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Produtividade e aspectos nutricionais de plantas de soja cultivadas em solos de cerrado com diferentes texturas

Yield and nutritional aspects of soybean grown in cerrado soils with different textures

Resumos

Nos últimos anos, o cultivo da soja teve grande expansão em áreas com texturas mais arenosas do Cerrado. Esse fato gerou questionamentos quanto à sustentabilidade e viabilidade técnica, econômica e ambiental da produção dessa cultura. Adicionalmente, esperam-se diferenças no potencial produtivo e na dinâmica de nutrientes em solo e planta com a variação da textura do solo. Este estudo objetivou avaliar a produtividade e os aspectos nutricionais de plantas de soja cultivadas em solos de Cerrado com diferentes texturas. Foram utilizados dois bancos de dados com informações de plantas de soja e solos com diferentes teores de argila (valores entre 30 e 840 g kg-1). Por meio de plotagem dos dados em gráficos e ajustes de equações de regressão, foram gerados relacionamentos da produtividade com a textura, histórico de uso e, em alguns casos, separando-se os efeitos por classes texturais: arenosa, média, argilosa e muito argilosa, além dos teores foliares de nutrientes com a textura e a produtividade. A produtividade de soja mostrou tendência de aumento com o teor de argila. Separando-se os bancos de dados por classes texturais, a mesma tendência foi verificada apenas nas classes arenosa e argilosa. Nas classes média e muito argilosa houve tendência de queda da produtividade com o aumento do teor de argila. Os nutrientes tiveram relacionamentos variados com a textura e produtividade da soja, merecendo destaque os teores foliares de P e S, que apresentaram aumento com os teores de argila até valores de 227 e 426 g kg-1, respectivamente, para posterior decréscimo. Potássio, Ca e Mg se relacionaram positiva e significativamente com teor de argila e produtividade da soja, mostrando limitação, principalmente de K+ e Ca2+, no solo para a soja cultivada em solos mais arenosos. Quanto aos micronutrientes, não houve limitação à produtividade, com exceção do B. Pode-se considerar que a produtividade de soja independe da textura do solo; condições climáticas e manejo adequado do solo parecem ser os principais fatores determinantes das respostas da cultura. Em solos arenosos, deve ser dispensada maior atenção ao manejo da adubação com K, Ca e B, que foram os elementos mais limitantes à produtividade da soja.

fertilidade do solo; nutrição mineral; teor de argila do solo


In the recent years soybean cultivation has expanded largely in areas with sandier textures in the Cerrado. This has raised questions as to the sustainability and technical, economic and environmental viability of soybean production in these soils. Moreover, differences in the yield potential and nutrient dynamics in soil and plants are expected along a variation of soil texture. This study aimed to evaluate yield and nutritional aspects of soybean plants grown in Cerrado soils with different textures. Two databanks with information on soybean plants and soils with different clay contents (values between 30 and 840 g kg-1) were used. The data were plotted and adjusted regression equation were used to establish relationships between yield and soil texture and, in some cases the effect was evaluated within separate soil texture classes: sandy, sandy-loam, clayey and very clayey, aside from the leaf nutrient contents with texture and yield. Soybean yield tended to increase with the clay content. In the separate texture classes, the same trend was verified in the sandy and clayey classes only. In the sandy-loam and very clayey classes, yields tended to decrease when the soils had higher clay contents. The nutrient-soil texture and nutrient-soybean yield relationships were varied. Interestingly, the P and S leaf contents increased with clay contents to values of 227 and 426 g kg-1, respectively, and decreased thereafter. Potassium, Ca and Mg were positively and significantly related with clay content and soybean yield, whereas soil K+ and Ca2+ was limited for soybean grown in sandier soils. The micronutrients, aside from B, were not yield-limiting. Soybean yield is independent of the soil texture; climatic conditions and adequate soil management seem to be the main determinant factors of the crop responses. In sandy soils more attention should be paid to the fertilization management with K, Ca and B, wich were the most limiting elements for soybean yield.

soil fertility; mineral nutrition; soil clay content


SEÇÃO IV - FERTILIDADE DO SOLO E NUTRIÇÃO DE PLANTAS

Produtividade e aspectos nutricionais de plantas de soja cultivadas em solos de cerrado com diferentes texturas1 1 Parte da Tese de Doutorado da primeira autora apresentada à Universidade Federal de Viçosa - UFV.

