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Language and globalization

RESENHA REVIEW

Resenhado por Jorge França de Farias Jr* * Doutor em Lingüística pelo Instituto de Estudos da Linguagem, da Universidade Estadual de Campinas. No período de setembro de 2006 e setembro de 2007 foi Pesquisador Visitante no Centro de Linguagem, Interação e Cultura, do Departamento de Antropologia, da Universidade da Califórnia - Los Angeles. O estágio no exterior foi financiado pela Agência de Fomento do Governo Brasileiro - CAPES, sob processo de número 147406-5.

UNICAMP / UCLA / CAPES. E-mail: jorge@iel.unicamp.br

PALAVRAS-CHAVE: linguagem; globalização; mídia.

KEY-WORDS: language; globalization; media.

FAIRCLOUGH, N. 2006. Language and globalization. London: Routledge, 186 p. ISBN 978-0-415-31765-8

A partir da leitura do livro, Language and Globalization, de autoria de Norman Fairclough (2006), apresento uma discussão sucinta e pontual dos aspectos específicos que norteiam esta obra em cada capítulo e trago à luz, de forma geral, a idéia central do seu trabalho. Pretendo, também, focar minha discussão nos pontos fundamentais que estão presentes neste estudo como um todo e os quais nos permitem entender a contribuição deste livro para o campo dos estudos da linguagem.

O livro divide-se em 7 capítulos, além da introdução e da conclusão, nos quais o tema central é a explicação de como se estabelece a relação entre linguagem e globalização em todos os seus níveis e a relação com o sentido do que vem a ser nação. A obra de Fairclough apresenta as terminologias desta relação e sua importância para áreas interdisciplinares dentro dos estudos de linguagem, especialmente, Lingüística e Lingüística Aplicada, Ciência Política e Análise Crítica do Discurso, dentre outros.

Ao abordar a principal temática que envolve linguagem e globalização, Fairclough explora os efeitos da inter-relação entre estes dois conceitos-chave. Este autor adota uma combinação da Análise Crítica do Discurso com o impacto de aspectos políticos, culturais e econômicos que regem as relações entre discurso e outras dimensões da globalização. Usando exemplos de diversos países, tais como Estados Unidos da América, Inglaterra, Romênia, Hungria e Tailândia, este livro mostra como a análise de textos discursivos pode ser coerentemente integrada dentro das análises que envolvem economia e política.

É fundamentalmente importante, para Fairclough, ao discutir o conceito de globalização, levar em consideração que a linguagem socialmente construída pela mídia aborde particularmente uma discussão sobre guerra e terrorismo. O autor chama a atenção para o termo "war on terror", no qual a questão do terrorismo é fator primordial para o entendimento do conceito de globalização.

No capítulo primeiro, o autor revisa posições assumidas na literatura acadêmica sobre discurso como um aspecto ou elemento da globalização. Há uma abordagem geral deste campo de estudo, seu escopo, seu foco e sua significância. A partir da leitura deste capítulo é possível compreender a diferenciação feita pelo autor de quatro posições que a literatura acadêmica assume sobre discurso enquanto elemento ou faceta da globalização, a saber: (i) objetivista - por tratar a globalização simplesmente como um fato objetivo, no qual o discurso tanto ilumina quanto obscurece, tanto representa quanto se omite dessa função; (ii) retoricista - por focar o aspecto sobre como os vários discursos da globalização são usados, por exemplo, quando políticos persuadem o seu público por meio de seus pontos de vista particulares sobre determinado assunto; (iii) ideologicista - por mostrar como os discursos da globalização sistematicamente contribuem para a legitimação de uma ordem particular global, a qual incorpora assimetricamente as relações de poder que ocorrem entre e dentro de diversos países; e, (iv) construtivista social - por reconhecer, no geral, o caráter socialmente construído da vida coletiva e suas formas de globalização particulares, além de ver o discurso com significantes efeitos causais no processo de construção social.

A partir destas quatro posições que permeiam discurso e globalização, saliento a importância desse capítulo para entendermos o caráter de poder inerente que forma-se em torno do discurso da mídia. Para observar isso mais detalhadamente, o autor apresenta em seu estudo três pontos que envolvem a importância da linguagem no processo da globalização. Segundo Fairclough (2006:03-04), a linguagem no processo de globalização envolve (i) redes conectivas e interacionais que ultrapassam os limites espaciais por meio de formas particulares que o autor chama de genre da comunicação e que são fundamentais para a interação global com fluxos de representação, narrativa e discurso. Neste sentido a linguagem, segundo o autor, é globalizante e globalizada; (ii) uma importante distinção dos processos atuais e das tendências de globalização e dos discursos sobre globalização; e, (iii) uma distinção fundamental sobre este tema, entre o fato de se considerar a relação presente nos processos atuais e nos discursos sobre globalização.

