Open-access Evaluation of the Ages and Stages Questionnaire-Brazil by Early Childhood professionals

Avaliação do Ages and Stages Questionnaire-Brasil por profissionais de Educação Infantil

Abstracts

Child development assessment is important for the development of action plans for early childhood problem prevention. There are few instruments that are systematically used in day care centers. The Ages and Stages Questionnaire-Brazil, which consists of 18 questionnaires, was adapted and used in the public day care system of Rio de Janeiro. However, studies on the user's evaluation of this screening tool have not yet been conducted. A total of 28 childhood educators who work in 6 different day care centers participated in this study. They completed two different versions of the Ages and Stages Questionnaire-Brazil: a version to Assess Beliefs of Educators about children Development and another one about the Characteristics of this screening tool. The internal consistency for 504 questionnaires was calculated and compared to the original sample. Analysis of Variance was performed to identify differences between the importance given by educators to the five developmental domains assessed in the Ages and Stages Questionnaire: gross motor, fine motor, communication, problem solving, and personal-social. Results indicated good internal consistency and the need for changes in the questionnaire to ensure clarity and adequacy to day care centers.

Assessment; Child care centers; Child development; Psychometrics


Avaliar o desenvolvimento infantil é importante para planejar ações de prevenção a problemas na primeira infância. Há poucos instrumentos aplicados sistematicamente em creches. O Ages & Stages Questionnaire-Brasil, que conta com 18 questionários, foi adaptado e aplicado no sistema público do Rio de Janeiro. Contudo, estudos de avaliação da medida pelos usuários ainda não foram conduzidos. Participaram 28 educadoras infantis de seis creches as quais respon-deram duas medidas: uma versão do Ages & Stages Questionnaire-Brasil para Avaliação das Crenças de Educadoras sobre o Desenvolvimento; e Características do Ages & Stages Questionnaire. Foi calculada a consistência interna de 504 questionários e comparada com a amostra original do Ages & Stages Questionnaire-Brasil. Foi aplicada, ainda, uma Análise de Variância para identificar diferenças na importância atribuída pelas educadoras às cinco áreas do Ages & Stages Questionnaire-Brasil: Coordenação motora ampla e fina, Comunicação, Resolução de problemas e Pessoal/Social. Os dados indicaram boa consistência interna, mas necessidade de mudanças quanto à clareza e contextualização para creches.

Avaliação; Creches; Desenvolvimento infantil; Psicometria


Na última década, a avaliação do desenvol-vimento cognitivo infantil vem crescendo dentro da temática das políticas públicas (Heckman, 2006). Com o objetivo de contar com um instrumento para levantar indicadores periódicos do desenvolvimento cognitivo das crianças que frequentam suas creches, a prefeitura do município do Rio de Janeiro utilizou pela primeira vez em 2010 a versão adaptada para o Brasil (Filgueiras, Pires, Maissonette, & Landeira--Fernandez, 2013) do Ages & Stages Questionnaire (Squires, Bricker, Twonbly, & Potter, 2009), denominado ASQ-BR. Todas as crianças de creches públicas do município foram avaliadas em 2010 pelos Agentes Auxiliares de Creche (AAC), ou cuidadores, totalizando 45 . 650 participantes entre 4 e 60 meses de idade. O estudo conduzido entre 12 de outubro e 17 de dezembro do mesmo ano culminou na conversão dos dados coletados em índices norteadores de futuras políticas públicas no âmbito das creches do Rio de Janeiro (Observatório da Educação, 2011; Pádua, 2011; Rio de Janeiro, 2010)

O Ages & Stages Questionnaire-3 (Squires et al., 2009), em sua versão brasileira - ASQ-BR (Filgueiras et al., 2013), consiste em uma série de questionários dividido em 20 diferentes intervalos etários; que busca, assim, avaliar crianças com idades entre 4 e 66 meses (cinco anos e meio). Cinco domínios do desenvolvimento infantil são medidos em suas subescavas do ASQ-BR: Comunicação, Coordenação motora ampla, Coordenação motora fina, Resolução de problemas e Pessoal/Social. O examinador precisa conhecer bem a criança, assim como seus hábitos e habilidades e, por isso, pais, familiares, professores e cuidadores são capazes de administrar o instrumento, uma vez que esses requisitos sejam cumpridos (Filgueiras et al., 2013; Squires et al., 2009).

