Este artigo argumenta ser plausível atribuir à Organização das Nações Unidas a condição de importante lócus de autoridade política das relações internacionais contemporâneas, a despeito de sua flagrante dificuldade em fazer cumprir, por via da violência organizada, parcela significativa de suas determinações - sobretudo, no que toca às questões de segurança coletiva. Para tanto, oferece-se aqui uma nova abordagem da crise institucional desencadeada pela invasão anglo-americana do Iraque, em 2003.
ONU; Autoridade; Segurança Internacional
This essay argues it is plausible to attribute to the United Nations organization the condition of important locus of political authority in contemporary international relations, despite its flagrant difficulty in enforcing, by means of organized violence, significant parcel of its determinations - especially those related to collective security issues. We hereby offer a new account of the institutional crisis brought about by Anglo-American invasion of Iraq in 2003.
UN; Authority; International Security
ARTIGOS
ONU e segurança coletiva no século XXI. tensões entre autoridade política e exercício efetivo da coerção*
UN and collective security in the 21st century. tensions between political authority and the effective exercise of coercitive power
Dawisson Belém LopesI; Guilherme Stolle Paixão e CasarõesII
IDoutorando em Ciência Política pelo Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (Iuperj) e professor de Relações Internacionais da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-Minas) e do Centro Universitário de Belo Horizonte (Uni-BH). E-mail: dawisson@gmail.com
IIMestre em Ciência Política pela Universidade de São Paulo (USP) e professor de Relações Internacionais da Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP) e das Faculdades Integradas Rio Branco (FIRB). E-mail: casaroes@gmail.com
RESUMO
Este artigo argumenta ser plausível atribuir à Organização das Nações Unidas a condição de importante lócus de autoridade política das relações internacionais contemporâneas, a despeito de sua flagrante dificuldade em fazer cumprir, por via da violência organizada, parcela significativa de suas determinações - sobretudo, no que toca às questões de segurança coletiva. Para tanto, oferece-se aqui uma nova abordagem da crise institucional desencadeada pela invasão anglo-americana do Iraque, em 2003.
Palavras-chave: ONU - Autoridade - Segurança Internacional
ABSTRACT
This essay argues it is plausible to attribute to the United Nations organization the condition of important locus of political authority in contemporary international relations, despite its flagrant difficulty in enforcing, by means of organized violence, significant parcel of its determinations - especially those related to collective security issues. We hereby offer a new account of the institutional crisis brought about by Anglo-American invasion of Iraq in 2003.
Keywords: UN - Authority - International Security
A sexagenária Organização das Nações Unidas (ONU) tem enfrentado, neste início de século, um momento de contestação no que se refere à forma como exerce sua autoridade política no sistema internacional. Se os eventos que sucederam diretamente ao episódico 11 de setembro de 2001 foram capazes de demonstrar, em alguma medida, a existência de possibilidades funcionais para as Nações Unidas, a invasão do Iraque, pouco mais de um ano depois, foi entendida por muitos como símbolo da patente incapacidade da Organização de São Francisco de evitar ações unilaterais como aquela perpetrada pelos Estados Unidos da América (EUA) e seus aliados.
Se é razoável falar de uma "crise de identidade" no seio da maior organização internacional do planeta, faz também sentido notar que o despertar do século XXI reacendeu ou, simplesmente, deu continuidade a certos debates cruciais, trazidos à baila no interior das Nações Unidas, a partir do corte epistemológico marcado pelo fim da Guerra Fria, na década anterior. Um deles, particularmente relevante, remonta à relação entre autoridade política e exercício da coerção por parte da ONU.1 Afinal, se a crítica fundamental levada a cabo por seus opositores buscava colocar, lado a lado, a ineficiência da Organização em lidar com a miríade de novas situações referentes a questões de segurança internacional e uma suposta quebra da credibilidade de sua autoridade política, julgou-se cabível reconsiderar o lugar do "exercício efetivo da coerção" no papel internacional desempenhado pelas Nações Unidas.
Este artigo trabalha com a hipótese de que a dimensão da autoridade política da Organização das Nações Unidas não está diretamente correlacionada com sua capacidade de impor-se coercitivamente. Partindo do estudo das transformações políticas ocorridas nos últimos anos, em especial os eventos internacionais pós-11 de setembro, busca-se demonstrar que, no advento deste século, a despeito dos desafios colocados ao sistema de segurança coletiva da Organização de São Francisco, a sua autoridade política é crescente - e largamente desvinculada do critério do "exercício efetivo da coerção".
Antes de tudo, cumpre definir os termos-chave que dão sentido a esse empreendimento. Destarte, um debate conceitual sobre as relações entre autoridade, poder e coerção será o fio condutor da primeira seção. Um olhar mais detido sobre a conjugação desses termos mostrará que, conceitualmente, não existe relação a priori entre autoridade e coerção. Essa constatação nos permite analisar, de forma dissociada, na segunda seção do texto, as variáveis da autoridade política e do exercício de coerção das Nações Unidas, aqui problematizadas. Por fim, antes de concluir o texto, uma terceira e breve seção busca dar conta de nossa hipótese de trabalho, e da forma como ela se confronta com os dados em tela.
Autoridade, Poder e Coerção
Nesta seção inicial, pretende-se examinar as relações entre autoridade, poder e coerção. Travar um debate conceitual, ainda que breve, é fundamental para que possamos problematizar, adiante, a relação entre autoridade política e capacidade coercitiva no contexto da ONU. O debate torna-se ainda mais premente quando se considera a grande dificuldade para traçar as fronteiras práticas e teóricas entre os três conceitos. Partamos de uma definição relativamente ampla e influente de autoridade: "o poder de obter, sem recorrer à coação física, certo comportamento por parte daqueles que estão submetidos a ela".2 A definição relaciona, em uma só equação, os três termos (autoridade = poder - coerção). O que faz existir a autoridade, nos termos do poder, é a plena aceitação de uma dada relação assimétrica entre os homens, desde que estejam ausentes elementos que violentem a formação livre e desimpedida das vontades.3
Falta definir poder. Segundo Bertrand Russell (1949), trata-se do conceito-chave das Ciências Sociais modernas, assim como o "átomo" é para a Química e a "energia" é para a Física. Etimologicamente, "poder" deriva do verbo latino posse (cuja forma infinitiva, no latim vulgar, é potere), significando "ter o poder de, ser capaz de" (ENCICLOPÉDIA MIRADOR INTERNACIONAL, 1977, p. 9.001). Para Max Weber (1992, p. 43) , o poder significava "a probabilidade de impor a própria vontade dentro de uma relação social, qualquer que seja o fundamento dessa probabilidade, ainda que se encontre resistência para tal". Weber (1992, p. 43) adverte que o conceito é "sociologicamente amorfo", uma vez que "todas as qualidades imagináveis de um homem e toda sorte de constelações possíveis podem colocar alguém na posição de impor a sua vontade em uma dada situação".4
A autoridade, por seu turno, não se encerra em uma forma de imposição de vontade. Não se reduz às relações diretas de um superior com um subordinado. O combustível da autoridade é exatamente a aceitabilidade de uma determinada ordem ou estado. A dinâmica da autoridade é bipolar, ou seja, requer um fluxo de autorização de mão dupla, conectando o sujeito-autorizador ao sujeito-autorizado. Já a relação de poder é impositiva, por excelência. Concerne à capacidade (ou ao poder) de submeter uma parte. Apesar de conexos, autoridade e poder reportam a relações de conteúdo mais ou menos específico.
