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Compatibilidades e incompatibilidades entre radiação gama e óxido de etileno como métodos sucessivos de esterilização

Compatibilidades e incompatibilidades entre rayos gama y óxido de etileno como métodos sucesivos de esterilización

Resumos

A dúvida sobre a questão da re-esterilização de artigos confeccionados com cloreto de polivinila (PVC), esterilizados em radiação gama (RG) e posteriormente em óxido de etileno (EO) persiste até os dias atuais. Por meio da revisão integrativa da literatura, este artigo analisou estudos que evidenciaram compatibilidades e incompatibilidades entre os processos de esterilização com RG e EO quando utilizados como métodos sucessivos de esterilização. Foram analisados 7 estudos. Constatou-se que há influência multifatorial na segurança do procedimento e que o método analítico da cromatografia empregado na maioria dos estudos produziu resultados controversos. Esse fato indica a necessidade da realização de novos estudos sobre o assunto, utilizando-se métodos analíticos mais sensíveis do que a cromatografia gasosa, como o teste de reatividade biológica em culturas celulares, que poderá dirimir em nosso meio a crônica dúvida da compatibilidade ou incompatibilidade de se esterilizar em EO materiais previamente gamairradiados.

Raios gama; Óxido de etileno; Esterilização


La duda sobre la cuestión de la reesterilización de artículos confeccionados con policloruro de vinilo (PVC) esterilizados con Rayos Gamma (RG) y posteriormente en óxido de etileno (EO) persiste hasta la actualidad. A través de la revisión integradora de la literatura, este artículo analizó estudios que evidenciaron compatibilidades e incompatibilidades entre los procesos de esterilización con RG y EO, cuando se utilizan en forma sucesiva. Fueron analizados 7 estudios. Se constató que hay influencia multifactorial en la seguridad del procedimiento y que el método analítico de cromatografía empleado en la mayoría de los estudios generó resultados controversiales. Este hecho indica la necesidad de realizar nuevos estudios sobre el asunto, utilizando métodos analíticos más sensibles que la cromatografía gaseosa, tales como el test de reactividad biológica en cultivos celulares para dirimir en nuestro medio la crónica duda de la compatibilidad o incompatibilidad de esterilizar en EO materiales previamente irradiados con Rayos Gamma.

Rayos gamma; Óxido de etileno; Esterilización


The doubt regarding the re-sterilization of articles made of polyvinyl chloride (PVC) sterilized with gamma radiation (GR) and subsequently with ethylene oxide (EO) persists to date. Through a systematic literature review, this article analyzed studies that demonstrated compatibilities and incompatibilities between the sterilization processes with GR and EO, when used as consecutive sterilization methods. Seven studies were analyzed. It was verified that there is a multifactor influence regarding the safety of the procedure and that the chromatography analytical method employed by most studies yielded controversial results. This fact indicates the need for further studies on the issue, using more sensitive analytical methods than gas chromatography, such as the biological reactivity test in cell cultures, in an attempt to clarify the chronic doubt regarding the adequacy or inadequacy of sterilizing previously gamma-irradiated materials with EtO.

Gamma rays; Ethylene oxide; Sterilization


ARTIGO DE REVISÃO

Compatibilidades e incompatibilidades entre radiação gama e óxido de etileno como métodos sucessivos de esterilização

Compatibilidades e incompatibilidades entre rayos gama y óxido de etileno como métodos sucesivos de esterilización

Rafael Queiroz de SouzaI; Kazuko Uchikawa GrazianoII

IMestrando Bolsista do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem na Saúde do Adulto da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo. São Paulo, SP, Brasil. rafaelqsouza@usp.br

IIProfessora Titular do Departamento de Enfermagem Médico Cirúrgica da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo. São Paulo, SP, Brasil. kugrazia@usp.br

Correspondência Correspondência: Kazuko Uchikawa Graziano Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 419 Cerqueira César CEP 05403-000 São Paulo, SP, Brasil

