Open-access Processamento de imagens RapidEye no mapeamento de uso do solo em ambiente de Mar de Morros

RapidEye image processing for soil use mapping in rugged landscape

Resumo

O objetivo deste trabalho foi analisar características de imagem do satélite RapidEye, bem como avaliar sua qualidade, quanto à ortorretificação, e sua aplicação no mapeamento de uso do solo, em ambiente de Mar de Morros. As imagens passaram por correção atmosférica, seguida por avaliação dos seguintes aspectos: resposta espectral a diferentes alvos, na imagem sem correção e na corrigida; acurácia da imagem ortorretificada; e exatidão da classificação supervisionada. A correção atmosférica permitiu melhor avaliação da resposta espectral dos alvos. A avaliação da ortorretificação da imagem, quanto ao Padrão de Exatidão Cartográfico, enquadrou-se na classe C da escala 1:20.000. A classificação supervisionada quantificou áreas e percentagem de cada classe de uso de forma consistente. A distribuição das classes evidencia o efeito histórico do uso na degradação das terras.

Termos para indexação: acurácia de imagem; conservação dos solos; correções radiométricas; sensoriamento remoto

Abstract

The objective of this work was to analyse RapidEye satellite image characteristics, as well as to assess its orthorectification geometric accuracy and its application for land use mapping, in a rugged landscape. An atmospheric correction was applied to the images, which was followed by the assessment of the following aspects: spectral response to different targets in the uncorrected and corrected images; accuracy of the orthorectified image; and accuracy of the supervised classification. The atmospheric correction allowed a better evaluation of the spectral response of the targets. The geometrical evaluation according to the Map Accuracy Standards, classified the orthorectified image in class C at the 1:20,000 scale. The supervised classification consistently quantified the areas and the percentage of each soil use class. The distribution of classes highlights the historical effect of the use on land degradation.

Index terms: image accuracy; soil conservation; radiometric corrections; remote sensing

Introdução

Tradicionalmente, os levantamentos de solos no Brasil ocorreram em função do desenvolvimento agrícola e a partir da segunda metade do século passado verifica-se que os mapeamentos ocorreram em regiões específicas onde existiam programas de apoio ao desenvolvimento agrícola (Carvalho et al., 2013). No entanto, recentes avanços tecnológicos na agricultura, bem como a necessidade de conservação e uso eficiente dos recursos naturais, demandam o refinamento nas escalas de mapas de solo e informações sobre uso e cobertura do solo para a interpretação desses levantamentos para diversos fins.

A utilização de tecnologias como o sensoriamento remoto, que incorpora informações espaciais de maior escala, é uma possibilidade para o refinamento de mapas de solos e de uso das terras (Mulder et al., 2011). Os dados de sensoriamento remoto fornecem covariáveis para o mapeamento, aplicadas em Modelos Digitais de Elevação (MDEs) e imagens da superfície (Poggio et al., 2013). Por exemplo, Nield et al. (2007) utilizaram imagens do ETM+ Landsat 7 para mapear dois tipos de solos. A combinação de dados de sensoriamento remoto com dados de perfis de solos é ainda mais promissora, pois permite avaliar características subsuperficiais (Lagacherie et al., 2013).

Nesse contexto, sensores a bordo da constelação de cinco satélites RapidEye têm resoluções espacial, radiométrica, temporal e espectral melhoradas (Antunes et al., 2014), especialmente em relação aos sensores TM e ETM+ dos Landsat 5 e 7, que são os mais utilizados nestes tipos de aplicações. Embora o OLI do Landsat 8 apresente resolução radiométrica e espectral melhoradas, o RapidEye proporciona as melhores resoluções espacial e temporal, além de uma banda na região da borda do vermelho, comumente conhecida como "red edge", propícia para a determinação do estado de saúde fotossintética da vegetação. Essa banda tem sido utilizada com a finalidade de aperfeiçoar o resultado da classificação do uso do solo - em comparação ao uso das bandas multiespectrais (Schuster et al., 2012) -, para a determinação do índice de área foliar em áreas de sistemas agroecológicos, por meio de índices que incluem o "red edge" (Delegido et al., 2013), e para a determinação de nitrogênio em gramíneas (Ramoelo et al., 2012).

