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Medidas de desempenho escolar: avaliação formal e opinião de professores

Learning performance measures: formal evaluation and teachers' opinion

Resumos

O objetivo deste estudo foi comparar o desempenho de escolares em relação à avaliação formal e a opinião de professores. Participaram 164 escolares de ensino fundamental de cidade do interior paulista, sendo 81 do sexo masculino e 83 do sexo feminino. Foi utilizado o Teste de Desempenho Escolar e foram definidos 2 grupos, segundo a opinião da professora quanto ao desempenho normal e abaixo da média. Os resultados revelaram diferença significativa indicando que o menor desempenho foi verificado para o sexo masculino e para a quarta série. As médias do grupo definido pela professora com desempenho inferior foram abaixo do esperado e diferiram significativamente. A opinião da professora neste estudo foi fundamental para a identificação dos problemas relacionados à escolaridade.

escolaridade; aprendizagem


The objective of this study was to compare the performance of school children in relation to formal evaluation and teachers' opinion. One hundred and sixty-four (164) elementary school students in an inland city in São Paulo state, 81 males, and 83 females, took part in this study. The formal performance evaluation was carried out through the Learning Performance Test, and 2 groups were defined according to the teacher's opinion as for normal and below-average performances. The results showed a significant difference, indicating the males and fourth graders as having the lowest performance. The average grades of the group defined by the teacher as having the lowest performance were lower than they were expected to be in the formal evaluation and differed significantly. The opinion of the teacher in this study was essential to the identification of problems related to education.

school education; learning


ARTIGOS

Medidas de desempenho escolar: avaliação formal e opinião de professores

Learning performance measures: formal evaluation and teachers' opinion

Simone Aparecida CapelliniI; Josiane Maria de Freitas TonelottoII; Sylvia Maria CiascaIII

IProfessora Doutora da Universidade Estadual de São Paulo – E-mail: sacap@uol.com.br

IIProfessora Doutora em Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de Campinas – Endereço para Correspondência: R. Antônio Prado, 116 Aptº 202 – Centro – Amparo/SP – E-mail: jtonelotto@uol.com.br

IIIProfessora Doutora da Universidade Estadual de Campinas

RESUMO

O objetivo deste estudo foi comparar o desempenho de escolares em relação à avaliação formal e a opinião de professores. Participaram 164 escolares de ensino fundamental de cidade do interior paulista, sendo 81 do sexo masculino e 83 do sexo feminino. Foi utilizado o Teste de Desempenho Escolar e foram definidos 2 grupos, segundo a opinião da professora quanto ao desempenho normal e abaixo da média. Os resultados revelaram diferença significativa indicando que o menor desempenho foi verificado para o sexo masculino e para a quarta série. As médias do grupo definido pela professora com desempenho inferior foram abaixo do esperado e diferiram significativamente. A opinião da professora neste estudo foi fundamental para a identificação dos problemas relacionados à escolaridade.

Palavras-chave: escolaridade, aprendizagem.

ABSTRACT

The objective of this study was to compare the performance of school children in relation to formal evaluation and teachers' opinion. One hundred and sixty-four (164) elementary school students in an inland city in São Paulo state, 81 males, and 83 females, took part in this study. The formal performance evaluation was carried out through the Learning Performance Test, and 2 groups were defined according to the teacher's opinion as for normal and below-average performances. The results showed a significant difference, indicating the males and fourth graders as having the lowest performance. The average grades of the group defined by the teacher as having the lowest performance were lower than they were expected to be in the formal evaluation and differed significantly. The opinion of the teacher in this study was essential to the identification of problems related to education.

Key words: school education; learning.

INTRODUÇÃO

As dificuldades escolares ou de aprendizagem, grande problema de nosso sistema educacional, vêm sendo amplamente estudadas por pesquisadores de diversas áreas do conhecimento como medicina, psicologia, sociologia e pedagogia interessados em compreender suas causas, métodos de avaliação e intervenção, além do impacto que produzem no desempenho acadêmico (Lewis, 1967; Poppovic et al.,1975; Porto, 1981; Carraher et al.,1995; Pain, 1995; Rocha, 2004).

