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Prevalência do uso de chupeta em lactentes amamentados e não amamentados atendidos em um hospital universitário

Prevalencia del uso de chupete en lactantes amamantados y no amamantados atendidos en un hospital universitario

Resumos

OBJETIVO: Avaliar a prevalência do uso da chupeta em relação ao tipo de aleitamento, as razões das mães para introduzi-la ou não e os fatores associados à mudança de opinião quanto à sua intenção inicial a esse respeito. MÉTODOS: Estudo transversal que avaliou 642 crianças (0-12 meses) atendidas no Hospital da Pontifícia Universidade Católica de Campinas quanto ao tipo de alimentação e uso de chupeta. A mãe foi questionada sobre sua intenção inicial quanto à chupeta, quanto ao seu uso e, se utilizada, porquê. Após análise descritiva, aplicou-se a regressão logística para verificar a associação da chupeta com a amamentação. RESULTADOS: A prevalência de uso de chupeta foi de 48% (IC95% 44-52), sendo maior entre as crianças não amamentadas (70%) comparadas às amamentadas (36%; p=0,029). Das que estavam em aleitamento exclusivo, 29% usavam chupeta (p<0,001). A chance de ser amamentada foi menor nas crianças com chupeta (OR=0,22; IC95% 0,15-0,33). Observou-se que 60% das mães mudaram de opinião quanto à intenção de introduzir a chupeta. O principal motivo alegado pelas mães que pretendiam dar a chupeta e não deram foi que a criança a rejeitou (95%) e, dentre as que não pretendiam e introduziram a chupeta, foi acalmar a criança (72%). CONCLUSÕES: A prevalência de uso da chupeta é elevada, sendo maior entre crianças não amamentadas; entre as amamentadas, é menor naquelas que recebem aleitamento exclusivo. A maioria das mães referiu ter mudado sua opinião inicial quanto ao uso da chupeta. Poucas mostraram preocupação com a possibilidade de seu uso interferir na amamentação.

chupetas; aleitamento materno; desmame


OBJETIVO: Evaluar la prevalencia del uso de chupete respecto al tipo de lactancia, los motivos de las madres para introducirlo o no y los factores que hicieron con que mudara de opinión respecto a su intención inicial con relación a eso. MÉTODOS: Estudio transversal que evaluó a 642 niños (0-12 meses) atendidos en el Hospital de la Pontificia Universidad Católica de Campinas (São Paulo, Brasil), respecto al tipo de alimentación y uso de chupete. La madre fue cuestionada sobre su intención inicial respecto al chupete, a su uso y, si lo utiliza, el porqué. Tras análisis descriptivo, se aplicó la regresión logística para verificar la asociación del chupete con la amamantación. RESULTADOS: La prevalencia de uso de chupete fue de 48% (IC95% 44-52%), siendo mayor entre los niños no amamantados (70%) si comparado a los amamantados (36%; p=0,029). De los que estaban en lactancia exclusiva, el 29% usaban chupete (p<0,001). La chance de ser amamantado fue menor en niños con chupete (OR=0,22; IC95% 0,15-0,33). Se observó que el 60% de las madres cambiaron de opinión respecto a la intención de introducir el chupete. El principal motivo alegado por las madres que pretendían dar el chupete y no lo dieron fue que el niño lo rechazó (95%) y, entre las que no pretendían introducir el chupete, fue para calmar al niño (72%). CONCLUSIONES: La prevalencia del uso de chupete es elevada, siendo mayor entre niños no amamantados; entre los amamantados, es menor en los que reciben lactancia exclusiva. La mayoría de las madres refirió haber cambiado su opinión inicial respecto al uso de chupete. Pocos mostraron preocupación con la posibilidad de que su uso interfiriera en la amamantación.

