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Doenças de felinos domésticos diagnosticadas no sul do Rio Grande do Sul: estudo de 40 anos

Domestic feline diseases diagnosed in southern Rio Grande do Sul: a 40-year study

RESUMO

O objetivo deste estudo foi identificar as principais doenças de felinos na região sul do Rio Grande do Sul. Foram revisados os protocolos de necropsia e das amostras biológicas de felinos encaminhados ao Laboratório Regional de Diagnóstico da Faculdade de Veterinária da Universidade Federal de Pelotas (LRD/UFPel), no período de 1978 a 2018. Nesse período foram recebidas 1633 amostras de felinos, sendo 363 (22%) entre os anos de 1978 e 1999 e 1270 (78%) entre os anos de 2000 e 2018. Com relação aos diagnósticos, 457 felinos (28%) apresentaram tumores benignos ou malignos, sendo os tegumentares e os mamários os mais frequentes. As doenças bacterianas, fúngicas, virais, parasitárias, sem agente definido e as intoxicações totalizaram 554 casos (33,9%), destacando-se a esporotricose, com 12,8% dos diagnósticos. Concluiu-se que, na região sul do RS, o encaminhamento de felinos para diagnóstico aumentou significativamente após o ano 2000, comprovando que a espécie passou a ter maior importância como animal de companhia. Concluiu-se, também, que as neoplasias têm papel relevante entre as doenças de felinos e que a esporotricose é uma das mais importantes zoonoses na região.

Palavras-chave:
felinos; tumores mamários; carcinoma de células escamosas; esporotricose

ABSTRACT

The goal of this paper was to identify the main disease affecting felines in the southern region of Rio Grande do Sul. The necropsy protocols and feline biological materials submitted to the Regional Diagnostic Laboratory of the Veterinary College of the Federal University of Pelotas (LRD / UFPel) were reviewed, from 1978 to 2018. During this period 1633 feline samples were received, 363 (22%) between 1978 and 1999 and 1270 (78%) between 2000 and 2018. 59% of felines did not present a defined breed. As for diagnoses, 457 felines (28%) presented benign or malignant tumors, the most common being the integumentary and mammary tumors. Bacterial, fungal, viral, parasitic or undefined agent infections and intoxications were observed in 554 cases (33.9%), especially sporotrichosis with 12.8 % of the diagnoses. It was concluded that in southern RS the referral of cats for diagnosis increased significantly after the year 2000, proving that they became more significant as companion animals. It was also concluded that neoplasia play a relevant role among feline diseases, and that sporotrichosis is one of the most important zoonoses in the region.

Keywords:
felines; mammary tumors; squamous cell carcinoma; sporotrichosis

INTRODUÇÃO

As primeiras evidências da domesticação dos felinos teriam ocorrido no Egito, dois mil anos antes de Cristo, quando estes eram o símbolo da deusa da fertilidade (Linseele et al., 2007LINSEELE, V.; VAN NEER, W.; HENDRICKX, S. Evidence for early cat taming in Egypt. J. Archaeol. Sci., v.34, p.2081-2090, 2007.). Na Europa, foram utilizados no combate às infestações por ratos. Na Idade Média, passaram de deuses e auxiliares sanitários para animais relacionados à bruxaria, sendo, então, perseguidos (Hyams, 1972HYAMS, E. Animals in the service of man: 10000 years of domestication. London: Dent, 1972. 209p.; Darnton, 1986DARNTON, R. O grande massacre de gatos. Rio de Janeiro: Graal, 1986.p.103-139.). A partir da Idade Moderna, a relação entre os felinos e o homem voltou a se estreitar, e a espécie passou a animal de companhia nas últimas décadas, devido a sua independência e praticidade (Informações, 2017).

No Brasil, estima-se que a população de gatos domésticos é de aproximadamente 22 milhões de animais, atingindo o segundo lugar mundial em números absolutos. Um estudo feito pela Associação Americana de Produtos Pets demonstrou que cerca de 30% das famílias que vivem nos EUA têm pelo menos dois felinos em seus lares (Informações, 2017). Com esse alto número de felinos domiciliados, a procura por profissionais especializados nessa espécie vem aumentando, tornando-se um novo campo na clínica veterinária de pequenos animais (Beaver, 2005BEAVER, B.V. Comportamento felino: um guia para veterinários. São Paulo: Roca, 2005. 372p.).