RESUMO

A dúvida sobre a questão da re-esterilização de artigos confeccionados com cloreto de polivinila (PVC), esterilizados em radiação gama (RG) e posteriormente em óxido de etileno (EO) persiste até os dias atuais. Por meio da revisão integrativa da literatura, este artigo analisou estudos que evidenciaram compatibilidades e incompatibilidades entre os processos de esterilização com RG e EO quando utilizados como métodos sucessivos de esterilização. Foram analisados 7 estudos. Constatou-se que há influência multifatorial na segurança do procedimento e que o método analítico da cromatografia empregado na maioria dos estudos produziu resultados controversos. Esse fato indica a necessidade da realização de novos estudos sobre o assunto, utilizando-se métodos analíticos mais sensíveis do que a cromatografia gasosa, como o teste de reatividade biológica em culturas celulares, que poderá dirimir em nosso meio a crônica dúvida da compatibilidade ou incompatibilidade de se esterilizar em EO materiais previamente gamairradiados.

Descritores: Raios gama. Óxido de etileno. Esterilização.

RESUMEN

La duda sobre la cuestión de la reesterilización de artículos confeccionados con policloruro de vinilo (PVC) esterilizados con Rayos Gamma (RG) y posteriormente en óxido de etileno (EO) persiste hasta la actualidad. A través de la revisión integradora de la literatura, este artículo analizó estudios que evidenciaron compatibilidades e incompatibilidades entre los procesos de esterilización con RG y EO, cuando se utilizan en forma sucesiva. Fueron analizados 7 estudios. Se constató que hay influencia multifactorial en la seguridad del procedimiento y que el método analítico de cromatografía empleado en la mayoría de los estudios generó resultados controversiales. Este hecho indica la necesidad de realizar nuevos estudios sobre el asunto, utilizando métodos analíticos más sensibles que la cromatografía gaseosa, tales como el test de reactividad biológica en cultivos celulares para dirimir en nuestro medio la crónica duda de la compatibilidad o incompatibilidad de esterilizar en EO materiales previamente irradiados con Rayos Gamma.

Descriptores: Rayos gamma. Óxido de etileno. Esterilización.

INTRODUÇÃO

Em 1967 uma carta enviada ao British Medical Journal reportava que a re-esterilização em Óxido de Etileno (EO) dos materiais utilizados na assistência à saúde confeccionados em Cloreto de Polivinila (PVC) e, previamente, esterilizados em Radiação Gama (RG) produzia altas concentrações de um subproduto tóxico do EO - a Etileno Cloridrina (ETCH)(1). Nesta carta, os autores não citam as dosagens encontradas que permitiriam comparar os limites considerados baixos ou aceitáveis pelas organizações oficiais. A divulgação desta afirmação provocou uma série de debates entre pesquisadores.

Nos anos seguintes, publicações embasadas somente nesta correspondência recomendaram não re-esterilizar em EO os materiais previamente irradiados(2-4); contribuindo assim para a disseminação da suposta incompatibilidade entre estes dois métodos de esterilização.

No Brasil, a polêmica surgiu em 1982, em um livro no qual consta a seguinte informação:

Nenhum artigo de PVC (Cloreto de Polivinil) originalmente esterilizado por raios gama deve ser reesterilizado pelo óxido de etileno porque os resíduos de HCl (ácido clorídrico) liberados pela irradiação reagem posteriormente com o óxido de etileno produzindo cloridrina etilênica que possui as mesmas propriedades cáusticas do óxido de etileno, sendo, todavia, de remoção muito mais difícil(5).

Esta afirmação é sustentada pela citação da referência bibliográfica de um trabalho realizado em 1971(6); o qual avaliou a duração da retenção de EO em materiais de PVC, borracha, Teflon e Polietileno, e o nível tóxico do gás para os tecidos por meio do implante subcutâneo em ratos. Este estudo não abordou a incompatibilidade entre os métodos de esterilização, portanto, não poderia ter sido citado para sustentar as afirmações do autor.

Já em um livro de 1987(7); o autor afirma que se os tempos recomendados para a aeração dos materiais de PVC forem obedecidos, a irradiação prévia com RG não contra-indicará a re-esterilização em EO. Esta afirmação baseou-se em um estudo primário de 1976(8); no qual foram dosadas as concentrações de EO em tubos endotraqueais de PVC e seu decaimento em função do tempo de aeração, e em um estudo de 1961(9); que consistiu em evidenciar danos em plásticos após a esterilização EO, sem qualquer menção ao uso prévio de RG. Em outra obra de 1997(10); encontra-se a mesma afirmação acompanhada das mesmas referências.