chupetes; lactancia materna; destete


OBJECTIVE: To evaluate the prevalence of pacifier use in relation to breastfeeding, to find out the reasons why mothers planned or not to introduce this habit and the arguments for changing their minds about the pacifier used. METHODS: Cross sectional study comprising 642 mother-infant pairs (0-12months) at a University Hospital, in Campinas, São Paulo, Brazil. The mother was questioned about her original intention regarding the pacifier, the current outcome and the explanation for changing or not her mind. After a descriptive analysis, the logistic regression was applied to verify the association between the pacifier and breastfeeding. RESULTS: The prevalence of pacifier use was 48% (95%CI 44-52), being greater among non-breastfeed infants (70%) compared those breastfed (36%; p=0.029). Among the infants exclusively breastfed, 29% used pacifier (p<0.001). The chance to be breastfed was smaller when the infant used a pacifier (OR=0.22; 95%CI 0.15-0.33). Among the mothers, 60% changed their minds regarding their previous intention about pacifier use. The main reasons for changing plans were: infant rejection (95% - for those who wanted to use the pacifier), and to soothe the baby (72% - for those who initially did not want to use the pacifier). CONCLUSIONS: The prevalence of pacifier use is high. This habit is more frequent among non-breastfed infants; among the breastfed ones, it is less frequent for those exclusively-breastfed. The majority of mothers changed their minds regarding their initial plans about pacifier use. Few worried about the possibility that the pacifier could interfere on breastfeeding.

pacifiers; breast feeding; weaning


ARTIGO ORIGINAL

Prevalência do uso de chupeta em lactentes amamentados e não amamentados atendidos em um hospital universitário

Silvia Diez CastilhoI; Renan Capitani CasagrandeII; Carolina Roman RachedII; Luciana Bertoldi NucciIII

Instituição: Ambulatório de Pediatria do Hospital e Maternidade Celso Pierro (PUC-Campinas), Campinas, SP, Brasil

IDoutora em Saúde da Criança e do Adolescente pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp); Professora da PUC-Campinas, Campinas, SP, Brasil

IIAcadêmicos da Faculdade de Medicina da PUC-Campinas, Campinas, SP, Brasil

IIIDoutora em Epidemiologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS); Professora do Centro de Ciências da Vida da PUC-Campinas, Campinas, SP, Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Silvia Diez Castilho Avenida Princesa D'Oeste, 1.144 apto 171 – Jardim Paraíso CEP 13100-040 – Campinas/SP E-mail: sdiezcast@puc-campinas.edu.br

RESUMO

OBJETIVO: Avaliar a prevalência do uso da chupeta em relação ao tipo de aleitamento, as razões das mães para introduzi-la ou não e os fatores associados à mudança de opinião quanto à sua intenção inicial a esse respeito.

MÉTODOS: Estudo transversal que avaliou 642 crianças (0–12 meses) atendidas no Hospital da Pontifícia Universidade Católica de Campinas quanto ao tipo de alimentação e uso de chupeta. A mãe foi questionada sobre sua intenção inicial quanto à chupeta, quanto ao seu uso e, se utilizada, porquê. Após análise descritiva, aplicou-se a regressão logística para verificar a associação da chupeta com a amamentação.

RESULTADOS: A prevalência de uso de chupeta foi de 48% (IC95% 44–52), sendo maior entre as crianças não amamentadas (70%) comparadas às amamentadas (36%; p=0,029). Das que estavam em aleitamento exclusivo, 29% usavam chupeta (p<0,001). A chance de ser amamentada foi menor nas crianças com chupeta (OR=0,22; IC95% 0,15–0,33). Observou-se que 60% das mães mudaram de opinião quanto à intenção de introduzir a chupeta. O principal motivo alegado pelas mães que pretendiam dar a chupeta e não deram foi que a criança a rejeitou (95%) e, dentre as que não pretendiam e introduziram a chupeta, foi acalmar a criança (72%).

CONCLUSÕES: A prevalência de uso da chupeta é elevada, sendo maior entre crianças não amamentadas; entre as amamentadas, é menor naquelas que recebem aleitamento exclusivo. A maioria das mães referiu ter mudado sua opinião inicial quanto ao uso da chupeta. Poucas mostraram preocupação com a possibilidade de seu uso interferir na amamentação.