Yield and nutritional aspects of soybean grown in cerrado soils with different textures

Flávia Cristina dos SantosI; Roberto Ferreira NovaisII; Júlio César Lima NevesII; José Marcos FoloniIII; Manoel Ricardo de Albuquerque FilhoIV; João Carlos KerII

IPesquisadora da Embrapa Cerrados. CPAC, CEP 73310-970 Planaltina (DF). E-mail: flavia@cpac.embrapa.br

IIProfessor do Departamento de Solos, Universidade Federal de Viçosa - UFV. Av. PH Rolfs s/n, CEP 36570-000 Viçosa (MG). E-mail: rfnovais@ufv.br; julio@ufv.br; jcker@ufv.br

IIIDoutorando do Departamento de Solos, UFV. E-mail: jmfoloni@terra.com.br

IVPesquisador da Embrapa Cerrados. E-mail: mricardo@cpac.embrapa.br

RESUMO

Nos últimos anos, o cultivo da soja teve grande expansão em áreas com texturas mais arenosas do Cerrado. Esse fato gerou questionamentos quanto à sustentabilidade e viabilidade técnica, econômica e ambiental da produção dessa cultura. Adicionalmente, esperam-se diferenças no potencial produtivo e na dinâmica de nutrientes em solo e planta com a variação da textura do solo. Este estudo objetivou avaliar a produtividade e os aspectos nutricionais de plantas de soja cultivadas em solos de Cerrado com diferentes texturas. Foram utilizados dois bancos de dados com informações de plantas de soja e solos com diferentes teores de argila (valores entre 30 e 840 g kg-1). Por meio de plotagem dos dados em gráficos e ajustes de equações de regressão, foram gerados relacionamentos da produtividade com a textura, histórico de uso e, em alguns casos, separando-se os efeitos por classes texturais: arenosa, média, argilosa e muito argilosa, além dos teores foliares de nutrientes com a textura e a produtividade. A produtividade de soja mostrou tendência de aumento com o teor de argila. Separando-se os bancos de dados por classes texturais, a mesma tendência foi verificada apenas nas classes arenosa e argilosa. Nas classes média e muito argilosa houve tendência de queda da produtividade com o aumento do teor de argila. Os nutrientes tiveram relacionamentos variados com a textura e produtividade da soja, merecendo destaque os teores foliares de P e S, que apresentaram aumento com os teores de argila até valores de 227 e 426 g kg-1, respectivamente, para posterior decréscimo. Potássio, Ca e Mg se relacionaram positiva e significativamente com teor de argila e produtividade da soja, mostrando limitação, principalmente de K+ e Ca2+, no solo para a soja cultivada em solos mais arenosos. Quanto aos micronutrientes, não houve limitação à produtividade, com exceção do B. Pode-se considerar que a produtividade de soja independe da textura do solo; condições climáticas e manejo adequado do solo parecem ser os principais fatores determinantes das respostas da cultura. Em solos arenosos, deve ser dispensada maior atenção ao manejo da adubação com K, Ca e B, que foram os elementos mais limitantes à produtividade da soja.

Termos de indexação: fertilidade do solo, nutrição mineral, teor de argila do solo.

SUMMARY

In the recent years soybean cultivation has expanded largely in areas with sandier textures in the Cerrado. This has raised questions as to the sustainability and technical, economic and environmental viability of soybean production in these soils. Moreover, differences in the yield potential and nutrient dynamics in soil and plants are expected along a variation of soil texture. This study aimed to evaluate yield and nutritional aspects of soybean plants grown in Cerrado soils with different textures. Two databanks with information on soybean plants and soils with different clay contents (values between 30 and 840 g kg-1) were used. The data were plotted and adjusted regression equation were used to establish relationships between yield and soil texture and, in some cases the effect was evaluated within separate soil texture classes: sandy, sandy-loam, clayey and very clayey, aside from the leaf nutrient contents with texture and yield. Soybean yield tended to increase with the clay content. In the separate texture classes, the same trend was verified in the sandy and clayey classes only. In the sandy-loam and very clayey classes, yields tended to decrease when the soils had higher clay contents. The nutrient-soil texture and nutrient-soybean yield relationships were varied. Interestingly, the P and S leaf contents increased with clay contents to values of 227 and 426 g kg-1, respectively, and decreased thereafter. Potassium, Ca and Mg were positively and significantly related with clay content and soybean yield, whereas soil K+ and Ca2+ was limited for soybean grown in sandier soils. The micronutrients, aside from B, were not yield-limiting. Soybean yield is independent of the soil texture; climatic conditions and adequate soil management seem to be the main determinant factors of the crop responses. In sandy soils more attention should be paid to the fertilization management with K, Ca and B, wich were the most limiting elements for soybean yield.