Apesar das diversas evidências empíricas de boa qualidade psicométrica do ASQ-BR aplicado no contexto das creches públicas, diversos itens e subescalas apresentaram coeficientes estatísticos inadequados ou longe do ideal (Filgueiras et al., 2013). Durante o processo de implementação desse questionário como indicador da prefeitura do Rio de Janeiro, uma série de questões foram levantadas em relação a sua adequação à realidade do professor de creche. Essas indagações tiveram início desde o momento em que as diretoras entraram em contato com o instrumento. A primeira dúvida diz respeito à contextualização dos quesitos à realidade pedagógica, dado que algumas perguntas demandam práticas e objetos os quais não fazem parte do material disponível na creche. Um exemplo é a questão: "a criança corta um papel ao meio com tesoura?".

Além disso, o tempo de aplicação e a disponibilidade de uma educadora deixar suas atividades de rotina para avaliar cada criança separadamente também foi questionado. As diretoras também mostraram preocupação com o que consideraram o caráter médico-biológico do instrumento. Finalmente, as educadoras indagavam se esse tipo de avaliação não deveria ser conduzida por profissionais da área da saúde (Fórum Permanente de Educação Infantil do Estado do Rio de Janeiro, 2011).

Essas dúvidas podem ter sido a causa de alguns problemas observados na estrutura psicométrica do ASQ-BR. Apesar de ser apenas uma hipótese, de fato, torna-se importante um olhar para as concepções das educadoras em relação a esse instrumento para que se possam construir caminhos mais homogêneos e confiáveis para a avaliação do desenvolvimento infantil nas creches do município do Rio de Janeiro.

Desenvolvimento ontogenético: o papel das crenças do cuidador na trajetória do desenvolvimento da criança

A literatura tem indicado que o desenvolvimento ontogenético ocorre em contextos específicos ou "nichos", como definem Harkness e Super (1996). Essa noção inclui três subsistemas, os quais devem ser levados em conta no estudo da ontogênese: o ambiente físico e social, as práticas compartilhadas de cuidado e a psicologia dos cuidadores. Este último refere-se às crenças e expectativas dos cuidadores, que acabam influenciando suas práticas de cuidado. Um cuidador pode acreditar que determinadas habilidades estão presentes desde o nascimento, não se preocupando em desenvolvê-las. Por outro lado, pode fazer parte da crença de outro profissional que é possível desenvolver a mesma habilidade na criança através da estimulação. Essas crenças diversas têm relação com a importância de diferentes tarefas de avaliação do desenvolvimento cognitivo, como aquelas presentes no ASQ-BR (Carvalho & Seidl de Moura, 2011). As metas de desenvolvimento representam crenças sobre habilidades e características que os educadores buscam ampliar nas crianças. Logo, essas metas possuem papel fundamental na trajetória que essas capacidades percorrerão em cada um desses indivíduos (McGillicuddy-DeLisi, 1985; Trommsdorff & Kornadt, 2003).

A figura do profissional de educação infantil mudou muito nos últimos anos. De técnico que transmite informações às crianças, o educador infantil passou a ser o mediador da construção do conhecimento e do desenvolvimento, assumindo, assim, novos papéis e responsabilidades no exercício de suas funções (Antunes, 2007). Do mesmo modo, a creche passou a ter importância pedagógica fundamental no desenvolvimento infantil a partir da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996 (Oliveira & Miguel, 2012), culminando na transferência da responsabilidade de gestão dessas instituições da Secretaria Municipal de Assistência Social para a Secretaria Municipal de Educação no município do Rio de Janeiro em 2000 (Tatagiba, 2010). Nesse prisma, o professor de creche possui dois tipos de meta a serem atingidas: (1) as diretrizes pedagógicas delimitadas pela prefeitura do Rio de Janeiro através do documento Orientações para profissionais da Educação Infantil (Rio de Janeiro, 2011); e (2) o desenvolvimento de habilidades com base nas metas do desenvolvimento, ou seja, crenças e valores do profissional sobre desenvolvimento infantil.

Essas crenças e valores manifestam-se nas práticas cotidianas do educador infantil e afetam seus objetivos em relação ao desenvolvimento das crianças sob seus cuidados (Carvalho & Seidl de Moura, 2011). Portanto, é importante analisar os efeitos que os valores pessoais dos educadores, suas preferências e o reconhecimento de normas têm em sua prática diária, em especial na avaliação do desenvolvimento cognitivo. Nesse sentido, o objetivo do presente trabalho foi avaliar a consistência interna e identificar a atribuição da importância dos domínios do desenvolvimento do ASQ-BR, sob o ponto de vista dos usuários do instrumento: as professoras de creches no município do Rio de Janeiro.

