A Influência de 25 Sessões de Treino na Capacidade de Tomada de Decisão de Jogadores de Futebol Sub-12

Resumo

O objetivo deste estudo foi verificar a influência de 25 sessões de treino na capacidade de tomada de decisão de jogadores de futebol sub-12. A amostra contou com 25 jogadores de futebol sub-12 de um clube de primeira divisão do Brasil. Avaliou-se a tomada de decisão através da plataforma online TacticUP®. As 25 sessões de treino foram organizadas baseadas nos princípios táticos fundamentais do futebol. Verificou-se correlação positiva (r=0,413, p=0,040) entre a variação do desempenho da tomada de decisão e o tempo de treino para os princípios ofensivos fora do centro de jogo. Conclui-se que o treino melhorou a capacidade de tomada de decisão de jogadores de futebol sub-12, para os princípios de espaço sem bola, mobilidade e unidade ofensiva.

Palavras-chave:
Conhecimento tático; leitura de jogo; desenvolvimento infantil; talento; habilidades perceptivo-cognitivas.

Abstract

The aim of this study was to verify the influence of 25 training sessions on the decision-making skill of U-12 soccer players. The sample was comprised of 25 U-12 soccer players from a first division Brazilian club. Decision making was assessed through the TacticUP® online platform. The 25 training sessions were organized based on the core tactical principles of soccer. There was a positive correlation (r=.413, p=.040) between the performance variation of decision-making and the training time for the offensive principles outside the center of play. It was concluded that training improved the decision-making skill of U-12 soccer players with respect to the tactical principles of width and length without the ball, mobility, and offensive unity.

KEYWORDS:
Tactical knowledge; game reading; child development; talent; perceptual-cognitive skills

Tomar decisões eficientes é uma componente essencial para que atletas consigam alcançar um bom desempenho no esporte (Fortes et al., 2019; Grehaigne et al., 2001). Nesse sentido, a tomada de decisão pode ser definida como o processo de selecionar a resposta mais adequada (ex.: movimentar para o espaço vazio para receber a bola) ou uma ação funcional (ex.: passar ou chutar a bola) a partir de diversas opções, com intuito de atingir um objetivo específico no jogo (Abernethy, 1996; Hastie, 2001). A tomada de decisão também está associada à capacidade de leitura de jogo dos jogadores, que pode ser definida no futebol como a habilidade dos jogadores em perceber e integrar as informações em movimento no campo, incluindo a bola, companheiros de equipe, adversários, bem como as suas ações (Hartigh et al., 2018Teoldo et al. , 2022; Williams & Reilly, 2000). No contexto do futebol, as capacidades de leitura de jogo e tomada de decisão parecem estar associadas ao desenvolvimento esportivo dos jogadores e ao alcance de altos níveis competitivos (Keller et al., 2018; Williams & Reilly, 2000).

Um estudo recente realizado com jogadores australianos de futebol da categoria sub-18 mostrou que atletas de nível nacional (participantes da principal liga do país) tomavam melhores decisões quando comparados a jogadores de nível estadual (participantes de liga estadual) (Keller et al., 2018). Além disso, Cardoso et al. (2020) mostraram que jogadores de futebol de base (idade de 16,7 ± 3,1 anos) que possuíam uma tomada de decisão mais rápida, quando comparados aos seus pares menos rápidos, possuíam melhor capacidade de leitura de jogo, ao utilizarem estratégias de busca visual mais eficientes, e também apresentavam menor esforço cognitivo para tomar decisões. Em outro trabalho, desenvolvido por O’Connor, Larkin e Williams (2016), a capacidade de tomada de decisão foi a variável mais importante, dentre 11 variáveis perceptivo-cognitivas (tomada de decisão, antecipação, probabilidade situacional, reconhecimento de padrões, desempenho perceptivo-cognitivo combinado) e desenvolvimentais (horas acumuladas em atividades de futebol de competição, treinamento coletivo, treinamento individual, jogo deliberado, envolvimento indireto e horas em outros esportes), a diferenciar jogadores sub-15 selecionados e não selecionados para um clube de elite (participantes da liga nacional australiana). Os resultados mostraram que os jogadores selecionados apresentavam melhor capacidade de decisão do que os não selecionados. A partir desses estudos, é possível verificar a importância dessa capacidade para o desenvolvimento de atletas no futebol.