A dificuldade teórica aparece quando tais conceitos são transportados para o campo da política. Isso porque o poder do governante (hipoteticamente, um governante eleito pela população) se confunde com a autoridade (de falar e agir em nome dessa população). Há que se considerar, porém, que o poder pode ser mantido sem o consenso, sem a manifestação de uma relação autoritativa entre o governante e os cidadãos. Pode até ser exercido somente pelo recurso à força. Nesse caso, seria configurada a hipótese da coerção pura. Portanto, já que o poder (sem qualquer lastro de autoridade democrática) equivale à coerção, e, em alguns casos específicos, esse mesmo poder está associado à autoridade, alguns teóricos, resgatando "a dupla face de Jano", fundem, para propósitos analíticos, a autoridade com a coerção.
Esse é, a nosso ver, um equívoco perigoso. Definir autoridade em termos de poder é ignorar que as relações de autoridade e de coerção apresentam diferenças de natureza, e não apenas de grau. A autoridade refere-se a uma relação eminentemente psicológica; a coerção, prioritariamente, a uma força física, material. Isso explica, por exemplo, a existência, de um lado, do "poder sem autoridade" (como no caso do bandido que força a vítima a um determinado comportamento mediante ameaça com uma arma de fogo) e, de outro, da "autoridade sem poder" (a autoridade espiritual do Papa, para um bom número de católicos no mundo).5
O triângulo de conceitos é explorado por Hannah Arendt a partir de uma outra perspectiva. Arendt (1988, p. 129-130) trabalha com as categorias de autoridade, poder e violência (coerção):
Visto que a autoridade sempre exige obediência, ela é comumente confundida com alguma forma de poder ou de violência. Contudo, a autoridade exclui a utilização de meios externos de coerção; onde a força é usada, a autoridade em si mesma fracassou. A autoridade, por outro lado, é incompatível com a persuasão, a qual pressupõe igualdade e opera mediante um processo de argumentação. Onde se utilizam argumentos, a autoridade é colocada em suspenso. Contra a ordem igualitária da persuasão ergue-se a ordem autoritativa, que é sempre hierárquica. Se a autoridade deve ser definida de alguma forma, deve sê-lo, então, tanto em contraposição à coerção pela força como à persuasão através de argumentos.6
Em uma versão menos teórica, o balanço entre os três conceitos, que a autora expõe, bem poderia ser expresso por uma metáfora acadêmica. Imagine-se a proverbial relação entre professor e aluno em sala de aula. Mais precisamente, a ação de o professor solicitar ao aluno a execução de uma tarefa. O aluno poderá optar por fazer ou não a tarefa. Caso faça, provavelmente poderá ter-se baseado em três motivos para formular a sua decisão: (i) temor de uma represália do professor - que detém em suas mãos a capacidade de dar as notas -, podendo este, em última análise, punir o aluno com a reprovação no seu curso; (ii) o autoconvencimento do aluno, depois da troca de argumentos com o professor, de que a execução daquela tarefa tem um propósito em si mesma, e que lhe será benéfica, útil ou boa em alguma escala; ou (iii) a confiança cega na capacidade de aconselhamento e comando do professor, sem avaliação do mérito da ordem que dele emanou ("ele deve saber o que está fazendo"). No primeiro caso, segundo Arendt (1988), ter-se-ia manifestado a lógica da violência; no segundo, a persuasão ou o poder; no terceiro, a autoridade.7
Arendt chega à noção de autoridade por exclusão: ela, a autoridade, não admite a "coerção pela força", tampouco a "persuasão através dos argumentos". Ao tratar da categoria da persuasão, a autora tem em mente uma "razão pura", isto é, o equacionamento de uma questão por dois indivíduos rigorosamente iguais em suas capacidades racionais (pressuposto dos iluministas). Arendt entende que, se há argumentação, não pode haver autoridade - e vice-versa. Adiante, no mesmo texto, afirma: "A relação autoritativa entre o que manda e o que obedece não se assenta nem na razão comum nem no poder do que manda; o que eles possuem em comum é a própria hierarquia, cujo direito e legitimidade ambos reconhecem e na qual ambos têm seu lugar estável predeterminado" (ARENDT, 1988, p. 129).
Caberiam alguns questionamentos pontuais. Em primeiro lugar: embora mentalmente concebível, é faticamente possível a ocorrência da persuasão pura? Em segundo lugar: ao afirmar que os pólos de uma relação de autoridade encontram uma base comum para a interação no arranjo estável da hierarquia, Arendt não estaria desconsiderando que, para que a referida hierarquia seja dada como legítima pelas partes, faz-se necessária uma prévia comunhão (igualdade) de valores e percepções? Em terceiro lugar: o reconhecimento da legitimidade de uma relação hierárquica qualquer não pressupõe, da parte dos agentes que a integram, plenas faculdades de racionalização? Dados os distintos pontos de partida, parece difícil conciliar algumas das ideias de Arendt com a noção de autoridade em que vimos operando. No entanto, há nitidamente uma ampla zona de interseção entre as duas abordagens. Em especial, há a ênfase de Arendt em um fenômeno que também nos preocupa: o da convergência instrumental entre a violência e a autoridade.
Arendt (1988, p. 140) aponta que, ao se conceituar modernamente a autoridade como "tudo aquilo que faz com que as pessoas obedeçam", permite-se uma completa subversão valorativa, de forma tal que a violência passa a ocupar crescentemente o lugar da autoridade nas relações sociais contemporâneas. Inicia-se com o seguinte raciocínio: "se a violência preenche a mesma função da autoridade - a saber, fazer com que as pessoas obedeçam -, então violência é autoridade" (ARENDT, 1988, p. 140, ênfase nossa). Está-se a lidar com um falso silogismo. Um sofisma funcionalista, que logo é contestado por Hannah Arendt (1988, p. 140): "É como se eu tivesse o direito de chamar o salto de meu sapato de martelo porque, como a maioria das mulheres, eu o utilizo para enfiar pregos na parede".
