Resumo
O objetivo do estudo é analisar as oportunidades de comércio a partir da simulação de uma possível integração comercial do Brasil com a China, com os EUA e com a UE, buscando identificar os setores mais beneficiados pelo eventual acordo, classificados conforme seu grau de intensidade tecnológica, com ênfase no agronegócio brasileiro. Empregou-se a classificação de produtos por grau de intensidade tecnológica segundo os critérios da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e foi utilizado o modelo de equilíbrio geral computável, mediante uso da base de dados Global Trade Analysis Project (GTAP), versão 9, para simular os impactos sobre o comércio internacional e os efeitos sobre o bem-estar de uma possível integração comercial do Brasil com os parceiros selecionados. Por fim, os resultados obtidos mostram que os ganhos de bem-estar para o Brasil, em todos os acordos, estão principalmente vinculados à melhor alocação dos seus recursos produtivos, que estariam concentrados basicamente nos setores primários e de baixa intensidade tecnológica, que agregaria o agronegócio.
Palavras-chave:
integração comercial; agronegócio; modelo de equilíbrio geral
Abstract
This study aims to analyze trade opportunities by simulating a possible trade integration between Brazil and China, US and the EU. The goal is to identify the sectors most benefited by the eventual agreement, classified according to their degree of technological intensity, with emphasis on Brazilian agribusiness. We classified products by level of technological intensity according to the criteria of the Organization for Economic Cooperation and Development (OECD). We used the computable general equilibrium model and the Global Trade Analysis Project (GTAP) database, version 9, to simulate the impacts on international trade and the welfare effects of a possible trade integration of Brazil with selected partners. Finally, the results show that welfare gains for Brazil, in all agreements, are mainly related to the better allocation of its productive resources, which would concentrate in the primary sectors, and of low technological intensity, which would add the agribusiness.
Keywords:
trade integration; agribusiness; general equilibrium model
1 INTRODUÇÃO
Os produtos do agronegócio, segundo Dilly et al. (2017)Dilly, R. F., Massuquetti, A., Freitas, G. S., & Fernandes, J. J. (2017). Exportações mundiais de milho: um estudo da competitividade e do grau de concentração do Brasil e dos Estados Unidos da América (EUA) no período 2000/2014. Revista Brasileira de Estudos Regionais e Urbanos, 11(1), 1-19., destacam-se na pauta exportadora brasileira e o aumento da sua demanda mundial apoiou-se na ascensão dos países emergentes, principalmente a partir dos anos 2000. A elevação do padrão de vida das populações desses países, principalmente a chinesa, também contribuiu para essa conjuntura. O resultado deste crescimento da demanda foi o aumento dos preços mundiais destes produtos nos anos 2000. Em 2000, as exportações do agronegócio brasileiro representavam 37,4% do total comercializado com o resto do mundo e, em 2016, sua participação foi de 45,9%. Também em 2016, o intercâmbio comercial foi liderado pela China, com 24,5% do total exportado pelo agronegócio brasileiro, enquanto União Europeia (UE) e Estados Unidos da América (EUA) representaram, respectivamente, 19,6% e 7,4% (Brasil, 2020Brasil. (2020). Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento – MAPA. Estatísticas de Comércio Exterior do Agronegócio Brasileiro (Agrostat). Recuperado em 17 de setembro de 2020, de http://indicadores.agricultura.gov.br/agrostat/index.htm
http://indicadores.agricultura.gov.br/ag...
).
Alguns setores se sobressaíram na pauta de exportação do agronegócio brasileiro desde os anos 2000, sendo eles o complexo soja, as carnes, o complexo sucroalcooleiro e os produtos florestais, que, juntos, representaram 72,1% do valor exportado pelo agronegócio, em 2016 (em 2000, representavam 57,3%). O complexo soja apresentou a maior participação no valor das exportações do agronegócio: 29,9% do total comercializado com o exterior, em 2016. O produto carnes também ampliou sua participação no total exportado, passando de 9,5%, em 2000, para 16,7%, em 2016. O complexo sucroalcooleiro teve uma participação de 13,4% do total comercializado com o exterior em 2016 (em 2000, foi de 6,0%). Os produtos florestais, por sua vez, tiveram queda em sua participação no total das exportações do agronegócio brasileiro. Em 2016, representavam 12,1% do total exportado, enquanto, em 2000, sua participação foi de 21,4%, correspondendo ao principal produto do agronegócio comercializado com o resto do mundo (Brasil, 2020Brasil. (2020). Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento – MAPA. Estatísticas de Comércio Exterior do Agronegócio Brasileiro (Agrostat). Recuperado em 17 de setembro de 2020, de http://indicadores.agricultura.gov.br/agrostat/index.htm
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).
Recentemente, em junho de 2019, o Mercado Comum do Sul (MERCOSUL) firmou um acordo comercial com a UE, após mais de duas décadas de negociação. O bloco europeu é o segundo maior parceiro comercial do Brasil, atrás somente da China e à frente dos EUA, mostrando a relevância do acordo para o país. Em 2016, 22% de tudo que o Brasil exportava era direcionado para a UE. Mas o perfil bilateral de comércio era tipicamente interindustrial, com o Brasil exportando, principalmente, produtos primários e de baixa intensidade tecnológica para a UE (63,4% do total), em 2016, enquanto suas importações do bloco europeu se concentravam em setores de média alta e alta intensidade tecnológica (76,2% do total). Um perfil de comércio similar é observado com a China, com as exportações brasileiras de produtos primários chegando a 75,9% do total, em 2016, enquanto com os EUA há uma maior participação de produtos com maior conteúdo tecnológico (Brasil, 2020Brasil. (2020). Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento – MAPA. Estatísticas de Comércio Exterior do Agronegócio Brasileiro (Agrostat). Recuperado em 17 de setembro de 2020, de http://indicadores.agricultura.gov.br/agrostat/index.htm
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).
O objetivo do estudo, portanto, é analisar as oportunidades de comércio a partir da simulação de uma possível integração comercial do Brasil com a China, os EUA e a UE, seus maiores parceiros comerciais, buscando identificar os setores mais beneficiados pelos eventuais acordos, classificados de acordo com seu grau de intensidade tecnológica, com ênfase no agronegócio brasileiro. O estudo justifica-se pela importância do agronegócio na pauta exportadora brasileira e das relações comerciais entre esses países. Empregou-se a classificação de produtos por grau de intensidade tecnológica segundo os critérios da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e foi utilizado o modelo de equilíbrio geral computável, mediante uso da base de dados Global Trade Analysis Project (GTAP), versão 9, para simular os impactos sobre o comércio internacional e os efeitos sobre o bem-estar de uma possível integração comercial do Brasil com os parceiros selecionados.
Este artigo está dividido em seis seções, considerando a Introdução. Na segunda seção, analisam-se o aumento das exportações brasileiras de produtos primários e as exportações do agronegócio brasileiro. Na terceira seção, apresenta-se a revisão da literatura acerca do modelo de equilíbrio geral e são expostos estudos empíricos que empregaram esta metodologia e que analisaram os impactos da integração comercial do país com outros países e blocos. Na quarta e na quinta seções, respectivamente, é apresentada a metodologia empregada e são analisados os resultados do estudo. Por fim, as conclusões encontram-se na sexta seção.
2 COMÉRCIO INTERNACIONAL E AGRONEGÓCIO BRASILEIRO
Pelegrini (2016)Pelegrini, T. (2016). Potencialidades de Acordos Preferenciais de Comércio entre o Brasil e seus principais parceiros. (Dissertação de mestrado). Universidade Federal de Viçosa, Viçosa. observou uma maior presença de commodities entre as principais mercadorias brasileiras comercializadas no mercado externo desde o início dos anos 2000. A expansão econômica de países emergentes, como China e Índia, influenciaram o aumento da demanda por estes produtos. O Brasil, por sua vez, tem aumentado as exportações de produtos agrícolas e agroindustriais, aproveitando os altos preços internacionais deles.