Index terms: soil fertility, mineral nutrition, soil clay content.

INTRODUÇÃO

O avanço do plantio de soja em solos mais arenosos do Cerrado delineou novas demandas de pesquisas em solos e nutrição de plantas, dado o cultivo tradicional dessa cultura em solos de texturas mais argilosas.

A textura é um dos principais indicadores da qualidade e produtividade dos solos (Cox & Lins, 1984; Wang et al., 2005), não obstante também a importância dos atributos biológicos, químicos e físicos (Roming et al., 1995; Sanchez et al., 2003).

O paradigma ainda vigente é de que a terra é dita "produtiva" quando o solo é de textura argilosa. Entretanto, constatação comum entre os sojicultores é a obtenção de produtividades semelhantes ou até maiores em solos de Cerrado de textura média e arenosa, comparativamente aos argilosos. Como a soja é uma cultura amplamente difundida em diferentes condições de clima, solo e latitude no Brasil, existem diversas informações disponíveis em bancos de dados gerados por pesquisas e consultorias agronômicas que podem ser mais bem sistematizadas e trabalhadas para auxiliar a análise e compreensão das questões envolvidas com a produtividade e os aspectos de solo e planta. Como exemplo, Lima (2004), utilizando dados de 293 talhões com cultivo de soja comercial em Campo Novo do Parecis-MT, divididos em solos de textura argilosa e arenosa média, evidenciou a sustentabilidade da produção da cultura sob agricultura intensiva. A produtividade média de soja elevou-se, ao longo de cerca de 10 anos de cultivo, de 3,1 e de 2,6 t ha-1 para os patamares de 3,5 e de 3,3 t ha-1 nos solos argilosos e de textura arenosa média, respectivamente, fato que também evidencia a maior resposta da cultura, em solos arenosos, às técnicas empregadas no processo produtivo. Novais (1996) ressalta a importância de pesquisas dessa natureza, em que se tem a possibilidade de observar as grandes tendências em substituição aos estudos de caso.

O acúmulo de nutrientes na planta também tem influência da textura do solo, principalmente para P, S e Zn. Diversos trabalhos de pesquisa têm mostrado que em solos mais intemperizados, com maior poder-tampão de P (PTP) e teores semelhantes de P-lábil, ocorrem menores concentrações de P, S e Zn na solução, resultando em diminuição na taxa de absorção desses nutrientes pelas plantas (Holford & Mattingly, 1979; Muniz et al., 1985; Couto et al., 1992; Mello et al., 1993; Silva et al., 1998). Em conseqüência disso, o nível crítico foliar deverá ser menor e a eficiência de utilização maior em solos com maior poder-tampão. Bedin et al. (2003) encontraram menores teores de P nas folhas e nos grãos de soja, variedade Conquista, cultivada em casa de vegetação, em solo argiloso (530 g kg-1 de argila), e maiores em solo arenoso (50 g kg-1 de argila) e de textura média (150 g kg-1 de argila). Essa constatação confirma a tendência geral do comportamento vegetal em solos com diferentes PTP (Muniz et al., 1985; Probert & Moody, 1998). Por essa razão, recomenda-se que os níveis críticos de P, S e Zn na planta sejam definidos como uma variável do poder-tampão do solo, como, por exemplo, a textura do solo.

Diante disso, objetivou-se com este trabalho avaliar a produtividade e os aspectos nutricionais da soja cultivada em solos de Cerrado com diferentes texturas.

MATERIAL E MÉTODOS

Este estudo foi desenvolvido utilizando dois bancos de dados de lavouras comerciais de soja dos Estados do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, que continham informações de análises física (textura) e químicas de solos e teores foliares de nutrientes. Buscou-se abranger lavouras cultivadas em solos com as mais diversas texturas, obtendo-se intervalo de argila entre 30 e 840 g kg-1. Cabe ressaltar que a textura do solo envolve a proporção relativa das partículas de areia, silte e argila. Em razão do uso mais rotineiro do teor de argila para representar a textura do solo, foram utilizados seus teores para os relacionamentos testados neste trabalho.