Essas características tornam o RapidEye um potencial fornecedor de covariáveis, as quais ajudam no mapeamento digital de solos por inferir a condição dos dosséis de plantas e, dessa forma, predizer variações nas características do solo. Além disso, o Ministério do Meio Ambiente (MMA) adquiriu, recentemente, três coberturas das imagens RapidEye, para todo o Brasil, de 2011 a 2014, e as tornou disponíveis para trabalhos de pesquisa em órgãos públicos do país.

Uma das regiões que mais carece de refinamento, na escala de mapeamento de solos e uso da terra, é o domínio morfoclimático conhecido como "mar de morros", onde a variabilidade espacial dos solos é grande, principalmente em razão do relevo dissecado e geologia complexa (Santos et al., 2010; Fontana et al., 2013, 2014), o que impõe maior dificuldade em obter informações sobre uso e cobertura em escala adequada. O bioma onde ocorre este tipo de domínio é principalmente o da Mata Atlântica, na sub-região biogeográfica conhecida como Floresta de Interior (Tabarelli et al., 2010). Com a pressão pelo uso do solo, apenas 11,7% da Mata Atlântica original é remanescente (Ribeiro et al., 2009).

Apesar de todas as características favoráveis, as imagens RapidEye ainda não foram avaliadas como fornecedoras de covariáveis para o mapeamento dos solos e de uso e cobertura no ambiente de Mar de Morros. Estudos anteriores (Antunes et al., 2014) foram realizados em condições de topografia, solos, material de origem e pressão de uso distintos dos observados na área de estudo (Santos et al., 2010; Fontana et al., 2013, 2014) representativa do ambiente de Mar de Morros.

O objetivo deste trabalho foi analisar características de imagem do satélite RapidEye, bem como avaliar sua qualidade, quanto à ortorretificação, e sua aplicação no mapeamento de uso do solo, em ambiente de Mar de Morros.

Material e Métodos

A área de estudo é a antiga Fazenda São José do Pinheiro, no município de Pinheiral, RJ, na região do Médio Paraíba do Sul, localizada entre as latitudes 22°29'03"S e 22°35'27"S e as longitudes 43°54'49"W e 44°04'05"W. A Fazenda São José do Pinheiro possui 1.462,0 hectares e está situada no terço inferior da microbacia do Ribeirão Cachimbal. Na área de estudo, hoje está instalado o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro (IFRJ), Campus Nilo Peçanha, Pinheiral.

As imagens de satélite foram cedidas pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA) por meio do Contrato MMA n° 30/2012, com a Empresa Santiago & Cintra Consultoria, distribuidora oficial das Imagens RapidEye, e autorização concedida à Embrapa Solos e à UFRRJ. As características das imagens de satélite RapidEye estão na Tabela 1. O produto RapidEye 3A utilizado é uma imagem ortorretificada empregando o MDE do SRTM-3 e pontos de controle derivados do Global Landsat Mosaic (Costa, 2010).

Tabela 1
Características técnicas gerais dos satélites RapidEye.

Para serem utilizadas no mapeamento do meio físico e do solo, em geral, as imagens de satélite devem passar por pré-processamento. As principais correções são as geométricas (georreferenciamento e ortorretificação das imagens) e radiométricas (eliminação de ruídos e correção atmosférica). As imagens RapidEye 3A já são fornecidas ortorretificadas, ou seja, corrigidas dos deslocamentos do relevo. Assim, foi feita a correção atmosférica da imagem e a avaliação da ortorretificação a partir de pontos de verificação obtidos no campo.

Na correção atmosférica, foi usado o modelo de transferência radioativa utilizando o 6S (Second Simulation of Satellite Signal in the Solar Spectrum), adaptado por Antunes et al. (2014) para imagens RapidEye. O modelo calcula a reflectância aparente (no sensor) e corrige para os efeitos da atmosfera, obtendo assim a reflectância da superfície. Nesse modelo, os seguintes parâmetros são necessários na entrada dos dados: i) latitude, longitude, data e hora de coleta da imagem; ii) tipo de modelo de atmosfera gasosa (espalhamento Rayleigh); iii) tipo de modelo de aerossóis (espalhamento Mie); iv) visibilidade horizontal (concentração de aerossóis, em km); e v) banda espectral que se deseja corrigir.