Em relação ao desenvolvimento da capacidade de tomada de decisão, a literatura aponta a importância de atletas vivenciarem ao longo do seu processo de formação uma grande quantidade de prática estruturada (ex.: treino em equipe) no esporte (Berry et al., 2008). Além disso, é necessário que grande parte desse tempo dedicado à prática estruturada contenha atividades que permitam a interação de habilidades perceptivo-cognitivas juntamente com habilidades técnicas, como através da utilização de jogos reduzidos, que permitem um ambiente rico no estímulo da capacidade de leitura de jogo e tomada de decisão dos jogadores (Machado et al., 2017; Machado et al., 2019; O’Connor & Larkin, 2016). Uma outra característica deste componente é a sua ligação direta com a dimensão tática do jogo, uma vez que toda ação no jogo tem um objetivo tático (Garganta, 2009). Um estudo recente mostrou que atividades de treinamento baseada em jogos reduzidos e condicionados, que buscam desenvolver tanto a tática grupal (2x2 até 4x4) quanto a coletiva (5x5 até estruturas maiores), são as principais dentro do treinamento para desenvolver a capacidade de tomada de decisão ofensiva e defensiva em jogadores de futebol de base, quando comparadas às atividades individuais, em duplas e analíticas (Machado et al., 2020).

Nesse sentido, é importante que a capacidade dos atletas de decidirem corretamente seja desenvolvida em consonância com conteúdos táticos preconizados para os diferentes períodos de formação esportiva em que se encontram (González-Víllora et al., 2015). A literatura indica que, para atletas a partir dos 11 anos de idade, torna-se necessário trabalhar conteúdos táticos relacionados aos princípios táticos fundamentais, especialmente aqueles relacionados aos comportamentos fora do centro de jogo (Teoldo et al., 2022). Além disso, o desenvolvimento desse tipo de conteúdo deve estar alinhado com o processo de avaliação contínua (Badari et al., 2021; Barquero-Ruiz et al., 2019). Portanto, é necessário a utilização de instrumentos que sejam capazes de avaliar a capacidade de tomada de decisão dos atletas a partir dos princípios táticos fundamentais, de maneira a alinhar o processo de ensino e avaliação.

Nesse contexto, estudos anteriores se preocuparam em avaliar a efetividade de intervenções no futebol, alinhando o conteúdo de ensino e da avaliação tática a partir dos princípios táticos fundamentais do futebol (Lima et al., 2015; Souza et al., 2014). Em ambos os estudos, buscou-se verificar a efetividade da organização do treino baseado nos princípios táticos fundamentais e no desempenho tático de atletas em categorias sub-13 e sub-14. Foi verificado que a organização do treino levou a uma melhora global do desempenho tático dos jogadores em ambas as categorias.

Apesar de esses estudos indicarem que a organização do treino baseada nesse tipo de conteúdo é capaz de gerar a melhora do desempenho tático dos atletas, a qualidade da decisão não foi um aspecto avaliado. Portanto, se faz necessário verificar se a capacidade de tomada de decisão pode ser influenciada a partir da organização de treino semelhante. Outro ponto que deve ser levado em consideração na sistematização do treino é a sua estruturação levar em consideração as necessidades individuais de melhora dos atletas e não apenas aspectos coletivos da equipe, como ocorreu nos estudos citados acima. Apesar de o futebol ser um esporte coletivo, é importante individualizar o treino em função das necessidades de cada atleta, para que se otimize o tempo de treino e potencialize o desenvolvimento dos jogadores (Andrade et al., 2021).

Dessa forma, um estudo que busque investigar a efetividade da sistematização do treino na capacidade de tomada de decisão dos jogadores, a partir de um processo de individualização do treino dos jogadores em função de suas necessidades, pode subsidiar o trabalho de treinadores e trazer uma nova perspectiva para uma abordagem mais individual no contexto de ensino dos esportes coletivos. Portanto, o objetivo deste estudo é verificar a influência de 25 sessões de treino na capacidade de tomada de decisão de jogadores de futebol sub-12.

Método

Amostra

No presente estudo, foram avaliados 25 jogadores de futebol (idade média de 12,0 ± 0,2 anos) do sexo masculino, da categoria sub-12, que participavam de competições a nível nacional e internacional, de um clube de primeira divisão do campeonato brasileiro. Os atletas possuíam tempo de treino no futebol de 5,4 ± 1,9 anos e tempo no clube de 1,9 ± 1,1 anos. Para inclusão da amostra, era necessário estar aprovado na categoria de base, treinando normalmente durante as quatro sessões de treino semanais, com a carga horária de duas horas por sessão.

