Resumos
Resumo Os direitos de acesso à água potável e ao esgotamento sanitário devem ser garantidos à população residente em áreas rurais brasileiras, mas a lei não se efetiva igualmente no país, mantendo precário o acesso em áreas rurais. O modelo de gestão estudado, adotado na cidade de Divinópolis/MG, é representado pela Copasa e ofertado sobretudo em áreas urbanas. O estudo analisou a influência do referido modelo de gestão no atendimento dos serviços de água e esgoto nas áreas rurais. Foram analisados documentos oficiais, relatos de gestores e lideranças comunitárias gerados em entrevistas, assim como discursos de moradores de duas aglomerações rurais do município produzidos mediante interações em grupos focais. O construto teórico-metodológico da Análise de Discurso Crítica (ADC) possibilitou a construção do corpus, a descrição e a interpretação dialético-relacional do material textual coletado e gerado. A análise apontou os níveis e os modos de engajamento de gestores públicos do município em relação ao saneamento rural e a necessidade de ações que integrem as demandas rurais às urbanas. Os relatos de atores envolvidos na pesquisa salientam uma visão problematizadora da atual gestão da água e do esgoto, já que a rede de discursos investigada representa práticas hegemônicas políticas atuando na persistência da fragmentação urbano/rural.
Palavras-chave: saneamento rural; modelo de gestão; práticas hegemônicas; participação social
Abstract Ensuring access to drinking water and sanitary sewage services must be guaranteed to the population living in Brazil's rural areas. However, the implementation of relevant laws across the country remains inconsistent, leaving many rural areas with precarious access to these resources. The study focuses on management model observed in Divinópolis/MG, where services, primarily provided by Copasa, are predominantly geared towards urban areas. The study presented in this article analyzed the influence of this management approach water and sewage provision in the rural areas. Official documents, reports from managers and community leaders generated in interviews were analyzed, as well discourses from residents of two rural agglomerations in the municipality produced through interactions in focus groups. The theoretical-methodological framework of Critical Discourse Analysis (CDA) enabled the construction of the corpus, description and dialectical-relational interpretation of the textual material. The analysis showed the levels and modes of engagement among municipal public managers in relation rural sanitation and the need for actions that integrate rural and urban demands. The narratives of the actors involved in the research point to a problematizing view of current water and sewage management, since the network of discourses investigated represents hegemonic political practices that act to persist the urban/rural fragmentation.
Keywords: rural sanitation; management model; hegemonic practices; social participation
1 Introdução
Este artigo tem como objetivo central ampliar a discussão sobre demandas de abastecimento de água e esgotamento sanitário em áreas rurais e a respectiva oferta de serviços com gestão pública pelo ente que presta serviços à sede municipal ou compartilha a operação com associações comunitárias. Mais especificamente, o presente estudo discute as influências que o modelo de gestão adotado na sede de um município tem sobre o abastecimento de água e o esgotamento sanitário em suas áreas rurais. Para isso, recorre-se ao município de Divinópolis, que possuía 242.505 habitantes em 2021 e está localizado a 118 km da capital do Estado. Apesar de o município ser reconhecido como polo industrial do Estado, com destacado desenvolvimento econômico, uma grande parcela dos mais de 6.000 habitantes das suas áreas rurais sujeita-se a deficiências no atendimento por serviços de saneamento, de acordo com informações de 2021, do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (2022).
O poder público, quando se trata de saneamento básico, constitui suas ações para atender as coletividades. Nos territórios rurais, a maioria das residências não conta com atendimento por serviço público e não segue normas e padrões universais. Ações individuais, em geral, são praticadas na esfera privada sem a garantia de atendimento adequado e segundo princípios básicos de direitos humanos. Tal condição reforça a persistência do déficit em áreas rurais e revela a importância de políticas públicas com foco na redução das desigualdades. Daí vem a importância de se compreender como a gestão municipal e a prestação de serviços de saneamento se posicionam frente às principais demandas associadas ao déficit e à forma como são e poderiam ser atendidas, seja no plano individual, seja no comunitário ou coletivo.
As particularidades das áreas rurais, ou ruralidades, são o resultado da ação humana em determinado contexto ambiental, criando teias socioculturais (Galizoni, 2021). A visão tecnocêntrica, dominante na engenharia, resulta em ações padronizadas, incapazes de fazer frente ao déficit em saneamento, que é persistente nos lugares que diferem dos preconizados pelas formas públicas convencionais de atendimento (Teixeira, 2014; Dias, 2021). Nessa perspectiva, interpretar como a gestão estabelecida no município se comporta e cria condições para o desenvolvimento de ações em áreas rurais pode trazer à tona elementos importantes para a discussão de como ultrapassar o estágio atual, de déficit persistente de serviços de saneamento em áreas rurais do Brasil.
O alcance da universalização do atendimento da população com saneamento básico é um dos princípios fundamentais estabelecidos no Marco legal do saneamento básico (Brasil, 2007) e preconizado no Relatório A/HRC/42/47, da ONU, que institui os direitos humanos à água e ao esgotamento sanitário – DHAES (Organization of the United Nations, 2010). Entretanto, a gestão do saneamento não tem se mostrado comprometida com o atendimento às áreas rurais, desconsiderando o conteúdo normativo dos DHAES, que aponta caminhos para a realização dos direitos. O gozo pleno dos direitos humanos à água e ao saneamento está sujeito à disponibilidade relacionada à oferta, à fiabilidade da prestação de serviços e sua perenidade, para demandas atual e futuras; à acessibilidade física, que traduz a forma de atendimento, no domicílio ou adjacências, ou seja, consiste na ligação residencial à infraestrutura de saneamento; à acessibilidade econômica, que prevê que os custos envolvidos no atendimento à demanda não interfiram no acesso a outros serviços essenciais; à aceitabilidade, que repercute na adoção de soluções tecnológicas condizentes com as necessidades específicas, influenciadas por padrões culturais; à qualidade, que se refere a questões afetas à potabilidade da água, seguindo diretrizes nacionais; e à efetividade na coleta, transporte e tratamento do esgoto (Organization of the United Nations, 2019).
Leva-se em conta as prerrogativas do Relatório da ONU, de compromisso por parte das nações com as metas globais, que apontam a necessidade de efetiva diminuição do déficit em áreas rurais – desde as faixas que conectam o atendimento prioritário, em sedes municipais, a áreas de particular interesse, passando por aglomerações domiciliares de distintas composições e tamanhos, e por domicílios esparsos. O déficit é relacionado a regiões segregadas dentro dos municípios, representadas em diversas ruralidades. Essas regiões estão presentes na maior parte dos municípios brasileiros, mantendo-se o paradigma que desvincula o poder público do atendimento a demandas de áreas rurais, com sua limitada capacidade de pagamento (Brasil, 2019).
Para a interpretação das influências do modelo de gestão sobre as ações voltadas ao abastecimento de água e ao esgotamento sanitário, utiliza-se a Análise de Discurso Crítica (ADC) como instrumento teórico-metodológico, tendo sido empregadas as dimensões de análises textual, prática discursiva e prática social (Fairclough, 2001).
2 Fundamentação Teórica
2.1 Ruralidade, política pública e gestão de saneamento no Brasil
O Brasil rural possui uma extensa abrangência territorial com variadas culturas, sendo permeado por ruralidades distintas. De acordo com o Programa Nacional de Saneamento Rural – PNSR (Brasil, 2019), as populações em situação de déficit de atendimento por água e esgotamento sanitário se encontram predominantemente em áreas rurais, nas macrorregiões Norte e Nordeste. Em grande parte das macrorregiões Sudeste e Sul do País, a oferta hídrica mais abundante e o desenvolvimento econômico destacado, resultaram em maior atendimento com abastecimento de água. Entretanto, com isso, criou-se um passivo ambiental de difícil solução, dada a poluição proveniente de fontes difusas de esgoto doméstico e outros efluentes sem a devida coleta e tratamento. O fluxo desses resíduos no ambiente traz consequências bastante negativas à população residente em áreas rurais de extensão urbana, que se encontram na rota dos esgotos canalizados e lançados ao longo dos córregos e rios urbanos. Essas áreas, apesar de estarem próximas das sedes municipais, nem sempre se beneficiam dos serviços ofertados. A economia de escala representa um aspecto determinante da presença de sistemas nas aglomerações humanas. A forma como a gestão se estabelece também guarda relação com o total de economias ativas, haja vista a sua influência sobre a quantidade de pessoal ocupado e a complexidade da técnica adotada.
Os estudos que subsidiaram a elaboração do PNSR trazem uma tipologia de caracterização do rural. Por meio da agregação de setores censitários foram criados grupos que representam quatro tipos de ruralidades: i) o das aglomerações próximas de área urbana, sendo as soluções sanitárias adotadas diretamente influenciadas pelas praticadas nas áreas centrais urbanizadas; ii) aglomerações mais adensadas isoladas, com número maior de economias e possibilidade de ações coletivas e organizadas em modelos de gestão. iii) aglomerações domiciliares menos adensadas e isoladas no território, com ações de saneamento bastante influenciadas pelas práticas individuais ou por soluções alternativas coletivas, em geral, com pouco ou nenhum apoio do poder público; iv) sem aglomerações, cujas soluções sejam adequadas para atender a uma unidade domiciliar (Brasil, 2019). No âmbito deste estudo analisam-se realidades situadas no terceiro grupo (iii) que compõe a tipologia do PNSR.
Quanto à prestação de serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário, o PNSR reitera que os principais modelos de gestão estão presentes nas sedes municipais, em muitos casos, não tendo atuação expandida para áreas rurais dos municípios. Trata-se de uma realidade comum em todo o território nacional, que pode ser explicada pelos contextos históricos. Os modelos de gestão de serviços de saneamento no Brasil foram moldados a partir de situações emergenciais, para fazer frente a questões prioritárias, dentre as quais, não se enquadrava o saneamento rural.
De acordo com Rezende & Heller (2008), após uma malsucedida atuação da iniciativa privada nas concessões públicas de serviços de água e esgotos, nas proximidades do fim do século XIX, o Estado brasileiro assumiu a responsabilidade pelos serviços de água e esgoto e buscou viabilizar a atuação dos poderes públicos locais, reconhecendo-os como os entes capazes de identificar e fazer frente às demandas. Com isso, a gestão correspondente à administração direta do poder público municipal estabeleceu-se, nas primeiras décadas do século XX, recebendo, desde o início, críticas relacionadas à burocracia excessiva e o clientelismo, bem como a falta de sustentabilidade financeira dos sistemas (Costa, 1994). Desde então, apesar de estar presente na prestação de serviços de saneamento, majoritariamente, no esgotamento sanitário, continua a responder por uma parcela significativa do déficit urbano e não demonstra ter avançado no atendimento consistente das populações rurais.