Método

Participantes

Participaram do presente estudo 28 educadores do sexo feminino, com idade média de 28,5 anos (Desvio-Padrão - DP = 4,3) e provenientes de seis creches do município do Rio de Janeiro (Cantinho Feliz, Chico Bento, Josefa Ferreira da Costa, Souza Pinto, Espaço de Desenvolvimento Infantil Samira Pires Ribeiro e Sementes do Amanhã). Foram selecionadas educadoras que estavam envolvidas no trabalho desde o projeto de validação, treinamento das diretoras e acompanhamento da coleta de dados do ASQ-BR, os quais ocorreram em 2010. Todos os participantes cumpriram dois requisitos mínimos: ter participado da primeira coleta do ASQ-BR, tendo, pelo menos, o ensino médio técnico normal completo, e experiência de trabalho maior que três anos, especificamente em educação infantil. O local da entrevista foi na própria creche onde trabalhavam cada um dos participantes, durante o horário de expediente. A presente pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética do Departamento de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, sob o parecer nº 006/2011.

Instrumentos

Para identificar a importância que as educadoras dão às questões do ASQ-BR, adaptou-se o instrumento para duas versões: uma para avaliar as crenças das participantes sobre o desenvolvimento, a partir do ASQ-BR, e outra para identificar quais características do questionário foram consideradas de maior ou menor importância pelas respondentes.

O ASQ-BR é formado, originalmente, por 18 questionários, um para cada um dos intervalos de faixa etária, onde se espera uma mudança significativa no repertório de comportamentos. As faixas de idade compreendem 6, 8, 10, 12, 14, 16, 18, 20, 22, 24, 27, 30, 33, 36, 42, 48, 54 e 60 meses. Cada questionário é composto por cinco dimensões a serem avaliadas: Coordenação motora ampla, Coordenação motora fina, Comunicação, Resolução de problemas e Pessoal/Social. Todas são delimitadas por seis perguntas referentes aos comportamentos catalogados pela literatura, a serem respondidas dentro de uma escala de frequência de três pontos do tipo Likert: "Sim", "Às vezes" e "Ainda não". O tempo médio de aplicação do instrumento foi de 15 minutos (Filgueiras et al., 2013; Squires et al., 2009).

O Ages and Stages Questionnaire-Brasil para avaliação das crenças de educadoras sobre o desenvolvimento

O Ages and Stages Questionnaire-Brasil para Avaliação das Crenças de Educadoras sobre o De-senvolvimento (ASQ-BR ACED) foi uma adaptação do ASQ-BR (Filgueiras et al., 2013) contendo os mesmos itens, os quais, no entanto, devem ser avaliados pelo educador quanto à sua importância através das seguintes possibilidades: "Pouco importante", "Irrelevante" ou "Importante" para o desenvolvimento da criança dentro da faixa etária relativa ao teste. Assim, o ASQ-BR ACED foi usado para verificar o julgamento das educadoras em relação à relevância de cada item e, principalmente, do domínio do desenvolvimento avaliado.

Características do Ages and Stages Questionnaire

Bricker, Squires e Clifford (2010) propuseram uma ferramenta que medisse a utilidade e a praticidade do teste chamada de Características do ASQ (CASQ). O estudo original estadunidense obteve seus resultados a partir de uma amostra de 731 pais que responderam ao ASQ-3. Estes responderam seis perguntas sobre suas opiniões pessoais acerca do procedimento do teste: 1. How long to complete ASQ?; 2. Was ASQ easy to understand?; 3. Were ASQ questions appropriate? 4. The ASQ questionary was...; 5. Would you fill out another ASQ?; 6. Would you change the ASQ?. Na amostra americana, 60% das respostas indicaram que o ASQ-3 leva menos de 10 minutos para ser preenchido, 96%, que é de fácil compreensão, e 90%, que as questões são apropriadas e que completar o questionário foi interessante, além de ter feito com que os pais pensassem a respeito de suas crianças. Além disso, a maioria preencheria outro ASQ-3 e não mudaria nada no questionário. Dessa forma, o CASQ foi traduzido para o português e respondido pelas educadoras, sendo que sua versão final pode ser encontrada na Tabela 1. Observa-se que a inserção da pergunta "Como?" na alternativa "a" do item 6 abre caminho para ouvir a fala de cada participante.