O conhecimento das enfermidades que ocorrem nos felinos domésticos é, portanto, fundamental para o estabelecimento de medidas de controle e prevenção, uma vez que esses podem ser potenciais portadores e disseminadores de doenças para outros felinos e para o homem (Figueiredo et al., 2001FIGUEIREDO, C.M.; MOURÃO, A.C.; OLIVEIRA, M.A.A.; ALVES, W.R. et al. Leptospirose humana no município de Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil: uma abordagem geográfica. Rev. Soc. Bras. Med. Trop., v.34, p.331-338, 2001.). Nesse contexto, os estudos retrospectivos das enfermidades que afetam os animais são de grande relevância. A sistematização de dados obtidos por laboratórios de diagnósticos, principalmente aqueles que abrangem várias décadas, permite a determinação da frequência, da epidemiologia e das características clínico-patológicas das doenças em um determinado local (Pierezan et al., 2009PIEREZAN, F.; RISSI, D.R.; RECH, R.R.; FIGHERA, R.A. et al. Achados de necropsia relacionados com a morte de 335 equinos: 1968-2007. Pesqui. Vet. Bras., v.29, p.275-280, 2009.; Togni et al., 2018TOGN, I.M.; CURTIS, A.; VARGAS, D.P.; KOMMERS G.D. et al. Causes of death and reason for euthanasia in cats in the central region of Rio Grande do Sul, Brazil (1964-2013) Pesqui. Vet. Bras., v.38, p.741-750, 2018.). O objetivo deste estudo foi identificar as principais doenças que afetam felinos na região sul do Rio Grande do Sul.

MATERIAL E MÉTODOS

Para a identificação das doenças dos felinos, foram revisados os protocolos de necropsia e de materiais recebidos no Laboratório Regional de Diagnóstico da Faculdade de Veterinária da Universidade Federal de Pelotas (LRD/UFPel), no período de 1978 a 2018. Desses protocolos resgataram-se os dados epidemiológicos, o histórico clínico, bem como as alterações macroscópicas e histológicas e o diagnóstico atribuído a cada caso. Foram consideradas quatro faixas etárias: jovens até um ano de idade; adultos jovens de um a cinco anos de idade; adultos maduros de cinco a 10 anos de idade; e idosos acima de 10 anos de idade.

Para a sistematização dos dados, as enfermidades foram agrupadas em: tumores benignos e malignos; doenças bacterianas; doenças virais; doenças fúngicas; doenças parasitárias; infecções sem agente definido; intoxicações; outras doenças; e inconclusivos, quando não foi possível estabelecer o diagnóstico. Na categoria de outras doenças, foram agrupados os distúrbios e os diagnósticos morfológicos.

RESULTADOS

Entre os anos 1978 e 2018, foram encaminhadas para o LRD/UFPel 1.633 amostras de felinos. Destas 363 (22%) foram enviadas entre os anos de 1978 e 1999 e 1.270 (78%) entre os anos de 2000 e 2018. Cadáveres totalizaram 683 materiais (42%); 667 eram biópsias (41%); 99 eram órgãos (6%); e 184 consistiam em outras amostras (11%) (fezes, suabes, líquidos tissulares, secreções e raspados cutâneos). De todas as amostras recebidas, 819 (50%) eram fêmeas, 665 (41%) eram machos e, em 149 (9%) protocolos, o sexo não foi informado. Quanto à idade, 107 felinos (6%) eram jovens, 394 eram adultos jovens (24%), 370 eram adultos maduros (23%) e 384 eram idosos (24%). Em 378 protocolos (23%), não havia informações da idade dos animais.