Trata-se de uma temática complexa, controvertida e de abordagem pluri e interdisciplinar que congrega profissionais que nem sempre concordam em relação às suas definições, concepções e causas, empregando termos diferentes como seus sinônimos; é o caso de déficit, deficiência, fracasso, insucesso, alteração, problema, transtorno e mais comumente o termo distúrbio (DSM-IV, 1994; Fonseca, 1995).

Essa diversidade de terminologia é decorrente também dos diversos enfoques que subsidiaram os estudos das dificuldades de aprendizagem ao longo do tempo. A primeira fase desses estudos é da fundação, compreendida no período de 1800 a 1930, etapa em que as lesões cerebrais foram mais destacadas, buscando-se suas origens e sua relação com as perdas ou distúrbios da linguagem e da fala. A segunda e terceira fase ocorreram no período de 1930 a 1960 e foram marcadas pela busca de instrumentos de diagnóstico e intervenção e desenvolvimento de programas escolares capazes de auxiliar crianças com problemas para aprender. A partir de 1960 experimenta-se a fase contemporânea que se caracteriza pela ampliação dos estudos sobre diagnóstico e intervenção para além da idade escolar, pela busca de definições mais precisas e pelo desenvolvimento de novas tecnologias de aprendizagem.

Segundo Rebelo (1993), as dificuldades de aprendizagem podem ser entendidas como obstáculos, ou barreiras, encontrados por alunos durante o período de escolarização referentes à captação ou assimilação dos conteúdos propostos. Eles podem ser duradouros ou passageiros e mais ou menos intensos e levam alunos ao abandono da escola, à reprovação, ao baixo rendimento, ao atraso no tempo de aprendizagem ou mesmo à necessidade de ajuda especializada. De forma semelhante, Martin e Marchesi (1996) entendem que dificuldade de aprendizagem refere-se a qualquer dificuldade observável vivenciada pelo aluno para acompanhar o ritmo de aprendizagem de seus colegas da mesma idade, independentemente do fator determinante da defasagem.

O termo distúrbio de aprendizagem é o termo mais utilizado como sinônimo de dificuldade de aprendizagem; cabe salientar, no entanto, que dificuldade é um termo mais global e abrangente com causas relacionadas ao sujeito que aprende, aos conteúdos, ao professor, aos métodos, ao ambiente físico e social da escola. Os distúrbios se referem a um grupo de dificuldades, mais difícil de serem identificadas, mais específicas e pontuais, caracterizadas pela presença de disfunção neurológica, que é responsável pelo insucesso na escrita, na leitura ou no cálculo (Johnson e Mykelbust, 1987; Rebelo, 1993; Fonseca, 1995; Guerra, 2002; Rocha, 2004).

Smith e Strick (2001) afirmam que a característica principal de uma dificuldade de aprendizagem é o baixo rendimento, ou desempenho, em atividades de leitura, escrita ou cálculo matemático apresentado por escolares em relação ao que se poderia esperar de acordo com sua inteligência e oportunidades. Embora o baixo rendimento ou desempenho, escolar não seja definitivo para caracterizar as dificuldades de aprendizagem, é necessário que os pais e professores estejam atentos a ele porque representa o ponto de partida para a detecção de problemas relacionados à leitura, à escrita e ao cálculo-matemático.

A intensificação de estudos sobre as formas pelas quais se aprende ou não evidenciou a educação escolar ou formal e os requisitos necessários para que alunos tivessem acesso a ela. Educação formal pode ser entendida como o conjunto de aprendizagens relacionadas à escrita, à leitura e ao cálculo que acontecem na escola, propiciadas por currículos e métodos diversos (Rebelo, 1993; Coll e Bolea, 1996).

De acordo com Proença (2002), o fenômeno escolaridade é extremamente complexo, e falhas ou problemas identificados neste período não podem ser atribuídos a uma causa única, geralmente são multideterminadas. Da mesma forma para Rocha (2004), apesar de as dificuldades se apresentarem no aluno, apenas podem ser compreendidas quando se analisa o processo ensinar-aprender e todas as variáveis envolvidas.

Assim, o processo de escolarização requer uma série de habilidades e competências que se constituem pré-requisitos para as aprendizagens que se processarão. É muito comum que escolares enfrentem problemas de ordens diversas nos primeiros anos de escolarização; existe neste período uma gama de fatores de ordem interna e externa, tanto próprios do indivíduo, quanto da escola ou do seu ambiente, capazes de interferir na aprendizagem e constituírem obstáculos à integração do pensar, sentir, falar, ouvir e agir (Paín,1985; Weiss,1992; Tonelotto, 2002).