Tabela 1
- Questões do CASQ e a frequência de resposta das educadoras. Rio de Janeiro, RJ, 2011

Procedimentos

Cada educador foi procurado individualmente, com a permissão da direção da respectiva creche, e perguntado sobre sua vontade e disponibilidade em responder dois questionários sobre o ASQ-BR. Em um deles (ASQ-BR ACED) o participante emitiria sua opinião sobre a importância de cada item para a avaliação proposta e, no outro (CASQ), daria sua opinião a respeito do próprio ASQ-BR. Os participantes responderam o CASQ - um por educador -, médio técnico normal completo, e os 18 questionários do ASQ-BR ACED, referentes às faixas etárias de 6 a 60 meses, totalizando 504 documentos respondidos. Os dados foram coletados nas próprias creches, pela primeira autora deste trabalho, nos intervalos entre as atividades dos educadores, os quais levaram em média 50 minutos para completar a tarefa.

Inicialmente, a estatística descritiva da quantidade (n) e da frequência de cada resposta em porcentagem (%) foi realizada para avaliar as características gerais de aplicação do CASQ: tempo médio de aplicação, clareza e adequação das perguntas, sensação subjetiva do educador em relação ao teste, nova possibilidade de aplicação e de mudança do instrumento pelo educador (Squires et al., 2009). Para cada uma dessas variáveis um teste inferencial de proporção na distribuição das respostas - teste Qui-quadrado (c2) - foi feito, visando verificar se uma resposta era mais prevalente em relação às demais.

As análises dos itens do ASQ-BR ACED ocorreram em função da soma total dos pontos, a partir do mesmo escore atribuído ao instrumento original: 0: pouco importante; 5: indiferente; 10: muito importante. Uma Análise das Variâncias (Anova) de uma via foi conduzida para identificar diferenças relativas à importância que cada educadora atribuiu aos cinco blocos de itens (coordenação motora ampla e fina, comunicação, resolução de problemas, pessoal/social). O teste post-hoc adotado para identificar diferenças individuais entre os níveis foi o Fisher's Least Significant Difference (LSD). O Alfa de Cronbach foi utilizado para acessar a consistência das escalas, bem como comparar com os originais do estudo de validação em amostra brasileira (Filgueiras et al., 2013), objetivando avaliar quanto as educadoras concordam em relação à relevância dos itens referentes àquele construto. Todas as análises foram conduzidas no softwareStatistical Package for the Social Sciences (SPSS, versão 15.0).

Resultados

Primeiramente, serão serão descritos os resultados do CASQ. A Tabela 1 apresenta as questões desse instrumento e as frequências das respostas das educadoras para cada uma delas.

Tabela 2
- Alfa de Cronbach dos 18 questionários para cada domínio do desenvolvimento. Rio de Janeiro, RJ, 2011

Na pergunta 1, a prevalência da resposta de maior frequência foi estatisticamente significativa: c2 = 14,0, p < 0,01. Os dados sugerem que a maior parte das participantes leva entre 30 minutos e uma hora para o preenchimento do questionário em ambiente pré-escolar. Já na segunda questão, a concentração de respostas "Sim" e "Às vezes" foi significativamente maior que a da resposta "Não", para c2 = 9,8, p < 0,01, mas quando comparadas apenas às concentrações de "Sim" e "Às vezes", não é possível determinar a prevalência de uma resposta sobre a outra: c2 = 0,4, p = 0,53. Esses dados sugerem que, apesar de algumas educadoras compreenderem facilmente o conteúdo do teste, ele poderia ser mais simples e claro no que tange às perguntas aplicadas ao contexto da educação infantil.

Com relação à pergunta 3, mais uma vez, a concentração de respostas foi estatisticamente significativa para c2 = 10,8, p < 0,01. Contudo, não houve diferença estatística entre as categorias "Sim" e "Às vezes": c2 = 1,1, p = 0,30. Isso sugere que, apesar de uma parcela significativa dos educadores considerarem as perguntas adequadas, alguns pensam que, às vezes, os itens poderiam refletir melhor seu conteúdo no que concerne ao desenvolvimento infantil observado no ambiente de creches e pré-escolas no município do Rio de Janeiro. Na pergunta 4, considerando somente as três respostas marcadas, houve diferença significativa entre elas: c2 = 6,3, p < 0,05. Esse resultado propõe que as educadoras acreditam que o instrumento é informativo e traz novos olhares sobre as crianças.