Segundo Roedel (1954), nos anos 1940 surgiu um modelo de gestão municipal, porém sob a forma de prestação indireta, representado pelas autarquias. Criadas por engenheiros norte-americanos que se encontravam no vale do Aço, durante a 2ª Guerra Mundial, as autarquias deveriam garantir a operação e a manutenção dos recém-instalados sistemas, com a nova tecnologia de tratamento da água, caracterizada por operações sucessivas e processos físicos e químicos (Rezende & Heller, 2008). As autarquias revelaram-se capazes de prestar serviços de água e esgotos nos municípios, simultaneamente, embora não tenham, por princípio, enfrentado o desafio de ampliar a prestação para além das áreas urbanas. Todavia, há exemplos de sistemas administrados por autarquias que avançaram bastante nessa direção, a exemplo de Uberlândia e Mal. Cândido Rondon (Cavalcante, 2019; Kloss, 2020). Elas foram criadas segundo um alinhamento entre a saúde e o saneamento, vigente à época, na perspectiva do convênio estabelecido entre o Brasil e os EUA, por meio do Serviço Especial de Saúde Pública. As feições iniciais das autarquias municipais foram remodeladas com o passar dos anos, destacando-se as adversidades oriundas da política desenvolvimentista dos anos 1960, que consolidou um novo paradigma pautado na economia de escala e na priorização de investimentos em determinados setores (Rezende & Heller, 2008).
As autarquias foram excluídas do acesso a investimentos pelo PLANASA, primeiro plano de saneamento do País, que elegeu as Companhias Estaduais de Saneamento Básico (CESB) como agentes de desenvolvimento do referido Plano. O fator de escala tornou-se ainda mais determinante para a atuação do poder público frente ao atendimento de demandas de água, esgoto, manejo de resíduos sólidos e das águas pluviais. Essa característica firmou-se no âmbito da política nacional dos anos 1970, de forte viés econômico e sob firme propósito de atender ao ritmo acelerado da urbanização, como resposta ao intenso processo de industrialização (Rezende & Heller, 2008). As Companhias Estaduais de Saneamento Básico (CESB) foram as protagonistas do PLANASA e responsáveis por executar suas premissas, representadas pela priorização do abastecimento de água e a atuação em regiões de demanda induzida por maciça imigração, principalmente em áreas metropolitanas (Rezende & Heller, 2008; Sousa & Costa, 2013). De forma bastante resumida, planejou-se o aumento acelerado da cobertura domiciliar por redes de água em detrimento da coleta dos esgotos e, principalmente, de seu tratamento. Foram utilizados recursos do FGTS para investimentos em instalação e expansão de redes, prevendo-se a autossustentação tarifária dos serviços. Sousa & Costa (2013) ressaltam o subsídio cruzado como mecanismo importante instituído pelo PLANASA a fim de prover equilíbrio financeiro ao conjunto de municípios sob concessão de serviços de água às CESB, com sistemas superavitários apoiando deficitários. As CESB buscaram municípios de grande e médio porte populacional, em abastecimento de água, dividindo atribuições com os poderes locais, cujas atuações estariam relacionadas às demandas de coleta e tratamento de esgotos, em todo o município, e de água, para as populações rurais (Britto & Rezende, 2017). Estudos constataram a atuação prioritária das CESB em cidades mais populosas e com o maior número total de economias (Rossoni, 2015) e informações da Pesquisa Nacional de Saneamento Básico (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 2017), revelaram a atuação das CESB em 62% dos municípios brasileiros, no que concerne ao abastecimento de água, e em menos de 33% destes no esgotamento sanitário.
Nos anos 1990 surgiram as cooperativas de municípios para o abastecimento de água e o esgotamento sanitário voltadas às áreas rurais. Tal modelo se fiou na dificuldade de se implantar serviços em comunidades rurais e na capacidade potencial de uma organização envolvendo várias associações comunitárias para enfrentá-la (Rezende & Heller, 2008). Essa experiência agrega a comunidade e um ente supra municipal com capacidade técnica e gerencial de fornecer apoio aos pequenos sistemas. As experiências bem-sucedidas de gestão de saneamento em áreas rurais, como o Sistema de Saneamento Rural – SISAR, do Ceará, demonstram que as especificidades dos territórios devem ser consideradas na definição do modelo de gestão e influenciam positivamente o atendimento da população com serviços de água nas áreas rurais (Cruz, 2019).
O Marco Legal do saneamento no Brasil foi aprovado em 2007, sob a Lei 11.445 (Brasil, 2007). A Lei de Diretrizes Nacionais para o Saneamento Básico (LDNSB) está pautada em princípios fundamentais, que devem ser observados a fim de se alcançar um saneamento básico universal, com equidade e integralidade. Por intermédio da Lei criou-se o Plansab, ou Plano Nacional de Saneamento Básico, aprovado em 2013 e editado em 2019 (Brasil, 2013, 2020). O referido Plano estabelece as bases para se avançar no atendimento da população com água, esgotamento sanitário, manejo de resíduos sólidos e de águas pluviais, por meio de metas, diretrizes e estratégias e programas e ações, incluindo a recomendação da elaboração de um Programa de Saneamento Rural. Em dezembro de 2019 foi aprovado o PNSR – Programa Nacional de Saneamento Rural, pouco mais de um mês antes da atualização do Marco Legal e lançamento da Lei 14.026/2020, que em seu texto ignora as realidades rurais e suas demandas, ao criar um processo rígido de licitação que impede a atuação de associações no fornecimento de água às comunidades rurais. Apesar de serem apresentados quase simultaneamente, a Lei e o PNSR são desalinhados. Por exemplo, destaca-se o retrocesso referente à revogação do Artigo 10, Parágrafo 1º, Inciso I da LDNSB. Anteriormente, permitia-se a prestação de serviços de saneamento por meio de convênios ou termos de parceria para cooperativas ou associações em localidades de pequeno porte, quando os custos de operação e manutenção se mostrarem incompatíveis com o pagamento pelos usuários. Em sua forma atual, a Lei define que a prestação de serviços públicos de saneamento básico depende da celebração de contrato de concessão de maneira exclusiva (Lei Federal nº. 14.026/2020, Art. 10). Assim, o PNSR prevê a gestão multiescalar, que deve se adequar às condições de ruralidade existentes, enquanto a Lei aponta no sentido de desmobilizar a participação dos diversos atores, considerados essenciais pelo PNSR para a sustentabilidade e perenidade dos serviços.
2.2 Análise de Discurso Crítica (ADC)
A Análise de Discurso Crítica (ADC) de Norman Fairclough é uma abordagem teórico-metodológica de investigação discursiva centrada nas assimetrias de poder e em seus efeitos nas práticas sociais, pois problemas sociais são parcialmente discursivos (Fairclough, 2001). Para o autor, além do discurso ser compreendido como forma de ação e interação entre os agentes sociais no mundo, é entendido de maneira tridimensional, pela prática social, prática discursiva e texto. Cada uma dessas três dimensões analíticas possui categorias próprias, que se articulam, produzindo significados dialeticamente. Fairclough (2001), ao propor seu enquadre metodológico tridimensional para a análise discursiva textualmente orientada, explica ainda que sua proposta se insere em uma Teoria Social do Discurso (TSD), haja vista a ligação entre linguagem, ideologia e poder.
A ADC é um campo de pesquisa socialmente responsável, isto é, analisa a linguagem, enfatizando as lutas hegemônicas, inserindo-se em discussões que envolvem relações assimétricas de poder, como é o caso das comunidades rurais no contexto do acesso à água e ao esgotamento sanitário, tema deste estudo. Considera-se o modo como documentos oficiais reproduzem as soluções dadas às demandas de saneamento, no plano local, e a forma como as narrativas de membros de regiões rurais representam linguisticamente a desigualdade no abastecimento de água e no esgotamento sanitário. Então, discursos sobre o acesso à água e ao esgotamento, em comunidades rurais, tendem a representar relações de dominação instituídas na esfera política, tornando viáveis problematizações voltadas para instituições e moradores dessas regiões a fim de sugerir mudanças sociais discursivamente mediadas (Resende & Ramalho, 2006).
Fairclough (2001) apropriou-se da Linguística Sistêmico Funcional (LSF) em razão da centralidade dada ao texto, que é tomado como uma unidade de sentido nessa perspectiva funcional da linguagem (Halliday & Matthiessen, 2004). Deste modo, análises discursivas críticas de linha faircloughiana são textualmente orientadas, ou seja, partem da realização semiótica dos discursos (escolhas lexicogramaticais), em direção à interpretação e explanação crítica. Outro fator que motiva essa filiação à LSF é o interesse comum entre ambas as áreas de observar e compreender a relação entre linguagem-contexto social. Conforme Fairclough (2001), o discurso é mais do que pura materialização semiótica, pois emerge em uma determinada conjuntura ideológica e hegemônica, representando um produto linguístico de práticas sociais particulares situadas no tempo-espaço e com objetivos particulares.
Práticas sociais são compreendidas a partir da descrição linguística (análise textual), tendo em vista principalmente que são mediadas por discursos investidos de ideologias e hegemonias. As ideologias são construções da realidade, do mundo físico, das relações sociais. Quando incutidas nas práticas discursivas, as ideologias são eficazes quando se tornam cristalizadas e atingem o status de senso comum (status quo) (Fairclough, 2001). Nessa perspectiva, ideologias são geralmente materializadas linguisticamente em textos, mas podem estar implícitas nas práticas discursivas e sociais, por isso, a relevância do caráter descritivo e interpretativo do exercício analítico. O que se tem na vida social são correntes ideológicas conflitantes e atuantes, as quais orientam negociações capazes de intensificar, articular, rearticular e desarticular relações de poder. Assim, as hegemonias também têm dimensões ideológicas, mas concentram-se na dominação do poder ideológico em várias esferas sociais: política, cultural, educacional etc. Fairclough (2001, p. 122), compreendendo que “hegemonia é o poder sobre a sociedade [...] das classes economicamente definidas como fundamentais em aliança com outras forças sociais”. Logo, o poder nunca é atingido totalmente, mas parcial e temporariamente; ele é contingencial.
Neste estudo, os conceitos de ideologia e hegemonia são retomados no momento da análise, buscando identificar, a partir dos textos, as forças que atuam na gestão do abastecimento de água e do esgotamento sanitário da população rural de Divinópolis/MG, trazendo evidências sobre como os poderes público, privado (incluindo empresas estaduais, como a Copasa) e sociedade inter(agem) discursivamente acerca da disponibilização e oferta desses serviços essenciais.