Os parâmetros utilizados como entrada no modelo são apresentados na Tabela 2. A refletância da superfície obtida entre valores de 0 a 1 foi multiplicada por 10.000 para o armazenamento em imagens de 16 bits, de modo a aproveitar melhor a capacidade radiométrica do sensor de 12 bits dentro do espaço de níveis de cinza disponíveis na imagem de 16 bits. As imagens corrigidas (em formato RAW) foram importadas para o Spring 5.2.5 e depois para o formato GeoTIFF, para processamento no ArcGIS 10.0 para a classificação supervisionada da imagem RapidEye. Com a finalidade de comparação foi obtida também a imagem em reflectância aparente (não corrigida para os efeitos da atmosfera) através da equação 1. Em ambas as imagens, corrigida e não corrigida, foram amostrados vários pixels para cada alvo (de 7 a 10 de acordo com o alvo) usando o Spring, quando foram gerados arquivos txt contendo valores da resposta física de cada alvo e respectivas coordenadas dos pontos amostrados, e depois calculada a média desses valores para cada alvo. As médias de reflectância aparente e da superfície foram colocadas em valores de 0 a 1 para confecção dos gráficos em função da banda do sensor para os diferentes alvos.

Tabela 2
Parâmetros de entrada usados no modelo 6S.

Equação 1: ρA = π × Lλ / 100d2 /Esolλ × cos Φ em que: ρA, reflectância aparente; Lλ, radiância espectral na abertura do sensor (nas imagens RapidEye é fornecida multiplicada por 100); π, constante matemática (3,1415); d, distância entre a Terra e o Sol no dia da aquisição da imagem em unidades astronômicas; ESolλ, irradiância solar exoatmosférica perpendicular aos raios solares e na distância média Sol-Terra, para cada banda do sensor RapidEye: Blue, 1997,8 W/(m2µm); Green, 1863,5 W/(m2µm); Red, 1560,4 W/(m2µm); RE, 1395,0 W/(m2µm); NIR, 1124,4 W/(m2µm); θ, ângulo zenital solar (90º- elevação solar).

Como as imagens RapidEye nível 3A já são ortorretificadas, foi avaliada a exatidão cartográfica. Essa etapa é necessária no ambiente de Mar de Morros, uma vez que o relevo acidentado pode conduzir a menor exatidão quando comparada à de áreas planas, como indicam os valores obtidos por Antunes et al. (2014). Para tanto foram coletados, em 3 e 4 de dezembro de 2013, seis pontos de verificação em campo com auxílio de um receptor Global Positioning System (GPS) geodésico L1L2 (marca Ashtech Promark 100) do Instituto de Tecnologia, do Departamento de Engenharia da UFRRJ, cujas coordenadas estão na Tabela 3.

Tabela 3
Pontos de controle coletados na área de estudo em Pinheiral, RJ, e pontos da imagem RapidEye.

A avaliação da exatidão da ortorretificação da imagem, quanto ao posicionamento planimétrico de um ponto ou feição espacial qualquer, foi executada com base na comparação de coordenadas planimétricas de pontos na imagem ortorretificada com as coordenadas de terreno determinadas com receptor (GPS). Como critério de avaliação foi utilizado o Padrão de Exatidão Cartográfico (PEC), definido pelo Decreto Lei 89.817 de 20 de julho de 1984 (Brasil, 1984). Segundo este decreto, as cartas devem obedecer ao PEC quanto à exatidão, sendo que 90% dos pontos bem definidos numa carta, quando testados no terreno, não deverão apresentar erro superior ao PEC planimétrico estabelecido. O Erro-Padrão (EP), também designado no decreto como desvio-padrão, isolado num trabalho cartográfico, não ultrapassará 60,8% do PEC. As cartas, segundo sua exatidão planimétrica, são classificadas nas Classes A, B e C, conforme critérios apresentados na Tabela 4.

Tabela 4
Padrão de exatidão cartográfica (PEC) para análise planimétrica dos produtos cartográficos.