A questão a ser enfrentada pela Filosofia Política de hoje, com impactos diretos na própria formulação e desenvolvimento do pensamento em Relações Internacionais, talvez seja conceber a maneira como se acomodam as lógicas da autoridade, do poder, da persuasão, da violência. Às Ciências Sociais, em geral, fica a missão de analisar como a autoridade se exerce na vida em sociedade.8 Mas os maiores desafios para a investigação acadêmica da noção de "exercício de autoridade" parecem mesmo reservados ao campo da Ciência Política, de forma particular, com atenção para o debate em âmbito internacional. E a dificuldade reside na resiliência e na natureza adaptativa do conceito de autoridade ao longo do tempo e do espaço, e também de todos os outros conceitos relacionados a ele. Na vida política, poder, autoridade, persuasão e coerção podem tornar-se (e, de fato, têm-se tornado, em inúmeros casos) fenômenos indissociáveis e indiscerníveis.
ONU, Autoridade Política e Exercício da Coerção
A afirmação de que à Liga das Nações teria faltado a capacidade para fazer cumprir as determinações de seu Conselho, ou para atingir as aspirações de seu tratado constitutivo, é não raramente creditada ao fato de a organização internacional não ter sido dotada de autoridade suficiente. Tal alegação nos parece trazer a confusão terminológica muito comum entre autoridade e poder, que embaça parte dos debates a respeito do tema da autoridade política. O "fazer cumprir" (enforcement) uma resolução nada mais é do que uma dimensão da coerção,9 ou seja, da obediência baseada no recurso - potencial ou real - à força. Se a Liga das Nações não dispunha de instrumentos bastantes para debelar situações de crise internacional por meio da força, daí não se depreende, todavia, que lhe faltasse autoridade política. Como já discutido neste texto, poder (de polícia) e autoridade são fenômenos que, embora entrelaçados de diferentes maneiras, discrepam em natureza.
A Organização das Nações Unidas: Fundamentos da Autoridade e Mecanismos de Coerção
Se a ONU, ao tempo de sua concepção, foi talhada para a manutenção da ordem estabelecida no imediato pós-Segunda Guerra, o seu Conselho de Segurança era basicamente um condomínio das potências aliadas vitoriosas, as quais se incumbiriam conjuntamente de manter o resto do mundo em ordem. A Assembleia Geral podia sediar discussões e fazer recomendações - inclusive chamando a atenção do secretário-geral para certas questões -, mas ela nunca teve capacidade institucional para decidir. O artigo 39 da Carta de São Francisco é bastante claro nesse aspecto: "O Conselho de Segurança deverá determinar a existência de qualquer ameaça à paz, violação da paz ou ato de agressão, e deverá fazer recomendações, ou decidir que medidas serão tomadas [...] para manter ou restaurar a segurança e a paz internacionais".10 Em relação à segurança internacional, o coração da Carta é o seu capítulo VII, referente às "Ameaças à paz, violações da paz e atos de agressão". Acreditou-se, em um primeiro momento, que a ONU havia sido dotada dos "dentes" que teriam faltado à Liga. Isso significava dizer que, no planejamento inicial, as Nações Unidas seriam capacitadas para, sempre que julgado necessário, convocar os seus membros a aplicar sanções não militares e, se essas falhassem, "mobilizar forças armadas pelo ar, mar e terra para manter ou restaurar a paz e a segurança". Além disso, havia a proposta da Comissão de Estado-Maior (Military Staff Committee), prevista para reunir representantes militares dos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança.11 O artigo 43 indicava que todos os Estados-membros da instituição aceitavam disponibilizar, sob a requisição da ONU, em qualquer tempo, Forças Armadas e equipamentos. A expectativa, em resumo, era de que as Nações Unidas não repetissem a sina de "cão sem dentes" da Liga das Nações; mas, sim, que tivessem dentes bastante afiados para implementar as suas deliberações.12
A esperança de que a ONU se convertesse em polícia do mundo13 era induzida pela crença de que, uma vez providenciados os instrumentos legais para que se satisfizesse tal condição, a organização passaria a fazer valer o seu poder coercitivo, sob o comando dos cinco detentores do poder de veto no Conselho de Segurança. A prática, no entanto, dissipou essas ilusões em muito pouco tempo. A Comissão de Estado-Maior, mesmo antes de ter sido colocada em teste, deixou de funcionar.14 A crise da Coreia, de 1950, tornou patentes os problemas de coordenação de vontades a que estava sujeito o Conselho de Segurança e, ainda, significou uma aberta violação15 do texto da Carta de São Francisco, com a saída ad hoc que se forjou para a superação da crise.16 A esse início turbulento, somou-se a dificuldade do primeiro secretário-geral, Trygve Lie, em exercer as suas atribuições,17 bem como a guerra iniciada com a independência política de Israel, o desencadeamento da Guerra Fria e as fundações sucessivas da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) e do Pacto de Varsóvia.
A rigor, a própria Carta da ONU já previa, no seu texto, a possibilidade de que organizações regionais18 se ombreassem às Nações Unidas nas questões de segurança internacional. Essa admissão de que as organizações regionais eventualmente dividiam espaço com a ONU não apenas acarretava a coexistência de duas lógicas no plano da segurança internacional (a "segurança coletiva universal" e a "balança regional de poder"), mas também implicava um furo na tese de que a ONU se teria constituído com o objetivo primário de promover a doutrina da segurança coletiva universal - conforme mencionava, em seus discursos, o presidente Roosevelt. Esse expediente da Carta - que permitia a convivência de dois princípios de segurança internacional - chega a ser saudado por alguns analistas como uma solução institucional inteligente para o propósito da manutenção da ordem, uma vez que a proposta de gestão da segurança internacional via "condomínio de potências" já se havia mostrado falha, tanto em 1815 quanto em 1920.19 Tratava-se, portanto, de uma válvula de escape legal. A resiliência da ONU foi percebida como virtude naquele contexto, porque teria ensejado a introdução gradual de uma nova "cultura" de segurança internacional, sem gerar rupturas drásticas com as práticas anteriores.20
O episódio da crise da Coreia e a aprovação da resolução "Uniting for peace" (ASSEMBLEIA GERAL DAS NAÇÕES UNIDAS, 1950) pela maioria dos membros da organização poderiam transmitir a falsa impressão de que a ONU (ou, talvez, a Assembleia Geral da ONU) demonstrou a sua autoridade na ocasião, na medida em que, confrontada com o veto soviético, foi capaz de projetar uma saída viável para a crise - obtendo o respaldo maciço de seus membros. Uma ilação desse tipo seria apressada, porque ignoraria o papel jogado pelos EUA naquela combinação de vontades.