Na Tabela 1, observam-se as balanças comerciais brasileiras e do agronegócio. Em 2016, 45,9% do total comercializado pelo país com o resto do mundo pertencia ao agronegócio. Em 2000, sua representação foi de 37,4%, ou seja, uma variação de 8,5 pontos percentuais no período. Também é possível verificar o crescimento do superávit do agronegócio: em 2000, a balança comercial do agronegócio brasileiro apresentou superávit de US$14,8 bilhões; já em 2016, a balança comercial fechou com um superávit de US$ 71,3 bilhões, representando um aumento de 382% no período. No contexto da recente crise econômico-financeira mundial, as exportações do agronegócio têm minimizado os desequilíbrios das contas externas. E, apesar da evolução positiva da balança comercial do agronegócio, as exportações têm declinado nos últimos anos: em 2013, as exportações atingiram seu maior valor, representando US$ 100 bilhões, reduzindo para US$ 84,9 bilhões ao final do período.
Balança comercial brasileira e balança comercial do agronegócio, em US$ bilhões – 2000-2016.
Na Tabela 2, são apresentados os produtos do agronegócio brasileiro exportados no período 2000/2016. Ressalta-se que os setores complexo soja, carnes, complexo sucroalcooleiro e produtos florestais, juntos, representaram 72,1% do valor exportado pelo agronegócio no ano de 2016. Em 2000, eles representavam 57,3% do valor comercializado pelo Brasil com o resto do mundo.
O complexo soja destacou-se com uma participação de 29,9%, em 2016 (em 2000, representava 20,4%). O setor de carnes e o complexo sucroalcooleiro tiveram aumento de participação de 7,23 pontos percentuais e de 7,35 pontos percentuais, respectivamente, no período. Por sua vez, o setor de produtos florestais, apesar de aumentar o valor exportado no período e de ser o principal produto de exportação em 2000, apresentou a maior queda na participação dos principais produtos do agronegócio: -9,4 pontos percentuais.
Na Tabela 3, observam-se os principais parceiros comerciais do agronegócio brasileiro no período 2000/2016. Dentre os dez principais destinos das exportações deste segmento, sete apresentaram uma variação positiva na sua participação no período analisado. Houve exceção para UE, EUA e Japão, que reduziram sua participação no total exportado pelo Brasil em 21,4 pontos percentuais, 10,7 pontos percentuais e 1,9 ponto percentual, respectivamente, entre 2000 e 2016. Em relação aos três primeiros destinos das exportações nacionais, pode-se notar que, em 2000, a UE, com 41,0%, e os EUA, com 18,0%, eram os principais parceiros comerciais, enquanto, em terceiro lugar, ficava o Japão, com a participação de 4,8% nas exportações do agronegócio brasileiro. Já, em 2016, o maior intercâmbio foi liderado pela China, com 24,5%, bem acima do terceiro colocado, os EUA, que apresentaram 7,4%.
Observa-se, portanto, que os principais destinos das exportações brasileiras do agronegócio são China, UE e EUA. Este cenário estimula a análise dos impactos sobre o comércio internacional, bem como os efeitos sobre o bem-estar, da integração comercial do Brasil com seus principais parceiros.
3 MODELO DE EQUILÍBRIO GERAL: REVISÃO TEÓRICA E EMPÍRICA
3.1 REVISÃO TEÓRICA
Do ponto de vista teórico, os efeitos da integração regional sobre comércio, produção e bem-estar podem ser divididos em três fases distintas, de acordo com Baldwin & Venables (1995)Baldwin, R., & Venables, A. (1995). Regional economic integration. In G. Grossman & K. Rogoff (Eds.), Handbook of International Economics (Vol. 3). Amsterdam: North Holland.. A primeira fase se baseia nos efeitos estáticos alocativos, na qual o comércio internacional pode ser resultado tanto das vantagens comparativas em mercados perfeitamente competitivos, como de uma estrutura de mercado baseada na concorrência imperfeita e em economias internas de escala. A segunda fase adiciona os efeitos cumulativos dinâmicos provocados pelo crescimento econômico de médio e longo prazo. Por fim, a terceira fase incorpora o impacto dos blocos regionais sobre a localização espacial das firmas2 2 Como o artigo busca examinar apenas os efeitos estáticos, a segunda e a terceira fases descritas pelos autores não serão apresentadas aqui. .
A teoria da integração regional surgiu a partir da contribuição pioneira de Viner (1950)Viner, J. (1950). The Custom Union Issue. London: Carnegie Endowment for International Peace.. Coube a Jacob Viner demonstrar que a imposição de tarifas preferenciais tanto poderia causar criação de comércio, quando a produção doméstica fosse substituída pela importação de produtos de outro país do bloco, como desvio de comércio, sempre que as importações de um país não membro fossem trocadas pelas importações de um país membro. Durante as décadas de 1960 e 1970, novos conceitos foram adicionados aos de criação e de desvio de comércio. Além da redução das tarifas, a união aduaneira prevê a remoção das barreiras não tarifárias. A análise das barreiras não tarifárias sustenta que um país teria ganhos de bem-estar se a formação do bloco promover a redução das restrições não tarifárias médias, medidas por meio de sua equivalência às tarifas.
A formação de um bloco regional também pode afetar os termos de troca dos países integrantes. Se os países envolvidos no processo de integração tiveram uma elevada participação na demanda mundial e suas importações apresentaram uma queda após a integração, é possível que haja uma melhoria de seus termos de troca, provocando um aumento de bem-estar. Mundell (1964)Mundell, R. (1964). Tariff preferences and terms of trade. The Manchester School of Economic and Social Studies, 32, 1-13. demonstrou que a adoção de uma redução preferencial das tarifas necessariamente iria melhorar os termos de troca do país beneficiário em detrimento daquele país excluído do bloco. O impacto sobre o país que concedeu a redução tarifária seria ambíguo, porém quando dois países adotam concessões tarifárias eles melhoram seus termos de troca em relação ao resto do mundo. O autor tratou do impacto da formação dos blocos regionais sobre os termos de troca a partir de um modelo com três países, onde os bens sejam substitutos e os preços se ajustam para equilibrar o balanço de pagamentos após a adoção de tarifas preferenciais.
Os efeitos escala e competição, conforme Baldwin & Venables (1995)Baldwin, R., & Venables, A. (1995). Regional economic integration. In G. Grossman & K. Rogoff (Eds.), Handbook of International Economics (Vol. 3). Amsterdam: North Holland., surgem quando mercados nacionais separados se tornam unificados, a partir da formação do bloco. O mercado ampliado do bloco permite que economias de escala sejam alcançadas, ao mesmo tempo que proporciona aos produtores dos países membros um contato mais próximo, ampliando a competição entre eles. O uso de modelos de equilíbrio geral computáveis baseados em concorrência imperfeita ampliou a possibilidade de ganhos da integração regional por meio dos efeitos de escala, de competição e de diversidade de produtos. Mercados fragmentados, ao elevar os lucros e reduzir a competição, provocam a proliferação do número de firmas operando nos setores protegidos, forçando-as a operarem em escalas ineficientes. A integração regional, de um lado, reduziria o número de firmas e, portanto, aumentaria a escala de produção (efeito escala) e, de outro, impediria que esta concentração de mercado permitisse um comportamento oligopolístico, ao aumentar tanto a oferta doméstica total (efeito competição) como a variedade dos produtos comercializáveis (efeito diversidade). Em suma, o bloco regional conduziria a um número menor de firmas, com cada uma ofertando uma quantidade maior de cada produto a preços mais baixos, com ganhos evidentes de bem-estar para os consumidores.