Palavras-chave: chupetas; aleitamento materno; desmame.

Introdução

O uso da chupeta vem sendo alvo de discussão desde a década de 1970, quando teve início o movimento de incentivo ao aleitamento materno(1). A Organização Mundial da Saúde (OMS) proibiu a propaganda de chupetas, pois se atribui a elas a confusão de bicos, que impede o estabelecimento da amamentação e favorece o desmame(2-4). A Iniciativa Hospital Amigo da Criança surgiu com o propósito de mobilizar a equipe de saúde no sentido de promover, proteger e apoiar o aleitamento materno, na tentativa de evitar o desmame e suas consequências sobre a morbimortalidade infantil(5). Os fundamentos das práticas necessárias para que se dê esse suporte às mães foram resumidos nos "Dez Passos para o Sucesso do Aleitamento Materno" e incluem "não oferecer bicos ou chupetas"(5). Atribui-se ainda ao uso de bicos artificiais (chupeta e mamadeira), alterações no desenvolvimento crânio-facial, que podem levar à respiração bucal, deformidades dentárias, maior predisposição a infecções de vias aéreas, problemas de fonação, dentição, mastigação e deglutição, que acabam por comprometer a saúde da criança(6,7).

Embora no campo da Psicologia não se encontre motivo para contraindicar a chupeta, outras áreas da saúde apontam mais efeitos deletérios do que benéficos decorrentes de seu uso(8). Em geral, os prejuízos estão vinculados à época de início, duração, frequência e intensidade do hábito(8).

Apesar do posicionamento das entidades promotoras de saúde contra o uso indiscriminado da chupeta, esta continua sendo oferecida aos lactentes. A II Pesquisa de Prevalência de Aleitamento Materno nas Capitais Brasileiras e Distrito Federal (PPAM), publicada em 2009(9), mostrou um avanço da amamentação no país e uma diminuição do hábito da chupeta por região e capital de cada estado, se comparado aos dados de 1999(10), mas esses índices ainda estão aquém do desejado.

Com o objetivo de conhecer o comportamento dos pais e os fatores que influenciam na decisão quanto à introdução da chupeta, investigou-se a prevalência do hábito da chupeta em pacientes atendidos no Ambulatório de Pediatria do Hospital da Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas) em relação ao tipo de aleitamento, as razões das mães para introduzi-la, ou não, e os fatores que fizeram-nas mudar, ou não, de opinião em relação à sua intenção inicial. Esse conhecimento pode ajudar os profissionais da saúde a melhor orientar os pais.

Método

Dados de 642 binômios mãe-filho foram coletados no período de agosto de 2009 a março de 2010 entre as crianças agendadas para consulta nos Ambulatórios de Pediatria (Sistema Única de Saúde – SUS – e convênio) do Hospital e Maternidade Celso Pierro da PUC-Campinas. Todos os pacientes matriculados até um ano de idade e acompanhados por suas mães foram convidados a participar. Cada binômio foi abordado apenas uma vez (estudo observacional, descritivo, transversal), sendo incluídos aqueles cujas mães assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.

Para o cálculo da amostra foram considerados os dados da PPAM de 1999(10) que apontavam 66% de prevalência do uso de chupeta, em São Paulo (capital), em crianças menores de um ano. Utilizando o plano amostral proposto por Callegari-Jaques(11), foram calculados tamanhos de amostra para os diferentes níveis alfa e erros em dois cenários (prevalência de 66 e 50%). Para prevalência de 66%, alfa de 5% e erro de 5%, o tamanho da amostra seria de 345 sujeitos. Considerando-se que, com a melhora dos índices de amamentação, esperava-se encontrar menor prevalência de uso de chupeta, optou-se por estimar a prevalência em 50%, com alfa de 5% e erro de 5%, sendo necessários 385 binômios. Como uma segunda etapa do trabalho foi estudar os fatores associados ao uso de chupeta, a coleta de dados continuou até atingir a amostra necessária para a análise de regressão logística.