O segundo capítulo prende-se na apresentação de conceitos básicos que aproximam os tópicos de globalização e linguagem, na qual a versão da análise crítica do discurso incorpora uma aproximação entre os conceitos de cultura, economia e política. Para Fairclough, uma economia do ponto de vista político difere-se de uma economia clássica que é vista neste livro a partir de sistemas e mudanças econômicas politicamente condicionadas e incorporadas pela dependência às formas e aos sistemas políticos. Por sua vez, a consideração do condicionante 'cultura', em termos gerais, aponta para o fato de que os objetos de uma opinião política e econômica são socialmente construídos.

A meu ver, este capítulo é importante porque nos permite entender a relação que se estabelece entre a disciplina da análise do discurso e os discursos construídos sobre o que vem a ser entendido por globalização, visto que: a) o discurso pode representar a globalização, dando ao povo informação sobre esse processo e contribuindo para seu entendimento; b) o discurso pode representar de forma errônea esse conceito ou mesmo mistificá-lo; c) o discurso pode ser usado retoricamente para projetar uma visão particular da globalização, na qual pode justificar e legitimar ações políticas por meio de estratégias, normalmente hegemônicas, de agências e agentes sociais particulares; d) o discurso pode contribuir para constituição, disseminação e reprodução de ideologias - mistificando ou não as formas pelas quais o poder se estabelece; e, e) o discurso pode gerar representações imaginárias de como o mundo será ou deveria ser de acordo com as estratégias de mudanças do poder hegemônico.

No capítulo terceiro, Fairclough discute estratégias e discursos da globalização de agências públicas governamentais e não-governamentais, focando sobre a estratégia internacional de controle dominante por meio dos discursos sobre a globalização neoliberal. Ainda para este autor, a teorização de estratégias dentro da economia política e cultural é sempre elaborada dentro e por meio de discursos. Ou seja, para Fairclough, os discursos são associados com diferentes estratégias e por meio de análises de textos. O autor ainda fala do discurso globalista da globalização, dada à posição de dominância internacional que a estratégia de globalismo tem alcançado por meio de um discurso dominante ou hegemônico.

Esse capítulo é primordial para entendermos a locomoção e fluidez do conceito de globalização nos tempos atuais. Aqui, Fairclough cita Steger e seus seis centros de fundamental importância para o chamado globalismo. Steger (2005) apud Fairclough (2006:40) apresenta um resumo geral referente à globalização pelas seguintes afirmações: (i) globalização trata da questão da liberalização e integração global de mercados; (ii) globalização é inevitável e irreversível; (iii) não há responsáveis pela globalização; (iv) globalização beneficia a todos; (v) globalização contribui para o espalhamento do sentido de democracia no mundo; (vi) globalização permite o domínio hegemônico por meio do terrorismo.

O quarto capítulo é todo estruturado na intenção de expor análises do impacto que o processo de globalização tem sobre entidades espaciais específicas, tais como (nação-estado, cidade, região etc.), por meio do que o autor chama de re-scaling. Isto é, pelo replanejamento das relações de escalas de atividade e interação entre o local, o nacional e o internacional. Seus exemplos são construídos por meio de um estudo da entidade nacional (Romênia) e suas reposições em relação às escalas globais e macro-regionais da União Européia e de materiais de agências governamentais. A importância desse capítulo recai no fato de entendermos globalização não somente como um assunto dentro de uma escala global, mas também como um novo assunto que envolve escalas globais, escalas locais e mudanças amplas entre as escalas sociais e suas relações entre elas.

O que me chamou a atenção nesse capítulo foi o aspecto relacionado à identidade e seu processo de alteridade, visto que o mesmo atrela-se ao conceito de diferença entre as nações. O autor, embora não discuta essa questão em si, deixa-nos a mercê do foco do debate de questões que envolvem uma política de identidade. Tal discussão é ponto primordial nos estudos sobre linguagem e, também, globalização, já que tendemos a fazer comparações entre nossa própria cultura e as de outros povos quando interagimos com o outro, com o diferente. Um exemplo disso é quando pessoas hierarquicamente mais abastadas observam e se comparam às pessoas menos privilegiadas economicamente, sempre observando o outro como diferente de si mesmo. Neste sentido, o que existe na globalização entre nações é uma comparação entre os modos de vida de outros povos que 'eu estou observando e o meu próprio'. Mas, a meu ver, esse capítulo também leva-nos a uma comparação no sentido mais amplo, uma idéia de que o modo de viver comunitário é representativo de um conjunto de opções, por modos de organizações que são muito mais variados do que as opções oferecidas.