A discrepância planimétrica (DPlan) e a média das diferenças planimétricas (ME) entre as coordenadas da imagem e de campo são obtidas pelas equações:

No cálculo da Raiz do Erro Médio Quadrático (RMSE), em E e em N são utilizadas as equações:

e

em que: n, número total de pontos; Ei-imagem, coordenada E do ponto i na imagem; Ei-GPS, coordenada E do ponto i obtido com GPS; Ni-imagem, coordenada N do ponto i na imagem; e Ni-GPS, coordenada N do ponto i obtido com GPS.

O erro-padrão (EP) ou desvio-padrão é calculado pela equação:

A classificação de um produto cartográfico segundo o PEC pode ser realizada por meio de testes estatísticos para a análise de tendência e precisão. O teste t de Student, com nível de confiança de 90%, é utilizado para avaliar se a média das discrepâncias planimétricas é compatível com a exatidão esperada no PEC (Tabela 4). As seguintes hipóteses são confrontadas: a hipótese nula (H0) pressupõe que a média populacional estimada (µ) é menor ou igual à exatidão planimétrica esperada para o PEC (µ0). A hipótese alternativa (H1) pressupõe que a média populacional estimada é maior que a exatidão esperada (µ0).

O valor da média populacional da planimetria é calculado em função das discrepâncias planimétricas. A estimativa por intervalo da média populacional, determinada pela equação µ ≤ x + (tα)(S/√), é feita por meio da média amostral (x), do desvio-padrão amostral (S), do tamanho da amostra (n) e da estatística (tα). A estatística amostral calculada (tcalc) é dada pela equação tcalc = (x - µ0)/s/√n

Na análise de precisão, aplica-se o teste do qui-quadrado que considera o EP estabelecido pelo PEC. As hipóteses testam se o desvio-padrão dos pontos de verificação (σ) é menor ou igual ao valor estabelecido pelo PEC (σ0): tcal<tα,gl.

No teste de precisão, aplica-se o teste do qui-quadrado (χ) que considera o EP estabelecido pelo PEC. As hipóteses do teste do qui-quadrado testam se o desvio-padrão dos pontos testados (σ) é menor ou igual ao valor estabelecido pelo PEC (σ0): H0: σ≤σ0 e H0: σ>σ0.

A hipótese nula não será rejeitada ao nível de significância de α se o valor χ α for maior que a estatística amostral (χcal): χ2cal ≤ χα,gl, sendo: χ2cal = ((n-1)s2)/(σ0)2.

Após a correção radiométrica da imagem, realizou-se a classificação supervisionada com o classificador MaxVer, tanto para a imagem corrigida como para a sem correção (em radiância), ambas com o mesmo conjunto de amostras para o treinamento. Na supervisionada, diferentemente da não supervisionada, o operador define o número de classes de acordo com o conhecimento da área e o trabalho de campo e usa essas classes para treinamento do algoritmo. Portanto a classificação através do MaxVer foi feita em duas etapas: a) treinamento, em que foram selecionadas amostras em áreas representativas de cada tipo de uso do solo e delas extraídos os parâmetros estatísticos (média e matriz de covariância) de cada classe. Esses parâmetros foram usados pelo classificador para criar uma regra de decisão que determinou a qual classe pertence um dado pixel dentro da área de estudo e fora das áreas amostradas. O procedimento foi feito no ArcGIS 10.0, sendo identificadas e selecionadas sete classes de uso do solo para o treinamento. b) classificação, em que foi calculada a probabilidade de um dado pixel pertencer a cada classe fornecida ao sistema na fase de treinamento. O pixel é então associado à classe com maior probabilidade de pertencer.

Todos os mapas temáticos finais de classificação supervisionada da imagem corrigida e não corrigida foram elaborados usando ArcView no ArcGIS Desktop10.0.

Resultados e Discussão

Os resultados da correção radiométrica da imagem RapidEye são apresentados na Figura 1, com as imagens com correção (à esquerda) e sem correção (à direita), na composição RGB 321, em que se observa o efeito visual da interferência da atmosfera na imagem. O efeito da atmosfera na resposta espectral dos diferentes alvos (Figura 2) mostra que as diferenças entre os valores de reflectância nas imagens com e sem correção são altas na faixa do azul, em todos os alvos, devido ao espalhamento Rayleigh, que é maior na faixa azul do espectro (Antunes et al., 2012).