No que diz respeito à quinta questão, a diferença estatística, c2 = 10,7, p < 0,01, aponta para a vontade das educadoras em responder ao instrumento continuamente. Isso, provavelmente, está atrelado ao conteúdo da pergunta 4, a qual permite que o educador receba informações interessantes e novas perspectivas para refletir sobre seus alunos. Finalmente, na questão 6, apesar da categoria "Sim" ter recebido maior concentração de respostas, essa prevalência não foi estatisticamente significativa: c2 = 0,2, p = 0,68. Com isso pode-se inferir que metade dos educadores considera importante mudar o ASQ-3. Diante da proporção de profissionais em educação infantil no município do Rio de Janeiro, é importante lhes dar ouvido para compreender de que modo gostariam que o ASQ-3 fosse modificado a fim de auxiliar em seu trabalho.

Em relação ao ASQ-BR ACED, a Figura 1 apresenta a média da soma dos escores atribuídos para cada um dos cinco domínios do desenvolvimento, medidos pelo ASQ-3, em função da relevância de cada item para as educadoras. No domínio Comunicação a média foi de 56,9, Erro-Padrão da Média (EPM) = 0,80; no Coordenação motora ampla, 55,90, EPM = 0,90; no Coordenação motora fina a média foi de 48,70, EPM = 2,00; no domínio Resolução de problemas, 49,70, EPM = 1,90; e, finalmente, no Pessoal/Social a média foi de 55,10, EPM = 1,10.

Figura 1.
Média dos escores do ASQ-3 para cada domínio do desenvolvimento.

A Anova de uma via revelou diferença significativa entre as médias - F (5,499) = 6,78, p < 0,01. O teste post-hoc LSD de Fisher mostrou que os domínios Comunicação, Coordenação Motora Ampla e Pessoal/Social não apresentaram diferenças significativas entre si (p > 0,05), contudo, mostram diferenças estatísticas em face dos domínios Coordenação Motora Fina e Resolução de Problemas (p < 0,05). Estes últimos não tiveram diferença significativa entre suas médias (p = 0,64).

As subescalas apresentaram, em sua maioria, bons alfas de Cronbach, demonstrando boa consistência interna, o que pressupõe coerência nas respostas de todas as educadoras. O domínio Comunicação apresentou alfas entre 0,76 (seis meses) e 0,89 (48 meses). O mesmo padrão se repetiu nos domínios Coordenação motora ampla, 0,74 (16 meses) e 0,87 (60 meses), e fina, 0,74 (6 e 20 meses) e 0,91 (60 meses). Resolução de problemas e Pessoal/Social apresentaram os menores valores de alfa: de 0,61 (48 meses) a 0,78 (22 meses) e de 0,44 (16 meses) a 0,75 (54 meses). A Tabela 2 apresenta os valores dos alfas de Cronbach de todas as faixas etárias do ASQ-BR ACED em cada um dos cinco domínios.

As correlações dos alfas de Cronbach dos ASQ-BR ACED com os do estudo de validação para população brasileira do ASQ-BR (Filgueiras et al., 2013) demonstraram que os quesitos Comunicação (r = 0,73); Coordenação motora ampla (r = 0,94); Coordenação motora fina (r = 0,86); Pessoal/Social (r = 0,71) apresentaram correlação forte, o que, provavelmente, aponta para convergência entre o que os educadores consideram desenvolvimento infantil e os resultados do ASQ-BR na avaliação desse mesmo desenvolvimento. No entanto, o quesito Resolução de problemas (r = 0,54) apresentou correlação apenas moderada, convergindo menos com seus valores e atuação profissional.

Discussão

As crenças e valores adquiridos pelo educador infantil ao longo de sua formação e a evolução destes para acompanhar o papel desse profissional, o qual está em constante mudança, refletem e direcionam suas práticas diárias nas creches. O incentivo e o estímulo ao desenvolvimento de certas habilidades dependem da crença do educador em relação a elas (Carvalho & Seidl de Moura, 2011), influenciando diretamente a avaliação dessas habilidades no contexto da creche. O educador infantil, nos dias de hoje, é o mediador na construção do conhecimento e desenvolvimento da criança. Suas metas representam a configuração de seus saberes, valores, hábitos, concepções e ações educativas, os quais se manifestam em suas práticas cotidianas e afetam seus objetivos em relação à avaliação do desenvolvimento das crianças sob seus cuidados.

