RESENHAS
World Investment Report 2007 (WIR07) Transnational Corporations, Extractive Industries and Development
United Nations Conference on Trade and Development
Nova York e Genebra: Nações Unidas, 2007.
Um dos principais temas de conjuntura econômica mundial dos dias atuais é o boom de demanda, e conseqüentemente de preços, das commodities metálicas e agrícolas no mundo. Este fenômeno é fortemente explicado pelo aumento da demanda asiática (principalmente a chinesa), por vários tipos de recursos naturais. Isso faz com que a análise do impacto do investimento direto estrangeiro (IDE) nas economias em desenvolvimento ganhe uma importância cada vez maior. É justamente esta análise o objetivo do Relatório de Investimento Mundial 2007 das Nações Unidas. O foco do trabalho é no papel das corporações transnacionais nas indústrias extrativas e sua presença cada vez mais atuante nas economias emergentes e menos desenvolvidas.
O relatório possui aproximadamente 300 páginas e está dividido em duas partes. Na primeira, a discussão enfoca o amplo crescimento do IDE e como tal crescimento influencia a produção industrial, as mudanças nos padrões de outros tipos de investimentos e as corporações transnacionais. Além disso, há uma discussão das tendências regionais do investimento nas principais regiões do mundo. Na segunda parte do relatório, o foco recai sobre o papel das corporações transnacionais e das indústrias extrativas no processo de desenvolvimento.
Acerca do crescimento do fluxo de IDE, dados do relatório mostram que tal fluxo alcançou a faixa dos US$ 1.306 bilhões em 2006. Isso significou um aumento de 38% em relação a 2005, sendo o terceiro ano consecutivo de elevação e já aproximando o nível recorde de 2000, quando os investimentos bateram a cifra de US$ 1.411 bilhões. Este influxo alcançou os três grupos econômicos mundiais: países desenvolvidos, países em desenvolvimento, as economias em transição do Sudeste Europeu e a Comunidade dos Estados Independentes.
A razão para esta disparada está nas fusões e aquisições internacionais, com o envolvimento crescente de fundos de private equity e resultando em aumentos da produção de bens e serviços das corporações transnacionais. Uma característica importante deste processo é a participação de empresas oriundas de economias emergentes. Como era de esperar, o destaque fica por conta da Ásia, com 78 das 100 maiores firmas transnacionais emergentes, seguida de África e América Latina, com onze corporações cada uma. Outra característica importante é a mudança do padrão geográfico do IDE, com um fluxo crescente Sul-Sul, especialmente na Ásia. Para o caso específico da América Latina, o relatório chama a atenção para os recebimentos de investimentos do Brasil e México, com US$ 19 bilhões de dólares para cada país no ano de 2006. Destaque para os novos empreendimentos (os chamados Greenfield Investiments), mais importantes que as fusões e aquisições. Destaque, também, para os ganhos reinvestidos.
A primeira parte do relatório conclui que, em linhas gerais, os prospectos para o fluxo de IDE global permanecem muito positivos. Em uma pesquisa feita pela UNCTAD, 63% dos respondentes expressaram otimismo quanto ao fluxo de IDE no período 2007-2009. Os destinos mais atraentes são a China (com 52% da preferência das empresas), Índia (41%), EUA (36%), Rússia (22%) e Brasil (12%). Contudo, apesar deste prospecto positivo, existem riscos e desafios para a economia mundial. Entre eles podem ser citados o desequilíbrio global de conta corrente, os preços voláteis do petróleo e a piora nas condições do mercado financeiro.
A segunda parte do relatório trata da correlação entre o desenvolvimento econômico, as corporações transnacionais e as indústrias extrativas. O texto começa relembrando que, nas últimas duas décadas, as indústrias extrativas transnacionais vinham recebendo pouca atenção de analistas e formuladores de políticas. Com a recente alta dos preços de commodities (principalmente metais, petróleo e gás natural) o investimento internacional nas indústrias extrativas começou a aumentar consideravelmente.
A explicação para esta crescente demanda por minerais e outras commodities está nos mercados aquecidos da Ásia, particularmente o mercado chinês. Isso impulsionou os preços de commodities de forma considerável, aumentou os lucros das corporações extrativistas minerais e fez renascer os investimentos internacionais no setor. A relativa importância de empresas estrangeiras na produção mineral varia de acordo com a economia e com o mineral. Isso reflete uma indústria extrativa que vem se diversificando com empresas privadas dominando o setor de metais e empresas públicas dominando os negócios de petróleo e gás natural.
A pergunta do relatório é se este boom de preços das commodities irá se traduzir em um desenvolvimento sustentado para os países produtores. Apesar de quererem que o processo de desenvolvimento aconteça, estas nações estão cientes dos problemas que podem surgir com a chegada dos investimentos estrangeiros e das corporações transnacionais em seus territórios. A participação destas grandes empresas no setor extrativo pode ter significantes impactos nas economias que estiverem recebendo as empresas, incluindo impactos de cunho econômico, ambiental, social e político. Isso é particularmente mais complexo para os países mais pobres e sem condições de barganhar contratos mais favoráveis à população. Contudo, o trabalho destaca que, dado o alto preço das commodities, a maioria das nações tem conseguido fazer contratos favoráveis com as corporações transnacionais. O relatório também destaca o cuidado que os países estão tendo com problemas relacionados ao meio ambiente, direitos humanos e questões sociais em geral.
Neste contexto, destaca-se a Companhia Vale do Rio Doce, que foi classificada pelo relatório como a terceira maior empresa mineradora do mundo (em 2005), respondendo por 4,4% da produção mundial, atrás da australiana BHP Biliton (4,8%) e da britânica Rio Tinto (4,6%). Destaque, também, para a Petrobras, que ocupava o 17º. lugar entre os maiores produtores de petróleo do mundo (dados de 2005), sendo os primeiros lugares ocupados pelos sauditas, russos, iranianos e americanos, nesta ordem.
A conclusão geral do relatório é que, sem dúvida, os países ricos em recursos naturais podem tirar proveito desta janela de oportunidade em seus processos de desenvolvimento. Contudo, a extração destes recursos naturais envolve questões importantes de cunho econômico e socioambiental. É neste contexto que entram os sistemas de governança e a importância que eles terão na maximização dos ganhos com o desenvolvimento dos recursos extraídos. Os sistemas de governança também serão importantes para traçarem formas contratuais e regulatórias relacionadas à entrada das corporações nos determinados países e suas respectivas operações. Sem dúvida, a garantia dos ganhos mais igualitários advindos do desenvolvimento requer uma responsabilidade compartilhada dos governos recebedores das corporações transnacionais, assim como da comunidade internacional, da sociedade civil e das próprias empresas transnacionais.
Cleomar Gomes da Silva
Doutor em Economia pela Fundação
Getulio Vargas de São Paulo, Professor da
Fundação Getulio Vargas de São Paulo
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
22 Ago 2008 -
Data do Fascículo
Set 2008