Resumos
O presente trabalho teve como objetivo estabelecer um método para a utilização de dados espectrais, obtidos em laboratório e imagens do Landsat 5, no reconhecimento e discriminação de três classes de solos do estado de São Paulo. Foram coletadas amostras de solo e obtidos os dados de reflectância por espectrorradiômetro em laboratório como padrão de um Latossolo Vermelho distroférrico (LVdf), um Argissolo Vermelho-Amarelo (PVA) e Neossolo Quartzarênico (RQ). Foram extraídos dados de reflectância das imagens, com os quais se efetuou a classificação digital pelo classificador Spectral Angular Mapper. As curvas espectrais obtidas por espectrorradiômetro em laboratório mostraram três padrões distintos de comportamento espectral, baseados nas diferenças da forma das curvas, feições de absorção dos minerais do solo e na intensidade de reflectância. O LVdf apresentou menor albedo em virtude da textura argilosa e maiores teores de Fe, ao contrário dos solos mais arenosos PVA e RQ. As bandas de absorção características da caulinta (2.200 nm), OH- e água (1.400 e 1.900 nm) ocorreram em todos os solos. Solos arenosos, como o RQ, apresentaram uma curva espectral com tendência positiva. A linha do solo mostrou distinção espectral, tanto com dados orbitais como terrestres, indicando que cada solo tem uma tendência individual. Os padrões espectrais obtidos em laboratório foram importantes para a eficiência do método na detecção dos mesmos nas imagens de satélite. Os solos avaliados podem ser discriminados e reconhecidos pela interpretação quantitativa em imagens. O método mostrou-se eficiente como auxílio no mapeamento de solos no nível semidetalhado de alta intensidade.
classificação de solos; sensoriamento remoto; classificação digital; imagem de satélite; mapeamento; radiometria
The objective of this research was to determine a methodology for the use of spectral data obtained in the laboratory and from orbital images for the recognition and discrimination of three soil classes in the State of São Paulo, Brazil. Reflectance data were obtained by a spectroradiometer/by Landsat 5 images in the laboratory as standards from soil samples of Oxisol, Ultisol, and Entisol profiles. Orbital data were converted to reflectance and classified by the Spectral Angle Mapper. The spectral curves obtained by a spectroradiometer in the laboratory showed three different patterns, based on the differences in the shape of the curves, soil mineral absorption features, and the reflectance intensity. The Oxisol presented smaller reflectance due to the clayey texture and greater iron content, in relation to the sandier Ultisols and Psament. The characteristic absorption bands of kaolinite (2,200 nm), OH-, and water (1,400 and 1,900 nm) occurred in all soils. Sandy soils such as the Psament presented a spectral curve with positive tendency. The soils were discriminated by the images (bands 5 and 7), being the terrestrial sensor data an important support in this evaluation. The soil line showed spectral distinction for both orbital and terrestrial data, indicating an individual tendency for each soil. The spectral standards obtained in the laboratory were important for the efficiency of the methodology to identify the same in the satellite images. The methodology was efficient to detect areas with exposed soil in the image. The methodology showed that the soil classes used in this work can be recognized and discriminated by orbital data. The obtained results of the digital classification indicated that this technique can be used to support soil survey at a semi-detailed level of high intensity.
soil classification; remote sensing; digital classification; satellite images; soil survey; spectroradiometry
SEÇÃO V - GÊNESE, MORFOLOGIA E CLASSIFICAÇÃO DO SOLO
Metodologia para reconhecimento de três solos por sensores: laboratorial e orbital
Methodology for the recognition of three soils by using laboratory and orbital sensors
J. A. M. DemattêI; A. M. A. ToledoII; M. S. SimõesIII
IProfessor do Departamento de Solos e Nutrição de Plantas, Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz" ESALQ/USP. Av. Pádua Dias 11, CEP 13418-900 Piracicaba (SP). E-mail: jamdemat@carpa.ciagri.usp.br IIDoutorando do Centro de Energia Nuclear na Agricultura CENA. Piracicaba (SP)
IIIPesquisador da Coopersucar. Piracicaba (SP)
RESUMO
O presente trabalho teve como objetivo estabelecer um método para a utilização de dados espectrais, obtidos em laboratório e imagens do Landsat 5, no reconhecimento e discriminação de três classes de solos do estado de São Paulo. Foram coletadas amostras de solo e obtidos os dados de reflectância por espectrorradiômetro em laboratório como padrão de um Latossolo Vermelho distroférrico (LVdf), um Argissolo Vermelho-Amarelo (PVA) e Neossolo Quartzarênico (RQ). Foram extraídos dados de reflectância das imagens, com os quais se efetuou a classificação digital pelo classificador Spectral Angular Mapper. As curvas espectrais obtidas por espectrorradiômetro em laboratório mostraram três padrões distintos de comportamento espectral, baseados nas diferenças da forma das curvas, feições de absorção dos minerais do solo e na intensidade de reflectância. O LVdf apresentou menor albedo em virtude da textura argilosa e maiores teores de Fe, ao contrário dos solos mais arenosos PVA e RQ. As bandas de absorção características da caulinta (2.200 nm), OH- e água (1.400 e 1.900 nm) ocorreram em todos os solos. Solos arenosos, como o RQ, apresentaram uma curva espectral com tendência positiva. A linha do solo mostrou distinção espectral, tanto com dados orbitais como terrestres, indicando que cada solo tem uma tendência individual. Os padrões espectrais obtidos em laboratório foram importantes para a eficiência do método na detecção dos mesmos nas imagens de satélite. Os solos avaliados podem ser discriminados e reconhecidos pela interpretação quantitativa em imagens. O método mostrou-se eficiente como auxílio no mapeamento de solos no nível semidetalhado de alta intensidade.