Assim, os resultados deste estudo demonstraram que, de modo geral, o ASQ-BR leva mais de 30 minutos para ser preenchido, o que não confirma as afirmações dos autores da escala (Squires et al., 2009; Filgueiras et al., 2013). Além disso, poderia ser mais simples e claro, refletindo melhor seu conteúdo no que concerne ao desenvolvimento infantil observado no ambiente de creches no município do Rio de Janeiro. Apesar de ter sido avaliado como um bom instrumento pelos autores originais (Squires et al., 2009) e pelos da adaptação brasileira (Filgueiras et al., 2013), algumas questões vão de encontro ao que os educadores acreditam ser importante avaliar no contexto da creche. Ainda assim, pode-se concluir que as perguntas propostas são, na opinião dos educadores, informativas e trazem novos olhares a respeito da criança. Isso reflete o desejo da maioria em realizar o instrumento continuamente, se realizadas algumas mudanças.

A falta de contextualização das questões e de sua adequação à realidade da criança na rotina da creche foi a crítica mais importante e presente no discurso dos educadores, seguida pela falta de conhecimento do instrumento, tempo de aplicação, relevância das perguntas e adequação aos domínios. De fato, torna-se uma tarefa difícil para o educador avaliar questões sobre o desenvolvimento infantil, as quais não comungam com suas crenças e valores e, consequentemente, não permeiam suas práticas diárias.

Os dados sugerem que as participantes acreditam que as questões sobre Comunicação, Coordenação motora ampla e Pessoal/Social possuem maior importância que aquelas acerca da Coordenação motora fina e da Resolução de problemas. Esse fenômeno pode estar relacionado a duas diferentes hipóteses: (1) as educadoras consideram que as questões do ASQ-BR para esses domínios não são adequadas para avaliar o desenvolvimento infantil ou (2) essas perguntas não possuem adaptabilidade para o ambiente de creches e pré-escolas no município do Rio de Janeiro.

De fato, o domínio Resolução de problemas apresentou alguns problemas nas análises dos dados normativos do ASQ-BR. Em uma amostra de 5 . 291 educadores infantis das creches do município do Rio de Janeiro, Filgueiras et al. (2013) encontraram o alfa de Cronbach relativamente baixo para esse domínio: 0,67. A análise de Teoria de Resposta ao Item não-paramétrica de Mokken também apresentou baixo índice de confiabilidade Rho = 0,68. O índice de escalonabilidade L de Loevinger também foi baixo para a escala Resolução de Problemas L = 0,30 (Filgueiras & Landeira-Fernandez, 2011), demonstrando que esse domínio apresenta alguns problemas, os quais podem ser explicados pelos temas presentes nas respostas das educadoras em relação ao item 6 do CASQ e pelas diferenças encontradas no ASQ-BR ACED.

As participantes não discordam que o ASQ-BR é um bom instrumento o qual pode levantar indicadores relevantes, mas acreditam que estes poderiam estar mais associados ao trabalho de psicólogos do desenvolvimento ou psicopedagogos, dado a perspectiva biopsicológica e a abordagem médico-empirista de acordo com as quais o instrumento foi construído (Squires et al., 2009). De fato, pode-se concluir que houve maior aceitação e menos resistência aos domínios de comunicação e coordenação motora. Esse fenômeno pode ser explicado pelo fato de que, em um instrumento baseado no desenvolvimento como fruto da maturidade neurológica, onde espera-se que, em determinada idade, a região cerebral responsável por um comportamento esteja formada, domínios mais comportamentais, como comunicação e coordenação motora, são mais facilmente observados e medidos. Conclui-se, portanto, que o ASQ-BR, após reformulações no sentido de contextualizar suas questões às creches brasileiras, em especial os domínios Resolução de Problemas e Pessoal/Social, poderia se tornar uma opção em termos de instrumento de avaliação do desenvolvimento infantil.

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  • Apoio: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior e Fundo de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro.

Publication Dates

  • Publication in this collection
    Apr-Jun 2016

History

  • Received
    11 Dec 2013
  • Reviewed
    12 Feb 2015
  • Accepted
    07 Apr 2015
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Programa de Pós-Graduação em Psicologia, Pontifícia Universidade Católica de Campinas Editora Splendet, Pontifícia Universidade Católica de Campinas, Campus I, Rua Prof. Dr. Euryclides de Jesus Zerbini, 1516, Pq. Rural Fazenda Santa Cândida, Telefone: (55 19) 3343-7223. - Campinas - SP - Brazil
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