Open-access Plastia cirúrgica de óstio coronariano esquerdo com estenose não aterosclerótica

Surgical ostial angioplasty of non-atherosclerotic left coronary artery stenosis

Resumos

Discute-se o caso clínico de um paciente homem, 38 anos, com insuficiência cardíaca classe IV (NYHA) e angina de repouso em razão de insuficiência aórtica severa, oclusão de óstio da artéria coronária direita e lesão subtotal do óstio da artéria coronária esquerda, em razão de aortite de origem luética. O tratamento constituiu-se de prótese aórtica mecânica e plastia do óstio coronariano esquerdo com "telhado" de veia safena. A evolução clínica pós-operatória foi excelente, tendo o paciente retornado à vida ativa e sem sintomas.

Artérias coronárias; Aorta; Revascularização miocárdica; Valva aórtica; Valva aórtica; Implante de prótese de valva


A clinical case of a 38 year old male, with heart failure grade IV (NYHA) and angina at rest related to severe aortic regurgitation, right coronary ostial occlusion, and a sub-total occlusion of the left coronary ostium owing to syphilitic infection in the past is reported and discussed. Treatment was established implanting a mechanical aortic prosthesis and a direct left main angioplasty suturing a patch made of safenous vein. Follow up has been excellent and the patient is today having a normal life, free of symptoms.

Coronary arteries; Aorta; Myocardial revascularization; Aortic valve prosthesis; Aortic valve; Heart valve prosthesis; Aortic valve stenosis


Plastia cirúrgica de óstio coronariano esquerdo com estenose não aterosclerótica

Fábio ARGENTA*, George WINCKLER*, Marcelo Kuhn MOMOLLI*, Roque FALLEIRO*, Luís Sérgio FRAGOMENI*

RBCCV 44205-521

Argenta F, Winckler G, Momolli M K, Falleiro R, Fragomeni L S - Plastia cirúrgica de óstio coronariano esquerdo com estenose não aterosclerótica. Rev Bras Cir Cardiovasc 2000; 15(4): 345-8.

RESUMO: Discute-se o caso clínico de um paciente homem, 38 anos, com insuficiência cardíaca classe IV (NYHA) e angina de repouso em razão de insuficiência aórtica severa, oclusão de óstio da artéria coronária direita e lesão subtotal do óstio da artéria coronária esquerda, em razão de aortite de origem luética. O tratamento constituiu-se de prótese aórtica mecânica e plastia do óstio coronariano esquerdo com "telhado" de veia safena. A evolução clínica pós-operatória foi excelente, tendo o paciente retornado à vida ativa e sem sintomas.

DESCRITORES: Artérias coronárias, cirurgia. Aorta, insuficiência. Revascularização miocárdica, cirurgia. Valva aórtica, prótese. Valva aórtica, cirurgia. Implante de prótese de valva.

INTRODUÇÃO

A incidência de estenose de óstio coronariano (EOC) em duas grandes séries de mais de quatro mil pacientes submetidos a angiografia coronariana foi de 0,13% e 0,25% (1,2). Em dois outros estudos, EOC isolada foi encontrada, em somente 0,07% e 0,09% dos mais de sete mil pacientes submetidos a coronariografia (3,4). Estas lesões têm sido mais freqüentemente causadas por doença aterosclerótica da aorta, confirmadas por autópsia e exame anatomopatológico(3,5). Entre as causas menos comuns de EOC, podem-se citar a aortite luética, a arterite de Takayasu, a displasia fibromuscular, a doença da valva aórtica, a hipercolesterolemia familiar e a doença congênita da aorta (1,3,5,6).

A técnica de correção cirúrgica usual dessas lesões é o bypass coronariano, usando-se enxertos arteriais como artéria torácica interna (ATI), radial e gastroepiplóica ou a veia safena (VS). Entretanto, a plastia cirúrgica do óstio coronariano pode ser, em casos selecionados, a alternativa ideal para restabelecer o fluxo coronariano em pacientes acometidos de lesão única no óstio coronariano (6,7).

Descreve-se, aqui, o caso de um paciente com aortite de origem luética com oclusão do óstio da artéria coronária direita e com lesão subtotal do óstio da artéria coronária esquerda. O quadro clínico era exacerbado por insuficiência aórtica severa e grave disfunção ventricular. O tratamento cirúrgico adotado foi o implante de prótese valvular aórtica e a ampliação do tronco da artéria coronária esquerda com um enxerto de veia safena como alternativa ao bypass tradicional.

CASUÍSTICA E MÉTODOS

Relato do Caso

Homem, branco, 38 anos, com angina de repouso após infarto agudo do miocárdio recente e insuficiência cardíaca classe IV (NYHA). No passado, teve quadro clínico de Luess tratado. Cineangiocoronariografia evidenciou insuficiência aórtica severa, oclusão do óstio coronariano direito e lesão subtotal do óstio coronariano esquerdo. Com exceção das lesões citadas, as artérias coronárias eram morfologicamente normais. A fração de ejeção do ventrículo esquerdo era de 0,30 (Figura 1). A abordagem cirúrgica foi através de esternotomia mediana com auxílio de circulação extracorpórea (CEC), hipotermia sistêmica moderada e proteção miocárdia com hipotermia tópica e solução cardioplégica anterógrada no óstio coronariano esquerdo. A aorta ascendente tinha seu diâmetro preservado, mas as alterações macro e microscópicas das camadas da aorta eram típicas de aortite. A valva aórtica apresentava-se francamente insuficiente em razão de absorção central dos seus folhetos. Após a remoção dos folhetos da valva aórtica, foi implantada uma prótese aórtica metálica de disco pivotante. A seguir, a lesão ostial esquerda foi abordada após a incisão da aorta ter sido estendida até o óstio coronariano e ampliada por mais dois centímetros. Para que esse acesso fosse possível, o tronco da artéria pulmonar foi seccionado transversalmente. Com um segmento de VS, realizou-se um "telhado" no tronco esquerdo até a aorta, de forma a ampliar adequadamente o óstio estenosado. A incisão da aorta foi fechada com sutura contínua e a artéria pulmonar foi reconstituída por uma anastomose término-terminal. Após a saída da CEC, o sangramento da região posterior da aorta era abundante e, para corrigí-lo, houve necessidade de novo pinçamento aórtico. O alargamento realizado no tronco da artéria coronária esquerda foi ressuturado num local de rotura onde a parede do vaso era mais rígida em razão da calcificação. O tempo de pinçamento aórtico foi de 120 minutos.