Termos de Indexação: classificação de solos, sensoriamento remoto, classificação digital, imagem de satélite, mapeamento, radiometria.
SUMMARY
The objective of this research was to determine a methodology for the use of spectral data obtained in the laboratory and from orbital images for the recognition and discrimination of three soil classes in the State of São Paulo, Brazil. Reflectance data were obtained by a spectroradiometer/by Landsat 5 images in the laboratory as standards from soil samples of Oxisol, Ultisol, and Entisol profiles. Orbital data were converted to reflectance and classified by the Spectral Angle Mapper. The spectral curves obtained by a spectroradiometer in the laboratory showed three different patterns, based on the differences in the shape of the curves, soil mineral absorption features, and the reflectance intensity. The Oxisol presented smaller reflectance due to the clayey texture and greater iron content, in relation to the sandier Ultisols and Psament. The characteristic absorption bands of kaolinite (2,200 nm), OH-, and water (1,400 and 1,900 nm) occurred in all soils. Sandy soils such as the Psament presented a spectral curve with positive tendency. The soils were discriminated by the images (bands 5 and 7), being the terrestrial sensor data an important support in this evaluation. The soil line showed spectral distinction for both orbital and terrestrial data, indicating an individual tendency for each soil. The spectral standards obtained in the laboratory were important for the efficiency of the methodology to identify the same in the satellite images. The methodology was efficient to detect areas with exposed soil in the image. The methodology showed that the soil classes used in this work can be recognized and discriminated by orbital data. The obtained results of the digital classification indicated that this technique can be used to support soil survey at a semi-detailed level of high intensity.
Index terms: soil classification, remote sensing, digital classification, satellite images, soil survey, spectroradiometry.
INTRODUÇÃO
A pressão sobre a necessidade de maior produção de alimentos em virtude do aumento populacional tem causado sérios danos ao ambiente em geral e, em particular, aos solos. Tal efeito é resultante da intensa e desorganizada urbanização, industrialização, desflorestamento e falta de planejamento do uso da terra. Portanto, existe uma necessidade urgente na sistematização do mapeamento e monitoramento das terras, como base para uma produção agrícola sustentável, preservando o ambiente.
O inventário sobre os solos pode ser realizado pelos métodos convencionais de levantamentos de solos, estabelecidos por Brasil (1960). Por outro lado, o solo também pode ser avaliado por métodos como os iniciados por Westin & Frazee (1976) e Venkataratnam (1980). Geralmente, os métodos convencionais são trabalhosos, caros e demorados, quando comparados com as técnicas de mapeamento por sensoriamento remoto.
Da mesma forma que o mapeamento de solos evoluiu no Brasil (Embrapa, 1999) e nos EUA (Soil Taxonomy, 1998), as técnicas auxiliares também evoluíram. Neste aspecto e dentre estas técnicas, o Sensoriamento Remoto (SR) vem-se destacando como uma importante ferramenta que pode auxiliar nos levantamentos de solos (Ben-Dor, 2002).
As aplicações de SR em pedologia começaram nos anos 30s com a utilização de fotografias aéreas como mapas-base. Nos anos 60s, um novo impulso ocorreu com o desenvolvimento de novas técnicas cartográficas aplicadas à pedologia, permitindo o estudo do padrão fisiográfico dos solos. Atualmente, são avaliadas imagens de satélite, com sucesso em diversas áreas, como em levantamentos geológicos (Vincent, 1999), no inventário e levantamento do uso da terra, visando à discriminação e ao monitoramento de culturas (Zermiani et al., 1999).