Quanto à raça, 112 felinos (7%) eram da raça Siamês, 73 Persa (4%), 27 Pelo Curto Brasileiro (2%), 958 sem raça definida (SRD) (59%) e 30 eram felinos de outras raças (2%). Na categoria outras raças, foram agrupadas raças com número de animais inferior a cinco casos (0,3%). Em 433 casos (26%), não constavam informações sobre a raça dos animais nos protocolos. Os diagnósticos realizados nos 1.633 cadáveres e nos materiais de felinos recebidos foram agrupados por etiologia e são apresentados na Tab. 1. Tumores benignos e neoplasias foram diagnosticados em 457 felinos (28%) (Tab. 2). As infecções bacterianas, fúngicas, virais, parasitárias, infecções sem agente definido e intoxicações foram observadas em 554 casos (33,9%) e são apresentadas na Tab. 3. Outras doenças e diagnósticos morfológicos corresponderam a 399 diagnósticos (24,4%) (Tab. 4). Em 223 casos (13,7%), os diagnósticos foram inconclusivos.

Tabela 1
Número e percentual de diagnósticos realizados em cadáveres e materiais biológicos de felinos domésticos no sul do Rio Grande do Sul, de 1978 a 2018

Tabela 2
Classificação e localização de tumores benignos e malignos oriundos de cadáveres e biópsias diagnosticados em felinos domésticos no sul do Rio Grande do Sul, de 1978 a 2018

DISCUSSÃO

Evidenciou-se, pelo presente estudo, aumento de aproximadamente 400% no número de cadáveres e materiais biológicos de felinos enviados ao LRD/UFPel para diagnóstico nos últimos 18 anos, quando comparados às duas décadas anteriores. Em estudo semelhante realizado na região central do Rio Grande do Sul, os autores observaram aumento de 200% nesse mesmo número em uma década (Togni et al., 2013TOGNI, M.; MASUDA, E.K.; KOMMERS, G.D.; FIGHERA, RAFAEL A. et al. Estudo retrospectivo de 207 casos de tumores mamários em gatas. Pesqui. Vet. Bras., v.33, p.353-358, 2013.). Esses dados demonstram a importância crescente dos felinos como animal de companhia (Informações, 2017).

As neoplasias tegumentares foram as mais prevalentes neste levantamento, sendo o carcinoma de células escamosas (CCE) o mais frequente. Em trabalhos similares realizados no Rio Grande do Sul (Hesse et al., 2015HESSE, K.L.; FREDO, G.; GUIMARÃES, L.L.B.; REIS, M.O. et al. Neoplasmas oculares e de anexos em cães e gatos no Rio Grande do Sul: 265 casos (2009-2014). Pesqui. Vet. Bras., v.35, p.49-54. 2015.; Togni et al., 2018TOGN, I.M.; CURTIS, A.; VARGAS, D.P.; KOMMERS G.D. et al. Causes of death and reason for euthanasia in cats in the central region of Rio Grande do Sul, Brazil (1964-2013) Pesqui. Vet. Bras., v.38, p.741-750, 2018.) e na Paraíba (Andrade et al., 2012ANDRADE, R.L.F.S.; OLIVEIRA, D.M.; DANTAS, A.F.M.; SOUZA A.P. et al. Tumores de cães e gatos diagnosticados no semiárido da Paraíba. Pesqui. Vet. Bras., v.32, p.1037-1040, 2012.), CCE foi, também, o tumor de pele mais frequente na espécie felina. Estes autores sugeriram que a alta frequência de radiação solar e o hábito da espécie de permanecer por longos períodos exposta ao sol são fatores predisponentes, de maior relevância. A alta radiação solar relacionada à ocorrência de CCE em felinos no Brasil pode ser atribuída à condição geográfica do país, localizado entre a linha do equador e o trópico de capricórnio, região na qual a incidência da radiação solar varia de média a alta durante todo o ano (Oliveira, 2014OLIVEIRA, M.M.F. Radiação ultravioleta/índice ultravioleta e câncer de pele no Brasil: condições ambientais e vulnerabilidades sociais. Rev. Bras. Climatol, v.13, p.60-73, 2014.).