Figura 1
Imagem RapidEye de 17/8/2011, com (à esquerda) e sem (à direita) correção atmosférica, com área da Fazenda São José do Pinheiro, Pinheiral, RJ, delineada em preto.

Figura 2
Reflectância aparente e da superfície (ρ) em função da banda do sensor para diferentes alvos, na área de estudo em Pinheiral, RJ. A, Floresta; B, Água; C, Queimadas; e D, Solo exposto. adim: unidade adimensional.

No alvo floresta, as maiores diferenças de reflectância se deram na faixa do visível (bandas 1, 2 e 3), e dentre as bandas do visível os maiores valores na imagem corrigida estão na faixa do verde (banda 2), que reflete mais nessa faixa do espectro devido à presença da clorofila na folha. Entre todas as bandas, os maiores valores de reflectância ocorreram na faixa do infravermelho próximo (banda 5) e do "red edge" (banda 4), devido à estrutura foliar que causa um maior espalhamento da radiação (Antunes et al., 2012; Delegido, et al., 2013).

Para os corpos de água, uma interpretação errônea poderia ser obtida caso não fosse feita a correção atmosférica, pois esse alvo mostra aumento de reflectância na faixa do verde, muito provavelmente devido à presença de algas, pois os valores de reflectância da água pura são maiores na faixa do azul (Mao et al., 2010). As maiores diferenças verificadas nesse alvo foram relativas às bandas 1 e 5, com valores de 72,06 e 79,52%, respectivamente.

Áreas de pastagens queimadas apresentaram comportamento semelhante ao da água na faixa do azul, tanto para a reflectância aparente quanto para a da superfície. Em todas as bandas a reflectância aparente foi maior que a da superfície. A banda ideal para diferenciação desses alvos (água e áreas queimadas) seria a do infravermelho próximo, pois para a água a reflectância da superfície nessa faixa do espectro é inferior ao valor das áreas que foram queimadas (Cardozo et al., 2014), podendo chegar a zero a partir desse comprimento de onda. De modo geral, as áreas queimadas apresentaram pouca diferença entre as bandas, o que corrobora os resultados de Cardozo et al. (2014).

No solo exposto, a reflectância aumentou desde o azul até o infravermelho próximo na imagem não corrigida (Figura 1, imagem à direita). Utilizando outro método de correção atmosférica, Vaudour et al. (2014) encontraram resultados semelhantes, com a reflectância do solo ao nível de superfície aumentando do azul até o infravermelho próximo. Na imagem corrigida, a maior reflectância ocorreu na faixa de 690-730 nm na banda 4; sendo que, nas bandas 3 (vermelho) e 4 ("red edge"), os valores de reflectância da superfície (imagem corrigida) foram maiores quando comparados à reflectância aparente (imagem não corrigida). Ao contrário dos outros alvos, a diferença de reflectância entre as imagens foi menor para o alvo solo exposto. É possível a comparação entre dados espectrais de imagens corrigidas e sem correção, pois os principais alvos como água, vegetação e solo têm suas propriedades espectrais bem conhecidas na literatura conforme os descritos nos trabalhos de Novo et al. (2004), Demattê et al. (2007), Ferreira et al. (2008), Bellinaso et al. (2010), entre outros.

Esses resultados mostram a importância de aplicar o modelo de correção atmosférica em imagens de satélites, na avaliação das respostas espectrais dos alvos. Ramoelo et al. (2012), avaliando estimativa de N em grama da savana sul-africana usando a banda "red edge" do sensor RapidEye, recomendaram a correção atmosférica. Assim como Tigges et al. (2013), usando série temporal de dados do RapidEye para classificar vegetação urbana em Berlim, Alemanha.