Outra técnica que vem sendo avaliada é a radiometria em laboratório. Neste caso, Cipra et al. (1980) compararam medidas de espectrorradiômetros em laboratório com dados digitais do Landsat 1 e observaram que os valores foram altamente correlacionados para todos os comprimentos de onda. Harrison & Johnson (1982) concluíram que o uso de mapas espectrais orbitais melhoram a acurácia e a qualidade dos mapas de solos.
Nos últimos trinta anos, a espectrorradiometria tem sido muito utilizada em estudos de solos (Stoner & Baumgardner, 1981), haja vista ser considerada uma excelente base de apoio para o entendimento de dados orbitais, conforme destaca Huete (1996). Em relação aos solos tropicais, verifica-se a necessidade de maior aprofundamento no conhecimento espectral, como demonstram trabalhos realizados por Formaggio (1983), Epiphanio et al. (1992), Madeira Netto (1996) e Formaggio et al. (1996) e principalmente em relação aos dados orbitais. A maior parte dos trabalhos de radiometria, tanto no nível terrestre como orbital, apresenta-se como material básico na caracterização dos solos, havendo necessidade de desenvolvimento de métodos que, efetivamente, sejam aplicados no levantamento de solos, conforme os realizados por Shiva Prasad et al. (1990) e Saha et al. (1990).
O fato de novos e modernos sensores estarem sendo constantemente atualizados e desenvolvidos justifica a importância dos trabalhos na área de SR, conforme destacado por Ben-Dor (2002). A disponibilidade de novos sensores orbitais com melhores resoluções, espectral e espacial, possibilitam o desenvolvimento e aperfeiçoamento de aplicações em estudos de solos. Dentre as novas técnicas, destaca-se o conceito de linha do solo (LS), que apresenta uma relação linear entre a reflectância do solo exposto na faixa do vermelho e a reflectância no infra-vermelho próximo. O conceito de linha do solo baseia-se no fato de que a reflectância de solos expostos determina uma curva linear para estes dois comprimentos de onda (Baret et al., 1993).
Utilizando este conceito, é possível determinar áreas que apresentam maior probabilidade de ter solo exposto, o que permite a inferência das propriedades espectrais de solo a partir de imagens orbitais. No entanto, uma das dificuldades no estudo de solo em nível orbital é identificar locais cujo valor espectral seja principalmente de solo. Na região de Piracicaba (SP), onde a topografia do terreno dificulta a colheita mecanizada, observam-se extensas áreas com solo exposto resultante da queima e corte anual da cana-de-açúcar. Por essa razão, encontra-se aí uma excelente oportunidade de desenvolver pesquisa nessa região sucroalcooleira no sentido de esclarecer dúvidas quanto ao comportamento de dados espectrais obtidos pelo sensor no satélite e em laboratório, procurando elucidar as vantagens e desvantagens desses sistemas e elaborar métodos para o uso de ambos no mapeamento de solos.
Diante do exposto, o presente estudo teve como objetivos: (a) caracterizar três solos do estado de São Paulo pela reflectância espectral no nível terrestre (espectrorradiômetro em laboratório, na faixa de 400 a 2.500 nm), e orbital (Landsat 5 TM); (b) determinar um método que identifique os solos na imagem orbital, e (c) avaliar a aplicação das imagens orbitais como ferramenta auxiliar no levantamento de solos.
MATERIAL E MÉTODOS
O trabalho foi desenvolvido em áreas próximas aos municípios de Piracicaba e São Pedro, estado de São Paulo, estando compreendidas na quadrícula de Piracicaba, mapa pedológico semidetalhado do Instituto Agronômico de Campinas (IAC), escala base 1:50.000 e de publicação 1:100.000 (Oliveira & Prado, 1989). O clima regional, segundo o sistema Köeppen, é do tipo Cwa, ou seja, mesotérmico de inverno seco, em que a temperatura média do mês mais frio é inferior a 18 °C e, no mês mais quente, ultrapassa 22 °C. O índice pluviométrico deste tipo climático varia de 1.100 a 1.700 mm e a temperatura no mês mais quente oscila entre 22 e 24 °C.