Com esses dados, foram relacionados a produtividade e os aspectos nutricionais da soja com a textura do solo. Os relacionamentos entre essas variáveis foram feitos por meio de plotagem dos dados em gráficos e ajustes de equações de regressão, utilizando o programa estatístico SAEG 9.1. A significância estatística utilizada foi: parênteses com o valor da significância do coeficiente, quando esta era acima de 10 %; e 0, *, **, *** para os níveis de significância a 10, 5, 1 e 0,1 %, respectivamente.

Composição do banco de dados

Os bancos de dados utilizados neste trabalho foram:

Banco A: Maeda (2002), referente a lavouras comerciais de soja da região de Dourados, Mato Grosso do Sul, na safra 2000-01. Este banco de dados contém informações sobre análises físicas e químicas de solos (Quadro 1), teores foliares e produtividades de soja de 87 talhões situados em 46 fazendas. Abrange teores de argila de 80 a 840 g kg-1.


Banco B: Eng. Agrônomo M.Sc. José Marcos Foloni (dados não publicados), referente a lavouras comerciais de soja localizadas nos municípios de Camapuã, Mato Grosso do Sul; Campo Verde, Nova Maringá, Santo Antônio do Leste, Tangará da Serra, Estado do Mato Grosso; nas safras 1998-99 a 2005-06. As informações contidas neste banco de dados são de análises física e químicas e de solos (57 talhões) (Quadro 2), teores foliares e produtividades de soja (84 talhões) de cinco fazendas, em alguns casos com histórico de uso dos solos. Algumas informações desse banco de dados não contemplam todas as safras do intervalo 1998-99 a 2005-06. Abrange teores de argila de 30 a 600 g kg-1.


A pluviosidade do município de Dourados-MS, na safra 2000-01, foi de 1.478 mm; as médias de pluviosidade, das safras 98-99 a 04-05, dos municípios de Camapuã-MS, Campo Verde-MT, Nova Maringá-MT, Santo Antônio do Leste-MT e Tangará da Serra-MT foram, respectivamente, de 1.787, 1.974, 1.566, 1.412 e 1.662 mm.

Textura do solo e produtividade da soja

Para relacionar textura do solo e produtividade da soja, foram utilizados os bancos de dados A (87 talhões, localizados em 46 fazendas na região de Dourados, safra 2000-01) e B (84 talhões, localizados em cinco fazendas nos municípios de Camapuã, Campo Verde, Nova Maringá, Santo Antônio do Leste e Tangará da Serra, safras 1998-99 a 2005-06). Como nem todos os talhões dispunham dos valores de produtividade em todas as safras, calcularam-se as médias das produtividades para a média de anos. Com esses valores, os dados de teor de argila e produtividade da soja foram relacionados por meio de procedimentos estatísticos de regressões, utilizando o programa SAEG 9.1. Essa relação foi estabelecida considerando toda a amplitude dos dados (171 talhões com argila entre 30 e 840 g kg-1) e por classe textural: arenosa (< 150 g kg-1 de argila, 28 talhões), média (151 a 350 g kg-1 de argila, 44 talhões), argilosa (351 a 600 g kg-1 de argila, 50 talhões) e muito argilosa (> 600 g kg-1 de argila, 49 talhões).

Avaliou-se, ainda, a relação entre textura e produtividade de soja com o histórico de uso do solo (anos 1, 3 e 5), utilizando parte dos dados do banco B (56 talhões para o ano 1, 30 para o ano 3 e 22 para o ano 5), com informações das lavouras localizadas nos municípios de Nova Maringá, Santo Antônio do Leste e Tangará da Serra. Para isso, foi considerado como ano 1 o primeiro ano em que se iniciou a assessoria técnica do responsável pelos dados, Eng. Agrônomo José Marcos Foloni. Dessa forma, em alguns casos, o ano 1 refere-se ao primeiro ano de cultivo com soja, e assim sucessivamente. Em geral, para as áreas arenosas, o ano 1 coincide com o primeiro ano de cultivo, pois estas áreas vêm sendo incorporadas recentemente ao plantio de soja, comumente sucedendo o Cerrado ou pasto. Nas áreas argilosas não ocorre essa coincidência, pois essas são as áreas mais velhas das fazendas, com mais de 10 anos de plantio de soja. Essa ressalva é válida para todos os relacionamentos testados neste trabalho que envolvem o histórico de uso. Infelizmente, a não-disponibilidade de informações do histórico de uso das áreas antes dessa assessoria não permite análise mais refinada.

