Open-access Tumor de Buschke-Lowestein: tratamento com imiquimod para preservação esfincteriana. Relato de caso

Buschke-Lowenstein tumor: imiquimod therapy to esphincter preservation. Case report

Resumos

O tumor de Buschke-Lowestein, também conhecido como condiloma acuminado gigante é uma lesão de aspecto verrucoso, extensa, envolvendo a região ano-genital. Não representa uma lesão maligna por critérios histológicos, embora exista claramente um potencial de malignização, e tenha um comportamento agressivo. Não existe um consenso sobre o seu tratamento, aventando-se o uso de drogas quimioterápicas aplicadas local ou sistematicamente, uso de imunoterapia, radioterapia e ressecções cirúrgicas amplas isoladas ou em combinação com outras terapias. Relatamos um caso onde a opção de tratamento foi o imiquimod creme 5%. A lesão envolvia musculatura esfincteriana e, sendo assim, a cirurgia acarretaria perda da continência fecal, causando ao paciente o ônus de um estoma definitivo. Após tratamento durante 20 semanas, o tumor apresentou regressão significativa de tamanho, sendo realizado excisão local da lesão residual com preservação esfincteriana.

Condiloma acuminado; Imiquimod; tumor de Buschke-Lowenstein; HPV; tratamento


Buschke-Lowestein tumor or giant condyloma acuminatum is a verrucous, large lesion in the anorectal and perianal regions. It is not a malignant lesion in histopathologic findings. However, there is a risk of malignancy and trends an aggressive behavior. There is not a gold standard therapy, with the use of topical or systemic chemotherapy, immunotherapy, radiation therapy and large surgical resections. These surgical resections can be doing alone or in combinations with others therapies (multimodality therapy). The authors describe a case that the treatment option was the imiquimod cream 5%. The lesion invades in the anal sphincters, so fecal incontinence will result after surgery and a colostomy was mandatory. After 20 weeks treatment, the tumor presented a great regression, and it was treated with local excision and avoided a mutilating procedure.

Condyloma acuminatum; Imiquimod; Buschke-Lowenstein tumor; HPV; Treatment


RELATO DE CASOS

Tumor de Buschke-Lowestein: tratamento com imiquimod para preservação esfincteriana. Relato de caso

Buschke-Lowenstein tumor: imiquimod therapy to esphincter preservation. Case report

Fernanda Meira Pinto CoelhoI; Aline Landim ManoII; Melina da Silva BacellarIII; Lina Maria Góes de CodesIII; Elias Luciano Quinto de SouzaIV; Euler de Medeiros Azaro FilhoV

IMédica estagiária de Coloproctologia do Hospital São Rafael

IIMédica residente de Coloproctologia do Hospital São Rafael

IIIMédica assistente de Coloproctologia do Hospital São Rafael

IVMédico assistente de Coloproctologia do Hospital São Rafael

VMédico cordenador de Coloproctologia do Hospital São Rafael

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Fernanda Meira Pinto Coelho Endereço Rua dos Radialistas 181/806, Pituba Salvador-BA, CEP 41.810-650 Tel: 71- 21096369 / 71- 99828316, Fax: 71- 33506202 E-mail: drafernandacoelho@bol.com.br

RESUMO

O tumor de Buschke-Lowestein, também conhecido como condiloma acuminado gigante é uma lesão de aspecto verrucoso, extensa, envolvendo a região ano-genital. Não representa uma lesão maligna por critérios histológicos, embora exista claramente um potencial de malignização, e tenha um comportamento agressivo. Não existe um consenso sobre o seu tratamento, aventando-se o uso de drogas quimioterápicas aplicadas local ou sistematicamente, uso de imunoterapia, radioterapia e ressecções cirúrgicas amplas isoladas ou em combinação com outras terapias. Relatamos um caso onde a opção de tratamento foi o imiquimod creme 5%. A lesão envolvia musculatura esfincteriana e, sendo assim, a cirurgia acarretaria perda da continência fecal, causando ao paciente o ônus de um estoma definitivo. Após tratamento durante 20 semanas, o tumor apresentou regressão significativa de tamanho, sendo realizado excisão local da lesão residual com preservação esfincteriana.

Descritores: Condiloma acuminado; Imiquimod; tumor de Buschke-Lowenstein; HPV; tratamento.