3 Metodologia
O estudo utilizou a metodologia qualitativa, interpretativa e explanatória da Análise de Discurso Crítica (ADC) de Norman Fairclough (2001). Foram analisados dados semióticos sistematizados com base na coleta de documentos oficiais que legislam sobre a gestão da água e o esgotamento sanitário em Divinópolis/MG, bem como na geração de dados provenientes de entrevistas e grupos focais. Tais técnicas foram selecionadas de acordo com as orientações de Bauer & Gaskell (2007), tendo em vista a produtiva relação dialética que pode ser estabelecida entre dados coletados na esfera do poder público e dados gerados com membros de uma comunidade rural particular, usualmente menos hegemônica; mais vulnerável.
Especificamente, participaram das entrevistas gestores e lideranças comunitárias; já dos grupos focais, membros da comunidade rural. Os áudios foram gravados e integralmente transcritos para a realização da análise linguístico-discursiva. Esse material semiótico (corpus) foi também organizado para uma análise temática-categorial de acordo com os objetivos da pesquisa. Conforme a abordagem teórico-metodológica transdisciplinar da ADC de Fairclough (2001), o trabalho do analista crítico do discurso deve seguir o método de análise textualmente orientado: descrição linguística, interpretação e explanação crítica. Para tal, a partir dos textos coletados e gerados, foram selecionadas as categorias linguístico-discursivas operacionalizadas na análise, as quais respondem aos objetivos do presente estudo. São elas: vocabulário (seleção vocabular/escolhas linguísticas), modalidade, intertextualidade, ideologia e hegemonia. Tais categorias são explicadas de maneira prática no momento da análise dos excertos elencados.
A análise textual teve como foco os instrumentos que controlam as relações entre estruturas sociais e ações para o atendimento à população das áreas rurais do município em estudo. Os dados foram coletados no contrato de prestação de serviços, da ARSAE (Agência Reguladora de Serviços de Abastecimento de Água e Esgotamento Sanitário do Estado de Minas Gerais, 2011), bem como no Plano Municipal de Saneamento Básico (Divinópolis, 2010) e no Plano Diretor Participativo (Divinópolis, 2013). Esses documentos foram encontrados digitalizados nos sites oficiais da ARSAE e da Prefeitura Municipal de Divinópolis. A busca de dados no contrato de prestação de serviços foi a partir dos seguintes temas: i) abrangência de atuação; e ii) obrigações e metas em relação às áreas rurais. Já no Plano Municipal de Saneamento Básico e Plano Diretor Participativo foram selecionados aspectos relativos ao planejamento de ações para as áreas rurais e ao diagnóstico situacional do saneamento rural. Isso foi possível pelo sistema de busca do leitor de PDF, a partir das palavras-chave: “rural” e “rurais”, ferramenta que possibilitou a seleção e organização de excertos para a análise linguístico-discursiva. Estas coletas de dados foram realizadas entre julho e dezembro de 2021.
Nos documentos oficiais foram identificados e analisados termos e enunciados que revelam o nível de comprometimento do município com o saneamento rural, focalizando a representação da obrigatoriedade no que tange à abrangência de atuação dos prestadores de serviços e às metas de atendimento no curto, médio e longo prazos para as áreas rurais. Outros aspectos observados envolvem a realidade do atendimento por abastecimento de água e esgotamento sanitário nas áreas rurais, as localidades atendidas por estes serviços e a qualidade destes atendimentos, as localidades ainda não atendidas e possíveis obstáculos relativos ao não atendimento, incluindo a organização da gestão destes serviços para as áreas rurais do município de Divinópolis/MG.
Na dimensão da prática discursiva foi analisada a rede de discursos produzidos por atores institucionais e locais na perspectiva do atendimento à água e ao esgotamento sanitário para a população rural. Foram analisados e articulados os discursos dos documentos oficiais com as entrevistas e grupos focais a fim de interpretar e explanar dialeticamente textos produzidos por membros da comunidade atravessados por distintos níveis de poder (hegemonia).
O contato inicial foi feito com o Prefeito do Município para autorização da pesquisa. Em seguida foram entrevistados um gestor que atua em saneamento rural, pela Prefeitura, e um gestor de saneamento da Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa). Esta foi a estratégia inicial para a seleção e organização logística da pesquisa nos aglomerados rurais de estudo (Buritis e Costas), onde foram realizadas entrevistas com as lideranças comunitárias e, posteriormente, realizados grupos focais com os moradores locais. Estes dois aglomerados menos adensados e isolados, que integram o município de Divinópolis, foram escolhidos em função de apresentarem condições precárias de saneamento e estarem fora do escopo de atendimento dos serviços estabelecidos na sede municipal. A geração dos dados submetidos à análise discursiva foi realizada de fevereiro de 2022 a abril de 2022, após a aprovação do projeto pelo Comitê de Ética em Pesquisas envolvendo seres humanos, COEP.
Na última etapa da análise de discurso crítica (prática social), objetivou-se discutir os efeitos das relações entre atores institucionais e locais na organização da gestão do saneamento e as intertextualidades que permeiam as práticas discursivas analisadas. É pertinente enfatizar, ademais, que a análise da prática social é, sobretudo, interpretativa, sendo essas interpretações orientadas pelas escolhas lexicogramaticais realizadas em textos, assim como por exclusões linguísticas e temáticas identificadas pelo analista. Assim, ideologias e hegemonias investidas nos textos são analisadas a partir do material linguístico e também da minuciosa interpretação do analista, visto que ideologias e hegemonias tendem à opacidade nos textos (Fairclough, 2001).
Os trechos apresentados ao longo da seção de resultados e discussão são relativos a narrativas individuais, obtidas nas entrevistas com gestores, ou a discussões mais amplas, contendo a fala de dois ou mais participantes de um grupo focal.
4 Resultados e discussão
4.1 Descrição do objeto de estudo
Para o atendimento da população urbana, o município de Divinópolis possui contrato de prestação de serviços de abastecimento de água com a Copasa, desde 1973. Na ocasião, ainda com a razão social de Companhia Mineira de Águas e Esgotos (Comag), o contrato foi celebrado para um prazo de 30 anos. Em 2003 foi assinado o Termo de Prorrogação do Contrato de Concessão para prestação dos serviços de abastecimento de água; em 2011, foi assinado o Contrato de Programa para a prestação de serviços de abastecimento de água e de esgotamento sanitário (Agência Reguladora de Serviços de Abastecimento de Água e Esgotamento Sanitário do Estado de Minas Gerais, 2011). Entretanto, o atendimento da população rural por estes serviços é de responsabilidade da Prefeitura, conforme indicam o Plano Municipal de Saneamento Básico (Divinópolis, 2010) e o Plano Diretor Participativo de Divinópolis (Divinópolis, 2013).
Segundo o PDP (Divinópolis, 2013), o município possui 44 comunidades rurais, sendo 20 delas atendidas por sistemas compostos de captação, reservação e distribuição de água. Dentre as 20 comunidades, nove são contempladas com captação de água em poços artesianos: Amadeu Lacerda, Buritis, Cacoco de baixo, Choro, Córrego do Paiol, Lava-pés, Ponte de ferro, Quilombo e Tamboril. As outras 11 localidades realizam captação em poços amazonas: Branquinhos, Cachoeirinha, Córrego Falso, Costas, Djalma Dutra, Lages, Lagoa, Lajinha, Lopes, Mata dos Coqueiros e Perobas. Estes sistemas de abastecimento de água possuem 935 ligações, mais de 61 quilômetros de rede de abastecimento e 703 m3 de água dispostos em reservatórios, contemplando o atendimento de aproximadamente 3.000 pessoas. Em relação ao esgotamento sanitário somente a comunidade rural de Buritis possui rede coletora seguida de tratamento.
As comunidades selecionadas para aprofundamento neste estudo são Buritis e Costas, sendo a primeira atendida por sistemas de abastecimento de água e esgotamento sanitário, embora não cumpra os protocolos de vigilância da qualidade da água. Buritis possui captação em dois poços artesianos dos quais a água é encaminhada a dois reservatórios, de onde é distribuída pela rede. Parte da população da comunidade reside em domicílios atendidos por rede coletora de esgotos seguida de tratamento. Situada 12 km ao Sul da sede do município (Divinópolis/MG), Buritis conta com aproximadamente 390 habitantes, distribuídos em 160 famílias. Seu nome é devido à grande presença da espécie de coqueiro Mauritia Flexuosa, popularmente conhecida como coqueiro-buriti (Divinópolis, 2013).
Já a comunidade rural dos Costas foi escolhida em função da sua longa distância à sede municipal e da existência de estrutura precária no sistema de abastecimento de água. Está localizada na porção Noroeste do município, a 25 km de sua sede. Possui captação de água em poço amazonas, de onde a água é transportada até um reservatório, do qual é distribuída em aproximadamente 55 residências, totalizando 120 moradores. A comunidade se instalou ao redor da igreja, após a doação do terreno em que foi construída, pela família Costas, sendo este o motivo do nome da localidade (Divinópolis, 2013).
4.2 Análise textual: A obrigatoriedade municipal e a necessidade do atendimento
Nesta primeira dimensão da análise de discurso crítica, foram analisadas as seleções lexicais, oracionais e as modalidades presentes nos textos (Fairclough, 2001, 2003), elementos que apontam os níveis de comprometimento dos atores governamentais com o saneamento rural. Por meio da análise da seleção de verbos (processos, em termos de Linguística Sistêmico Funcional LSF), advérbios modais e adjetivos (léxicos avaliativos) empregados nos textos coletados e gerados foram identificadas a obrigatoriedade e a necessidade do atendimento ao saneamento nos documentos oficiais. Em uma ordem cronológica, analisam-se trechos do Plano Municipal de Saneamento Básico (Divinópolis, 2010), do contrato de renovação de prestação dos serviços com a Copasa (Agência Reguladora de Serviços de Abastecimento de Água e Esgotamento Sanitário do Estado de Minas Gerais, 2011) e do Plano Diretor Participativo (Divinópolis, 2013).
O primeiro documento oficial é o Plano Municipal de Saneamento Básico publicado em 2010, elaborado pelos técnicos da Prefeitura sem a participação da população. Segundo Silva (2012), a maioria das prefeituras não tem recurso humano próprio especializado para elaboração dos PMSB e estes sofrem muito com a influência de vontades políticas. Já Pereira & Heller (2015), apontam que os PMSB que apresentam maiores chances de inferir na organização e qualidade do saneamento básico; e em melhorias da qualidade de vida da população são os que adotam métodos de planejamento e participação social para suas definições. Na seção de planejamento do PMSB de Divinópolis, encontra-se a seguinte proposta para ações no médio prazo:
(1) Executar os projetos de ampliação das unidades do sistema de abastecimento na área do Município e de implementação para zona rural objetivando a universalização dos serviços e garantindo a qualidade desses (Divinópolis, 2010).