As entrevistas foram realizadas após a consulta pediátrica por dois pesquisadores previamente treinados, que se revezavam para cobrir os horários do ambulatório. Nessa ocasião, foi aplicado um questionário semiestruturado que contemplava características da mãe (idade, escolaridade, existência de parceiro, número de filhos, trabalho, volta da licença gestante, consultas de pré-natal, orientação sobre amamentação e chupeta, influência externa para introduzi-la, conhecimento sobre seus efeitos), da criança (sexo, idade, tipo de aleitamento, idade gestacional, peso ao nascimento, internação no período neonatal, tempo de internação, idade da introdução da chupeta) e da família (residentes na casa), bem como o tipo de aleitamento e o uso ou não de chupeta nas últimas 24 horas. Para avaliar a intenção da mãe sobre o uso da chupeta por ocasião do nascimento da criança e a justificativa para o desfecho, havia uma pergunta aberta que posteriormente foi categorizada.

A prevalência da amamentação foi avaliada de acordo com as definições da Sociedade Brasileira de Pediatria, que está baseada em critérios da OMS(12): (1) Aleitamento materno exclusivo; (2) Aleitamento materno ou amamentados (quando a criança recebe leite materno independentemente de estar recebendo qualquer alimento, incluindo leite não humano), ou seja, os que estão recebendo leite materno exclusivo ou não e os que já recebem alimento complementar (água, chá, suco, papas); (3) Não amamentados (quando recebem leite de vaca ou fórmula, com ou sem alimento complementar).

Os dados foram analisados nos pacotes estatísticos R e SPSS. Foram feitas análises de frequência das variáveis e calculados seus respectivos intervalos de confiança de 95% (IC95%). Foram aplicados o teste do qui-quadrado (para comparar proporções) e a regressão logística (considerando o aleitamento materno como variável dependente e o uso de chupeta e idade como variáveis independentes). Considerou-se significante p<0,05. Este trabalho teve a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da PUC-Campinas.

Resultados

Dos 642 binômios avaliados, 90 (14%) mães eram adolescentes, 390 (61%) tinham segundo grau completo e 44 (7%) nível superior, 522 (81%) união estável, 400 (62%) não tinham emprego e, daquelas que trabalhavam, 97 (40%) ainda estavam de licença. Observou-se que 583 (91%) mães fizeram pelo menos seis consultas de pré-natal; 618 (96%) afirmaram ter recebido em algum momento (pré-natal, maternidade ou consulta pediátrica) orientação sobre a amamentação e 417 (65%) orientação sobre o uso de chupeta. Das 642 mães, 283 (44%) tinham apenas um filho. Apenas 185 (29%) binômios residiam com parentes ou amigos.

Das 642 crianças, 340 (53%) eram do sexo masculino, 495 (77%) nasceram a termo, a mediana de peso ao nascimento foi de 3112g (570–4810) e 141 (22%) estiveram internadas no período neonatal, com mediana da internação de dez dias (1–150). A distribuição da amostra de acordo com a idade das crianças não privilegiou qualquer faixa etária (Figura 1). A mediana da idade foi de 168,5 dias (5,5 meses) variando de dez a 363 dias.


A prevalência da chupeta (309/642) na amostra estudada foi de 48% (IC95% 44–52). Seu uso foi mais frequente entre os meninos (51%) do que nas meninas (45%). Em 34% (160/308) das crianças que usavam chupeta, ela foi introduzida no primeiro mês, sendo que em 77% (123/160), isso ocorreu antes de sete dias de vida.

Em relação à alimentação, 65% das crianças avaliadas recebiam leite materno e 35% não estavam sendo amamentadas (Tabela 1). A prevalência de aleitamento materno exclusivo em menores de seis meses foi de 46%, sendo de 79% nas crianças de até um mês, 64% aos dois meses, 61% aos três meses, 46% aos quatro meses, 23% aos cinco e 9% aos seis meses.