Os tumores mamários foram o segundo diagnóstico mais frequente em felinos, dado semelhante ao observado por outros autores em outros estudos sobre enfermidades que ocorrem nessa espécie (Andrade et al., 2012ANDRADE, R.L.F.S.; OLIVEIRA, D.M.; DANTAS, A.F.M.; SOUZA A.P. et al. Tumores de cães e gatos diagnosticados no semiárido da Paraíba. Pesqui. Vet. Bras., v.32, p.1037-1040, 2012.; Togni et al., 2013TOGNI, M.; MASUDA, E.K.; KOMMERS, G.D.; FIGHERA, RAFAEL A. et al. Estudo retrospectivo de 207 casos de tumores mamários em gatas. Pesqui. Vet. Bras., v.33, p.353-358, 2013.; Rolim, 2017ROLIM, V.M. Causas de mortes em gatos no sul do Brasil. 2017. 60f. Tese (Doutorado em Ciências Veterinárias) - Universidade federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre. RS.). Foi observado que 88% desses tumores eram malignos, percentual pouco superior ao observado na região central do estado, de 72,4% (Togni et al., 2013). Em felinos, as neoplasias mamárias representam 17% de todos os tumores diagnosticados na espécie e geralmente apresentam comportamento biológico muito agressivo (Zappulli et al., 2015ZAPPULLI, V.; RASOTTO, R.; CALIARI, D.; MAINENTI, M. et al. Prognostic evaluation of feline mammary carcinomas: a review of the literature. Vet. Pathol., v.52, p.46-60, 2015.).

A esporotricose foi a doença fúngica de maior importância. Essa micose tem sido considerada a principal doença zoonótica de felinos em diversas regiões do mundo (Gremião et al., 2017GREMIÃO, I.D.F.; MIRANDA, L.H.M.; REIS, E.G.; RODRIGUES, A.M. et al. Zoonotic epidemic of sporotrichosis: cat to human transmission. PLoS Pathog., v.13, p.e1006077, 2017.). O índice da doença encontrado no presente trabalho foi de 4,35%, sendo superior ao descrito em estudos semelhantes, que revelaram percentuais entre 0,2% (Rolim. 2017ROLIM, V.M. Causas de mortes em gatos no sul do Brasil. 2017. 60f. Tese (Doutorado em Ciências Veterinárias) - Universidade federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre. RS.) e 2,5% (Togni et al., 2018TOGN, I.M.; CURTIS, A.; VARGAS, D.P.; KOMMERS G.D. et al. Causes of death and reason for euthanasia in cats in the central region of Rio Grande do Sul, Brazil (1964-2013) Pesqui. Vet. Bras., v.38, p.741-750, 2018.). Isso sugere que possam ocorrer condições epidemiológicas mais adequadas ao desenvolvimento do fungo no sul do estado. A possibilidade de ocorrência de epidemia de esporotricose já foi mencionada em um estudo epidemiológico realizado na região (Poester et al., 2018POESTER, V.R., MATTEI, A.S., MADRID, I.M., PEREIRA, J.T.B. et al. Sporotrichosis in Southern Brazil, towards an epidemic? Zoonoses Public Health, v.52, p.815-821, 2018.). Nesse mesmo trabalho, os autores mencionam que, nos últimos sete anos, a enfermidade aumentou em felinos, caninos e no homem, sendo muito importante na saúde pública. Foi observado que o número de casos aumentou significativamente nos últimos 10 anos, com elevação da forma sistêmica da doença nos últimos três anos. No entanto, é provável que esse acréscimo seja em consequência do aumento da eficiência no diagnóstico e do conhecimento da doença entre a população, devido aos trabalhos de conscientização e aos exames gratuitos disponibilizados pelos órgãos de defesa sanitária do município.

