Open-access A longa crise italiana: Reformas socioeconômicas e conflito sindical

The long Italian crisis: socio-economic reforms and trade union conflict

Resumo

O artigo apresenta um quadro das principais reformas econômicas e sociais promovidas pelos governos italianos antes e depois da crise de 2008 e as tendências neoliberais que permeiam os governos de centro-direita e centro-esquerda no país. Nesse sentido, analisamos a difícil relação entre a principal central sindical italiana com o principal partido reformista de esquerda, também à luz da crise do modelo neocorporativista de relações industriais. A central ainda mantém um alto nível de adesão que nem sempre corresponde a uma capacidade igual de mobilização. As greves nas grandes empresas mostram redução clara e são constantes nos serviços públicos. A ausência de pesquisas sistemáticas, no entanto, dificulta a avaliação precisa dessa forma de conflito. Por fim, observamos que as ferramentas utilizadas pelo sindicato diferem cada vez mais daquelas do passado em relação à oposição às reformas econômicas e sociais.

Greve; Relações industriais; Conflito social; Estado de bem-estar; Sindicatos

Abstract

The article presents a picture of the main economic and social reforms promoted by Italian governments before and after the 2008 crisis and the neoliberal tendencies that have pervaded both the centre-right and centre-left governments. In this regard we have analysed the difficult relationship of the main Italian trade union with the main reformist left party, also in light of crisis of neo-corporatism model of industrial relations. The union still confirms a high level of adherence which does not always correspond to an equal capacity for mobilization. The strikes in large companies show a net reduction and are constant in the public utilities. The absence of systematic surveys, however, makes it difficult to accurately assess of this form of conflict. Finally, we observe that the tools used by the union have increasingly differed at least with reference to the contrast of economic and social reforms.

Strike; Industrial relations; Social conflict; Welfare State; Unions

Introdução

Neste artigo focaremos nossa atenção, em primeiro lugar, nas consequências da crise econômica de 2008 no sistema de bem-estar social italiano e nas medidas de política econômica. Em segundo lugar, analisaremos o papel desempenhado pelo sindicato na oposição às reformas implementadas nos últimos anos. A falta de dados sobre o andamento das greves na Itália, que não nas formas e dentro dos limites que ilustraremos na parte final do artigo, torna a análise mais complexa. No entanto, o que podemos antecipar é que a crise de 2008 intervém num contexto econômico já fortemente marcado por indicadores estacionários ou negativos em relação ao PIB e ao nível de emprego1 e no quadro de um recurso às greves muito mais limitado do que nas décadas anteriores. As razões para o movimento sindical viver um menor número de greves, como explicaremos mais adiante, são diferentes. Para o sindicalismo, os fatores de crise são evidentes: redução do número de filiados entre o segmento dos trabalhadores adultos, obstáculos para o proselitismo para adesão de novos integrantes, principalmente entre os trabalhadores mais jovens, além de dificuldades na capacidade de mobilização e de adesão às greves, aumento do trabalho precário etc.

Ao mesmo tempo, nos últimos anos, o sindicalismo conseguiu, ainda que em posição defensiva, exercer uma oposição parcial a algumas medidas, mantendo, assim, uma capacidade de resposta e de representatividade de alguma forma ainda significativas. Isso vem ocorrendo no contexto da utilização menor das greves no setor das médias e grandes empresas e da adoção de um patamar estacionário no setor dos serviços públicos. Geralmente tais greves têm ocorrido, seja para contrastar os processos de reestruturação determinados pela crise, seja para a renovação dos acordos coletivos de viés econômico.

O texto que segue está dividido da seguinte forma: nas duas primeiras partes analisamos as mudanças que têm ocorrido no contexto político-institucional e as principais reformas do sistema de bem-estar social italiano. Na terceira parte, examinamos a crise do modelo da concertação sindical inaugurado no início da década de 1990; na quarta e na última partes focamos nas principais questões críticas que o sindicato italiano enfrenta atualmente e na frequência das greves nos últimos anos.