Antes, é mais crível supor que tal episódio tenha refletido a incipiente autonomia da organização internacional em face de seus fundadores (em relação ao principal deles, os EUA, nomeadamente). Dois eventos, acontecidos no ano de 1956, ajudam a corroborar essa tese. O primeiro refere-se ao Canal de Suez, quando - exatamente nos moldes de 1950 - uma resolução foi aprovada em Assembleia Geral, novamente sob a articulação dos EUA, demandando o imediato cessar-fogo e a retirada de tropas da Inglaterra e da França (dois membros permanentes do Conselho de Segurança) do Egito. O segundo, praticamente simultâneo ao primeiro, foi a invasão da Hungria por tropas soviéticas, com nova aprovação de resolução pela Assembleia Geral, requisitando à União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) a retirada das tropas. Enquanto a primeira dessas resoluções foi acatada pela Inglaterra e pela França (e também por Israel), a segunda foi ignorada pela URSS. Isso não acontecia, certamente, porque Inglaterra e França eram mais fáceis de ser persuadidas do que a União Soviética, mas pelo fato de que as Nações Unidas não ousariam, em relação aos soviéticos, nada além do que tentar persuadi-los. Howard (2003, p. 63) sugere que a Inglaterra e a França teriam aquiescido "menos por respeito ou medo da força conjunta das Nações Unidas do que, efetivamente, por receio dos 'músculos econômicos' dos Estados Unidos". O professor conclui: "As lições de 1956 foram claras. Primeiramente, a ONU poderia tomar atitudes contra 'agressões' somente se as duas potências [EUA e URSS] concordassem, ou se uma delas estivesse indiferente ao caso; em segundo lugar, havia apenas duas potências que realmente contavam - EUA e URSS. Então, por muitos anos, assim permaneceu" (HOWARD, 2003, p. 63).
O Fim da Guerra Fria e a Emergência da "Nova Ordem Mundial": Uma Nova ONU?
O ocaso da Guerra Fria pareceu sinalizar o ingresso em um novo estágio para a Organização das Nações Unidas. Por volta do ano de 1990, havia-se instalado uma atmosfera eufórica, e a ideia de que, de uma vez por todas, a organização começaria a funcionar autoritativamente, da maneira como alguns dos mais idealistas haviam imaginado. Os indícios eram animadores: a guerra Irã-Iraque terminou em 1988, após a aprovação de uma resolução pelo Conselho de Segurança; forças soviéticas abandonaram o Afeganistão no período de 1988-1989, sob intermediação do secretário-geral da ONU; a independência política da Namíbia foi finalmente conseguida, com base em uma resolução do Conselho de Segurança de 1978; em 1989, as forças cubanas iniciaram a retirada de Angola; e as forças de manutenção da paz (peacekeeping forces) estavam obtendo êxito crescente nas empreitadas pela América Central. Com a queda do Muro de Berlim, o número médio de resoluções aprovadas pelo Conselho de Segurança em um ano passou de quinze para sessenta (ou de uma resolução por mês para uma por semana) (Ver Gráfico 1 e Tabela 1). Antes de 1989, o Conselho havia aplicado sanções duas vezes apenas; desde então, ele as aplicou ao menos quinze vezes.21 A profusão de indicadores positivos a respeito dos mecanismos onusianos fez com que a literatura registrasse, de forma quase unânime, que "[o] fim da guerra fria tornou possível o funcionamento - ainda que imperfeito, seletivo e passível de críticas - do sistema de segurança coletiva previsto na Carta de 1945" (LAMAZIÈRE, 1998, p. 22).
Cabe, neste momento, fazermos um contraponto crucial. A despeito do otimismo que balizara a transição para a chamada "nova ordem mundial", Hurd (2007), por exemplo, nota que o paradoxo entre comprometimento multilateral - a raiz, afinal de contas, do binômio autoridade/legitimidade da ONU - e soberania estatal ficou ainda mais evidente após o fim da Guerra Fria. Nas palavras do autor:
[...] talvez em nenhum lugar esse paradoxo esteja mais claramente colocado que em respeito ao Conselho de Segurança da ONU. O Conselho é dotado de grande poder formal pela Carta da ONU e com autoridade primária no sistema internacional sobre questões de paz e segurança internacionais. E, ainda assim, é aparente no mundo pós-Guerra Fria que tentativas do Conselho em valer-se deste poder geram enorme controvérsia. O poder do Conselho é evidenciado explicitamente pela Carta, mas sua prática é sempre problemática" (HURD, 2007, p. 5, ênfase nossa).
É possível ilustrar tal percepção com dois desafios que colocaram em xeque a recém-adquirida credibilidade da ONU no despertar dos anos 1990.