A literatura que trata de modelos de equilíbrio geral computáveis mostra que os ganhos de bem-estar são usualmente maiores em modelos com competição imperfeita quando comparados aos modelos que só permitem competição perfeita, como Brown et al. (1992)Brown, D., Deardorff, A., & Stern, R. (1992). A North-American Free Trade Agreement: analysis issues and a computational assessment. World Economy, 15, 15-29., Haaland & Norman (1992)Haaland, J., & Norman, V. (1992). Global production effects of European integration. In L. A. Winters (Ed.), Trade flows and trade policy after 1992. Cambridge: Cambridge University Press. e Watanaki & Monteagudo (2001)Watanaki, M., & Monteagudo, J. (2001). Regional trade agreements for Mercosur: the FTAA and the FTA with the European Union. In Proceedings of the Impacts of Trade Liberalization Agreements on Latin America and the Caribbean, Washington. Washington: CEPII/BID., na medida em que os primeiros criam mecanismos adicionais por meio dos quais um acordo preferencial de comércio (APC) pode afetar o bem-estar. No entanto, a teoria não afirma que os ganhos tenham de ser necessariamente maiores em uma estrutura de mercado caracterizada pela competição imperfeita. Harrison et al. (1997)Harrison, G., Rutherford, T., & Tarr, D. (1997). Quantifying the Uruguay Round. Economic Journal (London), 107, 1405-1430., por sinal, salientam que esses ganhos adicionais estariam mais associados com mark-ups mais elevados e/ou com a incorporação de outras mudanças, como elasticidades, do que com a mudança do regime em si.
Assim, este artigo utiliza o modelo de equilíbrio geral computável (GTAP), que adota uma estrutura de mercado de competição perfeita e retornos constantes de escala, para analisar as alterações causadas pela formação de uma série de possíveis acordos de livre comércio entre o Brasil e os seus principais parceiros comerciais no padrão de comércio e no bem-estar desses países. Os efeitos sobre o bem-estar, em modelos de equilíbrio geral baseados em uma estrutura de mercado de concorrência perfeita, com dotação de fatores e tecnologia fixa, como é o caso do GTAP empregado nesse artigo, é decomposto em três componentes: efeitos alocativos, termos de troca e saldo investimento-poupança. Nesses modelos, a maneira de incrementar o bem-estar é por meio da redução das distorções causadas pela incidência de tarifas sobre o comércio e a magnitude dessa variação é uma função do tamanho da distorção inicial, da amplitude dessa variação e da sensibilidade de resposta do mercado atingido por tal mudança. Os ganhos de eficiência alocativa estão diretamente relacionados com o grau no qual um país reduz suas tarifas. Produtos importados mais baratos provocam ganhos tanto no consumo ampliado como na forma na qual os recursos domésticos são aplicados.
Entretanto, como destacam Azevedo & Feijó (2010)Azevedo, A. F. Z., & Feijó, F. T. (2010). Análise empírica do impacto econômico da Alca e da consolidação do MERCOSUL sobre o Brasil. Revista de Economia, 3(2), 119-149., as mudanças no bem-estar também incluem as alterações nos termos de troca e no preço relativo da poupança e do investimento. No que tange aos termos de troca, a redução das tarifas de importação gera uma elevação maior na demanda por importações das regiões que promoveram os maiores cortes, criando dois efeitos. De um lado, cria-se a necessidade de elevar a sua oferta de exportações, para compensar o aumento das importações, levando à queda dos preços das exportações. Por outro lado, os países que se beneficiaram da maior demanda por seus produtos, elevando seus preços de exportação, obtêm uma melhoria nos seus termos de troca. O impacto sobre o bem-estar causado pelo componente investimento-poupança (I-S), por sua vez, depende dos preços da poupança e do investimento e se a região é uma fornecedora ou receptora líquida de poupança. Regiões que são fornecedoras líquidas de poupança para o banco global se beneficiam com o aumento do preço relativo da poupança ao do investimento, enquanto os recebedores líquidos perdem.
Segundo Gurgel (2012)Gurgel, A. C. (2012). Modelo de Equilíbrio Geral. Economia de baixo carbono: avaliação de impactos de restrições e perspectivas tecnológicas. Ribeirão Preto: Núcleo de Estudos em Economia de Baixo Carbono., os modelos de equilíbrio geral computáveis especificam intrinsecamente preços e níveis de produção relativos, o que garante uma certa precisão em explicar as alocações de recursos e sua evolução histórica. Segundo o autor, a utilização de modelos de equilíbrio geral se explica perante as expectativas de que ações ou políticas exógenas reflitam resultados de equilíbrio na economia. As simulações que representam modelos de economias reais heterogêneas são necessárias na identificação dos resultados advindos de mudanças exógenas. Mesmo havendo dúvidas em torno dos valores, o uso destes modelos metodológicos possibilita demonstrar as tendências e a significância relativa dos choques exógenos. Por vezes, segundo o autor, os resultados dos modelos possibilitam ilustrar as relações entre setores e agentes econômicos, o que não seria viável em modelos teóricos ou analíticos.
Em relação ao GTAP, é um modelo padrão multirregional de equilíbrio geral aplicável. Ele assume retornos constantes de escala e competição perfeita nas atividades de produção e consumo. O funcionamento da economia global é ilustrado por meio do exame de uma região e de seus relacionamentos com outras regiões, considerando as condições de equilíbrio entre os agentes globais (Hertel & Tsigas, 1997Hertel, T. W., & Tsigas, M. E. (1997). Structure of GTAP. Global Trade Analysis: modeling and applications (pp. 13-73). USA: Center for Global Trade Analysis.). No GTAP, de acordo com Castro et al. (2004)Castro, E. R., Figueiredo, A. M., & Teixeira, E. C. (2004). GTAP: modelo, instruções de uso e aplicação. In M. L. Santos & W. C. Vieira (Orgs.), Métodos quantitativos em economia (pp. 341-373). Viçosa: UFV., o funcionamento de uma economia é dado por um fluxo circular da renda entre os setores de um país ou uma região com o resto do mundo. Neste modelo, a renda regional é derivada do pagamento das firmas pela utilização dos fatores primários (VOA), que é gasta pelo consumo das famílias (PRIVEX), governo (GOVEX) e poupança (SAVE). A receita é proveniente do lado do produto pelo consumo das famílias (VDPA), governo (VDGA), intermediário (VDFA) e poupança (NETINV). A intervenção governamental é representada por taxas, impostos e/ou subsídios líquidos (TAX). Além disso, na economia aberta, firmas recebem receitas do estrangeiro devido às exportações (VXM) e gastam com as importações (VIFA). Uma parte da renda é gasta no exterior (VIPA e VIGA) e no pagamento de taxas à renda nacional (TAX e TAX).
3.2 ESTUDOS EMPÍRICOS
Nesta subseção, é realizada uma revisão da literatura empírica, abordando casos de aplicação do modelo de equilíbrio com agregação dos produtos do agronegócio. Pelegrini (2016)Pelegrini, T. (2016). Potencialidades de Acordos Preferenciais de Comércio entre o Brasil e seus principais parceiros. (Dissertação de mestrado). Universidade Federal de Viçosa, Viçosa. analisou os possíveis ganhos de bem-estar decorrentes de acordos comerciais entre o Brasil e seus principais parceiros comerciais: China, EUA e Argentina. O autor utilizou a versão 9 do GTAP e foram simulados diferentes cenários decorrentes de acordos preferenciais de comércio (APCs) entre: (1) Brasil e China; (2) Brasil e EUA; e (3) Brasil e Argentina. Nestes acordos, foram previstos dois cenários: (1) eliminação de tarifas de importações bilaterais entre os países; (2) redução parcial de tarifas de importações (33% de redução) e subsídios à exportação.