Textura do solo e teor de nutrientes na planta

Para a relação entre textura e teor de nutrientes na planta de soja foi utilizado o banco de dados A (87 talhões, localizados em 46 fazendas na região de Dourados, safra 2000-01) e parte do B (48 talhões, localizados em três fazendas nos municípios de Camapuã, Campo Verde e Santo Antônio do Leste, safras 1998-99 a 2005-06), pois não se dispunha de dados dos teores foliares para todos os talhões de soja.

Os teores foliares de N, P, K, Ca, Mg, S, Zn, Cu, Fe, Mn e B foram relacionados com a textura e com a produtividade de soja por meio de equações de regressões geradas pelo programa estatístico SAEG 9.1.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Condições climáticas variadas, diferentes classes de solos, variedades de soja, histórico de uso do solo, entre outros, interferem em vários relacionamentos testados, o que pode ser minimizado quando se tem número considerável de observações, levando-se à visualização clara de tendências gerais. A estatística utilizada nesses casos busca prever essas tendências; por isso, mesmo com alguns coeficientes de determinação baixos, embora significativos, as equações são apresentadas para viabilizar a discussão e o entendimento das tendências dos relacionamentos testados.

Textura do solo e produtividade da soja

A relação entre textura do solo e produtividade de culturas é contemplada em diversos trabalhos de pesquisa (Miranda & Volkweiss, 1981; van Laar, 1981; Gerhardt et al., 2001; Bedin et al., 2003), que ressaltam a elevada correlação dessa característica física do solo com a produtividade e sua importância para a avaliação da qualidade da terra para uso agrícola.

Quanto à relação entre produtividade e teor de argila, verificou-se relacionamento expresso por modelo potencial entre essas duas variáveis (Figura 1), o que mostra aumento da produtividade com os incrementos iniciais do teor de argila (até cerca de 150 g kg-1). É curioso notar a grande dispersão para produtividade de soja em solos mais argilosos (acima de 500 g kg-1 de argila), com maior tamponamento químico, de modo geral. Separando esses dados por classes texturais, notou-se que a relação entre produtividade da soja e teor de argila foi positiva para os solos arenosos (Figura 2a). Esse fato já era esperado, pois nessa classe textural (< 150 g kg-1 de argila) o incremento no teor de argila é favorável ao maior acúmulo de água no solo e menor disponibilidade natural de nutrientes em geral.



Ressalta-se a elevada produtividade média de soja nos solos arenosos (51,5 s ha-1), bem como alguns valores elevados de produtividade obtidos nesses solos, muitas vezes já no primeiro ano de cultivo. A exemplo, existem produtividades de mais de 70 s ha-1, evidenciando o potencial produtivo de solos arenosos semelhante ou mesmo, em alguns casos, superior ao de solos mais argilosos. Essas constatações levam a repensar a necessidade de revisão da classe de aptidão desses solos, 5 (n) - aptidão restrita para pastagem natural, segundo Spera et al. (1999), desde que seja adotado um conjunto de práticas de manejo adequadas, principalmente relacionadas à obtenção de boa cobertura vegetal do solo. Reforça essa idéia o fato de que grande parte das áreas arenosas que vêm sendo incorporadas ao cultivo de soja é de pastagens degradadas, não implicando aberturas de novas áreas.

A equação gerada para a classe textural arenosa mostrou que um incremento de 10 g kg-1 no teor de argila do solo aumentou a produtividade de soja em 1,3 s ha-1 (Figura 2a).

Entretanto, para a classe textural média (151 a 350 g kg-1 de argila) (Figura 2b), a relação entre produtividade e teor de argila foi negativa. Pode-se inferir que, com aumento de argila a partir de 150 g kg-1, já há maior expressão dos efeitos negativos da argila, principalmente relacionados à dinâmica de P no solo (Novais & Smyth, 1999). Entretanto, observaram-se valores elevados para o limite inferior da classe (63,3 s ha-1), evidenciando o elevado potencial produtivo desses solos (média de 61,6 s ha-1 de soja).

Na classe textural média, o incremento em 10 g kg-1 no teor de argila acarretou uma tendência de decréscimo de 0,15 s ha-1 de soja (significativo apenas a 30 %); ainda que negativo, o efeito do aumento do teor de argila foi pequeno, pois nessa classe textural consegue-se ter um equilíbrio entre os efeitos benéficos e danosos da argila, ou seja, a maior fixação de P, Zn, entre outros nutrientes, é compensada pelo melhor acúmulo e disponibilidade de água no solo. Pode-se dizer que não há variação em produtividade com a textura para essa classe textural.