Para coleta dos dados, houve autorização prévia dos responsáveis legais dos clubes e dos jogadores. O presente trabalho foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisas com Seres Humanos da Universidade Federal de Viçosa (Parecer: 2.312.402) e atende às normas do Tratado de Ética de Helsinque, estabelecida pelo World Medical Association Declaration of Helsinki (2013) para pesquisas feitas com seres humanos. O termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE) foi obtido pelos responsáveis legais dos participantes.

Instrumentos

O instrumento utilizado para avaliar a capacidade de tomada de decisão dos jogadores foi a plataforma online TacticUP® (Machado & Teoldo, 2020) - www.tacticup.com.br. Essa plataforma permite avaliar a capacidade de tomada de decisão dos jogadores baseado nos princípios táticos fundamentais do futebol da fase ofensiva e defensiva (vide figura 1) (Teoldo et al., 2022). Esses princípios permitem que os jogadores encontrem soluções efetivas para as ações do jogo através da gestão do espaço de jogo e foram escolhidos porque apresentam aspectos centrais do processo de ensino das capacidades táticas. Além disso, esses princípios têm medidas objetivas das movimentações dos jogadores relacionados ao gerenciamento do espaço de jogo.

Figura 1.
Descrição dos princípios táticos fundamentais do futebol: a) ofensivos; e b) defensivos (Fonte: Teoldo, Guilherme & Garganta 2022).

O teste de vídeo do TacticUP® é composto por sequências de vídeo (cenas) de ações ofensivas e defensivas de 11 contra 11, extraídas de jogos oficiais de futebol. Os vídeos são apresentados através de uma perspectiva panorâmica, que é a visão elevada de um objeto, de cima. Essa visão permite que os jogadores visualizem os princípios táticos, próximos ou distantes da bola. O teste é composto por cenas de cada um dos princípios táticos fundamentais, tanto da fase ofensiva quanto defensiva. Para cada cena, são apresentadas quatro possibilidades de soluções para a sequência de vídeos. Os participantes devem escolher a solução mais adequada para cada cena. Antes de iniciar o teste, a plataforma online apresenta instruções aos participantes sobre a estrutura e os procedimentos da avaliação e três cenas de teste são mostradas para que se familiarizem com a tarefa.

Procedimentos

Aplicação do TacticUP®

A avaliação através do TacticUP® ocorreu em dois momentos: i) avaliação diagnóstica da capacidade de tomada de decisão dos jogadores antes do início da aplicação dos treinos sistematizados (maio de 2019); ii) avaliação após o encerramento das sessões de treino (julho de 2019). A primeira avaliação ocorreu logo após o final da primeira competição da categoria no ano de 2019, enquanto a segunda avaliação ocorreu nos dois dias posteriores ao encerramento das 25 sessões de treino.

Os atletas avaliados foram separados em grupos de cinco para a realização do teste. Cada atleta contou com um computador com acesso à internet para acessar a plataforma e executou o teste de forma individual. Todos os computadores disponíveis eram iguais (CPU DELL Optiplex 3020 com processador i5 4570 - 4GB de memória e monitor DELL, tela 18.5) e ficavam em uma mesma sala. O teste foi conduzido pelo pesquisador responsável e levou aproximadamente 25 minutos para avaliação de cada grupo. Todos os atletas foram avaliados em dois dias consecutivos, sempre antes da sessão de treino.

Organização das 25 Sessões de Treino

Após a primeira avaliação realizada com os atletas, foram estruturadas 25 sessões de treino baseadas nas necessidades individuais de melhora ou manutenção da capacidade de tomada de decisão, relacionadas aos princípios táticos fundamentais do futebol. Esses treinos foram planejados semanalmente (quatro treinos por semana) considerando o desenvolvimento dos jogadores nas sessões de treinos anteriores e em competição, percebidos pela comissão técnica. Os atletas foram ranqueados e separados em três grupos de desempenho para cada um dos princípios táticos, baseado nos seus resultados no TacticUP®, sendo os grupos divididos em: i) alto; ii) regular; e iii) baixo.

Durante as 25 sessões de treino organizadas pela comissão técnica, a primeira atividade era focada nos princípios táticos fundamentais do jogo de futebol, buscando a melhora na tomada de decisão dos atletas. Essas atividades tinham o tempo médio de 36,7 ± 7,6 minutos (tempo mínimo = 28 minutos; tempo máximo = 50 minutos) por sessão.

