicators of post-trauma conditions in which the GOAT must be applied, and highlight the difficulties in the application of the instrument.
Amnesia; Trauma Severity Indices; Head injuries, closed; Validation studies
ARTIGO ORIGINAL
Galveston Orientation Amnesia Test (GOAT)
Galveston Orientation Amnesia Test (GOAT)
Silvia Cristina Fürbringer e SilvaI; Regina Márcia Cardoso de SousaII
IDoutora em Enfermagem. Docente dos Cursos de Graduação em Enfermagem e Medicina e Pós graduação em Enfermagem do Centro Universitário São Camilo. São Paulo, SP, Brasil. ssilva@scamilo.edu.br
IIProfessor Livre-docente do Departamento de Enfermagem Médico-Cirúrgica da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo. São Paulo, SP, Brasil. vian@usp.br
Correspondência Correspondência: Regina Mãrcia Cardoso de Sousa Rua Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 419 - Cerqueira César CEP 05403-000 - São Paulo, SP, Brasil
RESUMO
O trauma crânio-encefálico contuso (TCEC) é freqüentemente seguido pela amnésia pós-traumática (APT), caracterizada como um estado transitório de confusão e desorientação. Sua duração tem sido utilizada para quantificar a gravidade do TCEC e prever distúrbios nas funções cognitivas, assim como para antever as alterações na capacidade funcional das vítimas pós-trauma. O Galveston Orientation Amnesia Test (GOAT) é o primeiro instrumento sistematizado criado e o mais amplamente utilizado para avaliar a APT. Este artigo apresenta esse instrumento, as bases conceituais para seu desenvolvimento e a adaptação e validação do GOAT para cultura brasileira. Além disso, descreve sua aplicação e comenta as restrições do seu uso. Resultados de pesquisas realizadas em nosso meio contribuíram para as evidências sobre a validade do GOAT. Também apontaram os indicadores do momento pós-trauma em que o GOAT deve ser aplicado e destacaram as dificuldades no uso desse instrumento.
Descritores: Amnesia.Índices de Gravidade do Trauma. Traumatismos cranianos fechados. Estudos de validação.
RESUMEN
El trauma cráneo-encefálico contuso (TCEC) es frecuentemente seguido por la amnesia pos-traumática (APT), caracterizada como un estado transitorio de confusión y desorientación. Su duración ha sido utilizada para cuantificar la severidad del TCEC y prever alteraciones en las funciones cognitivas, tanto como para antever las dificultades en la capacidad funcional de las víctimas pos-trauma. El Galveston Orientation Amnésia Test (GOAT) es la primera encuesta sistematizada que fue creada y el mas ampliamente utilizada para evaluar la APT. Esta publicación presenta esta encuesta, las bases conceptuales para su desarrollo y la adaptación y validación del GOAT para la cultura brasileña. Además, describe su aplicación y limitaciones en el uso. Resultados de pesquisas brasileñas contribuyeron para las evidencias sobre la validad del GOAT. También apuntaron los indicadores del momento pos-trauma en que el GOAT debe ser aplicado y destacaron las dificultades en el uso de esa encuesta.
Descriptores: Amnesia. Índices de Gravedad del Trauma. Traumatismos cerrados de la cabeza. Estudios de validación.
INTRODUÇÃO
O Galveston Orientation Amnesia Test (GOAT) é um instrumento originalmente elaborado por Levin, O´Donnel e Grossman e publicado no ano de 1979(1). Criado na cultura americana, foi adaptado e validado para o nosso meio em 2002(2). É composto por dez questões que avaliam a amnésia pós-traumática (APT) de vítimas de trauma crânio-encefálico contuso (TCEC), após essa lesão.
O TCEC é freqüentemente seguido pela APT, definida como um estado transitório de confusão e desorientação, caracterizado por amnésia anterógrada, retrógrada e distúrbios de comportamento, entre eles, insônia, agitação psicomotora, fadiga, confabulação e, ocasionalmente, sérios sintomas afetivos e psicóticos(3-5). O término da APT é caracterizado pelo retorno da orientação e da memória contínua.