O hábito da chupeta foi maior (157/224; 70%; IC95% 64–76) em crianças não amamentadas, se comparadas às amamentadas (151/418; 36%; IC95% 32–41). Das que estavam recebendo leite materno exclusivo, 29% (48/164) usavam chupeta (IC95% 22–36). O valor p para a comparação entre a proporção das crianças que usavam chupeta e eram amamentadas em relação às não amamentadas foi 0,029 e, entre as que usavam chupeta e eram amamentadas exclusivamente em relação às não amamentadas, foi 0,001. A análise de regressão logística mostrou que a chance de ser amamentada entre as crianças que tinham o hábito da chupeta foi menor quando comparada às que não usavam chupeta (RC=0,22; IC95% 0,15–0,33), independentemente da idade pós-natal, incluída no modelo como covariada.

A Tabela 2 resume os motivos alegados pelas mães para mudar a sua intenção inicial quanto ao uso da chupeta. Das 642 mães, 61% (390) pretendiam dar chupeta aos filhos e 39% (252) afirmaram que não. Entre as que tinham a intenção inicial de introduzi-la, 40% (156/390) das crianças adquiriram o hábito, enquanto 60% (234/390) não usavam chupeta. A justificativa para a não aquisição do hábito em 95% desses 234 binômios foi a rejeição da criança. Das que inicialmente afirmaram ter a intenção de não dar chupeta, 60% (152/252) acabaram fazendo uso da chupeta e 40% (100/252) mantiveram a conduta planejada. Nesse caso, dentre as 152 mães que mudaram de ideia, 72% afirmaram que a chupeta foi introduzida para acalmar a criança.

Discussão

A prevalência do uso de chupeta em crianças de até um ano de idade, na população estudada, ainda é alta e os índices de aleitamento materno exclusivo ou não estão abaixo do desejado. O entendimento dos motivos que movem as mães a introduzir a chupeta contribui para que os profissionais da saúde possam atuar de forma a esclarecer as mães sobre os prós e contras do uso da chupeta.

Por conta de se tratar de amostra não probabilística, o estudo apresenta limitações. Embora todas as crianças menores de um ano que compareceram à consulta no período estudado tenham sido convidadas a participar, foram incluídos um binômio por família (com a criança menor que um ano) cujos bebês estavam acompanhados pelas mães (pessoas mais adequadas para dar as informações necessárias – amostra não probabilística intencional), que consentiram em participar. Não houve, no entanto, grande número de recusas e o tamanho da amostra foi adequado para avaliar a prevalência do uso de chupeta na população estudada e os argumentos das mães para sua introdução.

Estudos transversais não permitem estabelecer relações causais, mas nota-se que a prevalência do uso de chupeta foi maior entre as crianças não amamentadas do que entre as amamentadas e, entre essas, significantemente menor nas que recebem leite materno exclusivo. Vários autores têm sugerido a associação do hábito da chupeta com a diminuição da duração do aleitamento materno(13,14), mas a relação causa-efeito ainda é controversa. A chance da criança que usava chupeta estar sendo amamentada foi 22% menor do que na que não tinha o hábito. Enquanto Karabulut et al(15) relatam evidências de associação, O'Connor et al(16), afirmam não existir tal associação. Esses autores sugerem que outras variáveis, como as dificuldades para amamentar e a intenção da mãe, podem determinar vieses e que o assunto precisa ser mais estudado.

O hábito da chupeta esteve presente em 48% dos avaliados. Comparando esse dado com a I PPAM realizada em 1999(10), que apontava a prevalência de 58% no Brasil, 66% na região Sudeste e 66% em São Paulo em crianças menores de 12 meses, nota-se haver melhora. A prevalência acompanhou a redução observada na II PPAM 2009(9), que constatou que 43% das crianças brasileiras menores de um ano usavam chupeta (dados colhidos em 2008), sendo a prevalência de 51% na região Sudeste e em São Paulo. Segundo o Projeto Amamentação e Municípios(13), a proporção de uso de chupeta em Campinas variou entre 55 e 59% em 1999 e, cinco anos depois (2004), tinha caído para 51,5%.