Com a eliminação total de tarifas, as importações superariam as exportações, o que geraria déficit na balança comercial. O setor agrícola e o de alimentos seriam a maior fonte de bem-estar nas relações de comércio entre Brasil e China. Neste cenário, o único setor que apresentaria um grande desvio de comércio seria o de extração de produtos minerais. Isto ocorre, provavelmente, pelo fato de a China não ser um grande fornecedor destes produtos. Nas relações bilaterais do Brasil com os EUA e com a Argentina, constatam-se similaridades. Apesar da já conhecida vantagem comparativa de produção, as exportações brasileiras de produtos agrícolas apresentariam diminuição nos dois acordos. Contudo, haveria aumento na produção e na exportação de manufaturas leves e pesadas em razão das trocas entre parceiros comerciais semelhantes.
Nos acordos comerciais com supressão parcial das tarifas entre o Brasil e seus principais parceiros, haveria vantagem em termos de crescimento de Produto Interno Bruto (PIB) e de ganhos de bem-estar para o país. No acordo Brasil e China, o setor de manufaturas leves mostraria ganhos nos termos de troca e de bem-estar. O acordo com os EUA fomentaria a indústria brasileira. A supressão parcial das tarifas de importação juntamente com a eliminação do subsídio dos EUA estimularia a produção e as exportações de manufaturas leves e pesadas, que seriam os setores que demonstrariam ganhos elevados de bem-estar neste cenário. Quanto a uma maior relação comercial entre Brasil e Argentina, neste cenário, ela apresentaria uma piora nos termos de troca para o Brasil e seriam pouco relevantes os ganhos de bem-estar. O setor de manufaturas leves apresentaria perda de competitividade neste cenário.
Silva et al. (2016)Silva, M. L., Coronel, D. A., Freitas, C. A., & Silva, R. A. (2016). O impacto da Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento (TTIP) para as economias norte-americana e europeia. Perspectiva Econômica, 11(2), 143-154. verificaram o impacto da criação de uma área de livre comércio entre os EUA e a UE, em relação ao Brasil, à China e aos países-membros do MERCOSUL. Os autores empregaram a versão 8 do GTAP e foram propostos dois cenários: (1) primeiro cenário: eliminadas as tarifas de importação de bens e serviços entre as regiões; e (2) segundo cenário: eliminação de tarifas de importação de bens e serviços mais a eliminação de subsídios à produção e à exportação entre os EUA e a UE. No primeiro cenário, a formação de uma área de livre comércio entre EUA e UE geraria impactos econômicos positivos para a China e o MERCOSUL, os quais se devem ao aperfeiçoamento produtivo e às vantagens comparativas destas regiões. No segundo cenário, a liberalização total de comércio entre EUA e UE geraria perdas de bem-estar para a China (US$ 3,26 bilhões) e para o Mercosul (US$ 73 milhões).
Bueno (2013)Bueno, E. U. (2013). A entrada da Venezuela no Mercosul: uma análise de equilíbrio geral computável sobre os impactos setoriais no Brasil (Dissertação de mestrado). Universidade Federal do Rio Grade do Sul, Programa de Pós-Graduação em Economia, Porto Alegre. analisou a adesão da Venezuela ao MERCOSUL, quantificando os impactos dos choques tarifários sobre os setores da economia brasileira. Os autores utilizaram a versão 8 e foram propostos os seguintes cenários: (1) eliminação das tarifas de importação e dos subsídios à exportação entre os quatro países fundadores do MERCOSUL; e (2) choques tarifários que simulam a adesão da Venezuela ao bloco, dividido em dois grupos: em primeiro lugar, foram eliminadas as tarifas de importação e os subsídios dentro do MERCOSUL ampliado; e, em segundo lugar, foi simulada a adoção da Tarifa Externa Comum (TEC) pela Venezuela (o método utilizado para realizar esse choque foi mensurar a TEC média por produto cobrada pelos membros originais do MERCOSUL em relação a cada um dos parceiros externos e aplicá-la às categorias de produtos da Venezuela em relação a cada região). Os resultados seriam particularmente satisfatórios para a indústria automobilística. Quanto ao setor de extração não energética e demais manufaturas leves brasileiras, estes não apresentariam ganhos de produção e de comércio. No caso da Venezuela, seu comércio estaria limitado ao setor petrolífero, que já apresenta reduções tarifarias. Com isso, os impactos desta integração seriam reduzidos.
Monte & Teixeira (2007)Monte, E. Z., & Teixeira, E. C. (2007). Impactos da Área de Livre Comércio das Américas (Alca), com gradual desgravação tarifária, na economia brasileira. Nova Economia, Belo Horizonte, 17(1), 37-63., utilizando a versão 6.2, analisaram os efeitos da criação da Área de Livre Comércio das Américas (ALCA) com a gradual eliminação tarifária de importação nos principais indicadores da economia brasileira. Os cenários propostos pelos autores foram: (1) imediata: EUA eliminaria 35,6% das tarifas de importação sobre bens agrícolas e 51,7% sobre não agrícolas e o MERCOSUL eliminaria 11,9% sobre os bens agrícolas e 18% sobre os não agrícolas; (2) em até cinco anos: EUA eliminaria 53,5% das tarifas de importação sobre os bens agrícolas e 77,8% sobre os bens não agrícolas e o MERCOSUL eliminaria 27,9% sobre os bens agrícolas e 21,6% sobre os bens não agrícolas; (3) em até dez anos: EUA eliminaria 68,1% das tarifas de importação sobre os bens agrícolas e 100% sobre os bens não agrícolas, já o MERCOSUL eliminaria 68,9% sobre os bens agrícolas e 49,7% sobre os bens não agrícolas; e (4) acima de dez anos: ambos eliminariam 100% das tarifas de importação tanto para os bens agrícolas quanto para os bens não agrícolas. Os resultados revelaram que o setor de manufatura brasileira não apresentaria competitividade em nenhum dos cenários, apresentando redução na produção. Quanto aos indicadores de crescimento econômico (PIB) e de bem-estar, apresentariam resultados positivos em todos os cenários.
Figueiredo et al. (2001)Figueiredo, A. M. R., Ferreira, A. V., & Teixeira, E. C. (2001). Impactos da integração econômica nas commodities da economia brasileira e da União Europeia. Revista Brasileira de Economia, 55(1), 77-106. avaliaram os efeitos, sobre a agricultura brasileira e europeia, de um possível acordo de livre comércio entre a UE e os países da América Latina e do Caribe. Os autores empregaram a versão 3.16 do GTAP, e quatro cenários foram analisados: (1) eliminação dos subsídios à produção agrícola; (2) sem eliminação do subsídio à produção; (3) imposição de uma TEC; (4) sem a imposição da TEC e à eliminação aos subsídios à exportação em todos os cenários. Para os autores, os benefícios da liberalização para o Brasil se concentrariam no agronegócio, em setores de maior vantagem comparativa, e nos manufaturados para a UE, com criação de comércio.
Num panorama geral, os cenários analisados enfatizam os efeitos de uma maior integração comercial do Brasil com seus principais parceiros comerciais, sendo que ocorreria um aumento de bem-estar geral nesses acordos. Conforme visto nesta subseção, o agronegócio como um todo se apresenta com significativa relevância no comércio mundial e, principalmente, para o Brasil.