O primeiro dizia respeito à invasão do Kuwait pelo Iraque, em 1990, que precipitou a Guerra do Golfo (1990-1991). Quando Saddam Hussein invadiu o Kuwait, em 2 de agosto de 1990, o Conselho de Segurança agiu com velocidade e firmeza de propósito nada usuais. Entre 2 de agosto e 29 de novembro daquele ano, aprovaram-se doze resoluções sobre diferentes aspectos da crise. O Conselho ainda impôs sanções e um embargo naval até que, no dia 29 de novembro de 1990, autorizou o uso da força, caso o Iraque não acatasse as suas solicitações até 15 de janeiro de 1991. Embora esse senso de urgência que tomou conta do Conselho na ocasião tenha sido, de maneira geral, elogiado, é importante notar que as ações do Conselho não se balizavam exatamente pelo capítulo VII da Carta da ONU. Os artigos 46 e 47 expressavam claramente que as ações de coerção (enforcement) só poderiam ocorrer sob o comando do Conselho de Segurança e de sua Comissão de Estado-Maior. Já no dia 25 de agosto de 1990, quando demandou de seus membros forças navais para monitorar a navegação da região do Golfo, o Conselho distanciou-se dos procedimentos prescritos pelo capítulo VII. Em 29 de novembro, na resolução 678, o Conselho divergiu ainda mais do texto legal da Carta, autorizando Estados-membros a cooperar com o governo do Kuwait e usar todos os meios necessários (inclusive a força) se o Iraque não acedesse até 15 de janeiro de 1991.22 Para Brian Urquhart (2003, p. 83), ex-subsecretário-geral para Assuntos Políticos da ONU, "um comparável desvio da trajetória prevista pelo capítulo VII ocorreu na guerra da Coreia (1950-53), em que os Estados Unidos também tinham o controle das operações militares". Novamente, soluções políticas ad hoc haviam sido forjadas a despeito do texto da Carta da ONU e a reboque da atuação diplomática dos Estados Unidos.23
O segundo desafio de envergadura, surgido no pós-Guerra Fria, foi relativo à emergência, em larga escala, dos conflitos étnicos e intraestatais. O elemento complicador do quadro é que a ONU não foi concebida para dar conta desse tipo de enfrentamento - e, mais grave, não se encontrava devidamente preparada para debelá-los quando as demandas por sua intervenção começaram a acontecer. O desafio veio a configurar-se uma ameaça séria à autoridade da Organização das Nações Unidas a partir de 1992, com a escalada da violência na antiga Iugoslávia. Depois de alguma hesitação, um destacamento militar da ONU foi enviado para operar principalmente na Croácia, em 1992 - embora o quartel-general das Nações Unidas estivesse sediado na cidade de Sarajevo, na Bósnia. O desembarque das tropas onusianas coincidiu com o reconhecimento diplomático (por parte dos europeus) da Bósnia-Herzegovina como unidade soberana. A matança e a destruição avolumaram-se, e nem a imposição de sanções da ONU à Sérvia, tampouco as intervenções da Comunidade Europeia, foram capazes de fazer estancar o conflito. No caso da Somália, também de 1992, o Conselho de Segurança agiu menos prontamente. Depois de alguns meses de guerra civil, decidiu-se por enviar um pequeno contingente de forças de peacekeeping. Tentou-se uma ação conjunta com a Organização da Unidade Africana (atual União Africana) para a reconciliação das partes em contenda, mas não se obteve sucesso. Com a disseminação do caos e da fome, em dezembro de 1992, os Estados Unidos - do recém-eleito presidente Bill Clinton - ofereceram-se para uma expedição militar na Somália - oferta que foi aceita pelo Conselho de Segurança. A operação, batizada de Restore Hope (Restaurar a Esperança), tinha o direito de usar armas, se necessário - o que foi o protótipo de uma inédita intervenção humanitária com ação de polícia armada. Consumado o fracasso da Restore Hope, o comandante norte-americano entregou a responsabilidade pela operação ao comandante da ONU, em maio de 1993. O paroxismo, no entanto, foi atingido em 1994, com o caso de Ruanda. Sob pretexto étnico, soldados, oficiais governamentais e líderes empresariais - secundados pela milícia extremista hutu Interahamwe - organizaram o assassínio sistemático de tutsis e hutus moderados por todo o território ruandês. Entre 6 de abril de 1994 (data da emboscada que vitimou o então presidente ruandês, Juvenal Habyarimana, e o presidente de Burundi, Cyprien Ntaryamira) e 18 de julho de 1994 (dia da declaração de cessar-fogo), cerca de 800 mil vidas humanas foram ceifadas (de tutsis, em sua absoluta maioria), diante da hesitação e da indiferença dos membros das Nações Unidas. Conforme sentenciou Barnett (1997, p. 570),
[...] os Estados-membros [da ONU] não podiam ter simplesmente assistido, silenciosamente, no santuário do Conselho de Segurança [da ONU], à realização do genocídio [em Ruanda]. Em vez disso, na condição de "agentes" da "comunidade internacional", eles deveriam ter negociado esse fluido e contestado relacionamento entre seus respectivos "interesses nacionais" e a "comunidade internacional".
As tragédias iugoslava, somali e ruandesa trouxeram para a ONU a percepção de que, se a instituição não quisesse ver a sua autoridade política ser rapidamente corroída pelos insucessos (justa ou injustamente) a ela atribuídos, haveria de adaptar o seu modo de atuação à nova realidade internacional.24
O Sistema Onusiano de Segurança Coletiva hoje: Desafios no Despertar do Século XXI
Convém dedicar alguma atenção à atuação das Nações Unidas no campo da segurança internacional nos anos 2000. Comecemos pelo momentoso 11 de setembro de 2001 e os acontecimentos que se seguiram. A invasão norte-americana do Afeganistão - autorizada pelo Conselho de Segurança da ONU - em represália aos ataques creditados à rede terrorista Al Qaeda (supostamente mantida pelo regime afegão Taleban) pôde, enfim, expressar como, apesar dos desafios dramáticos enfrentados pela organização no imediato pós-Guerra Fria, existem inumeráveis - e, aparentemente, ilimitadas - possibilidades funcionais para a Organização de São Francisco. O Afeganistão é o microcosmo para a observação do leque de atividades em que a ONU se engaja quando intervém em questões contemporâneas de segurança internacional - sobretudo as que se dão nos chamados "Estados fracassados" (quasi-states ou failed states). As ações onusianas abrangem desde o estágio prévio à operação - a autorização do uso da força (por parte do Conselho de Segurança) e as discussões de direito internacional - até as operações de campo propriamente ditas - a condução das transições para governos democráticos e dos processos de reconstrução das instituições nacionais, peacekeeping, peacebuilding, retirada de minas terrestres, assentamento de refugiados e internamente deslocados, alívio da fome e da miséria etc. Porém, como se vem defendendo nesta avaliação da autoridade onusiana, talvez o papel primário das Nações Unidas na segurança dos Estados e dos indivíduos seja o de fixar parâmetros para o uso (social e politicamente) tolerável da força. Richard Price (2004) atenta para o fato de que a série de resoluções do Conselho de Segurança incidentes sobre o Taleban e a Al Qaeda - aprovadas antes e depois de 11 de setembro de 2001 - emprestou legitimidade pública à investida militar norte-americana em território afegão. Além disso, a ONU foi relevante na campanha de isolamento diplomático do Taleban, contribuindo para que o regime perdesse até o suporte da maioria dos países árabes. Embora os Estados-membros da organização tenham-se mostrado inaptos a elaborar e registrar em instrumento jurídico multilateral uma definição - aplicável erga omnes - de "terrorismo", aquele foi um dos casos em que virtualmente nenhum Estado tentou absolver de responsabilidade o Taleban, ou creditar-lhe a pecha de "guerreiro da liberdade" (freedom fighter). Por tudo isso, Price (2004) acredita que a guerra movida contra o Afeganistão não tenha sido recebida pela comunidade global com tanta polêmica quanto a invasão do Iraque.