Tabela 3
Doenças e agentes bacterianos, fúngicos, virais e parasitários diagnosticados em cadáveres e materiais biológicos de felinos domésticos no sul do Rio Grande do Sul, de 1978 a 2018
Tabela 4
Outras doenças diagnosticadas em cadáveres e materiais biológicos de felinos domésticos no sul do Rio Grande do Sul, de 1978 a 2018

Com relação às doenças bacterianas, as dermatites e as otites foram as mais frequentes, causadas principalmente por Staphylococcus spp., o que demonstra a sua importância na espécie felina. No presente trabalho, dos quatro casos de tuberculose, o Mycobacterium tuberculosis foi identificado genotipicamente em dois casos pela técnica de PCR (reação em cadeia da polimerase) (Alves et al., 2017ALVES, D.M.; MOTTA, S.P.; ZAMBONI, R.; MARCOLONGO-PEREIRA, C. et al. Tuberculose em felinos domésticos (Felis catus) no sul do Rio Grande do Sul. Pesqui. Vet. Bras., v.37, p725-728, 2017.). A infecção por M. tuberculosis em felinos é considerada antropozoonose, uma vez que os felinos infectados podem servir como fonte de infecção para o homem, destacando-se, assim, sua relevância na saúde pública (Gibbens, 2014GIBBENS, N. Mycobacterium bovis infection in cats. Vet. Rec., v.174, p.331-332, 2014). Tem sido mencionado que os casos de tuberculose vêm aumentando consideravelmente nos últimos anos, especialmente nos países em desenvolvimento (Gibbens, 2014; Alves et al., 2017).

Com relação às doenças virais, dos 18 casos de raiva 17 ocorreram até 1988, durante o período em que a raiva urbana não estava erradicada na região sul do RS (Schild et al., 1988SCHILD, A.L.; RIET-CORREA, F.; MENDEZ, M.C.; FERREIRA, J.L.M. et al. Relatório de atividades e doenças da área de influência no período 1978/1987. Bol. Lab. Regional Diag., n.10, 59p., 1988.). Estudos epidemiológicos sobre a ocorrência dessa doença no estado mencionam a gradual redução no número de casos a partir de 1987, devido ao controle da enfermidade com medidas como a vacinação em massa dos caninos e felinos urbanos (Teixeira et al., 2008TEIXEIRA, T.F.; HOLZ, C.L.; CAIXETA, S.P.M.B.; DEZEN, D. et al. Diagnóstico de raiva no Rio Grande do Sul, Brasil, de 1985 a 2007. Pesqui. Vet. Bras. v.28, p.515-520, 2008.). Apenas um caso de raiva em um gato doméstico foi registrado em 2014, porém a fonte de infecção foi um morcego, uma vez que não havia raiva urbana no entorno do foco e surtos de raiva paralítica vinham ocorrendo desde 2008 na região (Marcolongo-Pereira et al., 2011).

A peritonite infecciosa felina (PIF) e a leucemia viral felina (FeLV) apresentaram índices de 7,1% e 2,7%, respectivamente. A ocorrência dessas doenças está diretamente ligada à fácil disseminação viral entre a espécie, devido ao contato direto entre os animais, fato agravado pelo livre acesso à rua (Ludwick e Clymer, 2019LUDWICK, K.; CLYMER, J.W. Comparative meta-analysis of feline leukemia virus and feline immunodeficiency virus seroprevalence correlated with GDP per capita around the globe. Res. Vet. Sci., v.125, p.89-93. 2019.). A baixa incidência de FeLV deve-se, provavelmente, à necessidade de confirmação sorológica, teste nem sempre realizado devido ao seu alto custo (Novo et al., 2016NOVO, S.G.; BUCAFUSCO, D.; DIAZ, L.M.; BRATANICH, A.C. Viral diagnostic criteria for feline immunodeficiency virus and feline leukemia virus infections in domestic cats from Buenos Aires, Argentina. Rev. Argent. Microbiol., v.48, p.293-297. 2016.). Todavia, um fato relevante foi o número expressivo de linfomas que pode estar relacionado à manifestação proliferativa de FeLV (Santos et al., 2013SANTOS, D.L.; LUCAS, R.; LALLO, M.A. Epidemiologia da imunodeficiência viral, leucemia viral e peritonite infecciosa em felinos procedentes de um hospital veterinário: Ciênc. Anim., v.11, p.161-168, 2013.), embora isso não tenha sido confirmado devido à ausência dos testes sorológicos. Por sua vez, PIF é uma enfermidade com lesões macroscópicas e histológicas características (Sapin et al., 2017SAPIN, C.F.; SILVA-MARIANO, L.C.; FIALHO-XAVIER, A.G.; GRECCO-CORRÊA, L. et al. Estudo retrospectivo de dez casos de peritonite infecciosa felina diagnosticados entre 2000-2013 na região sul do rio grande do sul. Sci. Anim. Health, v.4, p.198-207, 2017.) o que permitiu o diagnóstico conclusivo em um maior número de casos.