Para os dados de textura argilosa (Figura 2c), observou-se relação positiva e significativa (p < 0,05) entre a produtividade de soja e o teor de argila. Esperava-se relação inversa, pelos efeitos negativos do maior teor de argila em relação à maior adsorção de P, S e Zn e menor transporte destes nutrientes no solo (Holford & Mattingly, 1979; Muniz et al., 1985; Ruiz et al., 1990; Couto et al., 1992; Mello et al., 1993; Villani et al., 1993; Alvarez V., 1996; Silva et al., 1998; Novais & Smyth, 1999), o que limitaria a produtividade. Entretanto, essa relação positiva pode ter sido favorecida pelos valores elevados de produtividade (acima de 75 s ha-1) na faixa de 500 a 550 g kg-1 de argila, áreas estas com mais de 10 anos de histórico de uso e fertilidade do solo corrigida para uso agrícola.

Quando se considera a classe textural muito argilosa (acima de 600 g kg-1 de argila) (Figura 2d), a relação entre produtividade de soja e teor de argila voltou a ser negativa (embora significativa apenas a 20 %), com decréscimo de 0,22 s ha-1 de soja com o aumento de 10 g kg-1 no teor de argila.

Novais (1996) enfatiza o fato de solos arenosos, ou mesmo de textura média, poderem ser mais produtivos que os argilosos. Esse autor argumenta que, assim como os solos mais argilosos, mais tamponados, resistiriam mais às perdas de suas reservas de nutrientes, eles também resistiriam mais aos ganhos. Nos argilosos, há forte predomínio do dreno-solo sobre o dreno-planta pelo que se adiciona como fertilizante e corretivo, enquanto nos solos mais arenosos o dreno-planta é predominante. A difusão de P em solos mais arenosos também é facilitada (Villani et al., 1993) e a formação de formas não-lábeis de P é menor (Gonçalves et al., 1989). Isso resultaria no elevado potencial produtivo dos solos mais arenosos, principalmente com adoção de alta tecnologia, quando não houver limitação por água. Neste trabalho, em que as condições de clima foram favoráveis, ficou evidente o elevado potencial produtivo dos solos arenosos.

É pertinente destacar que em solos arenosos o fator risco está mais associado à atividade agrícola. As margens para erros no manejo do solo e planta são menores e, em se fazendo tecnicamente tudo certo, se houver déficit hídrico, o rendimento será mais prejudicado que nos solos argilosos. Dessa forma, é importante conhecer o histórico de pluviosidade local, de distribuição das chuvas, bem como o potencial de evapotranspiração, para avaliar a relação entre essas duas variáveis: produtividade e textura.

Além disso, em solos arenosos a proporção de areia fina na fração areia deve ser elevada (acima de 80 % como valor de referência, relatado por agrônomos consultores das regiões produtoras do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul). Há ainda que se considerar que, na classe dos Neossolos Quartzarênicos, teores de argila de 60 a 80 g kg-1 e de 130 a 150 g kg-1, por exemplo, resultarão em dinâmica de água e nutrientes, assim como condições de crescimento e desenvolvimento das plantas, bem distintas. Isso indica que o refinamento no manejo do solo e planta deve aumentar à medida que o teor de argila diminuir.

O histórico de uso do solo é de grande importância para se entender melhor a relação entre textura e produtividade de soja, bem como a interação dessas variáveis com as informações climáticas, sobretudo a pluviosidade. Observaram-se maiores ganhos em produtividade com o aumento do teor de argila no ano 1 (Figura 3). No ano 3, pode-se considerar que não houve influência da argila na produtividade de soja (Figura 3), enquanto no ano 5 a produtividade aumentou com até 370 g kg-1 de argila (ponto de máximo da equação) e decresceu a partir desse valor. Esses comportamentos apontam para a possibilidade de maior resposta em produtividade às técnicas aplicadas para solos com menor poder-tampão, ou seja, solos mais arenosos. Esse fato é bem relatado por agrônomos consultores do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul e pode ser, em parte, explicado pela perda de estrutura dos solos mais argilosos, de baixa reversibilidade, com os anos de cultivo, resultando em aumento de sua densidade e redução na porosidade total e macroporosidade (Chagas, 2004). Essas modificações acarretam menor armazenamento de água, alterações nas trocas gasosas no solo, dinâmica de nutrientes, entre outros. Observa-se também que o salto em produtividade do ano 1 para o 3 foi maior nas áreas mais arenosas, em relação às argilosas (Figura 3), evidenciando seu maior tamponamento.