4 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Neste artigo, que empregou a versão 9 do GTAP (140 regiões e 57 setores), referente ao ano de 2011, foram agrupadas seis regiões e 11 setores, conforme se observa a seguir: (1) Brasil; (2) China; (3) EUA; (4) UE28: Alemanha, Áustria, Bélgica, Bulgária, Chipre, Croácia (tornou-se membro em jul. 2013), Dinamarca, Eslováquia, Eslovênia, Espanha, Estônia, Finlândia, França, Grécia, Hungria, Irlanda, Itália, Letônia, Lituânia, Luxemburgo, Malta, Países Baixos, Polônia, Portugal, Reino Unido, República Checa, Romênia e Suécia; (5) Resto do MERCOSUL: Argentina, Paraguai e Uruguai; e (6) Resto do Mundo: Venezuela, Rússia, Índia, África do Sul, Canadá, México, Austrália, Nova Zelândia, Resto da Oceania, Hong Kong, Japão, Coreia, Taiwan, Resto do Leste Asiático, Indonésia, Malásia, Filipinas, Singapura, Tailândia, Vietnã, Resto do Sudeste da Ásia, Bangladesh, Sri Lanka, Resto do Sul da Ásia, Resto da América do Norte, Colômbia, Peru, Resto do Pacto Andino, Resto da Europa, Chile, Resto da América do Sul, América Central, Resto da ALCA, Resto do Caribe, Suíça, Albânia, Resto da antiga União Soviética, Turquia, Resto do Oriente Médio, Marrocos, Tunísia, Resto do norte da África, Botswana, Resto do Sul Africano, Malaui, Moçambique, Tanzânia, Zâmbia, Zimbábue, Resto da Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral (SADC), Madagascar, Uganda e Resto da África Subsaariana.
Os setores foram organizados conforme a classificação da OCDE (baixa, média baixa, média alta e alta intensidade tecnológica), além da inclusão do setor primário e do setor de serviços. Em relação ao agronegócio, especificamente, foram destacados os quatro principais setores de exportação brasileira, como observa-se a seguir: (1) oleaginosas; (2) açúcar de cana ou beterraba; (3) carnes; (4) demais produtos primários: arroz, trigo, cereal, frutas e vegetais, fibras e outras culturas, animais vivos, produtos de origem animal, leite e lã, pescados, óleo, carvão e gás, silvicultura, óleos vegetais e gorduras; (5) produtos de madeira; (6) produtos de papel; (7) demais produtos de baixa tecnologia: laticínios, arroz processado, açúcar processado, outros produtos alimentícios processados, bebidas e tabaco, têxteis, vestuário, artigos em couro; (8) média baixa tecnologia: produtos de petróleo e de carvão, produtos de metais, metais ferrosos, outros metais e outros produtos minerais; (9) média alta tecnologia: veículos motorizados, peças automotivas e equipamentos de transporte, produtos químicos, plásticos; (10) alta tecnologia: máquinas e equipamentos, equipamentos eletrônicos e outras manufaturas; e (11) serviços: eletricidade, distribuição de gás, água, construção, comércio, transporte marítimo, aéreo e outros, comunicação, serviços financeiros, seguros, serviços para negócios, recreação, administração pública, defesa, saúde e educação e habitação.
A avaliação dos efeitos de uma integração do Brasil com a China, do Brasil com os EUA e do Brasil com a UE foi realizada a partir de simulações que eliminaram as tarifas de importação somente no comércio bilateral com cada um desses parceiros em 100% e em 50%3 3 A simulação não incluiu a eliminação de barreiras não tarifárias (BNTs) e de subsídios. . A Tabela 4 mostra as tarifas de importação bilateral vigentes no Brasil no período inicial, em 2011.
É possível identificar que os setores mais protegidos em relação aos países e às regiões são o de baixa intensidade tecnológica e o de produtos de madeira. Em relação à China, especialmente, a tarifa de importação bilateral de produtos de baixa intensidade tecnológica é de 26,4% e de produtos de madeira é de 16,9%. Os setores analisados do agronegócio e também os demais produtos primários, por sua vez, são aqueles que apresentam as menores tarifas de importação bilateral. Nota-se que, em praticamente todos os setores, as tarifas de importação do Brasil são maiores para a China do que para os demais países e regiões examinados, sinalizando que a liberalização comercial poderia causar um significativo aumento das importações brasileiras provenientes da China.
Na Tabela 5, verificam-se as tarifas de importação na China, ainda em 2011. O setor que se destaca com o maior grau de proteção tarifária em relação ao Brasil é também o de baixa intensidade tecnológica, com uma tarifa de 36,3%, seguido pelo de alta intensidade, com 6,6%. Assim como ocorre com o Brasil, a China também apresenta uma maior proteção ao setor industrial, especialmente de menor intensidade tecnológica. Portanto, tanto no Brasil como na China, a formação do acordo deve estimular esse setor mais do que os demais. Por fim, vale destacar o menor grau de protecionismo chinês tanto em relação ao Brasil como aos demais países e regiões no período inicial, antes da simulação de liberalização preferencial com o Brasil.
Na Tabela 6, são observadas as tarifas de importação nos EUA (2011). Novamente, o setor que se destaca com o maior grau de proteção tarifária em relação ao Brasil é também o de baixa intensidade tecnológica, com uma tarifa de 5,5%, seguido pelo de oleaginosas, com 3,9%. Observa-se um menor grau de protecionismo estadunidense no setor de produtos florestais, tanto em relação ao Brasil como aos demais países e regiões no período inicial, ou seja, antes da simulação de liberalização preferencial com o Brasil. Vale destacar que os EUA apresentam um menor grau de protecionismo em relação ao Brasil em comparação com os demais países/regiões examinados.
Por fim, na Tabela 7, constatam-se as tarifas de importação na UE, neste mesmo ano.
O setor que se destaca é o de carnes, com uma tarifa de 39,9% para o Brasil, e também o de baixa intensidade tecnológica, com uma tarifa de 26,0%. Observa-se um menor grau de protecionismo europeu no setor de produtos florestais e de oleaginosa, tanto em relação ao Brasil como aos demais países e regiões no período inicial.
5 RESULTADOS E DISCUSSÃO
Nesta seção, os resultados das simulações são demonstrados em três subseções: na primeira e na segunda, apresentam-se os impactos sobre a produção e o comércio internacional, respectivamente; e, na terceira, são expostos os efeitos sobre o bem-estar.
5.1 IMPACTOS SOBRE A PRODUÇÃO
As simulações de acordos comerciais entre o Brasil e a China, o Brasil e os EUA e o Brasil e a UE afetam diversas variáveis econômicas relevantes, destacando-se a produção e o comércio internacional. Ambos são impactados pela redução preferencial das tarifas de importação. Nas Tabelas 8, 9 e 10, é possível observar a variação percentual no volume produzido dos países e das regiões analisados numa simulação de acordos entre Brasil e China, entre Brasil e EUA e entre Brasil e UE, respectivamente, considerando-se as reduções das tarifas de importação em 100% e em 50%.
Na simulação de um possível acordo do Brasil com a China (Tabela 8), com eliminação de 100% nas tarifas de importação, verifica-se que o Brasil, em carnes, apresentaria queda na produção (-0,2%) e também reduziria sua produção nos setores de produtos de madeira e de produtos de papel (-2,6% e -0,3%, respectivamente). Por outro lado, oleaginosas e açúcar de cana ou beterraba teriam um crescimento em sua produção, com destaque para o primeiro setor, que aumentaria 1,8%. Em relação aos produtos com intensidade tecnológica, o crescimento ocorreria apenas no setor de produtos de baixa intensidade: 1,6%. Na China, por sua vez, o setor de açúcar de cana ou beterraba e o setor de baixa intensidade tecnológica seriam os que apresentariam os maiores crescimentos: 0,04% e 0,05%, respectivamente. As regiões que registrariam maiores ganhos de produção seriam Brasil, em oleaginosas e em açúcar de cana ou beterraba e resto do MERCOSUL, em carnes (0,4%) e elevação de 0,3% nos produtos de madeira e de 0,2% nos produtos de papel.