A prevalência do aleitamento materno na população estudada (65%) demonstra uma melhora em relação a dados de 2001 da região Noroeste da cidade de Campinas (a mesma em que se encontra localizado o Hospital e Maternidade Celso Pierro), com 56%(17), mas esses índices preocupam, pois tanto a mediana da amamentação exclusiva quanto a de aleitamento são baixas, se comparadas ao preconizado pela OMS(18).

Diante deste quadro é interessante observar que, embora 96% das mães afirmassem ter recebido orientação sobre amamentação e 65% sobre o uso de chupeta, a prevalência do hábito continua alta. O discurso sobre a chupeta pode variar na dependência do que o profissional consultado deseja privilegiar; no entanto, a decisão de introduzi-la cabe aos pais que devem ser esclarecidos a respeito de seus efeitos(8). Este estudo fornece informações que permitem avaliar os motivos que contribuem para que as mães ofereçam chupetas aos filhos.

Embora a chupeta tenha mais efeitos deletérios do que benéficos(8), o mito de que ela acalma a criança parece predominar sobre qualquer outra informação passada aos pais, pois 92% das mães que tinham a intenção de introduzi-la e 72% das que não tinham essa intenção afirmaram que ofereceram a chupeta para aquietar os filhos. Ao sugar o seio, a criança satisfaz tanto suas necessidades nutricionais quanto emocionais(19). O conceito de que a chupeta acalma costuma ser passado de mãe para filha e muitas a oferecem para aplacar o choro, postergando a mamada, quando na verdade a criança está com fome(20). Observa-se que nesses dois grupos aparecem mães (2% das que pretendiam dar e 12% entre as que não pretendiam dar a chupeta) que disseram ter introduzido a chupeta para espaçar as mamadas. Essa conduta, se iniciada antes do estabelecimento da amamentação, pode levar ao desmame, tanto pela confusão de bicos como pela falta de estímulo que determina a diminuição da produção de leite. A chupeta foi, em geral, introduzida no primeiro mês e, mais especificamente, na primeira semana de vida, fato concordante com outras pesquisas(14,21). Howard et al(22) observaram que o uso da chupeta se correlaciona tanto com o tempo de amamentação exclusiva quanto com o tempo de duração do aleitamento materno. De acordo com Binns e Scott(23), isso ocorre porque a mãe oferece o seio com menor frequência e a falta de estímulo reduz a produção de leite. As campanhas em favor do aleitamento materno salientam esses efeitos deletérios da chupeta, mas tais campanhas não parecem sensibilizar suficientemente as mães(5).

Entre as mães que ofereceram a chupeta, algumas (9% das que não pretendiam introduzi-la e 3% das que pretendiam) o fizeram para evitar que a criança chupasse o dedo. O conceito de que sucção digital é pior do que o hábito da chupeta também está arraigado na população. No entanto, tanto a sucção do dedo quanto a da chupeta, segundo Larsson(24), só levam à má oclusão dentária se continuadas após três a quatro anos. Quando o hábito é abandonado antes dessa idade, o contato entre os incisivos superiores e inferiores se restabelece, tendendo a normalizar a mordida (aberta e/ou cruzada) espontaneamente(25).

É interessante observar que 6% das mães que não pretendiam dar chupeta o fizeram por orientação de algum profissional da saúde. Como o estímulo da sucção pode ser utilizado para antecipar a alimentação por via oral em recém-nascidos inicialmente alimentados por sonda nasogástrica(8,26), o hábito pode ter sido introduzido nas crianças prematuras e/ou que ficaram internadas no período neonatal.

Em meados da última década, surgiram estudos que sugeriam a chupeta como fator protetor para a Síndrome da Morte Súbita do Berço (SMSB) e uma mãe decidiu introduzi-la com este objetivo. Enquanto esse efeito continua sendo contestado, pois as opiniões a respeito divergem(27). Um estudo caso-controle conduzido na Alemanha apontou que a amamentação reduz o risco da SMSB em 50% e, como a chupeta induz ao desmame, deve-se refletir antes de sugeri-la com essa finalidade(8,28).