A expressão linguística “executar os projetos” revela um comprometimento do município com a obrigação de levar abastecimento de água à população, inclusive na zona rural, o que é justificado pelas finalidades representadas (universalização e garantia de qualidade), incluídas por meio dos verbos no gerúndio (objetivando/garantindo), significando que, em 2010, essas eram demandas não contempladas pela gestão municipal. Quando insere o compromisso de universalizar o acesso à água, o documento oficial revela a necessidade da ampliação constante e progressiva do acesso de todos os domicílios ocupados, tendo também como finalidade o atendimento à população, com água potável, segundo os padrões de potabilidade. Entretanto, existe uma relação desta qualidade com a qualidade da oferta do serviço, que representa uma necessidade de estruturas físicas adequadas e rotinas de manutenção, operação e monitoramento planejados.
A proposta traz como meta ações para a universalização dos serviços de abastecimento de água no município, inclusive para as áreas rurais. No entanto, no que se refere ao esgotamento sanitário, o Plano não menciona ações que contemplem tais serviços para a população rural, indo de encontro ao princípio da integralidade.
Contudo, em (1) observa-se que a proposta traz como finalidade a garantia da qualidade do abastecimento de água. A qualidade é considerada um requisito para o cumprimento dos direitos humanos à água e ao esgotamento sanitário, assim como os requisitos de disponibilidade, acessibilidade e aceitabilidade. A disponibilidade, que pode ser oferta e continuidade dos serviços, também é revelada no trecho (1), junto à qualidade dos sistemas de abastecimento de água. Tais requisitos foram incluídos parcialmente no trecho (1), pois, apesar de o documento suscitar a ampliação do acesso à água rumo à universalização e a manutenção da qualidade da água, garantindo sua potabilidade, a acessibilidade relativa à continuidade não foi explicitada, situando uma lacuna no discurso impresso no documento, o que, em geral, autoriza a indiferença do poder público quanto à precarização desses serviços no contexto das comunidades rurais.
O segundo documento oficial analisado é o contrato de renovação de prestação de serviços celebrado com a Copasa em 2011. Este documento delimita a abrangência de atuação da prestação de serviços, conforme o trecho a seguir:
(2) O objeto do presente contrato é a prestação de serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário na sede municipal, conforme autorizado pela Lei Municipal n° 6589/2007 (Agência Reguladora de Serviços de Abastecimento de Água e Esgotamento Sanitário do Estado de Minas Gerais, 2011).
A afirmação categórica representada no trecho (2), constituída pelo verbo ser, no presente, (indicando um processo relacional na LSF) evidencia os objetivos do contrato com a Companhia Estadual, a saber, a oferta de água e o esgotamento sanitário. Quanto à circunstância local da oferta dos referidos serviços, há indicação de uma limitação geográfica (sede municipal). Em razão disso, as áreas rurais do município de Divinópolis são excluídas do acesso à estrutura dos serviços de abastecimento de água e do esgotamento sanitário.
Este objeto de contrato traz a integralidade dos serviços de abastecimento de água e do esgotamento sanitário, conforme princípios da política de saneamento básico e do Plansab. No entanto, exclui as áreas rurais do município do atendimento pela Companhia Estadual.
Em 2013 foi publicado o Plano Diretor Participativo do município de Divinópolis. Segundo Santos & Ranieri (2018), os municípios possuem um papel de extrema importância no direcionamento do desenvolvimento de seu território por meio do planejamento. No entanto, é constatada a falta de atenção ao planejamento territorial envolvendo as áreas rurais. A falta de informação elaborada ou disponível e a ausência de estudos que levem em conta as conexões destas áreas com o urbano são fatores considerados como obstáculos para o planejamento. No PDP de Divinópolis, consta, entre outras questões, o diagnóstico situacional do abastecimento de água e esgotamento sanitário nas áreas rurais:
(3) A água de abastecimento é clorada na maioria dos reservatórios, mas em nenhum deles são feitas análises por equipe especializada, causando frequentemente alterações na qualidade da água. Quanto ao esgotamento sanitário nestas comunidades somente Buritis apresenta rede de esgoto com filtro anaeróbio, mas a ETE está inoperante (Divinópolis, 2013).
No trecho “em nenhum deles são feitas análises por equipe especializada”, o verbo “é” e o advérbio modal de negação “nenhum” revelam uma negação categórica, mostrando que não são realizadas análises da qualidade da água nas comunidades rurais. Em “causando frequentemente alterações na qualidade da água”, o documento oficial mostra o efeito da ausência de análises, assumindo o alto risco da oscilação na qualidade da água, o que pode impactar a saúde da população rural. O que gera esse sentido é o emprego do léxico modal “frequentemente”, representando a vulnerabilidade da qualidade da água como uma rotina normalizada. Em “somente Buritis apresenta rede de esgoto com filtro anaeróbio, mas a ETE está inoperante”, o advérbio modal “somente” pressupõe a ausência do tratamento de esgotos nas demais comunidades rurais (exceto em Buritis). Nessa localidade, ainda que exista a estrutura de tratamento, este não se encontra em operação, sentido esse produzido pelo emprego do conectivo adversativo, “mas”, que introduz a inoperância desse atendimento na referida localidade.
O trecho (3) demonstra uma ineficiência no monitoramento da água ofertada para as comunidades rurais do município e uma falha operacional do único sistema de esgotamento sanitário existente (Buritis). Conforme o requisito de disponibilidade, tão importante quanto implantar sistemas de saneamento é a garantia da perenidade dos serviços. Portanto, este requisito envolve tanto a oferta, quanto a continuidade dos serviços após implantados (Bos et al., 2017). Para isso, uma eficiência na operação, monitoramento e manutenção nos sistemas implantados são características de modelos de gestão estruturados e engajados na dinâmica do atendimento. Pelo discurso do PDP (Divinópolis, 2013), nota-se que a gestão do saneamento de Divinópolis nas áreas rurais não está alinhada a um modelo que preze a efetividade no atendimento.
4.3 Análise da prática discursiva: Relação entre a análise textual e o discurso dos atores
Nesta segunda etapa da ADC, os significados analisados na etapa anterior tomam uma dimensão mais ampla na análise da prática discursiva. Os trechos dos documentos oficiais analisados anteriormente articulam-se a outros discursos, gerados por meio de distintas ferramentas metodológicas. São eles: discursos de gestores de saneamento (entrevistas semiestruturadas) e discursos de moradores das comunidades rurais (entrevistas e grupos focais). Essa análise intertextual é importante tendo em vista que potencializa uma visão problematizadora sobre o atendimento de demandas de abastecimento de água e esgotamento sanitário provenientes de áreas rurais de Divinópolis.
Em relação ao trecho (2), que delimita os serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário e a abrangência de atuação contratual da Copasa, somente à área urbana, adiciona-se o trecho (4), com relato do funcionário da Companhia Estadual:
(4) Nós temos duas comunidades que são operadas pela Copasa que, na verdade, não são comunidades rurais. No âmbito da Prefeitura Municipal de Divinópolis, elas são consideradas bairros, o Ferrador, que é a Chácara Belo Horizonte, e o Lago das Roseiras. Somente essas duas. Elas são operadas pela Copasa apenas no sistema de abastecimento de água. Essas duas comunidades foram repassadas à Copasa na concessão de renovação do município com a Copasa (Gestor, Copasa).
Apesar de os critérios de economia de escala e distância à sede serem determinantes para o atendimento às comunidades rurais e o contrato de prestação de serviços delimitar o atendimento da Companhia Estadual somente à sede municipal, existe o atendimento a duas localidades que são consideradas parte da sede (“bairros”) pela Prefeitura municipal. No entanto, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (2011), e de acordo com a reclassificação do rural pelo PNSR, a comunidade de Ferrador, localizada a 10 km da sede, e a comunidade Lago das Roseiras, localizado a 23 km da sede, se distribuem em setores censitários distintos dos setores urbanos, sendo caracterizadas como aglomerados domiciliares menos adensados. Os motivos do atendimento a estas comunidades não são delineados no contrato entre Prefeitura e Companhia Estadual, nem no diagnóstico situacional.
Em relação ao trecho (1), que revela a não integralidade dos serviços no município, o trecho (4) segue a mesma prerrogativa, ao traçar metas somente para o abastecimento de água, nas áreas rurais, não contemplando os serviços de esgotamento sanitário. A Companhia Estadual oferta o abastecimento de água às comunidades do Ferrador e do Lago das Roseiras. Enquanto isso, o esgotamento sanitário nestas duas comunidades não é de sua responsabilidade, e também não é contemplado pela Prefeitura municipal, mesma situação vigente nas outras 44 comunidades rurais, conforme relato do funcionário da Prefeitura:
(5) Não existe serviço de esgotamento sanitário na Prefeitura. Ela não oferta esse serviço, só de abastecimento de água. Existem perspectivas para que a gente ofereça tratamento. É necessário implantar uma estação de tratamento para essas comunidades, mas isso é uma perspectiva futura (Gestor, Prefeitura).
Ainda que no trecho (3), retirado do PDP, o diagnóstico situacional mencione um sistema de esgotamento sanitário inoperante, em Buritis, a gestão do saneamento rural não reconhece o atendimento deste serviço no município, conforme trecho (5). Tal incoerência mostra, então, a falta de alinhamento entre os discursos do PDP e do Gestor, o que representa novamente o problema sociodiscursivo já identificado: a insuficiente importância dada às demandas de saneamento no meio rural. Fairclough (2001, p. 171) pontua que “o conceito de coerência é o centro de muitas explicações sobre interpretação, atividade essa realizada pelo leitor/analista”, que precisa unir ideias de distintos textos (intertextualidade) para identificar, também, os efeitos ideológicos gerados por uma incoerência. Nessa dimensão ideológica do discurso (Thompson, 2009), ao afirmar categoricamente que todas as localidades carecem da implantação de estações de tratamento, o gestor padroniza a realidade das comunidades rurais em termos de saneamento. Isso ocorre por meio da unificação, da construção discursiva da identidade coletiva de um grupo (comunidades rurais sem qualquer estrutura de saneamento), tornando opaca qualquer outra explicação sobre o fato de a comunidade de Buritis possuir infraestrutura de esgoto.