Com a eliminação de 50% nas tarifas de importação, constata-se que o Brasil apresentaria uma redução menor na produção dos produtos florestais (-1,02% nos produtos de madeira e -0,1% para os produtos de papel) e em carnes (-0,04%). Oleaginosas e cana-de-açúcar ou beterraba, por sua vez, manteriam o aumento na produção: 1,0% e 0,07%, respectivamente. Já para a China, dentre os produtos primários, o maior ganho de produção seria no setor de açúcar de cana ou beterraba, com 0,03%. O resto do MERCOSUL continuaria sendo a região que registraria maiores ganhos de produção no setor florestal e em carnes.
Em relação à simulação de um acordo do Brasil com os EUA (Tabela 9), com eliminação de 100% nas tarifas de importação, pode-se verificar que o Brasil sofreria uma redução nos setores de produtos de madeira e de produtos de papel (-0,6% e -0,1%, respectivamente). O mesmo ocorreria com os EUA, que apresentariam uma redução nestes setores (-0,05% e -0,06%, respectivamente). E o resto do MERCOSUL manteria sua liderança no aumento da produção em ambos. Em oleaginosas e carnes, o Brasil apresentaria crescimento (0,2% e 0,1%, respectivamente), enquanto isso ocorreria apenas no setor de açúcar de cana ou beterraba para os EUA (0,06%). Os EUA se destacariam com um aumento na produção de 0,12% no setor de alta intensidade tecnológica. No que se refere à eliminação de 50% nas tarifas de importação, o panorama seria similar ao anterior, apenas com uma magnitude menor. Por fim, em ambos os cenários, o resto do MERCOSUL apresentaria aumento na produção de oleaginosas: 0,3% (100%) e 0,1% (50%).
Numa possível integração do Brasil com a UE (Tabela 10), com eliminação de 100% na tarifa de importação entre o país e o bloco, verifica-se que para o país haveria uma maior expansão no setor de carnes (32,3%), refletindo a grande redução tarifária promovida pelo acordo4 4 Esse é o setor em que havia o maior grau de proteção tarifária em todos os países e regiões examinados em relação aos produtos brasileiros (39,9%). , e crescimento reduzido no setor de açúcar de cana ou beterraba (0,7%). Por outro lado, enfrentaria redução na produção dos produtos florestais (produtos de madeira, -4,1%; e produtos de papel, -1,8%) e de oleaginosas (-2,6%). O resto do MERCOSUL seria a região com maior expansão na produção de produtos florestais e oleaginosas. Para a UE, haveria um aumento de produção em produtos de madeira e de papel (0,1% e 0,08%, respectivamente), em oleaginosas (0,4%) e, nos setores com intensidade tecnológica, se destacariam os produtos de alta intensidade (0,5%). No cenário de eliminação de 50% nas tarifas de importação, verifica-se que o Brasil sofreria perdas menores de produção nos setores do agronegócio se comparado ao anterior.
Em resumo, os setores de oleaginosas e de cana-de-açúcar ou beterraba seriam os mais beneficiados por um acordo entre Brasil e China (redução de 100% nas tarifas de importação) e o setor de carnes apresentaria maior ampliação da produção num acordo entre Brasil e UE (redução de 100% nas tarifas de importação). Por fim, para o setor de produtos florestais, as menores reduções na produção ocorreriam num acordo com os EUA, com redução de 50% nas tarifas de importação.
5.2 IMPACTOS SOBRE O COMÉRCIO INTERNACIONAL
Em simulações que promovem uma abertura preferencial tarifária, espera-se que ocorra uma elevação do comércio entre os membros do acordo, em detrimento dos demais países e regiões. Esse viés de comércio será tanto maior quanto maior for a redução tarifária preferencial e foi exatamente isso que se observou nas simulações deste estudo.
As variações dos volumes exportados pelos países analisados, num acordo Brasil-China, são observadas na Tabela 11 e 12, respectivamente. Na Tabela 11, identifica-se que, no setor do agronegócio, a ampliação das exportações de carnes para a China seria de 49,6% e de oleaginosas seria de 5,8%, com redução de 100% nas tarifas de importação. Neste mesmo cenário, as exportações dos demais produtos de baixa intensidade tecnológica seriam ampliadas em 492,3%. O resultado seria semelhante com redução de 50% nas tarifas de importação, mas em menor magnitude. Em relação ao setor de produtos florestais, o aumento das exportações de produtos de madeira para a China seria maior com a redução de 100% nas tarifas de importação, enquanto a redução de 50% das importações resultaria num maior volume exportado de produtos de papel para o mercado chinês. Por fim, observou-se que o Brasil reduziria suas exportações para os demais países/regiões e em todos os setores, com exceção dos produtos de alta tecnologia exportados para os EUA, a UE e o resto do mundo (em ambos os cenários de redução tarifária).
A China, por sua vez, em relação aos produtos do agronegócio, ampliaria as exportações de carnes (27,4%) e de oleaginosas (26,3%). Dentre os setores com intensidade tecnológica, os produtos de baixa intensidade seriam ampliados em 174,1%. Em relação às exportações do setor de produtos florestais para o Brasil, haveria ampliação em 116,9% e em 78,1%, nos setores de produtos de madeira e de produtos de papel, respectivamente. Com a redução de 50% nas tarifas de importação, o cenário seria similar, mas em menor proporção. Finalmente, a China reduziria as exportações para todos os países e regiões, com exceção de oleaginosas para a UE (Tabela 12).
Já as variações percentuais dos volumes exportados por Brasil e EUA são observadas nas Tabelas 13 e 14, respectivamente. A partir deste acordo, as oleaginosas e as carnes teriam suas exportações ampliadas, com destaque, para os EUA e, principalmente, no cenário de redução tarifária total (21,1% e 11,9%, respectivamente). O Brasil não ampliaria suas exportações de produtos florestais apenas para o resto do MERCOSUL e a maior expansão ocorreria nas exportações para o EUA (redução em 100%). Outro setor que merece evidência é o de baixa intensidade tecnológica, que também ampliaria o volume exportado em maior magnitude no comércio com os EUA neste mesmo cenário. Enfim, o resto do MERCOSUL seria a região mais impactada pela redução das exportações brasileiras.
Como observa-se na Tabela 14, os EUA, por sua vez, em relação aos produtos do agronegócio, ampliariam as exportações de carnes (82,0%) e de oleaginosas (20,9%), para o Brasil, com a redução de 100% nas tarifas de importação.
Também expandiriam as exportações de produtos de madeira e de papel para o Brasil em ambos os cenários de redução tarifária, mas com destaque para eliminação total das tarifas. Os demais países e regiões seriam impactados com a redução das exportações estadunidenses. Haveria também a ampliação do comércio EUA-Brasil, principalmente, nos setores de baixa e de alta intensidades tecnológicas.
Por fim, as variações percentuais dos volumes exportados pelo Brasil e pela UE são notadas nas Tabelas 15 e 16, respectivamente. Observa-se a significativa redução nas exportações do Brasil para os demais países e regiões com este acordo, nas duas simulações. As exportações de carnes brasileiras para o bloco europeu obteriam o maior ganho, representando ampliação de 970,2% num cenário de eliminação tarifária total. No setor de produtos florestais, o Brasil ampliaria suas exportações apenas para a UE e com a redução de 50% nas tarifas de importação somente no comércio de produtos de madeira. Também seriam ampliadas as vendas de produtos de baixa intensidade tecnológica para a UE em ambos os cenários.