Os objetivos das sessões de treino foram discutidos em reuniões de planejamento entre a comissão técnica no início de cada semana, onde foram direcionados os professores responsáveis para aplicação de cada atividade, assim como a definição dos feedbacks a serem realizados de acordo com os indicadores de desempenho relacionados aos princípios táticos propostos para serem trabalhados em cada sessão de treino (Figura 2). Os feedbacks ocorriam durante o treinamento (sem pausa), pós-treinamento (conversa no quadro tático) e no dia posterior ao treinamento individual, em caso de necessidade.

Figura 2.
Exemplo de planejamento e organização de uma atividade da sessão de treino organizada a partir dos princípios táticos fundamentais.

As interações das atividades foram organizadas de acordo com o nível de desempenho dos atletas (atleta com desempenho alto no princípio X contra atleta com desempenho alto no princípio Y). Essas interações poderiam mudar de acordo com a necessidade do exercício proposto (Figura 2).

Ao término de cada sessão de treino, ocorriam reuniões entre os professores e a coordenação técnica para realizarem o feedback de como ocorreu o desenvolvimento da atividade de cada grupo, além de discutirem possíveis ajustes na estruturação dos exercícios propostos para as próximas sessões de treinamento.

O tempo de treino médio por jogador dos principios táticos durante as 25 sessões estão demostradas na Tabela 1.

Tabela 1.
Média e desvio padrão do tempo de treino dos princípios táticos fundamentais, considerando os 25 jogadores da equipe.

Principíos	Tempo (min)
Ofensivos
Ofensivos dentro do centro de jogo	478,6 ± 140,4
Ofensivos fora do centro de jogo	223,5 ± 76,8
Defensivos
Defensivos dentro do centro de jogo	630,7 ± 192,3
Defensivos fora do centro de jogo	190,6 ± 83,8

O controle do tempo dos conteúdos ministrados nas 25 sessões de treino foi realizado a partir do agrupamento dos princípios táticos em: i) ofensivo dentro do centro de jogo (ODCJ) (penetração, cobertura ofensiva e espaço com bola); ii) ofensivo fora do centro de jogo (OFCJ) (espaço sem bola, mobilidade e unidade ofensiva); iii) defensivo dentro do centro de jogo (DDCJ) (contenção, cobertura defensiva e equilíbrio de recuperação); e iv) defensivo fora do centro de jogo (DFCJ) (equilíbrio defensivo, concentração e unidade defensiva). Este agrupamento foi feito por conta da relação espacial desses princípios com o centro de jogo e a sua relação no seu processo de ensino-aprendizagem. Os princípios táticos realizados dentro do centro de jogo apresentam uma menor complexidade para sua execução comparados aos princípios fora do centro de jogo.

De acordo com Teoldo et al. (2022), o centro de jogo é uma referência espacial dinâmica utilizada para caracterizar o espaço onde o jogo ocorre com maior intensidade/velocidade. O valor do seu raio é de 9,15 metros a partir do epicentro de jogo. Sobre esse espaço, se compreende que a transmissão da bola é facilitada entre os companheiros que estão dentro do centro do jogo, ou que, se respeitada a distância do seu raio pelos oponentes, também facilita a transmissão da bola entre o seu portador e os jogadores que se encontram fora do centro de jogo. No caso dos jogadores que se encontram dentro do centro do jogo, a transmissão da bola fica facilitada, porque a distância entre o portador da bola e o receptor é menor, assim permitindo mais eficiência nas ações técnicas e mais velocidade na transmissão da bola.

Como as atividades e suas interações foram planejadas a partir das necessidades individuais dos jogadores, a quantidade de tempo de treino por cada princípio não foi a mesma para todos os jogadores, considerando as 25 sessões de treino. O tempo de treino em cada um dos princípios táticos para cada jogador pode ser visualizado na Tabela 2.

Tabela 2.
Tempo de treino individual por princípio.