A amnésia anterógrada é a característica principal da APT e, às vezes, é usada como sinônimo desta. No entanto, é necessário distinguir essas duas condições clínicas, uma vez que a primeira refere-se à inabilidade de formar novas memórias após um determinado evento e é uma deficiência específica de memória. Por outro lado, a APT refere-se a um estado sub-agudo após TCEC que pode incluir as alterações comportamentais anteriormente descritas e, também, alterações na memória retrógrada(6). Além disso, a deficiência de memória anterógrada observada durante a APT é especificamente na memória declarativa, que se refere ao registro de fatos, eventos e conhecimentos, enquanto que a memória de procedimentos (memória de capacidades ou habilidades motoras ou sensoriais) é poupada(7).
A duração da amnésia após TCEC é usada, com freqüência, para quantificar a gravidade desse tipo de trauma e prever a capacidade funcional das vítimas. Assim, são muitos os autores que propõem esse parâmetro para diferenciar as vítimas, segundo distintos níveis de gravidade do TCEC, e estimar suas conseqüências. Quanto mais longo o período de APT, pior o resultado funcional esperado(4,8-11).
A duração dessa síndrome é também utilizada, em países desenvolvidos, como indicador da viabilidade da reabilitação dos pacientes que apresentaram TCEC (5,11-13). Das medidas comportamentais que têm sido estudadas, a APT tem repetidamente se revelado o melhor indicador isolado para prever problemas nas funções cognitivas ou nas atividades da vida diária das vítimas. Em muitos casos, a APT é melhor indicador do que a duração e profundidade do coma(8).
Portanto, conhecer a duração da APT e suas implicações depois do TCEC é de considerável importância clínica, pois permite oferecer informações adicionais para a família e as vítimas e, também, auxilia no planejamento e avaliação dos programas de reabilitação, além de oferecer indícios da fisiopatologia da APT.
Até a década de 80, a duração e o término da APT eram estabelecidos retrospectivamente, questionando-se o paciente sobre suas lembranças, após ter restaurado a memória contínua(1).
Críticas relacionadas à medida retrospectiva foram apresentadas por muitos autores que questionavam a acurácia dos dados assim obtidos. Para eles, quando se determina a duração da APT retrospectivamente, fica-se na dependência do julgamento do próprio paciente e da memória de seus familiares, que freqüentemente estão associados a momentos de grande stress, podendo resultar em lembranças irreais. O resultado da avaliação também pode ser inadequado devido à presença de "ilhas" de memória durante o período de APT que confundem a identificação do seu término(1).
O GOAT foi um dos primeiros de uma série de instrumentos que têm o propósito de estabelecer, prospectivamente, a duração da amnésia após o TCEC. Ainda que esse teste questione o paciente sobre eventos que aconteceram depois e antes dessa lesão e, portanto, obtém informações que permitem estimar retrospectivamente o tempo de amnésia, seus autores propuseram uma avaliação prospectiva, isto é, repetidas avaliações do paciente após o TCEC, até que o escore do teste indique término do período de amnésia(1).
BASE CONCEITUAL DO INSTRUMENTO
Em 1946, Russell e Nathan(14) já buscavam a base patológica da APT e afirmavam que, quando um indivíduo sofre uma lesão cerebral traumática, ocorre uma paralisia da função cerebral (motora, sensorial, reflexos e raciocínio) e, então, os acontecimentos ao redor não são registrados, com conseqüente amnésia permanente para eventos ocorridos durante esse período.
A mais tradicional definição da APT e os critérios mais utilizados para sua avaliação são baseados no pressuposto de que o estado pós-traumático envolve desorientação e amnésia e que o retorno de ambas significa o seu fim(15). Nesse pressuposto, a história natural da recuperação de uma patologia encefálica difusa ou grave inclui geralmente um padrão similar. Embora pacientes com lesão primária focal possam apresentar alguns ou todos os componentes desse padrão, o curso da recuperação não é tão previsível quanto nas lesões primárias difusas(16).