ABSTRACT

Buschke-Lowestein tumor or giant condyloma acuminatum is a verrucous, large lesion in the anorectal and perianal regions. It is not a malignant lesion in histopathologic findings. However, there is a risk of malignancy and trends an aggressive behavior. There is not a gold standard therapy, with the use of topical or systemic chemotherapy, immunotherapy, radiation therapy and large surgical resections. These surgical resections can be doing alone or in combinations with others therapies (multimodality therapy). The authors describe a case that the treatment option was the imiquimod cream 5%. The lesion invades in the anal sphincters, so fecal incontinence will result after surgery and a colostomy was mandatory. After 20 weeks treatment, the tumor presented a great regression, and it was treated with local excision and avoided a mutilating procedure.

Key words: Condyloma acuminatum; Imiquimod; Buschke-Lowenstein tumor; HPV; Treatment.

INTRODUÇÃO

O condiloma acuminado gigante ou tumor de Buschke-Lowenstein (TBL) é uma forma rara de apresentação do condiloma acuminado anogenital, que por sua vez é uma doença sexualmente transmissível relacionada ao Papilomavírus humano (HPV) (1).

A descrição clássica do TBL é uma grande lesão vegetante, verrucosa, de aspecto exofítico. Possui um crescimento lento e a despeito das suas características histopatológicas demonstrarem tratar-se de um tumor benigno, tem um comportamento agressivo localmente (2). Estas lesões podem ser consideradas também como lesões de risco para transformação e desenvolvimento de carcinoma escamo-celular.(3)

A melhor estratégia terapêutica no TBL não foi estabelecida. Têm sido usado agentes tópicos, imunoterapia, quimiorradioterapia e cirurgia. A cirurgia, isoladamente ou em conjunto com outros métodos, pode ocasionar ressecções extensas e a invasão do esfíncter anal pode levar a uma ressecção abdominoperineal.(4)

Outra característica muito freqüente do TBL é a sua tendência em recidivar, com índices de recorrência em torno de 60%.(5)

O imiquimod é uma substância imunomoduladora que vem sendo usada no tratamento de lesões virais, capaz de potencializar a resposta imunológica ao HPV.(6) Por causa da extensão da doença deste paciente, optamos por iniciar o tratamento com imiquimod, e em decorrência da excelente resposta obtida, apresentamos a opção de incluir esta terapia no tratamento do TBL.

RELATO DE CASO

Paciente do sexo masculino, 40 anos, homossexual, com sorologia positiva para o vírus da imunodeficiência humana há 11 anos. Encontrava-se em tratamento regular com anti retrovirais com as drogas TMC 114, TMC 125, Ritonavir, Vireaid, Lamivudine há 01 ano e Fusion há 02 anos, apresentando contagem de células CD4 variando entre 380 a 500. Há 11 meses refere inicio do quadro clínico com queixa de dor anal e lesão vegetante de tamanho pequeno em região perianal, fez uso de analgésicos e antiinflamatórios tópicos, sem resposta clínica. Esta lesão apresentou aumento progressivo de tamanho nos últimos 02 meses, quando o paciente procurou ambulatório de coloproctologia do nosso serviço.

O exame proctológico identificou uma lesão vegetante, com aspecto verrucoso, com cerca de 15 centímetros de diâmetro, localizada em região perianal, ocupando principalmente quadrante anterior direito, com prolapso mucoso circunferencial associado. Ao toque retal verifica-se hipotonia esfincteriana. (Figura 1)


Na investigação diagnóstica do paciente, foi realizado ultra-som endoanal com aparelho bidimensional. Este exame evidenciou imagem hiperecogênica envolvendo o esfíncter interno do ânus e ultrapassando seus limites, com acometimento da musculatura estriada (esfíncter externo do ânus), principalmente ao nível do canal anal inferior.

Foi realizado biópsia da lesão sob narcose, que evidenciou Condiloma acuminado com displasia moderada e alterações compatíveis com ação viral.

Realizado tratamento imunoterápico com imiquimod creme 5%, uso tópico, três vezes por semana durante 20 semanas, com seguimento mensal. A lesão apresentou regressão significativa de tamanho, persistindo em região posterior (Figura 2). Novo exame ultra-sonográfico verificou acometimento residual de musculatura de esfíncter externo e prolapso mucoso associado (Figuras 3 e 4).




O paciente referiu alteração da continência fecal precocemente. No 15º dia pós-operatório, retornou já referindo melhora da incontinência. Ao exame físico, apresentava ferida operatória com parte da musculatura externa recoberta de tecido de granulação.