Foram escolhidas três áreas com ocorrência dos solos: Latossolo Vermelho distroférrico, Argissolo Vermelho-Amarelo Tb distrófico abrupto e Neossolo Quartzarênico distrófico. Os perfis foram descritos de acordo com Lemos & Santos (1996). Como esses solos são constantemente comparados com a classificação anterior (Camargo et al., 1987), a classificação utilizada nas discussões é a seguinte: LR, Latossolo Roxo distrófico A moderado textura muito argilosa ou argilosa (Latossolo Vermelho distroférrico), localizado entre 22 º 35 ' 00 " e 22 º 43 ' 00 " S e 47 º 30 ' 00 " e 47 º 35 ' 00 " W, desenvolvido de rochas da formação Serra Geral, constituída por basalto, arenito inter-trap e diabásio; PV, grupamento indiscriminado de Podzólicos Vermelho-Amarelos Tb abruptos A moderado textura arenosa/argilosa ou média/argilosa (Argissolo Vermelho-Amarelo Tb distrófico abrupto), localizado entre 22 º 52 ' 00 " e 23 º 00 ' 00 " S e 47 º 32 ' 00 " e 47 º 30 ' 00 " W, relacionados com o Grupo Tubarão, constituída por arenitos, siltitos, varvitos, tilitos, conglomerados e fósseis e RQ, Areia Quartzosa álica profunda e pouco profunda A moderado (Neossolo Quartzarênico distrófico), localizado entre 22 º 42 ' 00 " e 22 º 46 ' 00 " S e 47 º 53 ' 00 " e 47 º 58 ' 00 " W, relacionada com a formação Botucatu-Pirambóia, constituída por arenitos, siltitos, folhelhos e fósseis.
Foram coletadas amostras de cinco perfis de solos, na profundidade de 020 cm. Nas análises químicas dos solos, foram determinados: pH (CaCl2), matéria orgânica, P, K, Mg2+, Ca2+, Al3+ e H + Al (Raij et al., 1987). Na análise granulométrica, foram determinados areia grossa e areia fina, silte e argila. A sílica, a alumina e o Fe total foram determinados pelo ataque sulfúrico (Camargo et al., 1986).
Para caracterizar os solos, também foram efetuadas análises mineralógicas da fração argila de acordo com Jackson (1969). A seguir, procedeu-se à separação granulométrica da fração areia (peneiração úmida), frações: silte e argila (decantação). Amostras da fração argila foram saturadas com K+ e Mg2+ e, posteriormente, transferidas para lâmina de vidro (esfregaço) e irradiadas por raios-X. As amostras de argila foram irradiadas num intervalo de 3 a 32 graus. Foram obtidos difratogramas das amostras saturadas com K+ a 25, 350 e 550 ºC e as saturadas com Mg2+ e glicoladas.
O trabalho apresenta quatro fases: (a) fase de obtenção de curvas espectrais sob condições de laboratório: refere-se à avaliação de dados espectrais de solos localizados em três áreas distintas (áreas-base) próximas ao município de Piracicaba (SP). Essa é a fase de conhecimento das curvas espectrais, usando-se sensor em laboratório; (b) fase de calibração dos dados orbitais: nessas mesmas áreas, também são coletados dados de reflectância de imagens de satélite e comparados com os padrões terrestres, salvo as diferenças inerentes a cada equipamento; (c) fase de aplicação: outras três áreas (áreas-teste), onde ocorrem os mesmos solos (e outros) próximos ao município de São Pedro foram selecionadas. O software ENVI (versão 3.3) foi municiado de informações espectrais provenientes das imagens das áreas-base e realizou-se uma classificação supervisionada na área-teste, e (d) fase de verificação: os dados foram verificados de duas formas: pela sobreposição do mapa de solos preexistente (Quadrícula) e verificação no campo com o Sistema de Posicionamento Global (GPS).
Utilizou-se, em laboratório, o sensor IRIS, Infra Red Intelligent Spectroradiometer, com resolução espectral de 2 nm entre 400 e 1.000 e de 4 nm entre 1.000 e 2.500 nm. O sensor foi colocado a 27 cm de altura sobre as amostras de solo (secas a 45 °C por 24 h), acondicionadas em uma placa de petri com diâmetro de 9 cm, formando uma camada com espessura de 1,5 cm. A fonte de iluminação, uma lâmpada halógena de 650 W, com feixe não colimado para o plano visado, foi posicionada a 61 cm do recipiente amostral, com um ângulo zenital de 15 °. Foi utilizada, como padrão de referência, uma placa branca, calibrada pela Labsphere (1996), cujos dados foram, posteriormente, corrigidos para 100 %. A energia que alimenta a lâmpada foi controlada por uma fonte de potência, evitando-se variações na corrente elétrica. A razão entre o fluxo radiante espectral refletido pela superfície de uma amostra de solo e o fluxo radiante espectral refletido por um padrão de referência, iluminados e visados sob as mesmas condições geométricas, gera o "fator de reflectância bidirecional espectral". Foram feitas três leituras por amostra, sendo utilizada a média para a avaliação. A partir do fator de reflectância bidirecional dos solos, obtiveram-se as curvas dos solos sob condições de laboratório (Figura 1).