Princípios	Jogadores - tempo por princípio (minutos)
	1	2	3	4	5	6	7	8	9	10	11	12	13	14	15	16	17	18	19	20	21	22	23	24	25
Ofensivos
Penetração	146	166	166	166	146	166	166	146	166	166	166	166	166	166	146	166	166	146	146	146	166	146	146	166	146
Cobertura ofensiva	301	301	349	301	265	265	301	301	265	265	265	349	313	301	301	301	265	265	313	301	265	265	301	301	301
Espaço com bola	66	66	66	66	66	66	66	68	66	66	66	66	66	66	66	66	66	66	66	66	66	66	66	66	66
Espaço sem bola	168	158	138	168	98	168	128	168	153	98	98	138	138	113	168	98	128	128	138	168	168	138	98	153	128
Mobilidade	68	158	68	158	68	68	68	40	85	68	40	68	68	158	68	68	40	113	40	130	40	40	40	85	113
Unidade ofensiva	45	0	45	0	45	0	45	0	0	45	45	45	45	0	45	45	45	0	45	0	45	0	0	0	45
Ofensivos dentro do centro de jogo	513	533	581	533	477	497	533	513	497	497	497	581	545	533	513	533	497	477	525	513	497	477	513	533	513
Ofensivos fora do centro de jogo	281	316	251	326	211	236	241	208	238	211	183	251	251	271	281	211	213	241	223	298	253	178	138	238	286
Defensivos
Contenção	398	418	408	378	468	378	418	426	406	448	476	408	408	448	398	448	446	438	456	426	406	456	496	406	466
Cobertura defensiva	210	210	210	210	294	294	210	210	254	246	246	210	246	294	258	258	294	246	246	218	206	254	180	140	228
Equilíbrio de recuperação	0	0	0	0	0	0	85	0	0	45	0	0	0	0	40	0	85	0	0	0	45	45	0	0	85
Equilíbrio defensivo	76	116	266	116	261	121	116	76	116	171	306	221	251	116	76	291	116	116	161	116	116	161	236	116	116
Concentração	28	28	28	28	28	28	28	28	28	28	28	28	28	28	28	28	28	28	28	28	28	28	28	28	28
Unidade defensiva	0	45	0	45	0	45	0	45	45	0	0	0	0	45	0	0	0	45	0	45	0	45	45	45	0
Defensivos dentro do centro de jogo	608	628	618	588	762	672	713	636	660	739	722	618	654	742	696	706	825	684	702	644	657	755	676	546	779
Defensivos fora do centro de jogo	104	189	294	189	289	194	144	149	189	199	334	249	279	189	104	319	144	189	189	189	144	234	309	189	144

Além disso, os conteúdos (princípios táticos) trabalhados por cada sessão de treino podem ser visualizados no Tabela 3.

Tabela 3.
Princípios táticos trabalhados e tempo de treino por sessão.

Sessão	Princípios táticos trabalhados	Tempo (min)
1	Penetração; Contenção	48
2	Mobilidade; Contenção	28
3	Cobertura Defensiva; Cobertura Ofensiva	36
4	Espaço sem bola; Equilíbrio Defensivo	36
5	Espaço sem bola; Equilíbrio Defensivo	36
6	Mobilidade; Contenção; Equilíbrio Defensivo	40
7	Equilíbrio Defensivo, Espaço sem bola; Contenção	40
8	Cobertura Ofensiva; Contenção	50
9	Cobertura Defensiva; Contenção	48
10	Equilíbrio Defensivo; Equilíbrio de Recuperação	40
11	Unidade Defensiva; Unidade Ofensiva	45
12	Equilíbrio Defensivo, Contenção; Espaço sem bola	30
13	Cobertura Ofensiva; Contenção; Cobertura Defensiva	30
14	Cobertura Ofensiva; Contenção; Cobertura Defensiva	40
15	Mobilidade; Equilíbrio Defensivo; Equilíbrio de Recuperação	45
16	Espaço sem bola; Cobertura Defensiva; Espaço com bola	30
17	Espaço sem bola; Penetração; Concentração	28
18	Espaço sem bola; Cobertura Ofensiva; Cobertura Defensiva	40
19	Penetração; Espaço com bola; Contenção	30
20	Cobertura Ofensiva; Contenção	40
21	Cobertura Ofensiva; Contenção	40
22	Cobertura Ofensiva; Mobilidade; Equilíbrio Defensivo	45
23	Penetração; Contenção	30
24	Cobertura Defensiva; Contenção; Penetração	30
25	Cobertura Defensiva; Espaço sem bola; Contenção	40

Análise Estatística

Para a análise estatística dos dados, inicialmente foi calculada a variação do desempenho dos jogadores considerando a avaliação realizada antes do início da intervenção e após o término da intervenção. O cálculo foi realizado através da conta (([resultado pós intervenção] - [resultado pré intervenção])/[resultado pré intervenção]) e o resultado foi expresso em percentual. Para cada jogador, os valores gerados a partir deste cálculo poderiam ser positivos em caso de aumento do valor da capacidade de tomada de decisão, ou negativos em caso de diminuição do valor da capacidade de tomada de decisão. Esse cálculo foi realizado considerando o agrupamento dos princípios em ODCJ, OFCJ, DDCJ e DFCJ.