Essa história natural pode ser descrita em três fases principais: a primeira fase é o período de coma caracterizado por ausência de respostas verbais e motoras voluntárias, bem como ausência de abertura ocular espontânea; na fase seguinte, o paciente fica confuso, amnésico para eventos do dia a dia e pode ter evidente distúrbio de comportamento; no terceiro e último estágio, ocorre uma restauração gradual da função cognitiva e das atividades da vida diária(12,16). Nessa descrição, a APT é a fase inicial de recuperação, após um intervalo de rebaixamento do nível de consciência, e inclui confusão e amnésia anterógrada.
Mais recentemente, evidências sugerem que, embora desorientação e amnésia possam ocorrer juntas durante a recuperação da APT, elas podem, de fato, envolver diferentes processos de recuperação e a resolução de cada uma pode ocorrer em tempos diferentes(15).
DESENVOLVIMENTO DO INSTRUMENTO ORIGINAL
O GOAT foi desenvolvido para avaliar as maiores esferas de orientação: tempo, lugar e pessoa; questiona sobre os acontecimentos antes e após o TCEC, período em que pode ocorrer a APT(1).
O núcleo do GOAT é uma avaliação breve de orientação temporal que requer que o paciente informe o dia da semana, dia do mês, mês, ano e hora (Questões 6 a 10 do GOAT). Estas questões derivam da avaliação da orientação temporal, proposta por Benton, Van Allen e Fogel, em 1964(17).
Desde a sua publicação, o GOAT não sofreu nenhuma alteração ou revisão, embora seja alvo de críticas por apresentar muitos itens de orientação em comparação aos poucos itens que avaliam a memória anterógrada (característica principal da APT). Há possibilidade de se obter uma pontuação acima do ponto de corte indicativo de término da APT em conseqüência às respostas aos itens relacionados à orientação, ainda que o paciente esteja em amnésia(11).
Na publicação que apresenta o GOAT, seus autores(1) descreveram três análises de validação desse instrumento tendo em vista a duração em dias da APT, determinada pela aplicação do GOAT. Uma das análises confrontou essa duração com os resultados dos itens da Escala de Coma de Glasgow (ECGl) determinados pelo neurocirurgião, na admissão do paciente; outra utilizou, como parâmetro, as lesões diagnosticadas por meio de tomografia computadorizada e a última análise verificou a relação entre duração da APT determinada pelo GOAT e capacidade funcional das vítimas a longo prazo.
Resultados mostraram que pontuações no GOAT foram fortemente relacionadas com a medida da Abertura Ocular, Resposta Verbal e Resposta Motora da ECGl, assim como foi significante a relação entre a duração da APT, estabelecida pelo teste, e resultados a longo prazo do TCEC(1).
Além disso, na análise do desempenho do GOAT frente à tomografia computadorizada, a lesão bilateral e difusa foi mais fortemente associada com intervalos da amnésia > 14 dias, quando comparada à lesão restrita em um hemisfério cerebral(1).
DESCRIÇÃO DO FORMATO DO INSTRUMENTO ORIGINAL
O GOAT é um instrumento constituído por 10 questões que avaliam orientação e amnésia. Além da orientação temporal do paciente (questões 6 a 10), como o paciente em recuperação de um TCEC freqüentemente fica confuso a respeito de informações básicas, o GOAT apresenta questões sobre seu nome, endereço e data de nascimento (questão 1). Distorções de memória podem envolver distúrbios na orientação geográfica, então o GOAT também propõe perguntas quanto a esse aspecto. Em relação a isso, o paciente deve identificar a cidade e informar que se encontra no hospital (questão 2). A questão 3 refere-se à data de admissão no hospital; as questões 4 e 5 testam o paciente sobre eventos que aconteceram depois e antes da lesão, respectivamente. Todas essas informações devem ser confirmadas através de dados obtidos do prontuário ou através de familiares do paciente. O profissional então determina a pontuação que deve ser atribuída ao paciente, com base em todas essas informações(1).
APLICAÇÃO DO GOAT
As 10 questões do GOAT são perguntadas oralmente ao paciente e cada questão tem um número determinado de pontos de erro, que deve ser atribuído quando a resposta se desvia da correta. Esse número de pontos é apresentado entre parênteses após cada questão do instrumento(1).