Além disso, conforme analisado no trecho (1), sobre a não integralização dos serviços de água e esgoto, no mesmo sentido, o trecho (5) aponta que o município oferta somente o abastecimento de água; quanto ao esgotamento sanitário, o planejamento do atendimento é referenciado no plano de perspectivas futuras.
Ainda que conte com estação de tratamento, de acordo com o trecho (3), extraído do PDP, a população de Buritis presencia o sistema inoperante de tratamento de esgoto sanitário, conforme relato da liderança comunitária, no trecho (6):
(6) A manutenção do tratamento deve ter quase 10 anos já, que não é feito; e quando fez, foi meia boca. Então ele está lá. É um existe que não existe. Só não tem água escorrendo na rua, mas aquilo que se propõe a fazer de fato não é concluído 100% (Liderança, Buritis).
Apesar de haver a disponibilidade (oferta) de redes coletoras e de estação de tratamento de esgoto, a disponibilidade (continuidade) não é satisfatória. Os trechos (3) e (6) convergem para o mesmo sentido, o da existência de tratamento em Buritis. No entanto, são inexistentes procedimentos de manutenção e operação do referido sistema. O paradoxo “É um existe que não existe” denuncia em alto nível de engajamento o descaso vivenciado por essa comunidade.
Ao observar a realidade da população da comunidade de Costas, as pessoas que compuseram os grupos focais interpretam que a falta de atendimento por serviço de esgotamento sanitário gera insegurança acerca da contaminação do solo e da alteração na qualidade da água:
(7) O esgoto, ele é por fossa. Aquela que se faz buraco lá e o esgoto é destinado ali no próprio quintal de cada casa. Acho que não sei se não pensou nessa questão da contaminação do lençol. Porque as fossas ficaram no meio e possivelmente, haveria uma contaminação futura do lençol freático, porque esse poço amazonas ele capta a água de um lençol mais raso. E aí, hoje já existe essa contaminação dessa água e ela não é tratada (Liderança, Costas).
O trecho (7) revela uma preocupação da população residente na comunidade dos Costas com a qualidade da água fornecida, situação relacionada ao critério de aceitabilidade. Os trechos (3), (5), (6) e (7) convergem para uma ausência de ações em esgotamento sanitário nas áreas rurais do município, comprometendo a integralidade dos serviços de água e esgoto.
O trecho (6) revela uma atenção voltada à manutenção do tratamento de esgotos na comunidade de Buritis há mais ou menos uma década, possivelmente, em uma outra administração municipal. Este histórico de troca de administração a cada quatro ou oito anos revela indícios de mudanças na forma de atuação do gestor público no saneamento rural. Essa possibilidade de leitura é comprovada pela análise do relato do trecho (8), que inclui o fato de ter existido uma parceria entre a Copasa e a Prefeitura que abrangia a análise da água na comunidade dos Costas. Diferentemente do trecho (6), não consta no excerto seguinte uma estimativa de quando essa atividade foi realizada pela última vez:
(8) Inclusive eu acho que é a Copasa já fez alguns, algumas análises, dessa questão da água e contaminação. O índice de contaminação por coliformes fecais já estava acima do permitido. É uma parceria que a Copasa tem com a Prefeitura, eu não sei se hoje persiste essa parceria. Mas, tinha uma parceria onde a comunidade fornecia a água e o monitoramento era feito pela Copasa. Só que eu não vejo mais esse monitoramento da Copasa e nem da Prefeitura (Liderança, Costas).
Dependendo do ideal sociopolítico da administração municipal, algumas ações pontuais podem ser detectadas por parte do município e/ou em parcerias, conforme pode-se observar no trecho (8) e no trecho seguinte:
(9) A gente sempre questionava a questão da falta de água. E aí o pedido foi atendido pelo deputado furando o poço. Mas, ele falou para a gente que ele furaria, mas quem tinha que fazer a ligação dele até a caixa de cima seria pela prefeitura, mas a prefeitura falou que não ligou porque não tem verba para ligar (Comunidade, Costas).
No caso da comunidade dos Costas foi perfurado um poço artesiano para a captação de água de melhor qualidade. No entanto, o poço está inoperante devido à falta de uma ligação até o reservatório. Esta situação diverge do compromisso firmado em 2010, durante a elaboração do PMSB, de executar os projetos de implementação para zona rural objetivando a universalização dos serviços, conforme trecho (1).
Apesar destas medidas identificadas nos trechos (8) e (9) estarem relacionadas a uma ação conjunta, não se configuram como ações planejadas e estruturadas para atenderem a estas populações. Para isso, a gestão dos serviços de saneamento deve ser consolidada em expansões planejadas e em uma rotina de manutenção, operação e monitoramento para que as ações sejam contínuas. O trecho (10) traz este sentido, no relato do Gestor da Copasa sobre o atendimento às comunidades do Ferrador e do Lago das Roseiras:
(10) Todas as duas são abastecidas por poços artesianos com tratamento por desinfecção e fluoretação (...). No sistema do Ferrador, nós temos uma ETA pré-fabricada e depois elas são recalcadas [as águas] pelo reservatório e distribuídas. A Copasa tem um operador do sistema de abastecimento de água e toda a manutenção é feita pelo sistema de Divinópolis. Então, o sistema é completo como um sistema normal do sistema de abastecimento de água da Copasa. Nós temos equipes de manutenção e toda a manutenção necessária, é feita por equipes próprias. Nós temos uma equipe de produção que é responsável pelos tratamentos das duas comunidades. Então, eles vão três vezes por semana no local e fazem as dosagens dos produtos químicos e são feitas análises periódicas. A operação do sistema é controlada. E é um sistema de pequeno porte, tranquilo. E a gente mantém essa operação e manutenção diariamente com as equipes da Copasa (Gestor, Copasa).
Em (10) revela-se uma organização administrativa e técnica para atuação nas duas comunidades rurais em que a Copasa atua, que promove rotinas de manutenção, operação e monitoramento dos sistemas. Esta atuação garante à população, água em quantidade suficiente, qualidade compatível com os padrões de potabilidade e continuidade na oferta, fazendo jus ao cumprimento dos DHAES. Nestas duas comunidades, o atendimento contínuo e de boa qualidade é reforçado no diagnóstico do PDP de 2013 (trecho 3). Contudo, cabe salientar que a gestão destes serviços nestas comunidades é eficiente porque é realizada pela Copasa.
Em outra perspectiva, a gestão dos serviços nas demais comunidades é realizada pela Prefeitura em condições opostas às reveladas no trecho (10), configurando uma atuação similar à analisada no trecho (3). Segue um relato de funcionário da Prefeitura:
(11) Não existe uma rotina de operação e de manutenção. Não existe uma rotina no sentido de que não há uma equipe que faz só isso. O que existe hoje são as equipes de campo da secretaria que percorrem todas as comunidades em função das demandas. É um atendimento às demandas e não uma rotina. Então, é uma equipe que está muito pressionada pelo excesso de demanda atualmente. Você tem uma equipe que, eventualmente, conta com alguns moradores das comunidades que trabalham como operadores de bombas. É um corpo técnico enxuto e insuficiente, hoje, para atender às demandas (Gestor, Prefeitura).
No mesmo município, atuações diferentes nas áreas rurais proporcionam atendimentos opostos, conforme denotam os trechos (10) e (11). A Companhia Estadual oferece toda a estrutura às duas comunidades privilegiadas e a Prefeitura de Divinópolis não possui uma estrutura necessária ao atendimento das outras 44 comunidades rurais. A delimitação do atendimento, trazida no trecho (2), separando a gestão segundo a circunscrição urbana ou rural, é a principal causa da desigualdade no atendimento, tematizada nos relatos das lideranças comunitárias do Buritis e dos Costas, quando denunciam o descumprimento do requisito disponibilidade (continuidade) pelo município, conforme trechos (12) e (13):
(12) Tem um administrador regional que a gente liga para ele, e ele faz a manutenção. Aí ele diz que tem que entrar na programação, porque não existe um equipamento disponível, tem que fazer o agendamento, às vezes o equipamento está quebrado, não podendo ser utilizado no momento. A mão de obra da manutenção não é uma mão de obra qualificada, são funcionários aleatórios que um dia estão no esgoto, amanhã está na água, depois está em outro setor da Prefeitura (Liderança, Buritis).
(13) A manutenção possui um funcionário que é da Prefeitura. Que ele é responsável por ligar a bomba. Ele mora na comunidade. Lá na comunidade ele faz a limpeza da comunidade. Quando há necessidade e ele faz essa manutenção desses canos de água, porque são canos muito antigos. Alguns são até de ferro e sempre quando dá algum problema ele tem que procurar onde que é o problema, tentar sanar... (Liderança, Costas).
Os discursos dos trechos (11), (12) e (13) assemelham-se quanto à ineficiência de atuação do poder público nas comunidades rurais de Divinópolis, em relação à manutenção, operação e monitoramento dos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário. Estes relatos mantêm a deficiência gerencial analisada no documento oficial de 2013, trecho (3). Tal ineficiência é vista também nos discursos das comunidades de estudo:
(14) Fica um empurra-empurra. Manda ligar pra um, manda ligar pra outro… É outro que é responsável… Até que vem assim, no cansaço mesmo... E vem e deixa um buracão na rua; e fica… Eu entendi assim: se é lá no Buritis, então deixa aquele povo sofrer mais. Aí depois é que a gente resolve.... (Comunidade, Buritis).
O relato do trecho (14) revela que a operação dos sistemas é falha em relação à programação e organização (empurra-empurra). Afinal, não existe um padrão a seguir no que tange ao atendimento ao usuário e a uma rotina, realidade que converge com o trecho (11). Ademais, é notório um sentimento de descaso com a população, que dificulta a participação social nas questões de saneamento na comunidade. No caso da comunidade dos Costas, que possui um “morador/funcionário”, também se configuram falhas operacionais:
(15) A manutenção é o “morador/funcionário” que cuida... Eu ligo a bomba e abro os registros, e aí fica o dia inteiro. Tem dia que eu deixo até de noite, quando eu não estou aqui, quando eu estou viajando. Mas, assim que eu chego às 6 horas, 6 e meia, eu vou lá e fecho.... Tem as pastilhas [de cloro], é uma pedra, aí quebra ela e dá 4 pedaços. Aí, eu coloco um pedaço dia sim, dia não. É pouco, não é muito não [fala do operador local referindo-se à própria dedicação]... Mas ele [quem fala é um outro membro da comunidade] também está pagando para trabalhar, porque ele compra o material dele para fornecer para a comunidade (Comunidade, Costas).