A UE, por sua vez, ampliaria, principalmente, as exportações de carnes (118,6%) e de oleaginosas (25,1%). Também se avultariam as exportações de produtos florestais, em maior magnitude, somente para o Brasil: 140,4% e 67%, respectivamente, para produtos de madeira e de papel. No segmento de produtos com intensidade tecnológica, produtos de baixa (159,3%) e de alta (110,2%) apresentariam as maiores ampliações. Num cenário de redução tarifária em 50%, apenas as exportações de produtos florestais para o Brasil seriam expandidas.
Por fim, os maiores ganhos para o Brasil ocorreriam nos cenários com redução tarifária total. A ampliação das exportações de oleaginosas, de açúcar de cana ou beterraba, de produtos de madeira e de produtos de papel seria maior no acordo entre Brasil e EUA. Para o setor de carnes, por sua vez, o Brasil ampliaria mais as suas exportações num acordo com a UE. Esses resultados corroboram os estudos de Silva et al. (2016)Silva, M. L., Coronel, D. A., Freitas, C. A., & Silva, R. A. (2016). O impacto da Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento (TTIP) para as economias norte-americana e europeia. Perspectiva Econômica, 11(2), 143-154., Pelegrini (2016)Pelegrini, T. (2016). Potencialidades de Acordos Preferenciais de Comércio entre o Brasil e seus principais parceiros. (Dissertação de mestrado). Universidade Federal de Viçosa, Viçosa., Silva et al. (2009)Silva, R. R., Domingues, E. P., Porsse, A. A., & Porto Junior, S. S. (2009). Impactos de acordos de livre comércio sobre o Rio Grande do Sul: uma análise inter-regional com o modelo de equilíbrio geral Arseti. Revista Brasileira de Estudos Regionais e Urbanos, 3(1), 34-67., Monte & Teixeira (2007)Monte, E. Z., & Teixeira, E. C. (2007). Impactos da Área de Livre Comércio das Américas (Alca), com gradual desgravação tarifária, na economia brasileira. Nova Economia, Belo Horizonte, 17(1), 37-63., Cypriano & Teixeira (2003)Cypriano, L., & Teixeira, E. (2003). Impacts of FTAA and MERCOEURO on agribusiness in the Mercosul countries. Revista de Economia e Sociologia Rural, 41, 323-343. e Figueiredo et al. (2001)Figueiredo, A. M. R., Ferreira, A. V., & Teixeira, E. C. (2001). Impactos da integração econômica nas commodities da economia brasileira e da União Europeia. Revista Brasileira de Economia, 55(1), 77-106., que também observaram a ampliação da produção e das exportações de produtos do agronegócio em diferentes acordos comerciais, como carnes, oleaginosas e produtos florestais.
5.3 EFEITOS SOBRE O BEM-ESTAR
Segundo Azevedo & Feijó (2010)Azevedo, A. F. Z., & Feijó, F. T. (2010). Análise empírica do impacto econômico da Alca e da consolidação do MERCOSUL sobre o Brasil. Revista de Economia, 3(2), 119-149., em modelos que utilizam concorrência perfeita e retornos constantes de escala, as variações de bem-estar estão relacionadas às mudanças na eficiência alocativa, resultado da influência das alterações tarifárias e da produção, aos termos de troca e aos preços relativos da poupança e de investimento5 5 As nações provedoras líquidas de poupança para o banco global do GTAP se favorecem da elevação no valor da poupança em comparação ao valor do investimento, isso em relação ao valor equivalente do investimento e da poupança (I-S). Por outro lado, os receptores líquidos perdem. . Espera-se, com a formação de um acordo de comercial, que se tenha uma melhora nos termos de troca entre os membros do bloco, que representa o efeito da queda no valor das exportações dos países de fora do bloco, que procuram a compensação da queda na demanda de seus produtos com o acordo.
Nas Tabelas 17, 18 e 19 são apresentados os efeitos sobre o bem-estar nos acordos comerciais entre Brasil e China, Brasil e EUA e Brasil e UE, respectivamente, considerando as reduções das tarifas de importação em 100% e em 50%. O acordo bilateral entre o Brasil e a China, considerando a eliminação tarifária total, seria benéfico para ambos os países, sendo que o Brasil teria um ganho agregado de bem-estar de US$ 2,5 bilhões, estimulado, principalmente, pela melhora na alocação de seus recursos (US$ 1,7 bilhão). Por sua vez, para a China, o ganho agregado de bem-estar seria muito superior ao do Brasil, totalizando US$ 6,5 bilhões, influenciado, principalmente, pelos termos de troca (US$ 4,2 bilhões). Nas demais regiões analisadas, haveria perda de bem-estar, em virtude, especialmente, da deterioração dos termos de troca. Os ganhos seriam similares com a redução em 50% nas tarifas de importação, mas em menor proporção (Tabela 17).
Na Tabela 18, o acordo bilateral entre o Brasil e os EUA, com eliminação de 100% da tarifa, não seria benéfico ao Brasil, apresentando perda de bem-estar. Em contrapartida, haveria ganho para os EUA. Para o Brasil, existiria uma perda no agregado de bem-estar de US$ 343,9 milhões, principalmente, devido à piora nos termos de troca (US$ -349,2 milhões).6 6 A piora dos termos de troca do Brasil no acordo com os EUA pode ser explicada pelas tarifas de importação praticadas pelos países antes da formação do bloco. Enquanto as tarifas de importação do Brasil sobre produtos dos EUA eram elevadas (Tabela 4), as tarifas dos EUA sobre os produtos brasileiros eram muito baixas, próximas a zero (Tabela 6). Assim, quando houve a simulação do acordo com a eliminação das tarifas entre os países, ocorreu um aumento significativo da demanda de importação brasileira em vários produtos (Tabela 14), elevando os preços de importação do país, levando à deterioração dos termos de troca. Para os EUA, o ganho agregado de bem-estar seria de US$ 4,9 bilhões, fruto, especialmente, dos termos de troca (US$ 3,3 bilhões) e pelo efeito positivo na poupança e investimento. Haveria perda de bem-estar nas demais regiões analisadas em virtude, sobretudo, da deterioração dos termos de troca, resultando em perdas no total global de bem-estar de US$ 247 milhões. Na simulação com redução tarifária em 50%, percebe-se uma evolução modesta, mas positiva, nos ganhos de bem-estar para o Brasil (US$ 177 milhões), motivada pela melhor alocação dos recursos produtivos. Os EUA teriam ganhos bem superiores aos do Brasil nesta simulação (US$ 2,1 bilhões). Por fim, haveria um ganho de bem-estar total de apenas US$ 147,84 milhões.
Por fim, na Tabela 19, são apresentados os ganhos de bem-estar numa possível integração entre Brasil e UE. Com isenção de 100% na tarifa de importação, observou-se o melhor resultado nos ganhos de bem-estar para o Brasil dentre os três acordos simulados. Verificou-se que, para o Brasil, o ganho agregado de bem-estar seria de US$ 7 bilhões, estimulado pela melhora na alocação de seus recursos (US$ 2,2 bilhões), mas, principalmente, pelos ganhos nos termos de troca (US$ 4,7 bilhões). A UE acompanharia essa tendência positiva, com ganhos no agregado de bem-estar um pouco inferiores ao brasileiro: US$ 5,9 bilhões (influenciados por uma considerável melhora na alocação de seus recursos, US$ 5,5 bilhões). Quanto às demais regiões, haveria perda de bem-estar em virtude, especialmente, da decomposição dos termos de troca. O ganho total global, contudo, seria positivo (US$ 5,6 bilhões). Por sua vez, com a redução de 50% nas tarifas de importação, o cenário se inverteria, sendo que o Brasil apresentaria ganhos de bem-estar na ordem de US$ 2,5 bilhões (destacando-se o efeito alocativo, US$ 1,3 bilhões) e a UE obteria ganhos de US$ 4,0 bilhões (com destaque para o efeito alocativo, US$ 2,9 bilhões).