Apesar da confusão na utilização de terminologias e na própria concepção das dificuldades de aprendizagem, que muitas vezes atrapalham seu esclarecimento e os avanços de conhecimentos na área, merece destaque o fato de que apenas 43% das crianças que ingressam no sistema educacional terminam o ensino fundamental e, dentre estes, apenas 13% não enfrentam repetências, ou seja, conseguem chegar à oitava série na idade esperada (Pilati,1994). Mais recentemente, dados divulgados pelo Instituto Nacional de Educação e Pesquisa (INEP, 2002) revelam que 59% dos alunos do ensino básico no país apresentam rendimento considerado crítico ou muito crítico e que a taxa de distorção série-idade atinge 39% do total de alunos avaliados.

As dificuldades para aprender estão mais presentes no sexo masculino, de acordo com a opinião de autores como Rapin (1988), Shaywitz et al. (1997), Selikowitz (2001) e Nopola-Hemmi et al. (2002) que apontam para uma incidência de três indivíduos do sexo masculino para um indivíduo do sexo feminino; outros autores, como Tirosh et al. (1998), afirmam que esta proporção pode atingir uma relação de dez para um.

Em relação à série em que as dificuldades são identificadas, de acordo com Rebelo (1993), maior número de crianças das duas séries iniciais do ensino fundamental apresentam alguma dificuldade para aprender. O referido autor atribui as dificuldades aos problemas de adaptação, ao contato com situações inusitadas e à não automatização do processo leitura-escrita. Para Proença (2002), as dificuldades enfrentadas neste período constituem uma etapa natural justificada pela exposição a novas e diferentes tarefas. Avaliar o rendimento ou desempenho escolar é tarefa árdua tanto para professores quanto para técnicos que enfrentam a falta de instrumentos de medida desenvolvidos e apropriados à nossa cultura, além da complexidade dos processos envolvidos (Cunha et al; 2000). No Brasil, é muito reduzida a experiência com instrumentos de avaliação padronizada relativos ao desempenho escolar, e a maior parte das pesquisas, abordando a temática, tem utilizado um instrumento proposto e padronizado por Stein (1994), o Teste de Desempenho Escolar – TDE, destinado à avaliação dos níveis de escrita, leitura e aritmética nas quatro primeiras séries do ensino fundamental. Este teste foi submetido aos critérios propostos pelo Sistema de Avaliação de Testes Psicológicos do Conselho Federal de Psicologia e foi aprovado em abril de 2003 (Resolução 002/2003).

É na sala de aula que as dificuldades para aprender se concretizam, tornando, assim, comum que as mesmas sirvam de laboratório para investigação e ensaios de avaliação da aprendizagem e mesmo para práticas de intervenção (Greene, 1995; Ervin et al., 1998). A avaliação inicial e referencial do professor pode então ser de grande utilidade para a investigação das dificuldades de aprendizagem (Romero, 1995).

Apesar do destaque para o papel positivo desempenhado pelo professor no início da avaliação, autores como Souza (1997) demonstram que professores, no início do processo de alfabetização, já tendem a considerar dificuldades de aprendizagem, apresentadas fazendo um pré-diagnóstico que demonstra não acreditarem na capacidade das crianças para aprender, responsabilizando-as pelo insucesso. Na opinião de Proença, o despreparo profissional do professor, fruto de uma política educacional que não dá a devida atenção à formação profissional, contribui para que o professor fique perplexo diante das dificuldades para aprender de seus alunos, recorrendo muitas vezes à rotulação como forma de lidar com o problema.

Essa rotulação, principalmente no início do período escolar, tem sido muito discutida e sabe-se que seus efeitos levam ao entendimento de que crianças que apresentam dificuldades de aprendizagem são incapazes, preguiçosas, lentas e perturbadas, o que apenas contribui para o agravamento de suas dificuldades, reforçando a imagem negativa que fazem de si mesmas e não permitindo que sejam vistas como únicas. De acordo com o DSM-IV (1995), a baixa auto-estima é uma condição freqüentemente associada às dificuldades de aprendizagem.