Verificou-se que as fazendas localizadas em Nova Maringá, Santo Antônio do Leste e Tangará da Serra tiveram pluviosidade média de 1.566, 1.412 e 1.662 mm anuais, respectivamente, nas últimas sete safras. Esses valores, que podem ser considerados satisfatórios para a cultura da soja, favorecem a menor influência do clima na variação de produtividade e possibilitam a maior influência de outros fatores, como, por exemplo, da textura dos solos.

Textura do solo e teor de nutrientes na planta

Embora os dados plotados dessas variáveis fossem observações de lavouras comerciais de soja, nas mais diversas condições de solo e clima, pôde-se perceber as tendências gerais. Observou-se relação linear e negativa entre os teores de N e Cu na planta e os teores de argila (Figuras 4a e 5b, respectivamente). Para K, Ca e Mg a relação foi linear, mas positiva (Figura 4c, d, e, respectivamente). Para P, S, Fe e B a relação foi quadrática e positiva, com ponto de máximo (Figuras 4b, f e 5c, e, respectivamente). Para Zn e Mn a relação foi quadrática e negativa, com ponto de mínimo (Figura 5a, d, respectivamente).



Para soja, o N na planta é praticamente todo proveniente da fixação simbiótica. Segundo Hungria et al. (1997), nas condições brasileiras de cultivo, a fixação biológica de N2 representa, em média, 75 % do N total acumulado pela planta, podendo atingir valores da ordem de 97 %; o restante é proveniente do solo. Dessa forma, esse nutriente não é limitante à planta, notando-se diminuição em seus teores foliares com o aumento do teor de argila e com a produtividade (Figura 4a). A relação inversa do teor foliar de N e produtividade pode indicar efeito de diluição ou mesmo que plantas mais produtivas são mais eficientes na utilização desse nutriente (Fageria et al., 1999).

Diversos trabalhos (Holford & Mattingly, 1979; Muniz et al., 1985; Couto et al., 1992; Mello et al., 1993; Alvarez V., 1996; Silva et al., 1998; Bedin et al., 2003) relatam a relação inversa do P, S e Zn com o poder-tampão do solo, que pode ser medido pelo teor de argila. Em condições de menor tampão, como as de solos mais arenosos, a passagem do P, S e Zn para a solução é facilitada, o que permite maior absorção desses elementos pelas plantas, gerando maiores teores foliares. Os dados apresentados neste estudo para todos os teores de argila mostraram que para P e S esse comportamento ocorreu a partir de 227 e 426 g kg-1 de argila, respectivamente (Figura 4b, f). Em menores teores de argila, a fixação desses nutrientes ainda é pequena, o que pode resultar em aumento nos teores com o aumento do teor de argila, que condiciona maior acúmulo de água e, por conseguinte, maior transporte. O fato de se encontrar na literatura citação apenas da relação inversa entre essas duas variáveis passa pela questão de que a maioria dos trabalhos realizados contempla texturas argilosas a muito argilosas e, em algumas situações, texturas médias. Para Zn, o teor foliar decresceu até 466 g kg-1 de argila para, a partir desse valor, aumentar (Figura 5a). Solos mais arenosos possuem, naturalmente, menores teores totais e disponíveis de Zn (Abreu et al., 2001). Os teores mais elevados de Zn foliar nos solos com teores de argila menores do que 150 g kg-1 (Figura 5a) refletem as adubações elevadas que vêm sendo utilizadas nos solos arenosos. Com aumento do teor de argila, a maior absorção de Zn pode ter sido favorecida pela maior riqueza natural deste nutriente no solo, de forma a compensar, parcialmente, o efeito do maior poder-tampão do solo e da menor difusão.

Portanto, percebe-se que plantas cultivadas em solos argilosos são mais eficientes no uso do P, S e Zn, ou mais "econômicas" (Figuras 4b,f e 5a).

Pesquisas desenvolvidas por Santos (2002) e Kurihara (2004) com a cultura da soja mostram a importância de se considerar a classe textural para a diagnose do estado nutricional das plantas, o que permite análises com maior acurácia. O que se encontra na literatura são índices ou valores médios de teores de nutrientes na planta, sem qualquer consideração para a textura do solo, o que pode gerar interpretações errôneas, principalmente para P, S e Zn, sensíveis ao poder-tampão do solo.