Neste trecho (15) apresenta-se um diálogo entre participantes do grupo focal, no qual aparece o relato do funcionário da Prefeitura, que também é morador daquela comunidade. Ele liga e desliga a bomba que transporta a água do poço amazonas até o reservatório local. Ainda assim, não há um padrão de funcionamento no sistema que pode ocasionar intermitências no atendimento ou o extravasamento do reservatório. Outro ponto observado é sobre o tratamento da água, não havendo comprovação sobre se a quantidade de cloro é suficiente, além do necessário para este tratamento ou suficiente para produzir água potável. Além disso, identificou-se que os materiais utilizados na manutenção da rede de água, tais como cola e tubos, são adquiridos pelo operador local, com recurso financeiro próprio. Os relatos dos trechos (11) a (15) enfatizam a ineficiência gerencial dos sistemas de água e esgoto nas áreas rurais, que não garantem a qualidade e a continuidade dos serviços, corroborando a análise do trecho (3).
A Companhia Estadual demonstra atuação competente, como depreende-se do trecho (10). Quanto ao seu planejamento, no sentido de ampliar o atendimento para as outras comunidades, com integralidade das ações e com equidade, tem-se o seguinte relato:
(16) Então, eu não sei qual é a política atual da empresa em relação a operar sistemas rurais. Existem muitas deficiências nas áreas rurais e a Copasa está disponível para conversar, para levantamentos a serem feitos. Na verdade, a gente nem conhece as comunidades. Eu não conheço as comunidades, quais são as deficiências, o que precisa fazer, se tem algum sistema de água ou sistema de esgoto que são suficientes e adequados para o bem da comunidade. Então, é preciso fazer um levantamento, um diagnóstico técnico, fazer relatórios e ver tecnicamente o que é possível ser feito, com o recurso possível. Não é simplesmente chegar e fazer. É preciso ter competência, é preciso ter recursos financeiros, disponibilidade, até mesmo disponibilidade hídrica do local (Gestor, Copasa).
No trecho (16), o gestor da Companhia Estadual afirma não conhecer as deficiências e necessidades de parte da população divinopolitana quanto às questões de abastecimento de água e esgotamento sanitário. Pode-se constatar novamente a influência relatada no trecho (2), sobre a delimitação contratual, que culmina na falta de comprometimento com o saneamento rural. Uma vez revelado que a empresa responsável pelo saneamento do município não atende a uma parcela da população, caberia um planejamento municipal para atuação da Prefeitura nessas áreas. Todavia, isto não se concretiza:
(17) Hoje, o saneamento rural não tem um planejamento. O que tem de planejamento ainda é tão incipiente que é quase um sonho. Um ponto de atuação dentro desse curto e médio prazo que até o fim deste ano que precisa andar é a criação do SAAE Rural e a criação da Agência Reguladora Municipal, agência reguladora de serviços públicos. Seria como uma autarquia com estrutura e recurso próprio, voltado exclusivamente para o saneamento rural: água e esgoto. Não é a tarifação que irá sustentar o serviço, mas ela irá, principalmente, valorar a água e o serviço. Um dos pontos chave da nossa proposta de intervenção do saneamento rural é a tarifação da água. Isso é urgente. Hoje, o povo paga uma anuidade irrisório simbólica. Não se dá o devido valor a esse bem escasso e a água é abusiva e indevidamente utilizada (Gestor, Prefeitura).
O discurso do trecho (17) demostra uma inconsistência em relação ao planejamento do saneamento rural, tanto para a criação de um Serviço Autônomo de Água e Esgoto (SAAE) rural e sua regulação, quanto para a implementação de tarifas nos serviços de abastecimento de água para a população rural. Por isso, trilhar um caminho pautado em estudos que identifiquem mecanismos capazes de atender ao princípio da sustentabilidade econômica é necessário. A manifestação de urgência relativa à tarifação e a criação de um SAAE, em poucos meses, são pontos que revelam atitudes precipitadas, que ecoam a falta de planejamento. Essa precariedade na gestão da água e do esgotamento sanitário potencializa a condição de vulnerabilidade da população rural, que vivencia o descaso do poder público, fato que faz emergir tensões discursivas, também nas tentativas de negociações:
(18) Até tentamos negociar com a Prefeitura a possibilidade da criação do SAAE rural, que de repente seria uma saída para que a gente pudesse até fazer num formato envolvendo os conselhos das comunidades rurais, gerando até uma fonte de renda do próprio conselho; e os próprios conselhos fariam estas manutenções, de uma autarquia ou coisa assim, uma coisa a ser estudada. Mas infelizmente, hoje, nenhuma proposta apareceu (Liderança, Buritis).
(19) Fazer essa autarquia... como que funciona essa autarquia? Questão assim, tem que apresentar um estudo, né? A gente precisa saber como vai funcionar, como vai sair do nosso bolso. Vai ter essa autarquia pra poder pensar na questão da lucratividade? (Comunidade, Buritis).
Os relatos dos trechos (18) e (19) revelam o interesse por parte da população em solucionar o problema da localidade, mas apontam também uma ausência da participação social neste processo (nenhuma proposta apareceu). Segundo o PNSR, educação e participação social compõem um dos eixos estratégicos essenciais à organização do saneamento rural (Brasil, 2019). Além da ausência da participação social, a população rural demostra estar excluída do cuidado e atenção do poder público em relação à população urbana (desigualdade geográfica):
(20) Antes, os gestores eram mais próximo da comunidade, realizavam-se reuniões para explanar qual era o problema do esgotamento, como que era a questão da captação de água. A Prefeitura tem olhares mais para o setor urbano nessa questão da água, abastecimento de água. Parece que o poder público, ele tem olhares mais para as vias urbanas e a zona rural vai deixando de lado. Porque se você pensar bem é um relato e também um desabafo (Liderança, Costas).
O relato do trecho (20) revela a frustração de não contar com a atenção do poder público no atendimento das necessidades básicas. O envolvimento do poder público e a participação da comunidade, essenciais para a continuidade dos serviços de saneamento, são pontos falhos nas áreas rurais deste município, que se confirmam nos relatos a seguir:
(21) Não temos oportunidade de participar de nada. Se alguém faz uma visita técnica ou administrativa na comunidade não é comunicado e quase ninguém fica sabendo. Se vem administrador a gente não sabe, se vem um e olha água a gente não sabe o que olhou, se vem um fazer um negócio no cano a gente nem quem veio, fica sabendo…. Ah! Deu um problema? …. Ah! Fulano veio olhar? Ah! Veio? Ah! Então tá bom. Mas veio e fez o que? Ninguém é informado de nada (Comunidade, Buritis).
(22) A gente tem que ter acesso, saber quais níveis estão nossa água. E por que não? E o porquê dessa não entrada da prefeitura com essa manutenção... Onde que tá o relatório final que fala que a água está própria para o consumo humano? (Comunidade, Costas). Nós não sabemos o que tira de água e a quantidade que consome.... Esse negócio da rede de esgoto, eu nem sei como é que funciona isso. Isso aí tinha que passar pra nós daqui. O que faz com o que cai ali? Eu sei que tem a caixa ali, mas se vai pro ribeirão ou pra onde que vai, eu não sei não (Comunidade, Buritis).
Assim como demonstraram os relatos da comunidade de Buritis (21) e (22), na dos Costas (22) defende-se a importância da oportunidade de se envolverem nas questões operacionais, do diálogo e da aproximação com o poder público. Para Piccoli et al. (2016), a participação social em saneamento só é possível com a população empoderada, mobilizada pela importância da água e dos outros componentes do saneamento. Assim, ações de saneamento seriam resultantes do aprendizado coletivo, com compartilhamento de diferentes pontos de vista sobre as dificuldades e possíveis soluções (Aguiar & Melo, 2016).
Em ambas as comunidades, a população rural conhece suas necessidades e sempre busca soluções junto ao poder público, alternativas viáveis ao atendimento de suas demandas. Isto fica explicito nas narrativas dos líderes das duas comunidades:
(23) É um sistema que é caro para o município, não é barato. O município não arrecada o que deveria arrecadar com ele, e com isso é deduzido que fica um sistema deficitário. Não se arrecada para poder reinvestir, não possui outra fonte de renda para poder colocar melhorias. Como não tem um hidrômetro, não tem uma taxação sobre a água ou sobre um excesso de água que consome, então fica aquela coisa muito solta. Porque quando você paga, você possui o direito de cobrar a qualidade do serviço. Se você não pagar, vai cobrar o que? Vai cobrar de quem? (Liderança, Buritis).
(24) É feita uma taxa anual por cada casa que é cadastrada na Prefeitura. Eu pago pela água um valor que é considerado muito pouco pelo tratamento de água. Aumenta-se esse valor, coloca na concepção da população que: “Oh! Está aumentando porque além de receber uma água, você está recebendo uma água de qualidade” O poder público, ele não consegue absorver toda essa questão, de ter que arcar com toda essa despesa. Se eu te dou uma água de qualidade e trato o seu esgoto, por que não pagar? Não pagar um valor que seja é muito abusivo, mas pagar um valor que caiba dentro do orçamento daquela família. E que também é uma forma de fazer o abastecimento de água de qualidade e o tratamento de esgoto (Liderança, Costas).
O trecho (23) revela que não há sustentabilidade financeira na operação dos sistemas nas comunidades rurais. Ambas as lideranças (Buritis e Costas) são condizentes com o pagamento pelos serviços para contribuir com esta deficiência, desde que seja um valor justo para terem água potável e tratamento de esgoto. Nessa lógica, o trecho (24) mostra que há pagamento de uma taxa anual à Prefeitura, que é insuficiente para manter os serviços. Essa medida interventiva surge contribuindo com o critério de acessibilidade financeira para o atendimento. Em ambos os trechos, a população reconhece parte das dificuldades do município, com sua insuficiência de recursos para levar os serviços à população rural. Essas dificuldades se tornam ainda mais complexas quando o setor responsável pelos serviços não possui um caixa único para gerir seus próprios recursos e não possui incentivos externos, conforme relato:
(25) Atualmente essa dinâmica financeira consiste em investimentos públicos por meio das rubricas destinadas à Secretaria. Não existe qualquer outra fonte de recurso que não seja o investimento público do Município. Ainda não existe um recurso suficiente justamente para capacitar e ampliar a equipe e criar rotinas, planos de ação e planejamento para agir no saneamento rural (Gestor, Prefeitura).
A necessidade de um constante subsídio financeiro é prerrogativa para as ações em saneamento rural, conforme trecho (25). Diante disso, a acessibilidade financeira aos serviços somente poderia ser alcançada com estes recursos, visto que os valores arrecadados nestas comunidades são inferiores aos custos operacionais dos sistemas. Consequentemente, a influência do fator de escala, assim como a distância das comunidades em relação à sede, são, em muitos casos, critérios para o (não) atendimento às áreas rurais. Neste sentido, modelos de gestão que estão menos voltados à geração de excedente econômico para geração de lucro têm maiores condições de atender às populações rurais e assim trilhar os caminhos da universalização e da equidade.