A avaliação descritiva das curvas espectrais foi realizada de acordo com Stoner & Baumgardner (1981), sendo os tipos de curvas por eles estabelecidos também discutidos em Valeriano et al. (1995) e Formaggio et al. (1996). Além disso, foram avaliadas as feições de absorção e a intensidade do fator de reflectância (Figura 1). A simulação dos dados do Landsat 5 TM foi determinada pelo cálculo da média dos valores de reflectância obtidos nos intervalos espectrais das bandas do TM (nm), ou seja, banda 1 (450-520), 2 (520-600), 3 (630-690), 4 (760-900), 5 (1.550-1.750), 7 (2.080-2.350), possibilitando a comparação dos dados terrestres com orbitais.
A imagem orbital, órbita-ponto 220-76 com data de passagem de setembro de 1992, foi processada a fim de corrigir as interferências atmosféricas e obter os valores de reflectância para a construção das curvas espectrais dos solos. De cada uma das bandas da imagem, foram extraídos, pixel a pixel, os valores de reflectância no topo da atmosfera e, em seguida, foi aplicado o modelo 6S para a correção do espalhamento Rayleigh e absorção do ozônio. As equações mostradas abaixo estão descritas com maior detalhe por Tanré et al. (1992) e por Vermont et al. (1995):
em que Ls(l) (W m-2 sr -1 µm-1) é a radiância no sensor; DN(l) é o número digital para uma faixa de TM; n, m são os coeficientes de calibração do sensor TM; rapp é a reflectância aparente no "topo da atmosfera"; Eol é a irradiância exo-atmosférica solar relacionada com cada banda espectral do TM; qz é o ângulo de elevação solar; d é a distância da Terra-Sol (unidade astronômica); r* é a relação Rayleigh/Ozone (reflectância corrigida); to3 é a transmitância do ozônio; ra,r é o espalhamento Rayleigh atmosférico; Tr é a absorção atmosférica Rayleigh total.
Posteriormente, em cada área-teste, foram amostrados os dados de reflectância de cada solo, sendo 17 pixels amostrados para o LR e 18 para a RQ e para o PV. A escolha dos pixels para as amostragens partiu da determinação das áreas com solo exposto. Para isso, foi realizado um gráfico da dispersão (scatter plot) dos valores de reflectância das bandas 4 e 3, representando a linha do solo (Baret et al., 1993). Este gráfico apresentou um conjunto de pontos que refletem a relação entre estas duas bandas para todos os pixels da imagem. No gráfico, foram marcados todos os pontos próximos à linha 1:1, apresentando cada ponto um pixel da imagem. Quanto mais próximo da linha 1:1, maior a possibilidade de o pixel representar solo exposto. Após marcar os pontos no gráfico, foi possível visualizar os pixels que indicam solo exposto. Além disso, analisou-se a percentagem de cobertura do solo pelo índice de vegetação "Soil Adjust Vegetation Index" (SAVI), Huete (1989). Quando o valor do índice SAVI para determinado pixel fosse igual a zero, considerou-se como um indicativo de solo exposto, sem vegetação, portanto:
em que IVP é a reflectância na faixa do infravermelho (banda 4 do Landsat 5 TM) e V é a reflectância na faixa do vermelho (banda 3).
Numa segunda etapa, em cada ponto marcado pelo scatter plot foi avaliada a posição do pixel em relação aos limites do solo na Quadrícula do levantamento Semidetalhado de Solos de Piracicaba, buscando-se os pixels localizados no interior das unidades de mapeamento estudadas. Para isto, foi sobreposto sobre a imagem o mapa da quadrícula previamente digitalizado. Avaliou-se também a posição dos pixels com solo exposto em relação ao relevo.
A análise visual da imagem também contribuiu para a identificação das áreas com solo exposto. Foram usadas duas composições RGB, das bandas 5, 4 e 3, e 3, 2 e 1. Portanto, o ponto de amostragem só era considerado satisfatório se atendesse a todos os fatores anteriormente citados, conforme estabelecido por Demattê et al. (2000).
A classificação digital dos solos baseou-se nos pixels coletados para a obtenção das curvas espectrais. Os pixels coletados para o cálculo da média da reflectância foram utilizados como amostras de treinamento no classificador "Spectral Angle Mapper" (SAM), baseado em pixels puros, conforme previamente descritos para as áreas-base, e referentes aos locais previamente avaliados pela radiometria em condições de laboratório (padrão).
