EDITORIAL
É preciso repensar o conceito da ventilação manual com balão autoinflável em recém-nascidos
There is a need to review the concept of manual ventilation with self-inflating bags in newborn infants
Celso Moura Rebello
Doutor em Pediatria pela FMUSP; Médico do Instituto da Criança da FMUSP; Médico do Departamento Materno-Infantil do Hospital Israelita Albert Einstein, São Paulo, SP, Brasil
Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Celso Moura Rebello Rua Engenheiro Teixeira Soares, 165 CEP 05505-030 - São Paulo/SP E-mail: celso.rebello@uol.com.br
O conhecimento acumulado nas últimas décadas com relação ao desenvolvimento e à fisiologia dos pulmões do recém-nascido permitiu uma maior compreensão dos mecanismos de lesão pulmonar causados pela ventilação mecânica e pelo uso do oxigênio. Isso resultou em um aperfeiçoamento das técnicas de ventilação não-invasiva, utilizando pressão positiva contínua nas vias aéreas (CPAP)(1), assim como das técnicas de ventilação invasiva, empregando-se tanto a ventilação mecânica convencional como a ventilação de alta frequência(2). Por outro lado, nesse período, não foi observado um aprimoramento significativo dos equipamentos e das técnicas de ventilação com balão autoinflável, que é utilizado com frequência nas salas de reanimação, nas unidades de terapia intensiva neonatal e pediátrica e no transporte dos pacientes pediátricos.
Atualmente, a maioria dos pediatras utiliza o balão autoinflável de uma maneira similar à de 20 anos atrás, com concentrações de oxigênio próximas a 100%, sem o uso de pressão expiratória final positiva (PEEP) e com pressões inspiratórias e volumes-correntes muito elevados. Isso resulta em lesão pulmonar por vários mecanismos, incluindo a exposição a elevadas concentrações de oxigênio, o atelectrauma e o volutrauma(3).
Neste sentido, os resultados publicados por Zaconeta et al(4) nesta edição da Revista Paulista de Pediatria têm o mérito de acrescentar mais informação a este assunto produzida por um grupo com tradição em pesquisa nesta área(5,6). Um dos pontos fortes do trabalho é o estudo de uma população pouco avaliada na literatura pediátrica: profissionais não-médicos que atuam na linha de frente das emergências ocorridas com crianças fora do ambiente hospitalar. Com a avaliação desses profissionais, foi demonstrado que, utilizando balão autoinflável, a ventilação foi realizada em 81% das vezes com pressões fora da faixa considerada adequada (20 a 40cmH2O) e em 52% das vezes com frequência respiratória abaixo da faixa preconizada (40 a 60 ciclos/minuto). Os resultados tornam clara a necessidade de reavaliar o treinamento destes profissionais.
A importância do aprimoramento dos equipamentos e das técnicas utilizadas na ventilação manual fica mais evidente com a observação de que a eficiência da ventilação com balão autoinflável não é maior quando aplicado por pediatras experientes no atendimento à criança com insuficiência respiratória(5).
Os resultados deste estudo nos obrigam a repensar o conceito da ventilação manual com balão autoinflável à luz do conhecimento atual sobre a ventilação protetora no recém-nascido. É necessário que a comunidade pediátrica interaja com a indústria e com os órgãos reguladores federais visando ao desenvolvimento de equipamentos de ventilação manual adequados às necessidades do prematuro, como a obrigatoriedade do uso de válvula de PEEP, de mecanismos de redução da concentração de oxigênio e de limitação da pressão inspiratória a valores inferiores a 40cmH2O.
Recebido em: 13/01/2010
Conflito de interesse: nada a declarar
Instituição: Instituto da Criança do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (ICr/HC-FMUSP), São Paulo, SP, Brasil
Referências bibliográficas
- 1. Courtney SE, Barrington KJ. Continuous positive airway pressure and noninvasive ventilation. Clin Perinatol 2007;34:73-92.
- 2. Keszler M. State of the art in conventional mechanical ventilation. J Perinatol 2009;29:262-75.
- 3. Jobe AH, Ikegami M. Mechanisms initiating lung injury in the preterm. Early Hum Dev 1998;53:81-94.
- 4. Zaconeta CAM, Borges MB, Souza DVB, Marques MG. Avaliação do pico de pressão e da frequência respiratória durante o uso de balão autoinflável por socorristas do corpo de bombeiros em um modelo de pulmão neonatal pré-termo. Rev Paul Pediatr 28;1:5-9.
- 5. Resende JG, Zaconeta CAM, Ferreira ACP, Silva CAM, Rodrigues MP et al Avaliação do pico de pressão, do volume corrente e da freqüência respiratória durante ventilação de carneiros prematuros utilizando balão auto-inflável. J Pediat (Rio J) 2006;82:279-83.
- 6. Resende JG, Menezes CG, Paula AM, Ferreira AC, Zaconeta CA, Silva CA et al Avaliação do pico de pressão e da frequência respiratória durante o uso de balão autoinflável em um modelo de pulmão neonatal. J Pediat (Rio J) 2006;82:359-64.
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
03 Maio 2010 -
Data do Fascículo
Mar 2010