A avaliação das dificuldades de aprendizagem deve ser um processo amplo de coleta de dados, que contemple uma análise quantitativa e qualitativa, e que vise verificar o nível de execução das tarefas escolares, desenvolvimento anterior da criança, comportamentos em sala de aula, opinião do professor, ambiente familiar e social, aptidões, métodos de aprendizagem, métodos de avaliação da aprendizagem e outros aspectos referentes ao ambiente e ao aluno (Romero, 1996).

Apesar das polêmicas e controvérsias sobre dificuldades de aprendizagem, é preciso que os estudos sobre o tema sejam ampliados, já que sua incidência, independentemente das causas, é muito alta. Segundo Cemark e Henderson (1994), cerca de 30% dos alunos em idade de escolarização enfrentam algum tipo de dificuldade para aprender. Na opinião de Bossa (2002), há uma necessidade em se avançarem esses estudos no Brasil em decorrência dos prejuízos que ocasionam para a criança, para a família, para o sistema educacional, para o país e para os profissionais que atuam na educação.

Com base no exposto acima, os objetivos deste estudo foram:

  • Avaliar e caracterizar o desempenho de escolares de segunda, terceira e quarta série do ensino fundamental em escrita, leitura e aritmética;

  • Comparar os resultados de acordo com sexo e série dos participantes;

  • Comparar os resultados de grupos de escolares com e sem dificuldades, de acordo com a opinião da professora.

MÉTODO

Participantes

Participaram deste estudo 164 escolares de ambos os sexos, com idade entre oito e onze anos, alunos da 2ª a 4ª série do ensino fundamental da rede pública de ensino de um município do interior paulista, selecionados de 250 que correspondem ao total de alunos da escola nas séries enfocadas. O critério para inclusão no estudo foram avaliações fonoaudiológica, psicológica, auditiva e oftalmológica normais.

Conforme é possível observar pelos dados da Tabela 1, 81 dos participantes pertencem ao sexo masculino e 83 ao sexo feminino, distribuindo-se entre as séries da seguinte forma: 43 na segunda, 66 na terceira e 55 na quarta. Verificada a existência de diferença entre freqüências esperada e obtida, obteve-se que não existem diferenças entre sexo e série na composição da amostra.

Material

Todos os participantes foram avaliados por meio do Teste de desempenho escolar (TDE) – instrumento construído para escolares brasileiros, padronizado, cujo objetivo é avaliar as capacidades fundamentais, relacionadas à leitura, à escrita, à aritmética e total, por séries, classificando o desempenho em superior, médio e inferior (Stein, 1994).

Procedimento

Ao ser iniciada a pesquisa na escola em questão, todos os pais foram contatados em reunião já programada pela escola. A eles foi explicado o propósito da pesquisa e solicitado que assinassem o Termo de Consentimento pós-informado, conforme resolução do Conselho Nacional da Saúde CNS 196/96, para autorização da participação.

Em seguida, iniciou-se uma triagem com avaliações fonoaudiológica, auditiva e oftalmológica, a fim de definir os escolares que participariam do estudo. Dos 250 escolares submetidos a estas avaliações, 86 obtiveram avaliação fora dos padrões considerados normais e 164 dentro dos padrões da normalidade.

Definida a amostra com um total de 164 participantes (segunda, terceira e quartas séries), foi iniciada a coleta de dados com a aplicação individual do TDE. Após todas as avaliações terem sido realizadas, os professores dos participantes foram contatados e foi solicitado que indicassem quais alunos, na opinião deles, manifestavam alguma dificuldade para aprender, tendo como referência situações vivenciadas em sala de aula.

Obedecendo ao critério sim e não para dificuldades no aprendizado, foram formados dois grupos, um com 80 participantes (com dificuldades) e outro com 84 participantes (sem dificuldades).

Os dados coletados foram analisados e interpretados, procedendo-se com a estatística descritiva, com o Teste de Qui-quadrado para se comparar freqüências esperadas e obtidas, com o Teste T de Student para comparação de médias de 2 grupos independentes e com a Análise de Variância para comparação de médias de 3 grupos independentes.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Inicialmente serão apresentados e discutidos os resultados de todo o grupo e, em seguida, os resultados obtidos pelos dois grupos formados a partir da indicação dos professores.