A partir desse resultado, foi verificada a distribuição dos dados através do teste de Shapiro-Wilk. A relação entre a variação do desempenho e o tempo de treino acumulado nas 25 sessões foi calculada através da correlação de Pearson. O nível de significância utilizado foi de p <0,05. Para interpretação do tamanho de efeito, foram consideradas as referências de Cohen (1988, 1992) para o valor de “r”: baixo (0,01-0,29); moderado (0,30-0,49) e alto (0,50-1,00). O software utilizado para análise foi o SPSS® versão 22.0.

Resultados

A Tabela 4 apresenta os resultados da correlação entre a variação do desempenho na capacidade de tomada de decisão e o tempo de treino nas 25 sessões, considerando o agrupamento dos princípios táticos fundamentais de jogo em ofensivo dentro do centro de jogo (ODCJ), ofensivo fora do centro de jogo (OFCJ), defensivo dentro do centro de jogo (DDCJ) e defensivo fora do centro de jogo (DFCJ).

Tabela 4.
Correlação entre a variação do desempenho na capacidade de tomada de decisão e o tempo de treino acumulado nas 25 sessões.

Variação Desempenho	Tempo de treino
	ODCJ	OFCJ	DDCJ	DFCJ
Ofensivo dentro do centro de jogo	0,009	-	-	-
Ofensivo fora do centro de jogo*	-	0,413	-	-
Defensivo dentro do centro de jogo	-	-	0,035	-
Defensivo fora do centro de jogo	-	-	-	0,138

• ^* p < 0,05. ODCJ = Ofensivo dentro do centro de jogo; OFCJ = Ofensivo fora do centro de jogo; DDCJ = Defensivo dentro do centro de jogo; e DFCJ = Defensivo fora do centro de jogo.

Os resultados apontaram uma correlação positiva e moderada entre a variação de desempenho relacionado aos princípios ofensivos fora do centro de jogo e o tempo de treino (r=0,413; p=0,040) destinado a esses mesmos princípios (OFCJ).

Discussão

Este estudo teve como objetivo verificar a influência de 25 sessões de treino na capacidade de tomada de decisão de jogadores de futebol sub-12. Os resultados apontaram uma correlação positiva entre a variação de desempenho da capacidade de tomada de decisão com o tempo de treino destinado para os princípios táticos fundamentais realizados fora do centro de jogo (espaço sem bola, mobilidade e unidade ofensiva). Esses princípios estão relacionados às ações ofensivas mais distantes da bola, como: i) a organização das linhas de ataque atrás da linha da bola (unidade ofensiva); ii) as movimentações à frente da linha da bola que permitam passes mais longos em largura e profundidade (espaço sem bola); e iii) as movimentações realizadas nas costas da última linha defensiva (mobilidade).

Estes resultados indicam a importância da individualização dos estímulos dados no processo de treino, relacionados às necessidades individuais dos jogadores, assim como foi estruturado neste estudo (Teoldo & Machado, 2022). Essa individualização deve estar em consonância com os conteúdos preconizados para a fase de desenvolvimento dos atletas que, se tratando de uma equipe sub-12, estão relacionados aos princípios táticos fundamentais do futebol, considerando a componente tática (Teoldo et al., 2022). Além disso, esses resultados apontam que jogadores dessa faixa etária já estão aptos a desenvolverem a capacidade de tomada de decisão relacionada aos princípios fora do centro de jogo, assim como sugerido previamente pela literatura (Américo et al., 2016).

Teoldo et al. (2022) destacam que os princípios táticos fundamentais de jogo requerem pensamento abstrato e testagem de hipótese para o preenchimento de espaço e movimentação em campo. Dessa forma, preconiza-se que eles devem ser o foco do ensino da componente tática por volta dos 11 ou 12 anos, especialmente dos princípios realizados fora do centro de jogo, quando o estágio de desenvolvimento cognitivo da criança já está maduro ou em fase final de maturação (Gallahue et al., 2013; Piaget, 1964).

Outro aspecto a ser considerado é que essa etapa de formação deve ser utilizada para o treinador promover a descentralização dos jogadores em relação à bola, como em ações realizadas fora do centro de jogo (González-Víllora et al. 2012). Os resultados desse trabalho suportam essa recomendação através de dados empíricos, reforçando a importância de já nessa faixa etária dar início aos conteúdos mais distantes da bola (fora do centro de jogo) nas sessões de treino, uma vez que os jogadores demonstram capacidade de assimilação dos mesmos (González-Víllora et al. 2012).