Nota-se que os estudos que embasam a afirmação supracitada não abordaram incompatibilidades entre métodos de esterilização. Sendo assim, não embasam a afirmação dos autores.

Em 1997, foi realizado um levantamento bibliográfico sobre o tema e na conclusão de sua análise, a autora considerou insuficiente o número de pesquisas para que a dúvida fosse esclarecida e sugeriu a realização de novos experimentos(11).

Atualmente, apesar de nenhuma recomendação oficial proibir este procedimento, considerando prática de se re-esterilizar os materiais cujo prazo de validade da esterilização está vencido, os materiais termossensíveis esterilizados em RG têm indicação de re-esterilização em EO, apesar dos inconvenientes desse método, como a adsorção e absorção de gás residual nos materiais(12). Porém, as publicações que alertam sobre a incompatibilidade de se re-esterilizar em EO os materiais previamente gamairradiados, sobretudo os confeccionados em PVC, deixam dúvidas que precisam ser dirimidas.

OBJETIVO

Analisar a literatura científica que evidenciou as compatibilidades e as incompatibilidades entre Radiação Gama e Óxido de Etileno como métodos sucessivos de esterilização.

MÉTODO

Trata-se de uma revisão integrativa da literatura científica, cujo método permite a inclusão de literatura empírica e teórica, tendo como uma das principais vantagens a possibilidade de combinar dados de diferentes desenhos de pesquisa(13).

A questão norteadora desta revisão consistiu em: Há incompatibilidade ou compatibilidade na re-esterilização de materiais esterilizados por RG e EO de forma sucessiva?

Para a recuperação das referências foi utilizada a busca eletrônica nas bases: LILACS, PubMed/MEDLINE e SciELO. Como descritores, foram admitidos os termos: Gamma rays, Ethylene Oxide e Sterilization. Como estratégia complementar, foi realizada a consulta aos acervos da Biblioteca da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo, Biblioteca Central da Universidade Federal de São Paulo e, também, a busca em árvore, que consiste na procura das referências utilizadas na construção dos trabalhos primários identificados, a fim de acessar as fontes primárias.

Foram incluídas publicações cujo escopo era constatar incompatibilidades ou compatibilidades na re-esterilização em EO de materiais previamente esterilizados em RG por meio de experimento.

A análise crítica de cada estudo foi realizada com base no quadro sinóptico, no qual foram descritos os aspectos metodológicos extraídos das publicações (Quadro 2) e também no quadro síntese de resultados (Quadro 3).



RESULTADOS

A fim de facilitar a apresentação dos resultados e da discussão, as publicações selecionadas receberam uma codificação de E1 a E7. Encontram-se relacionadas no Quadro 1, conforme seu código, referência e evidência.


No Quadro 2, são apresentados os aspectos metodológicos das publicações consideradas na análise.

No Quadro 3, estão apresentadas as sínteses dos resultados das publicações selecionadas.

DISCUSSÃO

Do ponto de vista metodológico o estudo E1 (carta original de 1967, que iniciou a polêmica) é frágil, pois não há detalhamento suficiente para torná-lo reprodutível. Portanto, seus resultados são questionáveis. Além disso, nenhum dado experimental quantitativo foi apresentado. Este estudo teve como referência um trabalho realizado em 1965(14); o qual evidenciou a formação de cloridrinas tóxicas em alimentos, quando fumigados com EO, devido à presença de Cloro na sua superfície. Não há relato da exposição prévia das amostras à RG, portanto, este estudo não sustenta concretamente as afirmações dos autores.

No estudo E2, não há dosagens de referência, que permitam classificar as quantidades encontradas como significativas. Não houve determinação da dose de radiação utilizada e não há especificação da concentração do agente esterilizante, comprometendo a reprodutibilidade do estudo.

O estudo E3 não incluiu o tempo de aeração após re-esterilização em OE antes das análises, que é determinante na segurança da utilização destes materiais, porém, apresentou detalhadamente a composição do PVC utilizado, demonstrando que a mesma interfere nas concentrações residuais do EO e seus subprodutos. Além disso, atentou para as diferenças na eliminação do gás no PVC rígido e no flexível.