Os resultados obtidos pelos participantes em escrita, aritmética, leitura e total de acordo com o sexo podem ser observados na Figura 1.


As médias obtidas foram maiores para participantes do sexo feminino em todas as avaliações, com diferença significativa em escrita (t= - 2,33 e p=0,02) e total (t= -1,98 e p=0,04), de acordo com a utilização do teste T para amostras independentes, sendo possível afirmar que o desempenho feminino foi significativamente maior em escrita e no total.

Conforme dados da Figura 2, verifica-se que as médias obtidas são maiores para participantes da quarta série em todas as avaliações, com diferença significativa em escrita (F= 5,56 e p=0,004) e aritmética (F=7,37 e p=0,008), de acordo com a utilização da Análise de Variância, sendo possível afirmar que o desempenho da quarta série foi significativamente maior em escrita e em aritmética.


Os resultados encontrados neste estudo referentes à maior presença de dificuldades nas séries iniciais estão de acordo com o proposto por Rebelo (1993) e por Proença (2002) e podem ser decorrentes da adaptação e exposição a novas tarefas e desafios, indicando que medidas especiais para prevenção das dificuldades devem ser tomadas neste período da escolarização. O melhor desempenho observado na quarta série pode também refletir uma capacidade natural de recuperação das dificuldades, já que os déficits sensoriais e cognitivos que poderiam comprometer o aprendizado foram descartados na ocasião da seleção da amostra. Destaque-se que a amostra foi selecionada a partir da exclusão de comprometimento sensorial, cognitivo e de linguagem oral e escrita.

Em seguida, pode-se observar o desempenho dos participantes, divididos em grupos de acordo com a indicação da professora, com dificuldade (G1) e sem dificuldade (G2).

Na Figura 3, os resultados apresentados revelam que as médias obtidas são maiores para participantes do grupo sem dificuldade, com diferença significativa em escrita (t= -11,54 e p=0,0000), aritmética (t= -5,73 e p=0,0000), leitura (t= -9,12 e p=0,0000) e total (t= -10,25 e p=0,0000), de acordo com a utilização do teste T de student, sendo possível afirmar que o desempenho do grupo sem dificuldades foi significativamente maior em todos os aspectos avaliados.


Ao serem comparados os resultados por grupo com e sem dificuldades, observou-se que as médias do grupo definido pela professora como aquele em que dificuldades não foram observadas foram muito maiores. Dificuldades relacionadas ao aprendizado nas séries iniciais são muito comuns e, como afirma Rebelo (1993), elas podem ser duradouras ou passageiras.

O papel do professor como item fundamental para identificar e triar as dificuldades da escolaridade é destacado por Romero (1995) e Smith e Strick (2001). De fato, a experiência do professor, como revelam dados do presente estudo é fundamental em situações de aprendizagem em sala de aula, na observação de comportamentos, na observação de estratégias para resolução de problemas, na observação do aluno com relação ao seu posicionamento diante de dúvidas e observação em relação ao rendimento nas avaliações.

Os professores do período inicial de escolarização tendem a considerar as dificuldades de aprendizagem dos escolares, fazendo um pré-diagnóstico que demonstra que não acreditam na capacidade das crianças para aprender, responsabilizando-as pelo insucesso (Souza, 1997). Entretanto, esse "pré-diagnóstico" pode auxiliar o professor na realização do levantamento das dificuldades de aprendizagem, no sentido de favorecer a elaboração de planejamentos de ensino mais adequados para a realidade educacional da criança, ou seja, a elaboração de planejamento com atividades capazes de minimizar as dificuldades para aprender a leitura, a escrita e o cálculo.

Todavia, a rotulação que ocorre, principalmente no início do período escolar, tem sido muito discutida e sabe-se que seus efeitos levam ao entendimento de crianças que apresentam dificuldades de aprendizagem como sendo incapazes, preguiçosas, lentas e perturbadas, o que apenas contribui para o agravamento de suas dificuldades, reforçando a imagem negativa que fazem de si mesmas e não permitindo que sejam vistas como únicas.