O paciente encontra-se em acompanhamento trimestral. No 10º mês, não há recidiva da lesão (Figura 6). Optou-se por ressecção total da lesão que de fato não envolvia esfíncter interno, e ressecção parcial de mucosa prolapsada por apresentar escarificação em sua superfície (Figura 5).



DISCUSSÃO

O condiloma acuminado da região anogenital é causado pelo Papilomavírus humano (HPV), e os tipos 6, 11, 16 e 18 são os principais responsáveis.(7) Foi considerada a doença sexualmente transmissível mais diagnosticada em nosso meio. Sua incidência vem aumentando, associada a estados de imunossupressão, particularmente à AIDS.(8) Nestes pacientes, costuma ser mais agressivo, com crescimento rápido, alto índice de recidiva e pouca resposta à terapia convencional.(9)

O Tumor de Buschke-Lowestein ou condiloma acuminado gigante é a forma de apresentação onde à lesão atinge proporções muito volumosas, com características locais de agressividade, invadindo e causando deformidade nos tecidos adjacentes. Pode apresentar fistulização, porém não ocorre invasão linfática, vascular ou neuronal, além de não possuir potencial de metastatização. (10) O risco de degeneração do TBL para carcinoma escamo-celular é alto, variando entre 30 a 56%, diferindo do condiloma acuminado simples, que possui uma incidência de apenas 2%. (11,12)

Existem diversas abordagens terapêuticas para o condiloma acuminado gigante, com medicações tópicas, criocirurgia, excisão cirúrgica, imunoterapia, quimioterapia, radioterapia, laser, eletrocoagulação e oxigenoterapia hiperbárica. (13,14)

No TBL, devido à sua extensão, ao índice alto de recorrência e pelo risco de malignização, a excisão radical é o tratamento mais utilizado, isoladamente ou em combinação com outras modalidades terapêuticas. (15)

Nós relatamos um caso de TBL com envolvimento significativo da musculatura interna e externa do ânus. Este padrão de acometimento acarretaria uma opção cirúrgica com excisão ampliada ou uma amputação abdominoperineal, o que levaria ao paciente o ônus de incontinência ou até mesmo de um estoma definitivo. Devido a este fato, optamos por tentar uma modalidade terapêutica com o uso de uma substância imunomoduladora, o Imiquimod creme a 5%.

O Imiquimod é uma medicação tópica imunoterápica da família imidazoquinolina, atua pela indução da produção de interferon alfa e citocinas, potencializando a resposta imunológica contra as células infectadas pelo HPV. (16,17)

Imiquimod creme a 5% é aplicado topicamente pelo próprio paciente. Este tratamento já é reconhecido como uma opção para lesões anogenitais causadas pelo HPV, e tem sido usado com êxito no tratamento de lesões pré-malignas e malignas da pele como Doença de Bowen e ceratose actínica. (18)

Os efeitos colaterais são mínimos e não exigem interrupção do tratamento, sendo relatados queimação local, eritema e ulcerações cutâneas superficiais. (6,18) Um fator limitante do uso mais amplo, em nosso meio, é que se trata de uma medicação dispendiosa.

É preconizado o uso do Imiquimod creme a 5%, três vezes por semana, em dias alternados, por um período de 12 a 16 semanas. Nosso plano terapêutico seguiu esta recomendação, porém estendemos para 20 semanas devido à permanência de lesões residuais. Após este período não houve regressão total, permanecendo pequena área afetada, que foi tratada com excisão local. Durante o tratamento, observou-se substituição das verrugas por tecido cicatricial e esbranquiçado.

Após 10 meses de tratamento, o paciente encontra-se livre de doença, e mantém acompanhamento trimestral. Este seguimento é necessário para vigilância de lesões malignas, devido ao TBL possuir alto índice de recidiva.(19)

Recebido em 08/04/2008

Aceito para publicação em 25/06/2008

Trabalho realizado no Serviço de Coloproctologia do Hospital São Rafael, Salvador- Bahia - Brasil.

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  • Endereço para correspondência:
    Fernanda Meira Pinto Coelho
    Endereço Rua dos Radialistas 181/806, Pituba
    Salvador-BA, CEP 41.810-650
    Tel: 71- 21096369 / 71- 99828316, Fax: 71- 33506202
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      10 Out 2008
    • Data do Fascículo
      Set 2008

    Histórico

    • Aceito
      25 Jun 2008
    • Recebido
      08 Abr 2008
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