É um procedimento importante, durante a aplicação desse teste, corrigir as respostas erradas do paciente e alertá-lo que o teste será reaplicado no dia seguinte para avaliar sua capacidade de memorização.
O escore total do GOAT deve ser obtido subtraindo-se o total de pontos de erro de 100 (Escore total = 100 total de pontos de erro). Pontuações menores de 75 indicam que a vítima ainda encontra-se no período de amnésia. É considerado o término da APT, quando a vítima atinge, por dois dias consecutivos, escore maior ou igual a 75 no GOAT. Portanto, o GOAT deve ser administrado quando o paciente está apto a cooperar e é repetido diariamente até que alcance um escore de 75 consistentemente, ou seja, mantenha o escore igual ou superior a 75 por, no mínimo, dois dias consecutivos(1,12).
Na avaliação da gravidade do TCEC pela duração da APT, menos de uma hora de amnésia é indicativo de trauma leve e entre 1 e 24 horas, moderado. Vítimas com duração da APT maior do que um dia têm indicação de lesão encefálica grave(9).
Em relação à aplicação do GOAT, vale ressaltar algumas dificuldades, face às condições restritivas observadas na prática clínica, principalmente relacionadas à incapacidade das vítimas de manter comunicação verbal.
Na revisão da literatura internacional, o requisito para aplicação da escala tem sido descrito como indivíduos consistentemente fora do coma(12), descrição que mantém indefinições na aplicação do instrumento.
Foi necessário, portanto, buscar indicadores do momento após trauma em que os questionamentos do GOAT podem ser realizados. A ECGl, por tratar-se de escala consagrada mundialmente e amplamente utilizada na avaliação de vítimas após TCEC, pode ser um indicador importante do momento apropriado para a aplicação do GOAT.
As indefinições observadas em relação ao momento de aplicação do teste levaram à realização de um estudo em nosso meio(2,18), com o objetivo de identificar, através das pontuações total e parcial da ECGl, o momento mais adequado para aplicação do GOAT. Em estudo de seguimento de vítimas de TCEC, internadas em centro de referência para trauma da cidade de São Paulo, resultados da aplicação desses dois instrumentos foram analisados. Com relação à aplicabilidade do teste, o mesmo pôde ser aplicado nos pacientes com ECGl > 12, porém o término da APT foi verificado nos pacientes com pontuação > 14 nessa escala(2,18).
As vitimas com escores 14 e 15 na ECGl, com pontuações parciais de 3 ou 4 no item Abertura Ocular, 4 ou 5 em Resposta Verbal e 6 em Resposta Motora foram as que alcançaram valor > 75 no GOAT. Tais resultados apontam para a aplicação desse teste após as vítimas atingirem essas pontuações na ECGl(2,18).
ADAPTAÇÃO E VALIDAÇÃO PARA CULTURA BRASILEIRA
Após autorização de seus autores, a tradução do GOAT, originariamente desenvolvido em língua inglesa, foi realizada em três etapas: a tradução para o português; a retro-tradução para o inglês; a avaliação da equivalência entre o instrumento original e a versão retro-traduzida.
Estiveram envolvidas na tradução para o português, duas enfermeiras especialistas em Terapia Intensiva, conhecedoras dos dois idiomas (português e inglês). A retro-tradução foi realizada por duas brasileiras, fluentes na língua inglesa. Uma canadense, especialista em Enfermagem em Neurociência, fez a avaliação da equivalência entre o instrumento original e a versão retro-traduzida.
Nas etapas de tradução e retro-tradução, as especialistas trabalharam independentemente e, posteriormente, compatibilizaram as traduções em uma única.
O processo de tradução transcorreu sem dificuldades e a comparação entre as escalas original e retro-traduzida resultou na indicação, pelo avaliador, de equivalência idiomática e conceitual das duas versões do instrumento(2,19).
Vale explicitar, no entanto, que na comparação entre as escalas original e a retro-traduzida, a avaliadora teceu o seguinte comentário referente à segunda parte da questão 5:
The back-translation is accurate but the original version is confusing when it says the "first" event you recall before the injury. The phrase in the previous question which refers to last thing you remember before...makes more sense.