A ação militar de 2003 contra o Iraque, liderada pelos EUA e aliados, é possivelmente um divisor de águas no tocante à autoridade política da ONU em questões de segurança internacional. A despeito da larga condenação25 da decisão anglo-americana de invadir o Iraque antes de se concluir o trabalho de inspeção das (supostas) armas de destruição em massa do regime de Saddam Hussein (até então realizado pela ONU e pela Agência Internacional de Energia Atômica), a ação militar unilateral foi levada a efeito - o que fez reforçar o estigma da ineficiência da ONU (a qual teria, segundo boa parte das análises, falhado na tentativa de impedir os EUA e seus aliados de adotar a orientação unilateralista). Contudo, por trás da cortina de fumaça produzida pela campanha de descrédito da Organização de São Francisco, alguns aspectos relativos à crise mereceriam ser olhados mais de perto, com mais critério. A seguir, são feitas algumas considerações sobre a invasão do Iraque, de 2003, e os seus efeitos sobre os níveis de autoridade política da Organização das Nações Unidas.
O primeiro deles é a autonomia política adquirida pela ONU em relação a alguns dos seus Estados-membros - em especial, na relação com os EUA. Pois, se é verdade que o unilateralismo de norte-americanos, ingleses e aliados, no caso do Iraque (2003), infligiu um duro golpe à imagem pública das Nações Unidas,26 parece também acertado o diagnóstico de que a reputação da ONU seria ainda mais seriamente afetada se ela simplesmente aquiescesse às demandas da superpotência e endossasse a guerra contra o Iraque. Aos olhos do mundo, a organização perderia toda a credibilidade; seria percebida como nada mais do que um selo para aprovação automática dos desígnios da potência militar hegemônica. A ONU demonstrou, como em poucas ocasiões, capacidade de manter-se firme em seus propósitos, apesar das pressões multiformes. Na síntese de Price (2004, p. 268): "A ONU pode ter falhado para a administração Bush e seu aliado Tony Blair, mas do ponto de vista do resto do mundo, ela obteve sucesso ao menos ao recusar-se a ratificar aquilo que ela [a ONU] havia considerado uma guerra injusta e ilegal; resgatando, assim, o que sobrara do seu papel de repositório de legitimidade".
Um segundo aspecto concerne à insistente atitude dos Estados Unidos de tentar justificar a ação militar perante a comunidade internacional - valendo-se da plataforma das Nações Unidas. Berdal (2003, p. 11) ressalta que os Estados Unidos e o Reino Unido têm recorrido continuamente a resoluções do Conselho de Segurança para embasar juridicamente as suas propostas políticas. Em adição, ao explicarem as posições nacionais, esses (e outros) Estados-membros costumam enfatizar o grau em que elas se conformam aos princípios e intenções da Carta de São Francisco. Na discussão que precedeu e sucedeu a invasão do Iraque, não foi diferente. Embora sabedores das dificuldades diplomáticas que enfrentariam, EUA e Reino Unido27 não cogitaram abrir mão de participar dos debates que se travavam no fórum. Boulden e Weiss (2004, p. 109) sugerem que
Até para os Estados Unidos, as Nações Unidas ainda importam. A abordagem funcional dos EUA pode ser chamada de "multilateralismo tático". Embora os resultados sejam mais condicionados e constrangidos do que a administração [republicana de George W. Bush] desejaria, tais resultados são preferíveis a prescindir-se inteiramente do processo [argumentativo]. A legitimidade internacional conta, até para os Estados Unidos. Nesse sentido, o multilateralismo é uma tática essencial na tentativa de se conduzir com êxito a estratégia de projeção e proteção do poder norte-americano.
É razoável, então, afirmar que o Conselho de Segurança funcionou em março de 2003 exatamente como se poderia prever. Sua função vinculava-se à projeção de autoridade política.28 O fato de que nenhum Estado - nem mesmo os Estados Unidos da América - tenha evitado expor o caso à ONU sugere a força normativa que o processo argumentativo onusiano adquiriu perante a comunidade internacional. "É um feito" - comemoram Boulden e Weiss (2004, p. 112) - "uma fundação, a partir da qual as Nações Unidas podem buscar um novo engajamento de todos os seus membros".
Um terceiro ponto importante da crise relaciona-se ao modo como o juízo da administração norte-americana de que a Organização das Nações Unidas estaria fadada à irrelevância política29 rapidamente se converteu na convocação da ONU para desempenhar um papel na reconstrução do Iraque pós-Saddam Hussein - tarefa para cuja execução os EUA e aliados se encontravam tecnicamente despreparados e politicamente desautorizados. A experiência da administração do Iraque após a guerra também serviu para demonstrar a eficiência comparativa dos programas e das agências especializadas da ONU - com destaque para o Programa Alimentar Mundial (em inglês, World Food Programme (WFP)), o Fundo das Nações Unidas para as Crianças (em inglês, United Nations Children's Fund (UNICEF)) e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) - na provisão de serviços e de uma mínima infraestrutura ao povo iraquiano. Revelou também como setores do Secretariado conseguiram adaptar-se rapidamente às circunstâncias, assumindo responsabilidades complexas na reconstrução do país - o que é incongruente com a propalada imagem de incompetência do pessoal onusiano. No que diz respeito à esfera política, passou-se a acreditar na hipótese de que, com o resgate de um papel para as Nações Unidas, a legitimidade com que Estados Unidos e Reino Unido eram percebidos poderia ser acrescida.30
Em quarto lugar, após os governos norte-americano e inglês, amparados por supostos relatórios de serviços de inteligência nacional, terem desautorizado as informações e os dados coletados pelos inspetores de armas das Nações Unidas e da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), veio à tona, com a não-descoberta dos arsenais iraquianos após a ocupação, que as referidas informações dos serviços de inteligência - que davam conta do iminente emprego de armas de destruição em massa por Saddam Hussein contra os Estados Unidos - haviam sido manipuladas ou forjadas. Os inspetores estavam corretos em seu diagnóstico, desde o início.31 Fareed Zakaria, em coluna veiculada em uma revista de grande circulação dos Estados Unidos, chegou a anotar: "Havia um grupo cujas estimativas pré-guerra sobre as capacidades nucleares, químicas e biológicas do Iraque se mostraram devastadoramente próximas da realidade: os inspetores da ONU [...]. Eles foram bem mais precisos do que bilhões de dólares gastos com satélites" (ZAKARIA, 2004).
Por fim, revê-se o argumento - acalentado pelo próprio secretário-geral Kofi Annan32 - de que a crise do Iraque consistia em um "teste crucial" das capacidades onusianas; que as Nações Unidas se encontravam em uma "encruzilhada", em um desafio sem precedente na história da organização. A crença beira a ingenuidade, uma vez que, enquanto "o Iraque esteve sob os holofotes em 2002 e 2003, a ONU permaneceu engajada - com êxitos e falhas - em múltiplas outras frentes, que afetavam a segurança de muito mais Estados e povos ao redor do globo do que aquelas [frentes] que preocupavam diretamente a superpotência [os EUA]" (PRICE, 2004, p. 264).