Com relação às doenças parasitárias, dois felinos foram diagnosticados com dioctofimose, parasitose rara nessa espécie geralmente observada em felinos errantes. Poucos casos de dioctofimose em felinos foram relatados no Brasil (Verocai et al., 2009VEROCAI, G.G.; MEASURES, L.N.; AZEVEDO, F.D.; CORREIA, T.R. et al. Dioctophyme renale (Goeze, 1782) in the abdominal cavity of a domestic cat from Brazil. Vet Parasitol., v.161, p.342-344, 2009.; Rapeti et al., 2017), todos associados a ambientes sujeitos a alagamentos. A região do estudo é de terras úmidas e alagadiças, o que favorece a contaminação dos animais pela ingestão de peixes e rãs infectados pelo hospedeiro paratênico (Verocai et al., 2009). Parasitoses gastrointestinais aparentemente não têm importância em felinos da região, uma vez que a ocorrência foi de 1,4% do total de casos. O fato de a maioria dos felinos encaminhados para diagnóstico ser domiciliada justifica esse baixo número de casos de verminose, já que esses animais, em geral, são vermifugados. Isso é mencionado também em outros trabalhos relacionados às parasitoses em felinos (Dall et al., 2010DALL, L.P.; OTTO, M.A.; SILVA, A.S.; MONTEIRO, S.G. Parasitos gastrintestinais em gatos naturalmente infectados no município de Santa Maria no estado do Rio Grande do Sul, Brasil. Acta Vet. Bras., v.4, p.181-184, 2010.).

A doença renal teve alta frequência neste estudo, sendo diagnosticada em 15,5% dos felinos. No presente trabalho, 73,5% dos casos ocorreram em felinos maiores de sete anos de idade. A etiologia das doenças renais é dificilmente determinada, sendo geralmente relacionada com a idade dos felinos. Estima-se que animais idosos acima de 10 anos de idade sejam mais frequentemente acometidos (Manteigas, 2013MANTEIGAS, F. Causas de mortalidade em gatos com mais de nove anos: estudo retrospetivo de cem casos. 2013. 86f. Dissertação (Mestrado Integrado em Medicina Veterinária) - Faculdade de Medicina Veterinária, Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias, Lisboa, POT.; Togni et al., 2018TOGN, I.M.; CURTIS, A.; VARGAS, D.P.; KOMMERS G.D. et al. Causes of death and reason for euthanasia in cats in the central region of Rio Grande do Sul, Brazil (1964-2013) Pesqui. Vet. Bras., v.38, p.741-750, 2018.).

CONCLUSÃO

Com base no presente estudo, conclui-se que, na região sul do RS, o encaminhamento de felinos para diagnóstico aumentou significativamente após o ano 2000, o que comprova que a espécie passou a ter maior importância como animal de companhia. Concluiu-se, também, que as neoplasias têm papel relevante entre as doenças de felinos, destacando-se o carcinoma de células escamosas e as neoplasias mamárias. Os resultados do estudo permitiram concluir, ainda, que a esporotricose é uma das mais importantes zoonoses na região sul do RS, indicando a possibilidade de aumento na prevalência dessa enfermidade em felinos na região, consequentemente o aumento no risco de transmissão ao homem.

REFERÊNCIAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Nov 2020
  • Data do Fascículo
    Nov-Dec 2020

Histórico

  • Recebido
    26 Set 2019
  • Aceito
    04 Jun 2020
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