Diante da análise discursiva desta etapa, associada à análise textual da anterior, pode-se constatar que o discurso da Prefeitura (trecho 3), de 2013, é atual (2022), revelando-se por meio da inconsistência operacional dos sistemas existentes. Em relação ao trecho (1), o compromisso firmado no PMSB de 2010 não foi concretizado. Não houve implementações de sistemas na zona rural, exceto nas comunidades do Ferrador e dos Lagos das Roseiras, atendidas pela Copasa. A universalização não vigorou nas demais comunidades sob gestão da Prefeitura. Nessa direção, a análise linguístico-discursiva do trecho (2), referente à renovação contratual de prestação de serviços (Agência Reguladora de Serviços de Abastecimento de Água e Esgotamento Sanitário do Estado de Minas Gerais, 2011), apontou uma influência causal nos discursos dos trechos (1 e 3), tendo em vista que a delimitação da oferta à sede (área urbana) desfavorece o atendimento às áreas rurais.
4.4 Análise da prática social: Identificação hegemônica e o consentimento da população
Nesta última etapa, a análise de discurso crítica se completa na dimensão da análise da prática social. A relação dialética entre os documentos oficiais e os discursos produzidos por meio das entrevistas e dos grupos focais, com os atores envolvidos na pesquisa, dá suporte à identificação de práticas hegemônicas presentes no modelo de gestão que atua na sede municipal. Essa identificação revela a influência de uma gestão antidemocrática.
Nas etapas anteriores foram analisados os níveis de comprometimento (modalidade discursiva) do município de Divinópolis com o saneamento rural; a realidade do atendimento nas comunidades rurais; a oferta de serviços e as condições operacionais dos sistemas existentes, bem como as perspectivas de planejamento, de participação social, da tarifação sobre os serviços e da dificuldade financeira em manter a continuidade operacional. Esta última revela a falta de viabilidade financeira enfrentada por pequenas comunidades para manutenção de seus sistemas. Não há equilíbrio entre a arrecadação local e as despesas operacionais. Em contrapartida, a Companhia Estadual atua em duas comunidades (Ferrador e Lago das Roseiras) e consegue atender às suas populações, com qualidade e continuidade, apesar da inviabilidade financeira:
(26) Nestas comunidades são poucas ligações, então é impossível um sistema de 200 e poucas ligações ser suficiente para bancar sua própria operação. Então, é um sistema deficitário financeiramente. Ele não consegue sobreviver somente com a arrecadação. Então, é um sistema que demanda um custo financeiro alto e que somente com arrecadação elas não seriam viáveis. O Lago das Roseiras tem 60 e poucas ligações. Então, ele é muito deficitário, porque você tem, além da operação e manutenção do sistema, você tem as despesas de energia elétrica, de produto químico, de pessoal, de veículo, de combustível, porque elas são fora da cidade (Gestor, Copasa).
Neste trecho (26), a Companhia Estadual assume que as duas comunidades (Ferrador e Lago das Roseiras) são sistemas deficitários financeiramente, com arrecadação insuficiente para manterem o alto custo de operação, sendo reconhecidas como localidades desconectadas da sede. Entretanto, elas são atendidas pelos serviços da Copasa, de abastecimento de água, conforme trechos (4) e (10). Os fatores de economia de escala e distância da sede não influenciaram nesse atendimento, revelando a capacidade de a Companhia atuar em outras comunidades, caso haja um acordo entre a Concessionária e o município. Sob outra ótica, a Copasa apresenta-se como uma instituição de maior poder em relação ao Município, ou seja, há uma assimetria de poder entre as esferas estadual e municipal. Afinal, quando há interesse, os serviços são oferecidos para além do que prevê o objeto contratual. O contrato prevê o seguinte:
(27) A Copasa tem concessão para operar os sistemas municipais da malha urbana. Ela não tem concessão para operar as 44 comunidades rurais que tem na cidade. Então, nós trabalhamos e operamos somente a malha urbana, que é o município de Divinópolis (Gestor, Copasa).
O poder que a Companhia Estadual possui na cidade de Divinópolis influencia o planejamento municipal e o saneamento rural, visto que o município se compromete com a universalização do abastecimento de água para toda a população (trecho 1). Há um compromisso de atendimento universal e sem quaisquer barreiras econômicas, mas a discriminação que a Companhia revela em relação às 44 comunidades rurais, com o consentimento do Poder Público, dificulta os avanços da população rural no alcance destes serviços. Essa delimitação do atendimento reflete uma gestão que atua na fragmentação territorial (urbano e rural), realidade que dificulta a resposta aos desafios do desenvolvimento social, em função da terceirização dos atendimentos da população com água e esgoto, sem o estabelecimento de diretrizes conjuntas com a Prefeitura. Ao se combater a fragmentação, assumindo-se estratégias que viabilizem a integração das demandas rurais e urbanas de água e esgoto, é que se criarão condições para reduzir o déficit de atendimento, conforme preveem o Plano Municipal de Saneamento Básico do município e no Plansab.
Esse poder da Copasa é explicitado não somente na fala do agente do Poder Público, mas também é constada no discurso da população rural:
(28) A Copasa não vai querer pegar comunidade. É prejuízo para ela. Ela nunca vai querer. Ela tem a opção de não querer. Como é que vai impor? (Comunidade, Buritis).
O resultado da relatada hegemonia da Copasa em suas relações com o município é mostrado no trecho (3) e discutido na segunda etapa, respectivamente, quando foram apresentadas as deficiências no atendimento e quando os critérios para alcance de direitos humanos à água e ao esgotamento sanitário foram apontados. A disponibilidade da água é diretamente relacionada à sua qualidade e, consequentemente, à aceitabilidade da população. Em suma, membros das comunidades rurais sabem que o interesse financeiro da Companhia é condição para a sua exclusão do acesso à água e ao esgotamento. O município de Divinópolis, apesar de oferecer os serviços de abastecimento de água para grande parte da população rural, conta com a precariedade de instalações e com a ausência de uma gestão consolidada, fatores que desencadeiam o não cumprimento do conteúdo normativo dos DHAES, de disponibilidade, acessibilidade, aceitabilidade e qualidade. Além disso, a concessão dos serviços à Copasa somente na área urbana inviabiliza o atendimento às áreas rurais, seguindo uma tendência de descumprimento dos referidos critérios, com impactos para as futuras gerações, visto que historicamente (desde 1973) essa dinâmica excludente de gestão impera no Município de Divinópolis.
Este acordo de atuação segregacionista define o privilégio a algumas comunidades e à sede municipal, obstaculizando o atendimento das áreas rurais. Verifica-se que o excedente auferido por meio receitas tarifárias não têm sido empregadas sequer na expansão e melhorias do sistema na sede municipal. Assim, a manutenção e a operação dos sistemas rurais não é assumida pela Copasa, cabendo aos próprios moradores a gestão dos serviços. Toda esta heterogeneidade no atendimento proporciona uma naturalização da desigualdade de acesso à água e ao saneamento entre as populações menos favorecidas, que apesar da luta por melhorias, não conseguem visualizar as mudanças que necessitam:
(29) Não espero nenhum tipo de melhoria. E não notamos também por parte dos gestores, do município no caso, um planejamento com relação a este tipo de manutenção preventiva ou corretiva. Mas a expectativa de melhoria para a comunidade, nenhuma. Nem água e nem mesmo o esgoto, que, muitas das vezes, passa até batido, hoje, às vezes até esquece que tem esgoto lá (Liderança, Buritis).
(30) Pro ser humano a esperança é a última que morre. E a gente tem sempre a esperança que as melhorias vão chegar na nossa comunidade. Porque é, se a gente está ali, persiste. Eu moro ali há 43 anos. E muitas pessoas que já estão ali á muito mais tempo que eu, que moram ali e tem, na sua concepção que as coisas vão melhorar por parte dos órgãos competentes, para fazer melhorias para aquela comunidade (Liderança, Costas).
(31) Entra ano e sai ano; e o que eu me entendo por gente é a mesma coisa; e vai continuar até eu morrer, não sei. E vai vir outra geração e vai ser essa mesma ladainha (Comunidade, Buritis).
Em ambas as comunidades, Buritis e Costas, conforme explicitado nos trechos (29), (30) e (31), as incertezas sobre os serviços ainda persistem. Diante dos discursos, tanto das lideranças comunitárias, quanto da própria população (Buritis), é perceptível um certo conformismo com a hegemonia da Copasa no município. Apesar da esperança de melhorias nas áreas rurais presente no discurso da liderança da comunidade dos Costas, os relatos da comunidade de Buritis revelam descrença pela falta de comprometimento do poder público. Por outro ângulo, é destacada uma tendência a participação social para avanços futuros, no discurso do Gestor da Prefeitura, quando questionado sobre as possíveis soluções para o saneamento das áreas rurais:
(32) Fomentar a formação de associações na comunidade que poderiam estar engajadas não só na questão da água, mas também dos resíduos sólidos, do esgoto e outras questões. Mas, isso funciona apenas com capacitação de pessoas da comunidade. É necessário estar lá marcando presença e é um caminho que queremos percorrer (Gestor, Prefeitura).
No mesmo sentido, a comunidade dos Costas se mostra aberta à possibilidade de participação social mais ativa no cotidiano da prestação de serviços:
(33) Acho que reunir, discutir problemas, analisar o que poderia ser feito. Ver o que cada um poderia contribuir. A comunidade tinha que entrar em um consenso e ver o que cada um tem condição. Uma água de qualidade que não falta, funcionando direitinho e a taxa dentro da condição de cada um (Comunidade, Costas).
O relato do trecho (33) revela a possibilidade de a população se unir e contribuir com a efetivação das soluções para a provisão de continuidade aos serviços. Além disso, o relato do Gestor municipal, trecho (32), amplia essa possibilidade à toda área rural, envolvendo outros serviços e o apoio gerencial e técnico necessários para este engajamento. Estes relatos podem estar em convergência com a proposta do Programa Nacional de Saneamento Rural de uma gestão multiescalar, que no caso, ainda deveria se articular com outras esferas (estadual e federal) para que esta gestão tenha possibilidade de ser efetivamente satisfatória (Brasil, 2019).