Registra-se ainda que, no seguimento (follow-up) da invasão do Iraque, houve um aumento considerável no número de operações de paz da ONU - quase todas destinadas à África (República Democrática do Congo, Libéria, Costa do Marfim, Burundi, Sudão). Essas missões foram estabelecidas a despeito de toda a tensão (relativa ao Iraque) que afetava os membros permanentes do Conselho de Segurança naquele momento. Com a instauração dessas seis novas operações (desde a invasão do Iraque), em setembro de 2007, atingiu-se o contingente aproximado de 105 mil homens, entre civis e militares, envolvidos em missões de paz da ONU pelo mundo. Em perspectiva histórica, esse é um patamar inédito. Mais importante do que os números é a constatação de que se tratava de operações de manutenção da paz ditas "complexas", incluindo tarefas múltiplas, combinando componentes civis e militares. Em que pese todo o simbolismo da Guerra do Iraque, era e continua sendo muito pouco crível a suposição de que um evento pontual poderia jogar por terra toda a autoridade do sistema ONU.
Tensões entre Autoridade Política e Capacidade de Coerção: Uma Realidade?
À turbulência dos anos 1990, sobrevieram oportunidades para a revisão de protocolos e a realização de certos debates não antes enfrentados no seio da Organização das Nações Unidas. Um deles, o que mais nos importa discutir aqui, remete à relação entre a autoridade política e o exercício de coerção por parte da ONU. Um primeiro ponto para o debate é repensar o papel da ONU vis-à-vis o dos Estados no que toca ao legítimo uso da força. Porque, se um dos elementos que autorizou, historicamente, a existência de Estados foi a sua faculdade de promover a ordem nas comunidades políticas (por intermédio da violência organizada), é fundamental ter-se em mente que o Estado moderno contou, desde os primeiros momentos, com exércitos - braços armados capazes de "fabricar" essa ordem. Esse monopólio do recurso legítimo à coerção é uma das principais fundações da Modernidade - um dos fatores que torna possível a noção de Estado moderno.33
Por outro lado, a Organização das Nações Unidas não é, nem nunca foi, dotada de exércitos. Não é um "superestado", nem está apta, legal ou politicamente, a exercer o "monopólio da coerção legítima". As ações da ONU no campo da segurança internacional dão-se sempre por delegação dos Estados-membros - nomeadamente, os cinco detentores do veto no Conselho de Segurança. O mais relevante, no momento atual, é que esses Estados não parecem nem um pouco inclinados a dar poder à Organização das Nações Unidas para o exercício eficiente da coerção. Exemplo óbvio do que se alega é a inoperante Comissão de Estado-Maior, uma das inovações trazidas pela Carta da ONU, concebida para investir a instituição de São Francisco de um mínimo de capacidade para ação militar nas contingências, nos termos do capítulo VII. Além disso, o dispositivo do artigo 43, que prevê para os Estados-membros a tarefa de disponibilizar forças para o rápido manejo do Conselho de Segurança, nunca foi efetivado, e permanece tão ineficaz hoje quanto durante a Guerra Fria.
No entanto, no segmento da segurança internacional, fica mais inteligível a afirmação que fizemos no início deste texto - qual seja, de que poder e autoridade são fenômenos diferentes em essência. Isso porque, a despeito de todas as dificuldades enfrentadas pela ONU para fazer cumprir as suas determinações (ou seja, no que concerne à dimensão do enforcement, do seu poder efetivo), ainda parece sustentável a tese de que, sob vários aspectos, a organização teve um incremento da autoridade política no plano internacional ao longo de sua existência - e, mais notoriamente, após o fim da Guerra Fria.34 Brian Urquhart (2003, p. 86) percebe, por exemplo, que o capítulo VII da Carta da ONU é muito mais livremente invocado no pós-Guerra Fria do que antes.35 A tendência leva, entre outras coisas, a uma disputa acirrada pela reforma do Conselho de Segurança da ONU, a fim de que este se possa expandir e contemplar novos países e novas regiões do globo. Por trás dessa disputa, existe o reconhecimento tácito à autoridade política de um fórum que, em outros tempos, esteve engessado, incapacitado de desempenhar um papel, em face do confronto bipolar da Guerra Fria. A luta por uma vaga permanente no Conselho reflete, se nada mais, a crença na relevância do debate político encenado naquele fórum; e a expectativa de que as principais deliberações da política internacional do futuro passarão por aquela via institucional. Evans (2004) assinala ainda que, dada a imprecisão do texto da Carta da ONU e do direito internacional sobre o que seriam as proverbiais ameaças à paz e à segurança internacionais, elas se tornam, na prática, aquilo que o Conselho de Segurança determina que sejam.
Em vez de uma aferição da autoridade política da ONU pelo critério do exercício efetivo da coerção - metodologia tão comum quanto equivocada36 -, sugere-se observar o uso simbólico que se tem feito da insígnia da instituição nas operações de paz pelo mundo (com o ocaso da Guerra Fria, sobretudo). Fomerand (2002) nota como, à ausência do poder efetivo do Secretariado para implementar certas investidas armadas, tem-se firmado uma prática de "subcontratação de capacetes azuis"37 por parte de potências com capacidade e disposição de agir. Isso quer dizer que a bandeira da ONU tem sido empregada, algumas vezes, para o propósito da validação/legitimação das ações empreendidas por determinados Estados. Se não fossem encampadas pelas Nações Unidas, dificilmente as tais campanhas disporiam de autorização política no plano internacional. Embora não exatamente consistente com o "espírito" da Carta de São Francisco, essa tendência revela o juízo, da parte dos tomadores de decisão dos Estados, de que o simbolismo do endosso onusiano gera maior permeabilidade normativa nos agentes sujeitos à sua ação (FOMERAND, 2002).