Dessa forma, a aplicação sistematizada desses conteúdos táticos poderá contribuir de forma positiva para o desempenho dos atletas dessa faixa etária, principalmente para a sua organização coletiva (Lima et al. 2015). Assim, a sistematização dos conteúdos e das interações dos jogadores nos exercícios com o intuito de solucionar problemas táticos, buscar a compreensão dos espaços de jogo e estimulação da capacidade de tomada de decisão promove melhorias significativas na aprendizagem tática dos jogadores nas fases iniciais de desenvolvimento. Isso contribui para a formação de jogadores capazes de solucionar com rapidez e eficácia as situações-problema decorrentes de um jogo (Aquino et al. 2015).

Em relação aos resultados que não apresentaram correlação significativa entre a variação de desempenho da capacidade de tomada de decisão e o tempo de treino, estão tanto os princípios ofensivos e defensivos dentro do centro de jogo como os princípios defensivos fora do centro de jogo. Em relação aos resultados encontrados para os princípios dentro do centro de jogo, eles podem estar relacionados ao maior nível de desempenho esperado para os princípios dentro do centro de jogo, quando comparados aos princípios fora do centro de jogo para essa faixa etária (Teoldo et al., 2010). Isso ocorre devido ao grande volume de estímulos que ocorrem próximos da bola (dentro do centro de jogo) serem realizados nos treinos desde idades mais novas (ex.: a partir de 4 e 5 anos) no desenvolvimento esportivo (Teoldo et al., 2010).

Além disso, pesquisas ressaltam, que nesse período de formação (aproximadamente até os 12 anos de idade), os jogadores querem ser protagonistas do jogo e jogar diretamente com a bola, tendendo a ficar mais focados em aprender a técnica do jogo (eu-bola) sem levar em conta as soluções de problemas distantes da bola (González-Víllora et al., 2010; González-Víllora et al., 2011; González-Víllora et al., 2012). Também observa-se que, nessa faixa etária, os jogadores respondem de forma mais eficiente às ações do jogo quando estão agindo diretamente sobre a bola (González-Víllora et al., 2010). Essa característica aparentemente está associada ao fato de o maior tempo de ensino ser focado majoritariamente sobre este tipo de conteúdo (ações próximas da bola). Portanto, o maior tempo de estímulo que tiveram ao logo da formação leva ao acúmulo de conhecimento sobre essas ações.

Dessa forma, observa-se a tendência dos jogadores apresentarem um nível de conhecimento e desempenho sobre essas ações próximas da bola mais desenvolvidos comparadas à ações distantes da bola (González-Víllora et al., 2010). Como a realização dessas ações próximas da bola estão mais consolidadas, é provável que seja necessário um maior tempo de estímulo de treino para que eles evoluam nesta componente (Mesquita et al., 2012). Isto pode explicar o fato de não ter sido observada uma relação significativa entre o tempo de treino e a variação do desempenho na capacidade de tomada de decisão para os princípios dentro do centro de jogo (ofensivo e defensivo).

Em relação ao resultado do tempo de treino dos princípios defensivos fora do centro de jogo não apresentar correlação significativa com a variação de desempenho da capacidade de tomada de decisão, ele pode estar associado a alguns fatores. Entre eles, podemos destacar que essa categoria de princípios foi a que teve menor tempo de estímulos durante as sessões de treino dentre as quatro categorias de princípios (vide tabela 1). Além disso, o foco das intervenções nos treinos foi destinado principalmente para a fase ofensiva do jogo, deixando a fase defensiva como foco secundário. Outra possível explicação está relacionada à capacidade de tomada de decisão na fase defensiva, que aparentemente se desenvolve mais lentamente quando comparada à fase ofensiva, como demonstrado por diversos estudos (González-Víllora et al., 2010; González-Víllora et al., 2011; González-Víllora et al., 2013).

Como limitação do trabalho, pode-se citar o fato de não ter sido utilizada uma progressão pedagógica dos conteúdos, iniciando com os conteúdos menos complexos (princípios táticos fundamentais dentro do centro de jogo) para os mais complexos (princípios táticos fundamentais fora do centro de jogo). Esse tipo de estratégia pode ser utilizado em estudos futuros. Além disso, sugere-se, para estudos posteriores, o aumento de tempo dos exercícios e do número de sessões de treinos com base nos princípios táticos fundamentais entre os períodos de testes. Também pode ser utilizada uma ênfase maior nos exercícios com conteúdos táticos fora de centro de jogo (especialmente os defensivos), visando assim investigar o efeito de um volume maior de estímulos desses conteúdos nessa faixa etária. Por fim, sugere-se desenvolver protocolo semelhante de intervenção em outras categorias etárias, outros níveis competitivos (ex.: escolas de futebol) e diferentes modalidades de esportes coletivos.