Já no capítulo quinto, Fairclough trata da questão da mídia e da mediação, as quais são aspectos amplamente importantes e influentes no processo de replanejamento sóciopolítico de uma nação. Nesse capítulo, o foco recai sobre as agências públicas. Para esse autor, a mídia de comunicação de massa tem um importante papel na constituição das novas escalas, na transformação da relação entre escalas, no replanejamento das entidades espaciais e na construção e consolidação de um novo 'fix' entre um regime de acumulação e um modo de regulação social. Todos esses processos dependem da disseminação social de discursos, narrativas, idéias, práticas, valores etc., sobre suas legitimações, sobre suas posições e ou, pelo menos, suas aquiescências e mudanças. O segundo ponto desenvolvido pelo autor e que me despertou interesse é o fato de que nas sociedades contemporâneas a comunicação de massa é um campo social primordial para a agência destes processos de poder discursivo e a mediação é seu primeiro mecanismo.

A partir dessa abordagem da importância que a mídia vem tendo por meio da globalização, acredito que Fairclough contribui para entendermos a questão da mediação de forma imbricada com os conceitos de globalização e globalismo.

No capítulo seguinte, o sexto, o autor discute as estratégias com as quais o povo lida com suas vidas comuns em localidades específicas (cidades, centros urbanos, lugarejos etc.) e como essas pessoas comuns desenvolvem recursos sociais num mundo globalizado. Além disso, o autor ainda aponta para os efeitos dessas estratégias sobre a globalização que é definida em suas palavras como 'globalization from below', ou 'grounded globalization' (p.121).

Esse capítulo é importante por apontar estratégias de agentes sociais em lugares específicos ao buscarem defesa contra os efeitos negativos da globalização ou encontrarem vantagens para novas possibilidades oferecidas por esses processos. Isso inclui estratégias e alternativas contra o globalismo e mais, especificamente, questões relevantes entre o sentido de local e global e suas identificações.

Por fim, no capítulo sétimo, o autor lida com os conceitos de guerra e terrorismo a partir de exemplos extraídos de agências governamentais. O autor usa o termo 'war on terror' como um termo que tem uma proximidade de vínculo com a recente história da globalização. O autor enfoca neste capítulo as mudanças atuantes causadas pela violência, pelo conflito e pela guerra como parte do processo de terrorismo. Fairclough ainda apresenta sua discussão neste momento por meio do estudo da posição do Presidente George W. Bush diante dos ataques ao World Trade Center, em Nova Iorque, e ao Pentágono, em Washington, em 2001.

Esse capítulo, a meu ver, tem como ponto de partida a idéia de que os processos de linguagem que foram mobilizados pela mídia, para "falar" dos eventos do terrorismo, têm como fundamento conceitos cujos limites foram legitimados previamente pelo discurso hegemônico americano, mais precisamente, a partir do momento em que os Estados Unidos tornaram-se a superpotência mundial. Estes discursos surgiram como instrumentos para a demarcação das novas fronteiras, no que diz respeito às atuais tensões do mundo. Surgiram como parâmetros para se pensar os novos conflitos mundiais e para definir os traços do que está sendo significado como a nova ameaça do chamado mundo livre e democrático.

Em suma, bem estruturado e sério no que propõe, o estudo do autor flui a partir do propósito de apresentar um tratamento vasto sobre o que vem a ser globalização, o que isso inclui e o que exclui, o que é enfatizado e o que é deixado para trás. Uma importante contribuição do autor para o campo de estudo da globalização recai na discussão acerca do conceito chave de globalismo (Steger 2005 e Saul 2005), por meio do qual a estratégia e o discurso da globalização têm se tornado mais e mais influente e tem tido mais efeitos nos processos de mudanças atuais entre países, agências internacionais e corporações hegemônicas. O autor desenvolve o tema com bastante clareza e concisão, na medida em que, tanto mostra os dados analisados anteriormente por outros estudiosos, como Falk, Steger, Saul, dentre outros, como os seus próprios dados sobre o campo da linguagem e globalização.

Recebido em agosto de 2007

Aprovado em março de 2008

  • FALK, R. 1999. Predatory Globalization: A Critique Cambridge: Polity Press.
  • SAUL, J.R. 2005. The Collapse of Globalism and the Reinvention of the World. London: Atlantic Books.
  • STEGAR, M. 2005. Globalism: Market Ideology meets Terrorism Lanham: Rowman and Littlefield.
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    Doutor em Lingüística pelo Instituto de Estudos da Linguagem, da Universidade Estadual de Campinas. No período de setembro de 2006 e setembro de 2007 foi Pesquisador Visitante no Centro de Linguagem, Interação e Cultura, do Departamento de Antropologia, da Universidade da Califórnia - Los Angeles. O estágio no exterior foi financiado pela Agência de Fomento do Governo Brasileiro - CAPES, sob processo de número 147406-5.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      17 Set 2009
    • Data do Fascículo
      2008
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