Tendo em vista este comentário, optou-se, nas duas partes da questão 5, pela tradução a última coisa que você lembra antes do acidente, conforme pode-se observar no instrumento traduzido apresentado.
Após a tradução, o GOAT foi renomeado como Teste de Amnésia e Orientação de Galveston e avaliado quanto a sua confiabilidade e validade, sendo submetido a processo de validação convergente e divergente. Para esses procedimentos, o instrumento foi aplicado em pacientes internados em hospital governamental, centro de referência para atendimento de vítimas de trauma. Durante a coleta de dados, 73 pacientes foram localizados e acompanhados nas diferentes unidades hospitalares para avaliação diária. Participaram da casuística do estudo vítimas de TCEC, entre 12 e 60 anos de idade; sem diagnóstico anterior de trauma crânio-encefálico ou alteração de memória, atendidas no local de estudo após o trauma e internadas para tratamento, no período de 03/01 a 03/05/2001(2,19).
A confiabilidade do instrumento foi avaliada pela análise de consistência interna dos itens através do coeficiente alfa de Cronbach e o valor de referência adotado como aceitável (boa confiabilidade) foi igual ou maior que 0,7. Uma das condições para o cálculo do alfa, é que todos os itens envolvidos estejam correlacionados positivamente e tal hipótese foi satisfeita por todas as questões que integram o instrumento. O alfa calculado para o instrumento foi de 0,76, valor superior ao adotado como aceitável(2,19).
Tendo em vista que tanto a alteração do nível de consciência inicial da vítima, como a duração da APT têm sido consideradas importantes indicadores da gravidade do TCEC, e que a ECGl e o GOAT são instrumentos indicados para detectar essas alterações, hipóteses foram formuladas visando a validação do GOAT.
Em relação à validação convergente, uma das hipóteses formuladas afirma que o valor obtido na primeira avaliação realizada com a ECGl pela neurocirurgia correlaciona-se positivamente com os escores obtidos na primeira avaliação com o GOAT. O pressuposto de correlação positiva baseia-se no significado dos escores dos instrumentos que, em ambas as aplicações, apresentam sentido similar: alterações acentuadas são designadas com baixas pontuações e estados de normalidade no parâmetro medido são indicados por elevados valores.
Ainda para a validação convergente, outra hipótese formulada pressupõe que a duração da APT, em dias, estabelecida através do GOAT, apresenta correlação negativa com os valores da primeira avaliação pela ECGl feita pela neurocirurgia. Neste caso, a hipótese de correlação é negativa devido ao pressuposto que, quanto maior o período de APT, maior a gravidade do TCEC e pontuações mais elevadas na ECGl indicam menor gravidade dessa lesão.
Nas duas hipóteses anteriormente descritas, a correlação entre as variáveis é esperada e, portanto, tem-se em pauta a validação convergente do instrumento. Para testar as hipóteses de validação convergente foi aplicado o Coeficiente de Correlação por Postos de Spearman.
O estudo mostrou correlação ordinal positiva estatisticamente significante (rs = 0,56; p<0,05) entre o escore da ECGl e a pontuação da 1ªavaliação do GOAT. Assim, os altos valores da ECGl, indicadores de trauma leve, tenderam a estar associados com altas pontuações no GOAT na 1ªavaliação durante o seguimento realizado com as vítimas. Por outro lado, baixo escore na ECGl, que indica TCEC grave, esteve relacionado com as menores pontuações do GOAT(2,19).
O estudo mostrou ainda correlação negativa estatisticamente significativa (p<0,05) entre a ECGl e a duração da APT. Nesse caso, a indicação de TCEC leve pela ECGl, apontada por escores elevados, esteve relacionada com curtos períodos de amnésia. De forma análoga, a indicação de TCEC grave esteve associada com prolongados períodos de APT. Tais resultados são evidências de validade convergente do GOAT, à medida que os valores resultantes da aplicação desse instrumento correlacionam-se com outro método de medir o mesmo conceito, no caso, a gravidade do TCEC, medido pela ECGl(20).