RESULTADOS

O paciente teve evolução pós-operatória satisfatória, com alta hospitalar em boas condições clínicas 14 dias após o ato cirúrgico. A evolução, com um seguimento de 52 meses, revela que o paciente reassumiu suas atividades normais, livre de angina, encontrando-se em classe funcional I. O reestudo hemodinâmico, realizado após quatro meses, demonstrou ampla abertura do óstio coronariano esquerdo e também melhora significativa na função ventricular (Figura 2).


COMENTÁRIOS

A abordagem cirúrgica para reparar a EOC foi pioneira por DUBOST et al.(8),em 1960, e por CONNOLLY et al. (9), em 1964, tendo ambos utilizado endarterectomia transaórtica para reparar obstruções ostiais sifilíticas. Em 1965, EFFLER et al. (10) e SABISTON et al. (11) foram os primeiros a relatar uma série de ostioplastias, porém esses procedimentos foram posteriormente abandonados, em virtude das altas taxas de mortalidade (acima de 45%). Entretanto, em 1983, com o advento da melhor proteção miocárdica, HITCHCOCK et al. (12),reviveram com sucesso os conceitos da ostioplastia e seus excelentes resultados encorajaram outros cirurgiões a utilizar essa técnica em grupos de pacientes selecionados. Subseqüentes relatos por SULLIVAN & MURPHY (13) e por DION et al. (14) confirmaram a utilidade desse procedimento.

A técnica de ostioplastia utilizando-se enxertos de VS ou pericárdio bovino pode ser empregada para restaurar um fluxo sangüíneo adequado tanto em estenoses ostiais da artéria coronária direita como da esquerda. Preferencialmente, a plastia cirúrgica do óstio deve ser aplicada em pacientes com lesão ostial única, como no caso exposto, porém há casos já descritos em que a ostioplastia foi associada ao bypass convencional, com resultados satisfatórios (7). Sabe-se que pacientes com idade avançada, lesões calcificadas e envolvimento de bifurcações distais contra-indicam essa técnica. Embora aplicada apenas a um número selecionado de pacientes com doença isquêmica cardíaca, citam-se como vantagens a restauração da anatomia normal coronariana, uma circulação sangüínea anterógrada mais fisiológica ratificada pelos princípios de Prizometer(14) e a preservação do material venoso ou arterial que seria usado em possíveis intervenções futuras.

CONCLUSÃO

A reconstrução do óstio coronariano por abordagem direta, especialmente quando for o esquerdo, através de retalho autólogo, é uma ótima alternativa para se restabelecer o fluxo coronariano normal em pacientes com estenoses ostiais isoladas. Entretanto, por ser uma técnica cirúrgica mais elaborada, em que o índice de complicações, especialmente sangramento, é mais crítico, deve ser empregada com cautela. Cada caso deve ser julgado em particular e, após criteriosa avaliação pré-operatória, a técnica cirúrgica mais apropriada escolhida. Caso se opte pelo bypass tradicional, as ATIs são uma ótima alternativa, seguido dos demais enxertos arteriais, hoje tidos como preferenciais sobre os enxertos venosos. O importante é que o cirurgião escolha a opção em que se sinta mais confiante, e que a obstrução coronariana e todas as lesões associadas sejam abordadas simultaneamente.

RBCCV 44205-521

Argenta F, Winckler G, Momolli M K, Falleiro R, Fragomeni L S - Surgical ostial angioplasty of non-atherosclerotic left coronary artery stenosis. Rev Bras Cir Cardiovasc 2000; 15(4): 345-8.

ABSTRACT: A clinical case of a 38 year old male, with heart failure grade IV (NYHA) and angina at rest related to severe aortic regurgitation, right coronary ostial occlusion, and a sub-total occlusion of the left coronary ostium owing to syphilitic infection in the past is reported and discussed. Treatment was established implanting a mechanical aortic prosthesis and a direct left main angioplasty suturing a patch made of safenous vein. Follow up has been excellent and the patient is today having a normal life, free of symptoms.

DESCRIPTORS: Coronary arteries, surgery. Aorta, insufficiency, Myocardial revascularization, surgery. Aortic valve prosthesis. Aortic valve, surgery. Heart valve prosthesis, implantation. Aortic valve stenosis, surgery.

Recebido para publicação em novembro de 1999.

* Do Hospital São Vicente de Paulo.

Endereço para correspondência: Luís Sérgio Fragomeni. Rua Teixeira Soares, 777, sl. 702. Passo Fundo, RS, Brasil. CEP 99010-080. Tel. (54) 311-6762. Fax. (54) 311-1423. e-mail: fragomeni@annex.com.br

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  • Trabalho realizado no Hospital São Vicente de Paulo - Faculdade de Medicina da Universidade de Passo Fundo. Passo Fundo, RS, Brasil.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      03 Maio 2001
    • Data do Fascículo
      Dez 2000

    Histórico

    • Recebido
      Nov 1999
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