Após a correção da imagem, foi possível fazer a classificação supervisionada da área (Figura 3), para a imagem corrigida (reflectância) e não corrigida (radiância). Foram identificadas as seguintes classes de uso do solo: floresta, áreas com médio a avançado estágio de regeneração; área urbana, áreas construídas, com ruas, casas, comércio e etc; água, açudes e outros corpos hídricos; pastagem vigorosa, manejada ou com maior qualidade devido à posição na paisagem em locais com maior umidade; pastagem degradada, com falhas na cobertura da superfície do solo ou menor quantidade de biomassa de folhas, estágio médio a elevado de degradação; solo exposto, ou seja, área sem nenhuma cobertura vegetal; e outras coberturas, que se diferenciam das demais pela forma ou textura na imagem. Essas áreas são constituídas por florestas em estágio inicial de regeneração (capoeiras); áreas com plantio homogêneo de palmeira-real-australiana (Archontophoenix cunninghamiana ) para produção de palmito; pastagem com muitos arbustos e plantas invasoras (pasto sujo); além de bambuzal com bambu-gigante (Dendrocalamus giganteus), nas margens do Rio Paraíba do Sul. As terras com sinais de queimada na data da imagem foram classificadas como pastagens degradadas.

Figura 3
Distribuição de classes de uso do solo da Fazenda São José do Pinheiro, Pinheiral, RJ, por meio da classificação supervisionada (MaxVer) da imagem RapidEye de 17/08/2011. Imagem corrigida (esquerda) e imagem não corrigida (direita).

As classes de uso e áreas de ocorrência dentro dos limites da Fazenda São José do Pinheiro foram quantificadas (Tabela 5), sendo que mais de 45% da área é coberta por pastagens degradadas. Segundo Silva et al. (2012), na região do Médio Vale do Paraíba do Sul, RJ, com o ciclo do café e a ocupação imobiliária, houve intensas transformações da paisagem e degradação do solo. Em algumas áreas de cafezais abandonados, depois usados com pastagens em diferentes condições de degradação, hoje se observa a floresta secundária em estágio avançado de regeneração (Machado et al., 2015).

Tabela 5
Quantificação das áreas de cada classe de uso do solo, classificadas pelo MaxVer, na Fazenda São José do Pinheiro, Pinheiral, RJ.

A classe de pastagem vigorosa (manejada) corresponde a 20,93 e 18,14% da área total (imagem corrigida e sem correção, respectivamente) e ocorre, principalmente, nas terras para criação de gado de leite do IFRJ Campus Nilo Peçanha, Pinheiral, nas planícies aluviais do Rio Paraíba do Sul e margens do ribeirão Cachimbal, além de várzeas em vales fechados com maior umidade.

A classe de uso do solo com floresta secundária ocupa em torno de 10%. Essa classe, que ocorre nas partes mais altas e de maior declive da Fazenda São José do Pinheiro, apresentou menor pressão antrópica. O que se deu pela aplicação do Código Florestal, segundo o qual áreas com declividade acima de 45% são destinadas à preservação, pela dificuldade de acesso e elevados custos do manejo e manutenção de lavouras agrícolas.

Quanto à ocupação não agrícola, a área urbana é de 8,92 e 7,59% (imagem corrigida e sem correção, respectivamente). Já a classe de uso identificada como água ocupa, principalmente, açudes particulares e os tanques para piscicultura do IFRJ Campus Nilo Peçanha, Pinheiral, localizados próximos ao Rio Paraíba do Sul. Este rio não foi incluído na quantificação da classe água, pois está fora da área de estudo.

Quanto à validação da classificação das imagens corrigidas e sem correção, com base nos pontos de controle obtidos com GPS de navegação em 179 amostras coletadas, os índices analisados não mostraram diferença significativa entre as classificações. A exatidão da classificação e o índice Kappa (Congalton & Green, 2008) para a imagem sem correção foram de 0,73 e 0,91, respectivamente. Já para a imagem corrigida os valores foram de 0,72 e 0,89, respectivamente. A matriz de confusão da classificação supervisionada é apresentada na Tabela 6. De acordo com Lu et al. (2004), a técnica de comparação de imagens multitemporais usando uma variedade de alterações depois da classificação reduz a interferência atmosférica, assim a correção radiométrica pode não ser necessária.

Tabela 6
Matriz de confusão da classificação supervisionada da imagem corrigida e a sem correção.