5 Conclusões
Em Divinópolis/MG, em decorrência de forças hegemônicas (Prefeitura e Copasa) atuantes na fragmentação urbano/rural, a universalização do atendimento da população com água e esgotamento sanitário é realidade distante. A Companhia Estadual e o Poder Público Municipal, dispostos a confiar nos seus serviços, compactuam com um contrato segregacionista de prestação de serviços, mantendo os obstáculos à consolidação de uma gestão capaz de atender de forma efetiva e equânime as áreas rurais deste município. A gestão atual no município não se propõe a integrar o atendimento de demandas das áreas rurais ao expediente da atual concessionária de água e esgotos, mas, está aberta à fragmentação do rural, dado que atua em duas comunidades, conforme acordos entre o poder municipal e a Copasa.
O alcance do primeiro degrau para a universalização do acesso à água e ao esgotamento sanitário passa por uma gestão atuante, capaz de desenvolver os projetos e implantá-los de acordo com as necessidades dos usuários, promovendo rotinas de manutenção, operação e monitoramento, possibilitando subsídios que proporcionem a sustentabilidade econômica dos sistemas e envolvendo a população nestes procedimentos e nas tomadas de decisão. Toda essa dinâmica somente será possível em presença de participação social, com efetivas contribuições das populações rurais.
Por fim, vale reforçar a importância de se fomentar diálogo constante entre todos os atores envolvidos com o saneamento rural, sejam gestores e técnicos institucionais, sejam membros das comunidades rurais, proporcionando um compartilhamento das tecnologias implantadas e do funcionamento cotidiano delas (manutenção e operação). À vista dessas possíveis intervenções, a satisfação da população rural e a perenidade dos serviços podem ser promissoras em uma convergência com a proposta do Plano Nacional de Saneamento Rural, quando se refere a uma gestão multiescalar para as áreas rurais.
-
Como citar: Gontijo, H. M., Ribeiro, S. S., & Lima, S. C. R. B. (2024). Gestão da água e do esgotamento sanitário em divinópolis/mg: o discurso vigente acerca da fragmentação urbano/rural. Revista de Economia e Sociologia Rural, 62(3), e265399. https://doi.org/10.1590/1806-9479.2023.265399pt
-
Classificação JEL: R58
6 Referências
-
Agência Reguladora de Serviços de Abastecimento de Água e Esgotamento Sanitário do Estado de Minas Gerais – ARSAE. (2011). Contrato de Programa entre Copasa e Município de Divinópolis Recuperado em 27 de abril de 2023, de http://www.arsae.mg.gov.br/?s=Divin%C3%B3polis
» http://www.arsae.mg.gov.br/?s=Divin%C3%B3polis - Aguiar, M. M., & Melo, E. M. (2016). Participação como ação comunicativa. In L. Heller, M. M. Aguiar, & S. C. Rezende (Orgs.), Participação e controle social em saneamento básico: conceitos, potencialidades e limites UFMG.
- Bauer, W. M., & Gaskell, G. (2007). Pesquisa qualitativa com texto, imagem e som. Vozes.
-
Bos, R., Alves, D., Latorre, C., Macleod, N., Payen, G., Roaf, V., & Rouse, M. (2017). Manual sobre os direitos humanos à água potável e saneamento para profissionais IWA Publishing. Recuperado em 4 de junho de 2022, de iwa-network.org
» iwa-network.org -
Brasil. (2007). Lei nº 11.445, de 5 de janeiro de 2007. Estabelece diretrizes nacionais para o saneamento básico e para a política federal de saneamento. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília. Recuperado em 4 de junho de 2022, de http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/lei/l11445.htm
» http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/lei/l11445.htm -
Brasil. Ministério da Saúde. Fundação Nacional de Saúde. (2019). Programa Nacional de Saneamento Rural. PNSR Recuperado em 4 de junho de 2022, de http://www.funasa.gov.br/documents/20182/38564/MNL_PNSR_2019.pdf/08d94216-fb09-468e-ac98-afb4ed0483eb
» http://www.funasa.gov.br/documents/20182/38564/MNL_PNSR_2019.pdf/08d94216-fb09-468e-ac98-afb4ed0483eb -
Brasil. Ministério do Desenvolvimento Regional. Secretaria Nacional de Saneamento. (2013). Plano Nacional de Saneamento Básico. Plansab Recuperado em 4 de junho de 2022, de http://www.gov.br/mdr/pt-br/assuntos/saneamento/plansab
» http://www.gov.br/mdr/pt-br/assuntos/saneamento/plansab - Britto, A. L., & Rezende, S. C. (2017). A política pública para os serviços urbanos de abastecimento de água e esgotamento sanitário no Brasil: financeirização, mercantilização e perspectivas de resistência. Cadernos Metrópole, 557-581.
- Cavalcante, F. B. F. (2019). Consumo residencial de água em Uberlândia–Minas Gerais, Brasil (2006-2016): subsídios informacionais para gestão da demanda (Dissertação de mestrado). Faculdade de Engenharia de Ilha Solteira – UNESP Ilha Solteira.
- Costa, A. M. (1994). Análise histórica do saneamento no Brasil (Dissertação de mestrado). ENSP-Fiocruz, Rio de Janeiro.
- Cruz, B. A. S. (2019). Acesso à água na perspectiva dos direitos humanos: análise dos efeitos de uma intervenção do SISAR na comunidade de Cristais, Ceará (Tese de doutorado). Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte.
- Dias, A. P. (2021). Programa Nacional de Saneamento Rural PNSR: eixos estratégicos, aspectos teóricos, conceituais da gestão, educação e participação social (Série Subsídios ao Programa Nacional de Saneamento Rural, Vol. 3; t. 2, 103 p.). Brasília: Funasa.
-
Divinópolis. Prefeitura Municipal. (2010). Plano Municipal de Saneamento Básico de Divinópolis. PMSB Agência Reguladora de Serviços de Abastecimento de Água e Esgotamento Sanitário do Estado de Minas Gerais. Recuperado em 4 de junho de 2022, de http://www.arsae.mg.gov.br/?s=Divin%C3%B3polis
» http://www.arsae.mg.gov.br/?s=Divin%C3%B3polis -
Divinópolis. Prefeitura Municipal. (2013). Plano Diretor Participativo do Município de Divinópolis. PDP Recuperado em 4 de junho de 2022, de http://planodiretordedivinopolis.wordpress.com/author/planodiretordedivinopolis/
» http://planodiretordedivinopolis.wordpress.com/author/planodiretordedivinopolis/ - Fairclough, N. (2001). Discurso e mudança social Universidade de Brasília.
- Fairclough, N. (2003). Analysing discourse: textual analysis for social research. Routledge.
- Galizoni, F. M. (2021). Rural e Ruralidades: Reflexões para o Programa Nacional de Saneamento Rural. In: FUNASA. Programa Nacional de Saneamento Rural - PNSR: aspectos conceituais da ruralidade no Brasil e interfaces com o saneamento básico (Série Subsídios ao Programa Nacional de Saneamento Rural, Vol. 1, 127 p.). Brasília: Funasa.
- Halliday, M., & Matthiessen, C. (2004). An introduction to functional grammar (3. ed.). Arnold.
-
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. (2011). Censo Demográfico 2010 Recuperado em 4 de junho de 2022, de https://cidades.ibge.gov.br/brasil/mg/divinopolis/panorama
» https://cidades.ibge.gov.br/brasil/mg/divinopolis/panorama - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE. (2017). Pesquisa Nacional de Saneamento Básico Ministério do Planejamento, Orçamento.
- Kloss, N. (2020). Gestão da água e educação ambiental: a experiência do serviço autônomo e água e esgoto–SAAE de Marechal Cândido Rondon-Paraná (Dissertação de mestrado]. Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Cascavél.
-
Organization of the United Nations. (2010). Human Rights Council. Resolution adopted by the General Assembly on 28 July 2010 (A/RES/64/292) Recuperado em 4 de junho de 2022, de http://undocs.org/A/RES/64/292
» http://undocs.org/A/RES/64/292 -
Organization of the United Nations. (2019). Human Rights Council. Human rights to water and sanitation in spheres of life beyond the household with an emphasis on public spaces - Report of the Special Rapporteur on the human rights to safe drinking water and sanitation (A/HRC/42/47) Recuperado em 4 de junho de 2022, de https://ap.ohchr.org/documents/dpage_e.aspx?si=A/HRC/42/47
» https://ap.ohchr.org/documents/dpage_e.aspx?si=A/HRC/42/47 - Pereira, T. S. T., & Heller, L. (2015). Planos municipais de saneamento básico: avaliação de 18 casos brasileiros. Engenharia Sanitaria e Ambiental, 395-404.
- Piccoli, A. S., Kligerman, D. C., Cohen, S. C., & Assumpção, R. F. (2016). A Educação Ambiental como estratégia de mobilização social para o enfrentamento da escassez de água. Ciencia & Saude Coletiva, 797-808.
- Resende, V. M., & Ramalho, V. (2006). Análise de discurso crítica. Contexto.
- Rezende, S. C., & Heller, L. (2008). O saneamento no Brasil: políticas e interfaces (2. ed.). UFMG.
- Roedel, O. O. (1954). Serviços autônomos d’água e esgotos no Vale do Rio Doce - sua criação e administração durante o primeiro ano de existência. In Anais do IV Congresso Interamericano de Engenharia Sanitária. São Paulo.
- Rossoni, H. A. V. (2015). Fatores condicionantes da presença de diferentes modelos de prestação de serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário no Brasil: uma análise quantitativa (Tese de Doutorado). Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte
- Santos, M. R. R., & Ranieri, V. E. L. (2018). Deficiências e desafios do planejamento territorial de áreas rurais no Brasil. Revista Rural & Urbano, 3(1), 2-21.
- Silva, F. J. A. (2012). A natureza dos planos municipais de saneamento é influenciada pelas instituições elaboradoras? Um estudo comparativo em três municípios de Minas Gerais (Dissertação de mestrado). Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte.
-
Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento. (2022). Série Histórica Ministério do Desenvolvimento Regional. Recuperado em 4 de junho de 2022 de http://app4.cidades.gov.br/serieHistorica/
» http://app4.cidades.gov.br/serieHistorica/ - Sousa, A. C. A., & Costa, N. R. (2013). Incerteza e dissenso: os limites institucionais da política de saneamento brasileira. Revista de Administração Pública, 47, 587-599.
- Teixeira, J. B. (2014). Saneamento rural no Brasil. In S. Rezende (Org.), Panorama do Saneamento Básico no Brasil (pp. 237–294). Ministério das Cidades/Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental.
- Thompson, J. B. (2009). Ideologia e cultura moderna: teoria social crítica na era dos meios de comunicação de massa. Vozes.
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
21 Jun 2024 -
Data do Fascículo
2024
Histórico
-
Recebido
04 Jul 2022 -
Aceito
29 Fev 2024