Posteriormente, foram escolhidas áreas-teste, onde se realizou a classificação digital, utilizando os dados da área-base, sendo analisados os pontos com índice de vegetação zero e com níveis de reflectância iguais aos da linha dos solos, obtidos na área-base, configurando áreas de solo exposto. A classificação usando o classificador SAM foi realizada no software ENVI com seis classes: água, vegetação, área urbana, LR, PV e RQ. A probabilidade utilizada para a classificação foi de 95 %. Após esta etapa, foram realizadas checagens de campo, com apoio do mapa de solos e GPS, com o propósito de avaliar o resultado da distribuição espacial das classes selecionadas na classificação e confrontá-lo com o mapa semidetalhado de solos da região. As figuras 2 e 3 ilustram a seqüência de trabalho.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Caracterização espectral dos solos (laboratorial e orbital)
As três classes encontram-se na região geomorfológica denominada Depressão Periférica. Observam-se, pelas características físicas e químicas (Quadro 1), três solos, cujos atributos também são analisados estatisticamente quanto aos teores de matéria orgânica, óxidos de Fe, areia, silte, argila, Ca2+ e V % (Quadro 2).
O Latossolo Roxo, LR (Latossolo Vermelho distroférrico) teve um padrão espectral semelhante ao da curva a pertencente à mesma classe de solos no estudo de Formaggio et al. (1996) (Figura 4). Seu comportamento é resultado basicamente dos altos teores de óxidos de Fe (186,46 g kg-1 Fe2O3), MnO e TiO2 diferenciando-se estatisticamente dos outros solos. O alto teor de hematita e o elevado teor de argila resultam em solos com baixo albedo, ou seja, reflectância baixa na faixa do visível e infravermelho, e mascaram as feições de absorção da água e dos outros minerais. O baixo albedo é também resultado da presença de minerais opacos, como a ilmenita e a magnetita, expressos pelos teores de TiO2 e MnO. Algumas bandas de absorção perceptíveis nesta classe de solo estão presentes entre 450 e 550 nm e entre 800 e 950 nm devido à presença de Fe3+.
O Podzólico Vermelho-Amarelo, PV (Argissolo Vermelho-Amarelo), teve um comportamento bastante similar ao apresentado por Formaggio et al. (1996) na curva d, referente a um Podzólico Vermelho-Escuro. Tais solos são caracterizados por um comportamento composto, ou seja, apresentam-se semelhantes as curvas dos LR (curvas do tipo a) na faixa de 450 a 1.100 nm e um comportamento mais parecido com o tipo b de curvas dos PV na faixa de 1.100 a 2.450 nm. Seu comportamento é semelhante ao da curva do tipo a, em decorrência da influência dos óxidos de Fe presentes em teores consideráveis no solo nesta faixa do espectro (Galvão & Vitorello, 1997). Na faixa seguinte, o compor-tamento é parecido com o da curva do tipo b, pelas presença de materiais mais refletivos, como o quartzo, provenientes de materiais arenosos ou siltosos. Tal observação concorda com as de White et al. (1997) que verificaram a refletividade do quartzo. A banda em 1.400 nm é devida aos grupos OH e às vibrações das moléculas de água, enquanto em 1.900 nm é devida à água. A feição da caulinita pode ser visualizada nas três curvas, em 2.200 nm, porém é mais perceptível nas curvas do PV e da RQ, e menos no LR graças ao Fe2O3 e magnetita, componentes do solo que mascaram as feições da água e da caulinita.
Nota-se que as amostras de RQ mostraram comportamento semelhante ao da curva b (Figura 4). O alto albedo apresentado por este solo é resultado, dentre outros fatores, do baixo teor de óxidos de Fe, dos minerais opacos e do material de origem arenoso. Este solo apresenta bandas de absorção em 1.450 e 1.950 nm mais visíveis em virtude da menor ocorrência de minerais opacos, mascarando este tipo de feição, assim como nas curvas do tipo d de Formaggio et al. (1996).
As curvas espectrais dos solos e a simulação das bandas do Landsat 5 TM mostraram o mesmo padrão de reflectância, porém com menor grau de detalhe espectral das bandas de absorção presentes nas curvas obtidas em laboratório (Figura 5a). A variação na intensidade é devida ao valor médio representativo da reflectância de cada banda no gráfico simulando o Landsat 5 TM. O padrão geral dos solos foi o mesmo, aliás, em acordo com observações de Demattê et al. (2000) para os mesmos solos ocorrentes em Lençóis Paulistas. O LR apresentou o menor albedo em todas as bandas nas três classes estudadas. Nas bandas do visível (bandas 1, 2 e 3), tal fato está associado à presença de óxidos de Fe, como descrito anteriormente, e concordando com Galvão & Vitorello (1998). Na curva como um todo, os minerais que absorvem muita energia como o TiO2 e MnO também atuam de forma a diminuir o fator de reflectância. A curva do PV apresentou alto albedo, mostrando que a ausência de óxidos de Fe e materiais opacos alterou a intensidade de reflectância dos solos, principal-mente nas bandas do infravermelho (bandas 4, 5 e 7).