Tal rotulação, por vezes, decorre da falta de interação existente entre professor-escola-família, ou seja, o professor identifica o problema de aprendizagem da criança, atribuindo a esta ou à sua família a responsabilidade pelo fracasso escolar, desconsiderando muitas vezes todas as dimensões do processo ensino-aprendizagem. A sobrecarga de atribuições que o professor tem que assumir diante da sala de aula, bem como o número de alunos pelos quais se responsabiliza, também deve se considerada. Outro aspecto pode ainda se referir ao despreparo profissional do professor, como observado por Proença (2002), que é fruto de um sistema educacional que não prioriza ou não dá a devida atenção à qualidade necessária na formação do docente.

Na Tabela 2 são apresentadas as correla-ções entre os escores obtidos pelos participantes nas áreas avaliadas pelo TDE e é possível observar que são positivas e significativas e que permite que se diga que os participantes com resultados altos numa área também apresentaram resul-tados altos em todas as outras. Maior correlação foi observada para Leitura e Total e menor correlação para Leitura e Aritmética.

As correlações positiva e significativa observadas permitem que se observe que participantes com bom desempenho numa área também apresentam bom desempenho em outra. Isto indica que para a amostra estudada as dificuldades presentes foram mais gerais. Cabe destacar, porém, que eventuais déficits de linguagem oral e/ou escrita foram identificados e excluídos na seleção da amostra e, portanto, não concidem com o perfil dos participantes, o que provavelmente levaria à identificação de problemas de leitura e/ou escrita.

Outro aspecto a ser considerado é que a não predominância de dificuldades pode referir-se, como relata Proença (2202), a falhas provavelmente multideterminadas e que não poderiam ser identificadas na avaliação de rendimento apenas. No entanto, é importante que se avalie continuamente as capacidades da criança para acompanhar a maioria de seu grupo, pois assim a prevenção das dificuldades pode se concretizar.

Os dados da Tabela 3 permitem verificar que, em relação à escrita, as maiores freqüências concentram-se em presença de dificuldade e escores abaixo da média; e ausência de dificul-dade e escores na média ou acima (c2 =66,14 e p=0,0000), com p<0,05. É possível dizer que existe diferença significativa entre freqüências esperadas e obtidas; e que escores baixos em escrita estão associados com presença de dificuldade, da mesma forma que escores na média ou acima estão associados com ausência de dificuldades.

Em aritmética, as maiores freqüências concentram-se em presença de dificuldade e escores abaixo da média. Ausência de dificuldade e escores na média ou acima (c2 =20,51 e p=0,0000), como p<0,05, é possível dizer que existe diferença significativa entre freqüências esperadas e obtidas, e que escores baixos em aritmética estão associados com presença de dificuldade, da mesma forma que escores na média ou acima estão associados com ausência de dificuldade.

Em relação à leitura, da mesma forma, maiores freqüências concentram-se em presença de dificuldade e escores abaixo da média. Ausência de dificuldade e escores na média ou acima (c2 =63,69 e p=0,0000), com p<0,05. É possível dizer que existe diferença significativa entre freqüências esperadas e obtidas, e que escores baixos em leitura estão associados com presença de dificuldade, da mesma forma que escores na média ou acima estão associados com ausência de dificuldade.

Para avaliação do total, verifica-se que maiores freqüências concentram-se em presença de dificuldade e escores abaixo da média. Ausência de dificuldade e escores na média ou acima (c2 =78,30 e p=0,0000), com p<0,05; é possível dizer que existe diferença significativa entre freqüências esperadas e obtidas, e que escores baixos em total estão associados com presença de dificuldade, da mesma forma que escores na média ou acima estão associados com ausência de dificuldade.

Observa-se neste estudo que um número significativo de crianças obteve baixos rendi-mentos em leitura, escrita e cálculo. Estes dados estão de acordo com o proposto por Pilati (1994), apontando para o fato de que apenas 43% das crianças que ingressam no sistema educacional chegam a concluir o ensino fundamental e entre os que concluem, apenas 13% não enfrentam repetências.

Após quase uma década da publicação citada acima, dados semelhantes e preocupantes sobre rendimento escolar foram apresentados em relatório divulgado pelo Instituto Nacional de Educação e Pesquisa (INEP, 2002). A maioria dos alunos que cursaram o ensino básico no país apresentou, em avaliação nacional, rendimento escolar considerado crítico ou muito crítico e a taxa de distorção série-idade atinge 39% do total de alunos avaliados.