Entre as mães que inicialmente pretendiam dar chupeta e não deram, a maioria (95%) alegou que, apesar de tentarem, a criança recusou seu uso. A sucção do seio, quando oferecida de forma irrestrita, demanda força e satisfaz não só a fome da criança quanto seu desejo de sugar(29). No entanto, quando a criança é alimentada na mamadeira, sua fome é satisfeita, mas não a pulsão relativa à sucção. É de se esperar, portanto, que o incentivo à amamentação em regime de livre demanda diminua a prevalência do uso de chupeta. Apenas 2% das mães desse grupo disseram que não fizeram uso da chupeta para evitar o desmame. Esse dado preocupa, pois parece apontar para o fato de que poucas mães mudaram de opinião frente ao discurso em favor do aleitamento materno.

As mães que não pretendiam dar a chupeta e não a introduziram justificaram sua decisão com argumentos mais coerentes: 27% alegaram que o hábito cria dependência e, posteriormente, seria difícil tirar a chupeta da criança. A sucção é um reflexo inato que garante a sobrevivência no início da vida. Como satisfaz a libido, este comportamento tende a ser repetido, tornando-se inconsciente e transformando-se em hábito, que normalmente vai sendo abandonado à medida que a criança passa para outras fases do desenvolvimento(29). Quando a chupeta é oferecida de forma irrestrita, a criança pode fixar o hábito e ter mais dificuldade em abandoná-lo.

Enquanto 12% das mães não introduziram chupeta por temerem o desmame, quase o dobro (22%) referiu preocupação com a possibilidade de a chupeta levar à deformidade da arcada dentária. Embora a chupeta possa determinar alterações de arcada dentária, estudos demonstram que as deformidades dependem, além da intensidade e do tempo de início e descontinuidade de uso já referidos, da posição em que ela é mantida, padrão de crescimento da face e tonicidade da musculatura orofacial8. Motivos estéticos, numa sociedade que valoriza a aparência, acabam por ter maior peso do que outros que não são tão facilmente compreendidos pela maioria da população.

Preocupações com a possibilidade de infecções foram apontadas por 11% das mães para não introduzir a chupeta, o que se mostra correto, uma vez que a chupeta serve de veículo de transmissão de infecções tais como otites, candidíase oral, cáries e enteroparasitoses(8,27,30,31).

Concluindo, a prevalência do uso de chupeta na população estudada está diminuindo, acompanhando a queda observada no país de acordo com os dados da II PPAM de 2009(9). A prevalência do uso de chupeta é maior entre as crianças não amamentadas. As crianças em aleitamento materno exclusivo usam menos chupeta. Mais da metade das mães afirma ter mudado de opinião quanto à intenção inicial de introduzir a chupeta ou porque a criança a rejeitou ou para acalmá-la. Preocupações com o desmame, alterações da arcada dentária, aumento da frequência de infecções, que deveriam ser informadas pelos profissionais da saúde, parecem ter menor peso na decisão de uso ou não da chupeta, mostrando que há necessidade de melhorar as estratégias de atuação nessa área.

Recebido em: 2/2/2011

Aprovado em: 17/10/2011

Fonte financiadora: Bolsa de Iniciação Científica do Fundo de Apoio à Iniciação Científica (FAPIC/Reitoria) da PUC-Campinas

Conflito de interesse: nada a declarar

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  • Endereço para correspondência:
    Silvia Diez Castilho
    Avenida Princesa D'Oeste, 1.144 apto 171 – Jardim Paraíso
    CEP 13100-040 – Campinas/SP
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      16 Jul 2012
    • Data do Fascículo
      Jun 2012

    Histórico

    • Recebido
      02 Fev 2011
    • Aceito
      17 Out 2011
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