Nas imagens de satélite (Figura 5b), a intensidade de reflectância foi menor em relação ao laboratório, resultado das interferências atmosféricas, em concordância com Nanni & Demattê (2000) para solos da região de Rafard, SP. Tais interferências foram, teoricamente, eliminadas pelo 6S. No entanto, é importante considerar outras fontes de variação, tais como: a fonte de iluminação, a heterogeneidade dos alvos, a unidade de geometria angular de visada e a iluminação. De maneira geral, a tendência das curvas em laboratório e orbital foi semelhante. Todavia, algumas diferenças ocorreram. A curva da RQ, que apresentava um comportamento intermediário entre os LR e os PV nas curvas em laboratório, passou a ter maior intensidade entre as curvas orbitais. O padrão apresentado pela curva do LR nos dois níveis de aquisição se manteve, apresentando baixa intensidade e albedo menor nas duas primeiras bandas em virtude das feições de absorção dos óxidos de Fe. As bandas 4, 5 e 7 tendiam a um ascendente, ao contrário dos valores orbitais. Tais resultados concordam com os de Nanni & Demattê (2000) e se devem a aspectos de umidade das amostras de campo, que diminuem a intensidade de energia refletida. Fato semelhante ocorreu com o PV.
Correlação dos atributos do solo com as bandas do Landsat 5 TM
Foram determinadas correlações entre os atributos do solo e as bandas 1, 2, 3, 4, 5 e 7 simuladas em laboratório referentes às faixas espectrais do TM (Quadro 3). Valores acima de 0,7 indicam que houve boa correlação. Os resultados mais satisfatórios podem ser observados nas bandas do infravermelho (4, 5 e 7), relacionados com elementos estruturais do solo, como: areia, silte, argila, Fe2O3, Al2O3, TiO2 e MnO e com a matéria orgânica, concordando com Ben-Dor & Banin (1995). Os valores obtidos para areia mostraram correlação positiva em quase todo o espectro, fato ratificado na literatura (Demattê et al., 2000) e nas curvas observadas. Para o silte, verificou-se também correlação positiva, bem como o aumento da reflectância de materiais intemperizáveis, concordando com Demattê & Garcia (1999). Acredita-se que os minerais intemperizáveis tenham maior atuação na faixa do visível, o que justifica as melhores correlações. Solos mais argilosos apresentam menor intensidade de reflectância e explica a correlação negativa referente a este atributo do solo.
As características dos elementos que compõem a fração argila (óxidos de Fe, minerais de argila) apresentam processos vibracionais que absorvem energia. Tais elementos encontram-se em menor proporção nos solos mais arenosos, ocorrendo efeito contrário. O mesmo pode ser observado quanto aos resultados obtidos para Fe2O3, Al2O3, TiO2, MnO e matéria orgânica, em que as maiores correlações encontram-se na TM5 e TM7. Em particular, o Fe apresentou valores satisfatórios em quase todo o espectro, concordando com Nanni & Demattê (2000). Isto indica que um mesmo elemento pode ter efeito em várias bandas de absorção, em menor ou maior proporção. Na realidade, a curva espectral é o resultado de um "jogo de forças" entre características do elemento e energia incidente e refletida. Neste aspecto, todos os elementos do solo atuam simultanea-mente, gerando, finalmente, uma curva espectral.
Avaliação da linha de solo (LS)
A LS dos três solos obtida em laboratório (Figura 6) mostrou resultados semelhantes aos obtidos por Baret et al. (1993) e Galvão & Vitorello (1998). As LS dos solos com menor albedo, caso do LR, apresentaram valores de curva (a) e intercepto (b) similares aos apresentados pela literatura. Isso é resultado do baixo albedo dos solos e da interferência dos altos teores de óxidos de Fe.
É possível observar a menor dispersão dos pontos para a LS do LR, mostrando a maior homogeneidade deste solo frente às outras duas classes. A LS do PV apresentou diferenças em relação à apresentada pelo LR, principalmente na dispersão dos dados e no maior afastamento dos pontos em relação à origem, mostrando que esta classe de solo apresenta maior intensidade de reflectância (Figuras 4 e 5), concordando com Galvão & Vitorello (1998). É possível observar também que a inclinação da linha de solo desta classe é intermediária, resultado dos valores também intermediários da matéria orgânica e do teor de Fe (Quadro 1).
Os dados da RQ mostraram alta dispersão e intensidade de reflectância média. A inclinação da curva também foi a maior entre os solos, tanto para os dados de laboratório quanto para os dados orbitais. A comparação entre os níveis de aquisição de dados mostrou que a linha de solo dos dados do Landsat 5 TM foi próxima às apresentadas nos dados de laboratório e que a inclinação e o intercepto das linhas de solo em ambos os níveis mostraram o mesmo comportamento entre os solos. A semelhança na forma das curvas e dos R2 obtidos entre os dados de laboratório e orbitais é um indicativo da veracidade dos dados obtidos pelo satélite. Isso concorda com Huete (1996), que coloca os trabalhos de laboratório em alto grau de importância para o entendimento dos dados orbitais.