Vive-se uma crise educacional que é do aluno, do professor da família, da escola, do sistema educacional e, como afirma Rocha (2004) apesar das dificuldades apresentarem-se no aluno, estas não constituem como um problema só dele, de forma que só podem ser compreen-didas quando se olha para todos os processos interativos dos quais ele participa.

Os dados da Tabela 4 permitem que se observe que maior número de crianças, aponta-das pela professora, com dificuldades para aprender estão mais presentes no sexo masculino, com diferença significativa, o que permite dizer que dificuldades de aprendizagem estão mais associadas ao sexo masculino.

Embora seja possível considerar que os padrões educacionais ainda possam favorecer o sexo masculino, aceitando-se com maior facilidade o baixo desempenho escolar para o sexo masculino, cabe salientar que as diferenças de desempenho escolar, considerando-se o sexo, têm sido mais bem estudadas pela genética, atribuindo-se as dificuldades encontradas a uma herança genética ligada ao cromossomo X. Os resultados do presente estudo são corroborados com os achados de Nopola-Hemmi et al. (2002), Selikowitz (2001), Shaywitz e Shaywitz (1987), Rapin (1988) e Cemark e Henderson (1994) que apontam para uma incidência de dificuldades no desempenho escolar no sexo masculino.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os dados obtidos neste estudo permitem considerar que o papel do professor enquanto identificador dos problemas de aprendizagem é efetivo, pois os escolares por eles classificados como alunos com dificuldades de aprendizagem formaram o grupo que apresentou escores abaixo da média em atividades de leitura, escrita e aritmética. Desta forma, a percepção inicial das alterações na aprendizagem escolar deve ocorrer por meio de um diagnóstico ou sondagem pedagógica realizada em âmbito escolar como forma de identificar e prevenir problemas na aprendizagem da leitura e escrita, buscando, desta forma, a preparação de programas educa-cionais efetivos para o trabalho com as dificul-dades dos alunos visando à diminuição do número de escolares que apresentam fracasso escolar.

Outro aspecto importante é o número de alunos com baixos rendimentos observados, que revela o estado crítico da educação formal a eles proporcionada. Se de fato apenas podemos entender dificuldades quando olhamos para o processo ensinar-aprender, parece urgente que políticas educacionais possam se ocupar melhor da questão da dificuldade de aprendizagem, exigindo, sem dúvidas, um grande esforço do sistema educacional.

Quanto mais precoce for a identificação, por parte do professor, das alterações referentes aos atos de ler, escrever e calcular, melhor se estabelecerá sua prática pedagógica, pois questões que permeiam a sala de aula como o fracasso escolar, a repetência, a baixa-auto-estima tanto do professor como do aluno e a evasão escolar podem ser minimizadas, a partir do oferecimento de melhores condições de estabelecimento da relação desenvolvimento/aprendizagem.

A identificação de que o maior número de escolares, neste estudo, com dificuldade de aprendizagem está na quarta série nos faz refletir sobre como alunos, que apresentam problemas em sua aprendizagem escolar, conseguem acompanhar situações de ensino-aprendizagem mesmo sem ter conseguido, ao longo das seriações, superar suas dificuldades, criando, desta forma, uma lacuna na compreensão de como o professor que ao mesmo tempo, "sabe" identificar o aluno com alterações na aprendiza-gem não "sabe", ou não "consegue", ajudar este aluno a superar suas falhas pedagógicas.

Este estudo remete à necessidade de considerar que o professor que atua com crianças que estão em fase de desenvolvimento neuroló-gico, cognitivo e lingüístico merece formação continuada para o entendimento das relações bio-psico-sociais envolvidas na ocorrência do desenvolvimento acadêmico normal destas crianças, pois somente assim conseguiremos uma participação efetiva destes profissionais, não apenas na identificação precoce dos problemas de aprendizagem de origem pedagó-gica ou social, como também na sua participação em equipes de profissionais que realizam diagnóstico para verificação de disfunção neuropsicológica, o que muito contribuiria para a diminuição de "rótulos" sobre os problemas escolares, bem como para um maior aproveita-mento destas crianças em sala de aula.

Recebido para publicação em 24 de outubro de 2003 e aceito em 15 de março de 2004.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Mar 2009
  • Data do Fascículo
    Ago 2004

Histórico

  • Aceito
    15 Mar 2004
  • Recebido
    24 Out 2003
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