A capacidade de adaptação institucional da ONU no campo da segurança internacional é bem demonstrada pela evolução do que se convencionou chamar de "capítulo VI e meio" da Carta de São Francisco - para usar a consagrada expressão do ex-secretário-geral Dag Hammarskjöld. Em face das dificuldades enfrentadas para exercer a coerção (dificuldades não raramente impostas pelos próprios Estados-membros), a ONU desenvolveu um mecanismo de envio de operações de manutenção da paz a focos internacionais de tensão, o qual se robusteceu no correr dos anos. Desde 1948 - quando forças de manutenção da paz foram enviadas ao Oriente Médio, por ocasião da guerra da independência de Israel -, 61 operações do gênero foram organizadas, 48 delas no período pós-1988.38 O aumento vertiginoso de demanda por operações de manutenção da paz (peacekeeeping) da ONU nos anos após a Guerra Fria fez-se seguir pela diversificação e sofisticação das "operações de paz" da organização. Não tardou para que um departamento dedicado ao gerenciamento do peacekeeping onusiano fosse criado, além da providencial desvinculação entre os orçamentos regular e de operações de manutenção da paz da organização - que passaram, então, a ser contabilizados separadamente (ver Tabelas 2 e 3 e Gráfico 2).
Originalmente restrita à diplomacia e aos "bons ofícios" do secretário-geral (o chamado peacemaking), a performance do Secretariado da ONU no campo da segurança internacional passou a englobar, além das já referidas operações de manutenção da paz, a modalidade mais sofisticada da "construção da paz" (peacebuilding) e a assistência eleitoral. A operação de construção da paz comporta "os esforços para dar assistência a países e regiões em transição da guerra para a paz, incluindo-se as atividades e os programas de suporte e fortalecimento dessas transições" (UNITED NATIONS, 2004, p. 78-79). Tais operações chegam a envolver o envio de forças militares para a manutenção da paz, a repatriação e a reintegração de refugiados, a desmobilização e a reintegração de soldados etc. Trata-se, ao cabo, da tentativa de se estabelecer um novo Estado, com viabilidade técnico-administrativa e legitimidade sociopolítica. Interinamente, durante o processo de peacebuilding, a ONU assume as funções administrativas e de polícia do próprio Estado. Outro campo em que a ONU tem atuado é na assistência à realização de eleições em países marcados por algum tipo de instabilidade política. Desde 1989, quando supervisionou a eleição que levou à independência da Namíbia, a ONU foi requisitada para executar funções semelhantes pelos governos de outros doze países.39 O grau e o tipo do envolvimento onusiano dependem de fatores como o teor das requisições feitas por governos, as provisões dos acordos de paz e os mandatos recebidos pela Assembleia Geral ou Conselho de Segurança.40
Cabe notar como difere, em relação à eficiência, a performance da ONU nas operações militares que o Secretariado pode gerenciar (destaque para o peacekeeping) e naquelas que ele não pode comandar. A dimensão do "fazer cumprir", na maior parte dos casos, extrapola a capacidade onusiana instalada, uma vez que lhe faltam exércitos e o mandato para recorrer legitimamente à força, por conta própria. Daí a constatação do terceiro secretário-geral da ONU, U Thant, para quem "não é surpreendente que a organização [ONU] seja culpada por falhar na resolução de problemas que já haviam sido considerados insolúveis por governos" (apud WEISS et al., 2001, p. 106).
A questão que sumariza o debate deste trabalho, então, é a seguinte: para afirmar a sua autoridade política, a ONU deve exercer efetivamente a coerção?
Se analisarmos os fundamentos da autoridade política de Estados e da Organização das Nações Unidas, tenderemos à negativa - ou seja, tenderemos a corroborar a ideia de que a dimensão da autoridade política da ONU não se correlaciona diretamente com a capacidade de coerção da organização,41 haja vista a hesitação dos próprios Estados-membros em equipar com recursos militares e de inteligência o Secretariado da ONU, deixando clara a indisposição de estender à ONU a prerrogativa do exercício da coerção. Nem sequer se menciona a independência militar da entidade nos debates políticos atuais.42 Adicionalmente, resta a alegação de que a força simbólica do secretário-geral provém exatamente de sua imparcialidade, derivada da falta de engajamento prévio com qualquer parte em contenda. A fim de manter a credibilidade como "terceira parte", a ONU - dissociada identitariamente dos Estados que a integram - abstém-se, via de regra, de tomar partido em conflitos.43 Na palavra do ex-secretário-geral assistente da ONU, Giandomenico Picco (1994, p. 15), "transformar a instituição do Secretariado [da ONU] em uma pálida imitação de Estado na gestão do uso da força pode ser uma tática suicida". A esse respeito, Ruggie (1996, p. 1), por exemplo, opina taxativamente: "a ONU e o mundo estarão em melhores condições futuras se baixar o perfil militar da organização, e se ela não se intrometer no cálculo estratégico dos Estados". Afinal, a ONU não é (nem está municiada para fazer as vezes de) um Estado - por acaciano que pareça reafirmá-lo.
Considerações Finais
Em resumo, parece-nos, em face de tais considerações, equivocada a interpretação de que haveria uma tensão real entre as variáveis (i) da autoridade política detida pelas Nações Unidas e (ii) de sua capacidade efetiva de coerção; bem como a hipótese da correlação negativa, ou seja, a suposição de um eventual prejuízo à primeira caso a última não fosse desenvolvida, aperfeiçoada e, no limite, imposta. Pelo fato de a ONU diferir em diversos aspectos de um Estado, pensado especialmente em suas características institucionais, não faz sentido, ao menos no que se refere ao campo da segurança internacional, a associação causal entre as duas variáveis de que buscamos tratar neste artigo.
Ressalve-se que, se autoridade e coerção não se correlacionam no caso das Nações Unidas, e partindo da hipótese de que a primeira foi (e vem sendo) concedida à ONU a despeito de falhas e percalços no exercício coercitivo, é necessário refletir sobre os elementos que fundaram e reiteram tal autoridade. É plausível considerar que (i) a pretensão de universalidade; (ii) a pretensão de imparcialidade; (iii) a vantagem cognitiva comparativa em certas áreas temáticas; e (iv) a formação institucional inclusiva - e, naturalmente, o processo de aceitação de tais elementos por parte dos Estados-membros - são características que conferem às Nações Unidas, no contexto de sua inserção no sistema internacional e à medida que se tornam mais complexas as questões globais, significativo grau de autoridade política.44 Recorrer à ONU para solucionar ou aliviar problemas internacionais, em particular quando a iniciativa é tomada por potências que poderiam, sem grandes esforços, agir à revelia da organização, é legitimar e fomentar a autoridade onusiana.
Donde a alegação de que, especialmente no despertar do século XXI - e a despeito de certos episódios inerentemente controversos, como a invasão do Iraque, em 2003 -, a autoridade política da ONU é crescente (desde a sua fundação) e alimenta-se dos desafios que se lhe colocam, seguindo os passos de um mundo cada vez mais complexo e distante daquele em que viviam seus fundadores.
Notas
Artigo recebido em janeiro e aprovado para publicação em agosto de 2008.
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