Merece destaque a correlação positiva e significativa dos teores foliares de K, Ca e Mg com o teor de argila (r = 0,39*** para K e Ca e r = 0,30*** para Mg) e dos teores foliares de K e Ca com a produtividade (r = 0,39*** e r = 0,44***, respectivamente). Isso indica que há necessidade de maiores teores foliares para as produtividades mais elevadas e que esses teores são mais facilmente obtidos em solos mais argilosos. No caso do Ca, pela correlação de seu teor foliar com o teor de argila e a produtividade (r = 0,39*** e r = 0,44***, respectivamente), pode-se supor que sejam necessários mais altos teores deste nutriente no solo para satisfazer a demanda da planta. A recuperação do Ca do solo pela planta está em torno de 50 % (Santos, 2002), valor relativamente baixo. Isso pode ter relação com as elevadas doses de calcário que vêm sendo utilizadas em solos mais arenosos (Santos, 2006).

As relações dos teores foliares de micronutrientes com teor de argila e produtividade de soja foram, em sua maioria, inversas, à exceção do B (Figura 5a,e). Isso sugere que esses nutrientes não são limitantes à produtividade e que não haveria justificativa para preocupações maiores, como tem ocorrido. Os elevados teores de Zn, Cu e Mn nos solos com menores teores de argila e nas mais baixas produtividades de soja (Figura 5a,b,d) podem indicar toxidez na planta, devido ao excesso de adubações com esses micronutrientes. Solos arenosos são, naturalmente, mais pobres em micronutrientes (Abreu et al., 2007). Além da pobreza química dos materiais desses solos mais grosseiros, os baixos valores de CTC e teores de MO (Quadros 1 e 2) proporcionam menor retenção desses elementos no solo (Abreu et al., 2001; Borkert et al., 2001). Dessa forma, os elevados teores foliares em condições de teores mais baixos de argila estão relacionados a teores médios a altos de micronutrientes no solo (Quadros 1 e 2), devido ao baixo poder-tampão deste, principalmente para Zn, e às adubações com doses elevadas que vêm sendo realizadas nas áreas de solos mais arenosos do Cerrado. Esse manejo é realizado, possivelmente, para compensar o efeito da diminuição da disponibilidade desses micronutrientes em decorrência da elevação do pH do solo, pela aplicação comum de doses impropriamente muito elevadas de calcário nessas condições.

O relacionamento do teor de B com a textura do solo e a produtividade da soja foi diferente dos demais, com aumento dos teores foliares até 540 g kg-1 de argila e 67,6 s ha-1 de soja, respectivamente, para posteriores decréscimos (Figura 5e). Assim, os dados deste trabalho mostraram que esse micronutriente se apresenta como o limitante mais provável para a produtividade da soja. Solos mais arenosos são, de modo geral, mais pobres nesse micronutriente do que os argilosos. Com o aumento do teor de argila, há maior adsorção deste ânion aos silicatos e óxidos de Fe e Al (Fontes et al., 2001). Além disso, a disponibilidade de B aumenta com o pH, até valores próximos a 6,5, para, a partir daí, diminuir pela precipitação com carbonatos. Assim, o pH mais alto nos solos arenosos (cerca de 7,0), como tem sido observado em áreas cultivadas, em conseqüência das doses elevadas de calcário, deve ocasionar precipitação do B, e o manejo da adubação nesses solos não deve estar adequado, pois os outros micronutrientes, que têm suas disponibilidades mais alteradas pelo pH do solo do que o B, não são limitantes, possivelmente pelo maior favorecimento do efeito de acidificação da rizosfera (Marschner, 1995).

CONCLUSÕES

1. O cultivo da soja em solos arenosos apresenta potencial produtivo equivalente ou até mesmo superior ao dos solos argilosos, desde que adotado manejo nutricional adequado.

2. A sustentabilidade da produção de soja é pouco dependente da textura do solo, sendo os principais determinantes desse fator as condições climáticas e o manejo.

3. Os nutrientes mais limitantes à produtividade de soja foram o K, Ca e B, principalmente em solos arenosos.

LITERATURA CITADA

Recebido para publicação em novembro de 2007 e aprovado em junho de 2008.

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  • 1
    Parte da Tese de Doutorado da primeira autora apresentada à Universidade Federal de Viçosa - UFV.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      13 Jan 2009
    • Data do Fascículo
      Out 2008

    Histórico

    • Aceito
      Jun 2008
    • Recebido
      Nov 2007
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