A capacidade discriminativa do GOAT foi avaliada, num primeiro momento, pela comparação das médias da pontuação obtida na sua primeira aplicação nas vítimas, de um grupo caso e um grupo controle. O grupo controle foi constituído de pacientes que tiveram indicação de trauma moderado e leve pelos escores da ECGl (9 a 15) e o grupo caso teve como componentes as vítimas com trauma grave, segundo a pontuação da mesma escala (3 a 8)(2,19).
Considerou-se nessa análise que, na primeira avaliação realizada com o GOAT, vítimas com TCEC leve e moderado deveriam estar na fase de término do período de APT e obter, portanto, pontuações próximas da normalidade. Entretanto, o mesmo não deveria ocorrer com aqueles que tiveram indicação de trauma grave(2,19).
Dando seqüência à validade discriminante do instrumento, considerou-se a duração da APT, em dias, determinada pela aplicação diária do GOAT até a indicação de término da amnésia e os mesmos grupos formados segundo gravidade do TCEC, indicada pela ECGl(2,19).
A validade discriminante do instrumento foi avaliada pela comparação de médias do grupo caso com o grupo controle. A normalidade dos escores da primeira avaliação do GOAT e da duração, em dias, da APT, verificada pelo teste de Kolmogorov-Smirnov, permitiu realizar a comparação através do Teste t de Student para amostras independentes(2,19).
Para o grupo controle, com indicação de TCEC de gravidade leve e moderada, observou-se um escore médio do GOAT muito superior ao do grupo caso, com TCEC grave. Houve evidência estatística (p< 0,05) de que o grupo controle apresenta escore médio superior ao valor do grupo caso; tal resultado é indicativo de que o instrumento apresenta validade discriminante, pois distingue grupos de respondentes que, teoricamente, devem diferir no atributo avaliado(20).
Quando a variável analisada foi duração da APT, a comparação revelou que há evidência estatística de que o número médio de dias de amnésia do grupo caso supera o do grupo controle. Tal resultado reafirma a evidência da capacidade discriminativa do GOAT(2,19).
Em todas as análises de validação foi calculado o p value associado à hipótese de nulidade (Ho) adotado em cada teste e as análises em que o p value foi inferior a 0,05, o resultado foi considerado estatisticamente significante(2,19).
COMENTÁRIOS FINAIS
Desde a sua publicação, o GOAT tem sido amplamente utilizado. Estudos que aplicaram o teste demonstraram que ele é um importante instrumento para detectar a APT e determinar sua duração(4,10).
Não obstante, o uso da pontuação do GOAT para determinar o término da APT identifica um estágio de recuperação que parece mais concorrente com o retorno da capacidade de orientação, do que com a recuperação da lembrança espontânea. Segundo alguns autores, em pacientes mais gravemente traumatizados, a amnésia realmente contribui para o escore do GOAT, mas nos traumas mais leves, atenção e confusão são primariamente os fatores que contribuem para a pontuação(21).
O uso do GOAT como instrumento para estabelecer o término da amnésia limita a capacidade do pesquisador distinguir quadros confusionais das alterações de memória pós-traumática. Na estrutura do GOAT, o predomínio das medidas de orientação é evidente e condizente com o pressuposto de que o período de amnésia é a fase inicial de recuperação, após um intervalo de rebaixamento de nível de consciência.
Além disso, a experiência de determinar o tempo de APT prospectivamente evidenciou dificuldades e restrições a serem ponderadas: a aplicação diária do instrumento pode se prorrogar por muitos dias; o período de permanência hospitalar é o mais viável para as avaliações diárias, entretanto, o tempo de APT muitas vezes supera esse período; existem muitas condições durante a internação hospitalar das vítimas de TCEC que impossibilitam a comunicação verbal e inviabilizam, independente do método, a avaliação da memória(2,22).
Recebido: 30/01/2009
Aprovado: 16/04/2009
APÊNDICE
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
18 Dez 2009 -
Data do Fascículo
Dez 2009
Histórico
-
Aceito
16 Abr 2009 -
Recebido
30 Jan 2009