Constata-se, portanto, que um acordo comercial com a China apresentaria ganhos de bem-estar para ambos, entretanto, com frutos superiores para a China nas duas simulações. O cenário com os EUA não apresentaria ganhos de bem-estar para o Brasil na simulação com 100% de isenção, pelo contrário, seriam verificadas perdas. Já com isenção de 50%, a simulação mostraria ganhos de bem-estar não muito expressivos, contudo, positivos. Por sua vez, o acordo com a UE apresentaria ganhos significativos de bem-estar para ambos, com o Brasil apresentando melhores ganhos que o bloco europeu na simulação com isenção total de tarifas.
Os resultados obtidos mostram que os ganhos de bem-estar para o Brasil, em todos os acordos, estão principalmente vinculados à melhor alocação dos seus recursos produtivos, que estariam concentrados basicamente nos setores primários e de baixa intensidade tecnológica, que agregaria o agronegócio. Assim, seriam confirmados os resultados obtidos por Silva et al. (2016)Silva, M. L., Coronel, D. A., Freitas, C. A., & Silva, R. A. (2016). O impacto da Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento (TTIP) para as economias norte-americana e europeia. Perspectiva Econômica, 11(2), 143-154., Pelegrini (2016)Pelegrini, T. (2016). Potencialidades de Acordos Preferenciais de Comércio entre o Brasil e seus principais parceiros. (Dissertação de mestrado). Universidade Federal de Viçosa, Viçosa. e Megiato et al. (2016)Megiato, E. I., Massuquetti, A., & Azevedo, A. F. Z. (2016). Impacts of integration of Brazil with the European Union through a general equilibrium model. Economía, 17, 126-140., que constataram que estes setores, em que o Brasil possui vantagens devido à abundância do fator terra, são os que influenciam os ganhos de bem-estar para o Brasil.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este estudo analisou as oportunidades de comércio a partir da simulação de uma possível integração comercial do Brasil com a China, com os EUA e com a UE, buscando identificar os setores mais beneficiados pelo eventual acordo, classificados de acordo com seu grau de intensidade tecnológica, com ênfase no agronegócio brasileiro.
No que se refere aos impactos sobre a produção, as ampliações dos volumes produzidos ocorreriam para o setor de oleaginosas, num acordo entre Brasil e o país asiático, com eliminação tarifária total (1,8%), e de carnes, num acordo com o bloco europeu, também considerando eliminação total das tarifas de importação (32,3%). Para o setor de cana-de-açúcar ou beterraba, ambos os acordos com China e UE (eliminação de 100% das tarifas) promoveriam um aumento da produção: 0,9% e 0,7%, respectivamente. Para o setor de produtos florestais, a menor redução da produção brasileira ocorreria no acordo entre Brasil e EUA, considerando uma diminuição de 50% nas tarifas de importação (produtos de madeira, -0,3%, e produtos de papel, -0,06%).
Os resultados dos impactos sobre o comércio internacional brasileiro revelaram que os ganhos no setor de oleaginosas no acordo com os EUA e de carnes com o bloco europeu seriam maiores, chegando a 21,1% e a 970,2%, respectivamente. No caso do setor de produtos florestais, existiria um acréscimo das exportações de produtos de madeira e de produtos de papel do Brasil nas simulações de acordos preferenciais com a China, ampliação de 2,2% e de 0,42%, respectivamente; e com os EUA, 5,76% e 1,46%, respectivamente. Em ambos os acordos, os maiores aumentos do volume exportado ocorreriam com a completa eliminação tarifária. Já num acordo entre Brasil e UE, as exportações brasileiras seriam ampliadas apenas no comércio de produtos de madeira e no cenário de redução tarifária de 50% (aumento de 2,35%).
Em relação ao bem-estar, por sua vez, observou-se que Brasil e China apresentariam ganhos num acordo comercial, com destaque para o país asiático. No caso do Brasil, os ganhos estariam associados, principalmente, aos efeitos alocativos. No caso de um acordo comercial com os EUA, o Brasil obteria ganhos de bem-estar somente com isenção de 50% e também originários dos efeitos alocativos. O acordo com a UE, no que lhe concerne, apresentaria ganhos significativos de bem-estar para ambos. Entretanto, num cenário de eliminação total tarifária, seria o único acordo em que o Brasil exibiria melhores ganhos diante do parceiro comercial.
A análise dos setores mais afetados pela formação dos acordos comerciais é importante para uma eventual negociação futura do Brasil com esses parceiros comerciais. A identificação daqueles setores mais beneficiados (prejudicados) pelo processo de integração regional poderá ensejar a adoção de políticas públicas que maximizem (minimizem) tais ganhos (perdas). Setores potencialmente mais beneficiados pela integração, por exemplo, poderiam receber uma atenção especial no processo de liberalização comercial do país, ao passo que aqueles mais prejudicados poderiam ser alvo de uma fase de transição mais longa.
Por fim, observou-se que tais acordos também resultariam em ampliação da produção e das exportações de produtos brasileiros de baixa intensidade tecnológica. Sendo assim, como sugestão de pesquisas futuras, recomenda-se aprofundar a análise deste setor. Também seria importante utilizar modelos de equilíbrio geral computáveis baseados em retornos crescentes de escala e concorrência imperfeita, pois mesmo na atividade primária há sinais de que há setores com predomínio de estruturas de mercado mais concentradas. Seria importante também buscar estimar os impactos das barreiras não tarifárias (BNTs), cada vez mais relevantes, sobre o comércio do setor do agronegócio.
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Como o artigo busca examinar apenas os efeitos estáticos, a segunda e a terceira fases descritas pelos autores não serão apresentadas aqui.
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A simulação não incluiu a eliminação de barreiras não tarifárias (BNTs) e de subsídios.
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Esse é o setor em que havia o maior grau de proteção tarifária em todos os países e regiões examinados em relação aos produtos brasileiros (39,9%).
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5
As nações provedoras líquidas de poupança para o banco global do GTAP se favorecem da elevação no valor da poupança em comparação ao valor do investimento, isso em relação ao valor equivalente do investimento e da poupança (I-S). Por outro lado, os receptores líquidos perdem.
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A piora dos termos de troca do Brasil no acordo com os EUA pode ser explicada pelas tarifas de importação praticadas pelos países antes da formação do bloco. Enquanto as tarifas de importação do Brasil sobre produtos dos EUA eram elevadas (Tabela 4), as tarifas dos EUA sobre os produtos brasileiros eram muito baixas, próximas a zero (Tabela 6). Assim, quando houve a simulação do acordo com a eliminação das tarifas entre os países, ocorreu um aumento significativo da demanda de importação brasileira em vários produtos (Tabela 14), elevando os preços de importação do país, levando à deterioração dos termos de troca.
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Como citar: Buchmann, J. L., Massuquetti, A., & Azevedo, A. F. Z. (2021). Análise de cenários do agronegócio brasileiro frente à China, aos EUA e à UE, utilizando um modelo de equilíbrio geral computável. Revista de Economia e Sociologia Rural, 59(4), e221493. https://doi.org/10.1590/1806-9479.2021.221493
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JEL Classification: Q13; Q17; C68.
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O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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- Baldwin, R., & Venables, A. (1995). Regional economic integration. In G. Grossman & K. Rogoff (Eds.), Handbook of International Economics (Vol. 3). Amsterdam: North Holland.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
09 Jul 2021 -
Data do Fascículo
2021
Histórico
-
Recebido
19 Mar 2019 -
Aceito
18 Dez 2020