Os valores de acurácia e de Kappa foram semelhantes aos de Oliveira et al. (2013) avaliando o desempenho de Redes Neurais Artificiais e o algoritmo MaxVer no mapeamento de fragmentos florestais em Tumiritinga, MG. Os autores usaram imagens RapidEye e obtiveram melhor desempenho para MaxVer, com coeficientes Kappa de 0,8 e Kappa condicional de 0,9. Riedel et al. (2014), avaliando imagens para detecção de mudanças na cobertura da terra em faixas de dutos, obtiveram acurácia de 0,83 e 0,63 para as imagens RapidEye e Ikonos, respectivamente, concluindo assim que a primeira foi mais eficiente.

Aplicando nas equações os valores das coordenadas da imagem e dos pontos de controle obtidos com auxílio do GPS (Tabela 3) têm-se os valores de ME de 19,23 m; de RMSEE de 7,07 m; e de RMSEN de 18,44 m. O erro-padrão resultante foi de 4,91 m. Considerando-se a resolução espacial da imagem RapidEye ortorretificada (reamostrada de 6,5 m para 5 m), verifica-se que os valores de RMSE obtidos são de cerca de 1,4 pixels na componente E e 3,7 pixels componente N. Costa (2010), em estudo da acurácia do RapidEye 3A, verificou a existência de erro sistemático de cerca de 4 pixels em ambas componentes. Quando este erro foi eliminado, usando transformação polinomial com pontos de controle, a acurácia posicional, segundo o autor, foi similar (~1 pixel) à da imagem ortorretificada com maior número e mais acurados pontos de controle.

Considerando os valores de discrepâncias, os resultados encontrados para a imagem da Fazenda São José do Pinheiro foram maiores que os valores obtidos para as três imagens do sensor RapidEye avaliadas por Antunes et al. (2014).

Como esses mesmos autores relatam, o trabalho por eles realizado foi em uma área plana, no município de Seropédica,RJ. De acordo com os autores, os resultados da ortorretificação podem ser distintos em área com relevo acidentado, o que torna necessária a avaliação para esses ambientes. Apesar da pior qualidade quanto à avaliação da acurácia geométrica, pode-se observar que, assim como em Antunes et al. (2014), a maior discrepância está na componente N como mostra o RMSE.

Com base nos valores das estatísticas dos testes para análise de exatidão e precisão (tcalc = -0,347; tα.gl = 0,132; χcalc = 0,838; e χα.gl = 1,610) pode-se afirmar com 90% de confiança que a imagem ortorretificada se enquadra na classe C da escala 1:20.000 do PEC. Apesar de os resultados para a área da Fazenda São José do Pinheiro serem inferiores aos encontrados por Antunes et al. (2014) em área plana, a análise da imagem do sensor RapidEye apresenta potencial de uso no planejamento agrícola, monitoramento ambiental e no levantamento de solos a nível detalhado.

Conclusões

  1. A resposta espectral dos alvos é melhor na imagem de satélite RapidEye com correção atmosférica, tanto para a obtenção de parâmetros da superfície quanto para a interpretação visual da imagem e comparação entre imagens de épocas e áreas diferentes; entretanto, a correção não resulta em ganho significativo no processo de classificação supervisionada, com uso do MaxVer, para o ambiente de Mar de Morros.

  2. A classificação supervisionada possibilita quantificar as áreas e a percentagem de cada classe de uso do solo de forma consistente.

  3. A distribuição das sete classes de uso na Fazenda São José do Pinheiro reflete o processo histórico de ocupação do solo e a degradação das terras no ambiente de Mar de Morros.

  4. A avaliação da ortorretificação da imagem do sensor RapidEye possibilita seu enquadramento na classe C da escala de 1:20.000, de acordo com o Padrão de Exatidão Cartográfico.

Agradecimentos

À Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, à Embrapa Solos, ao Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro, à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e à Fundação de Amparo à Pesquisa do Rio de Janeiro (Faperj), pelo apoio técnico e financeiro ao projeto e pela concessão de bolsas; ao Ministério do Meio Ambiente, pelo fornecimento das imagens RapidEye.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Set 2016

Histórico

  • Recebido
    30 Jul 2015
  • Aceito
    12 Nov 2016
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