O estudo E4 apresentou detalhadamente os parâmetros utilizados para a esterilização. Uma variável importante, controlada no estudo, foi o intervalo entre as esterilizações. Em suas conclusões, os autores afirmam que seria prudente aguardar alguns dias para a recuperação do material antes da re-esterilização em EO. Esta variável necessita ser melhor investigada. Outro aspecto importante considerado foi à apresentação do material: rígido, flexível e pó, que foi determinante na segurança da re-esterilização em EO.

O estudo E5 foi minucioso quanto à descrição dos parâmetros utilizados para as esterilizações. Além disso, foi o primeiro estudo que contestou o estudo E1 que gerou a polêmica da incompatibilidade entre métodos de esterilização. O resultado permitiu que, em 1976, uma publicação assegurasse que uma vez obedecido o tempo recomendado para aeração dos materiais de PVC, a prévia irradiação destes materiais não configura uma contraindicação à re-esterilização dos mesmos em EO(15).

O estudo E6 empregou métodos de quantificação de resíduos e toxicidade em culturas celulares. Mesmo utilizando o EO puro para esterilização os resultados demonstraram compatibilidade entre os métodos de esterilização. Apesar do uso da cromatografia gasosa para quantificação dos resíduos do EO e subprodutos, o autor conclui os resultados com base nos testes de toxicidade celular.

O estudo E7, ao contrário dos outros estudos, utilizou látex e algodão como corpo de prova. Apesar de não utilizar materiais de PVC, este trabalho nos chama atenção para a citotoxicidade dos materiais utilizados na assistência a saúde, mesmo quando não expostos ao EO, fator que merece mais investigações. Outras características que merecem destaque são a utilização e o detalhamento da aeração forçada empregada na eliminação dos resíduos do EO e seus subprodutos, que é fundamental para assegurar o uso dos materiais esterilizados nesse método.

Há controvérsias nos resultados dos estudos que utilizaram a cromatografia gasosa como método analítico. O fato pode ser um indicativo de que esse método seja questionável quanto à sensibilidade para evidenciar a resposta das questões norteadoras das pesquisas. Por outro lado, a análise da toxicidade celular empregada em dois dos estudos analisados, demonstrou ser um método passível de ser utilizado para verificação de morte celular na presença de substâncias tóxicas em artigos submetidos aos processos de esterilização com esses agentes, pois os corpos de prova são testados diretamente em células vivas, reproduzindo o contato do artigo com resíduo tóxico com o organismo humano, tal como ocorreria na prática assistencial.

CONCLUSÃO

A análise das evidências presentes nos estudos demonstrou que não há uma situação em que esse procedimento seja totalmente seguro, pois, com base nos experimentos realizados, a segurança do procedimento teria influência multifatorial como: o tipo da matéria-prima, se o material é flexível ou rígido, conformação do produto, aditivos empregados (estabilizadores), além do tempo de aeração do material após a esterilização em EO. Entretanto, estes fatores foram constatados a partir de estudos que empregaram, em sua maioria, o método analítico da cromatografia gasosa, que atualmente é questionado por especialistas no assunto.

Esta última afirmação direciona para a necessidade de novos estudos sobre o tema, utilizando métodos analíticos mais sensíveis do que a cromatografia gasosa, por exemplo, o teste da reatividade biológica em culturas celulares, para dirimir em nosso meio a crônica dúvida da compatibilidade ou incompatibilidade de se esterilizar em EO materiais previamente gamairradiados.

Recebido: 17/02/2009

Aprovado: 08/03/2010

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  • Correspondência:

    Kazuko Uchikawa Graziano
    Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 419
    Cerqueira César
    CEP 05403-000
    São Paulo, SP, Brasil
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      15 Dez 2010
    • Data do Fascículo
      Dez 2010

    Histórico

    • Recebido
      17 Fev 2009
    • Aceito
      08 Mar 2010
    Universidade de São Paulo, Escola de Enfermagem Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 419 , 05403-000 São Paulo - SP/ Brasil, Tel./Fax: (55 11) 3061-7553, - São Paulo - SP - Brazil
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