Implicações Práticas

Considerando os resultados deste estudo, de maneira geral, é possível constatar que a organização dos exercícios de treino considerando os princípios táticos fundamentais do futebol na categoria sub-12 permitem melhorar a capacidade de tomada de decisão dos atletas, especialmente em ações ofensivas fora do centro de jogo. Esta melhora parece estar relacionada à aquisição do conhecimento e melhora na capacidade de leitura de jogo pelos jogadores (Hartigh et al., 2018; O’Connor et al., 2017). Aparentemente, é possível alcançar esses resultados uma vez que esses conteúdos sejam organizados e treinados, levando em consideração informações objetivas sobre as características individuais dos jogadores e suas necessidades de melhora (Teoldo et al., 2021). Esses achados podem subsidiar o trabalho de coordenadores e treinadores de programas de ensino de esportes coletivos para utilizarem uma abordagem focada nas necessidades individuais dos participantes.

Portanto, este trabalho mostra a efetividade da sistematização de sessões de treino (baseada nos princípios táticos fundamentais do futebol) para a melhora da tomada de decisão de jogadores de futebol sub-12. Além disso, ele aponta que jogadores entre 11 e 12 anos de idades já estão aptos a aprender conteúdos de futebol que requerem pensamento abstrato para sua operacionalização. A literatura indica por meio de trabalhos teóricos (Teoldo et al., 2022; Teoldo et al., 2009) que os jogadores dessa idade (11 e 12 anos) estariam aptos a ter o início do ensino desses conteúdos abordados neste estudo (princípios táticos fundamentais do futebol). Entretanto, pelo que sabemos, este é o primeiro trabalho empírico realizado com jogadores dessa idade para testar este pressuposto teórico de que há aprendizado destes conteúdos nessa idade, e, portanto, contribui com a literatura científica, dando sustentação para essa diretriz de ensino.

Em relação ao contexto competitivo, esse tipo de intervenção pode contribuir para maior entendimento relacionado à capacidade de leitura de jogo das ações individuais e coletivas do jogo por parte dos atletas. Também permite colaborar de forma positiva para a maior organização e distribuição da equipe no espaço de jogo, além de maior percepção, interpretação e decisões mais assertivas para soluções de problemas táticos próximos e distantes da bola apresentados durante uma partida.

Resumidamente, verificamos que os jogadores da categoria sub-12 de alto nível competitivo (equipe que participa de competições nacionais/internacionais) já estão aptos a aprender conteúdos relacionados aos princípios táticos ofensivos fora do centro de jogo (espaço sem bola, mobilidade e unidade ofensiva). Além disso, a utilização desse tipo de sistematização permite otimizar o tempo de treino para os jogadores, uma vez que as atividades levam em consideração o que os jogadores necessitam evoluir individualmente, baseado em avaliações objetivas da sua capacidade de tomada de decisão. Isto subsidia a utilização desse tipo de metodologia por coordenadores e treinadores de programas de ensino de esportes coletivos. Em função da organização dos treinos ter um foco nas necessidades individuais dos jogadores, há uma necessidade maior de planejamento dos exercícios e objetivos de treino, assim como maior integração por parte da comissão técnica para operacionalizar esta proposta.

Conclusão

Conclui-se que 25 sessões de treino baseadas nos princípios táticos fundamentais melhorou a capacidade de tomada de decisão de jogadores de futebol sub-12, no que se refere às movimentações de jogo fora do centro de jogo. Essa melhora está associada principalmente à capacidade de tomada de decisão relacionadas aos princípios táticos fundamentais ofensivos realizados fora do centro de jogo (espaço sem bola, mobilidade e unidade ofensiva). Em outras palavras, isso significa que, quanto mais tempo dedicado ao treino desses princípios, maior foi a variação positiva do desempenho na capacidade de tomada de decisão para esses princípios.

Agradecimentos

O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001. Este estudo também foi financiado pela Lei de incentivo ao Esporte do Governo de Minas Gerais, pelo Programa Academia & Futebol do Ministério da Cidadania, através da Secretaria Nacional de Futebol e Defesa dos Direitos do Torcedor, pela FAPEMIG, CNPQ, FUNARBE e pela PPG, CCB e Reitoria da Universidade Federal de Viçosa.

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  22 Ago 2022
• Data do Fascículo
  2022

Histórico

• Recebido
  04 Abr 2020
• Aceito
  27 Fev 2021