Por outro lado, os dados de laboratório, que representam a curva espectral real dos solos, apresentaram também R2 mais expressivos. Os dados orbitais, apesar de também apresentarem altos R2, são mais baixos. Isso indica que os resultados orbitais, apesar de todo o cuidado metodológico, estão sendo influenciados por fatores não controlados, como restos de culturas, rugosidade da superfície, umidade, atmosfera, geometria de ângulos de visada e iluminação (Guyot, 1996).
Classificação digital
Após a calibração dos dados orbitais dos solos nas áreas-base, outras três áreas foram reclassificadas. Primeiramente, os pixels foram classificados pelo sistema Endmember e, posteriormente, avaliados individualmente pelo método de Demattê et al. (2000). Ou seja, o pixel classificado pelo Endmember para ser considerado do solo RQ deveria atender às exigências para ser solo exposto avaliado aqui de acordo com Demattê et al. (2000) (Figura 2 e 3) e ter sido classificado pelo pedólogo. Se o pedólogo indicasse ser uma RQ, mas os valores digitais fossem interpretados como não sendo de solo exposto, o ponto não era considerado como RQ.
O quadro 4 apresenta os resultados das classificações na imagem, no campo e no mapa semidetalhado, para fins comparativos. Na área onde a maior ocorrência era de RQ, foram avaliados 136 locais. Destes, 91,2 % foram identificados como RQ no campo. Os mesmos locais, identificados por georreferenciamento no mapa semidetalhado da região, indicaram também todos como RQ. Nesse caso, o mapa semidetalhado obteve 100 % de acerto com o que foi visto no campo. Dentro da unidade de mapeamento tipo associação, identificada como PV + Li no mapa, foram identificados 8,8 % de PV no campo, também concordando com as informações do mapa. Na área de ocorrência de Podzólicos também houve concordância entre o campo e o mapa. A única diferença é que o campo indica a avaliação pontual e o mapa uma unidade de mapeamento. No caso da área dos LR, porém, 5,3 % das amostragens indicaram ocorrência de PV no campo, sendo LR no mapa. Esses "erros" são inerentes ao detalhamento do mapa.
Posteriormente, foi avaliada a classificação por imagens de satélite com o mapa semidetalhado (Quadro 4). Observou-se que 56,6 % dos pixels classificados como RQ estavam dentro da unidade de mapeamento RQ do mapa, havendo, portanto, coincidência. Entretanto, 34,6 % das amostragens foram identificadas como PV pela imagem, sendo RQ no mapa. Nesse caso, as checagens de campo é que tiraram a dúvida, demonstrando ser RQ. Apesar disso, 8,8 % dos Podzólicos foram coincidentes entre campo e imagem. A confusão da classificação pela imagem é explicada por referir a leitura espectral à camada superficial e, no caso, são PV arenosos. A imagem não tem como avaliar o horizonte B diagnóstico, demonstrando sua limitação. Na área de predominância de PV, houve 70,8 % de coincidência entre a classificação das imagens e no campo. Na área-teste com predominância de LR 85,0 % das amostragens foram coincidentes entre campo e imagem.
CONCLUSÕES
1. Os solos estudados podem ser caracterizados e discriminados pelo sensoriamento remoto espectral em laboratório e em nível orbital.
2. Os elementos estruturais que mais influenciaram o comportamento espectral dos solos foram: argila, Fe, Al2O3, TiO2, MnO e areia.
3. Os dados espectrais de laboratório foram mais eficientes no diagnóstico das interações entre os atributos dos solos e a reflectância. Além disso, estes dados foram fundamentais como base metodológica para o reconhecimento do nível orbital.
4. O método proposto indica que podem-se ser utilizados dados orbitais no reconhecimento de solos nos níveis: pontual (local específico no campo) e espacial (unidade de mapeamento) com até 85% de confiabilidade. Esta técnica pode auxiliar, portanto, em mapeamentos de solos, principalmente no nível semidetalhado.
AGRADECIMENTOS
À Fundação de Amparo à Pesquisa, do estado de São Paulo, pela aquisição do espectrorradiômetro IRIS (proc. n. 95/6259-6), e ao Conselho Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento, pela bolsa de pesquisador do primeiro autor.
LITERATURA CITADA
Recebido para publicação em setembro de 2003 e aprovado em agosto de 2004
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
04 Fev 2005 -
Data do Fascículo
Out 2004
Histórico
-
Aceito
Ago 2004 -
Recebido
Set 2003