A crise econômica de 2008 e o contexto institucional da ação sindical

A avaliação dos efeitos da crise de 2008 nos sistemas econômicos europeus e, em particular, na estrutura da intervenção pública, é bastante compartilhada por muitos analistas. A crise iniciada em 2008, por um lado, tem evidenciado novamente as contradições da acumulação capitalista e, por outro lado, tem transformado a conjuntura de forma constante, não mais de maneira cíclica ou temporária; isto é, tem se constituído em um complexo com base no qual as economias ocidentais justificam suas políticas neoliberais ( Krugman, 2009 ).

Nesse contexto, a intervenção pública é resultado fundamental para combater, a princípio, os efeitos da crise, mas, imediatamente depois, os desgastes públicos produzem uma interpretação pelos mesmos governos como se essas intervenções fossem as causas da própria crise. A consequência é um grande paradoxo. De acordo com Pennacchi (2011 , p. 114):

A intervenção pública foi redescoberta por um certo período para salvar o sistema bancário e financeiro global do colapso e, agora que a persistência de um desemprego incrível e o declínio no padrão de vida da classe média imporiam medidas adicionais para apoiar o desenvolvimento e os investimentos, se afirma a ideia de voltar novamente, especialmente na Europa, à ortodoxia falaciosa neoliberal e monetarista das políticas restritivas e deflacionárias, drasticamente adversas aos gastos públicos ( Pennacchi, 2011 , p. 114).

Diante disso, verifica-se que boa parte da política econômica dos governos europeus, muitas vezes, independentemente de a gestão ser de esquerda ou de centro-direita, têm adotado medidas de austeridade, no sentido de redução progressiva da intervenção pública e de maior abertura ao mercado. Isso vem acontecendo seja através de reformas do mercado do trabalho, seja com a redução da despesa pública, por exemplo, em temas como previdência ou seguro-desemprego. No entanto, a adoção dessas políticas não significa que o valor da despesa pública tenha diminuído. Ademais, como veremos mais adiante, a exemplo da questão italiana, os gastos sociais não vêm sendo reduzidos, pelo menos em termos de incidência no PIB. E certamente não têm aumentado adequadamente para combater a emergência social produzida pela crise. Além disso, muitas das reformas aprovadas, como, por exemplo, as reformas previdenciárias, mostrarão sua capacidade de poupança apenas no futuro próximo, em detrimento dos trabalhadores mais jovens que hoje têm carreiras mais instáveis e de baixa renda2 .

Entretanto, nota-se o quadro europeu bastante diferenciado: o impacto da crise de 2008 tem diferentes resultados entre os países da União Europeia. Os do sul da Europa (Portugal, Itália, Grécia e Espanha, os chamados “PIGS”) são os mais afetados, porque têm maiores dívidas públicas e sistemas de assistência social mais fracos e seletivos em relação aos potenciais beneficiários ( Pavolini e Raitano, 2015 )3 . De certa forma, a crise de 2008 marcou novamente as diferenças existentes entre os países da União Europeia nas respostas oferecidas pelos sistemas de proteção social4 . As políticas sociais permanecem ancoradas a uma dimensão nacional e condicionadas pela dinâmica da dívida e dos gastos públicos de cada país, bem como pelas características específicas dos mercados de trabalho nacionais.

Então, qual tem sido o papel desempenhado pelo sindicalismo na Itália frente à adoção de medidas neoliberais destinadas a reduzir, em primeiro lugar, os gastos públicos, e em segundo lugar, a reformar de forma flexível as relações trabalhistas? As reformas promovidas na Itália têm produzido um represamento do conflito social?

Para responder a essas questões, podemos antecipar que, no caso italiano, o sindicalismo, considerada a sua diversidade interna em termos de orientações políticas, evidencia uma tendência mais defensiva, mesmo levando em conta uma progressiva autonomia na relação com o principal partido da esquerda reformista (o Partido Democrático, herdeiro do Partido Comunista Italiano), mas não a ponto de uma ruptura completa.

A fraqueza da resposta do sindicalismo, em termos de conflitualidade e de capacidade de mobilização em geral neste período, consiste em resultado bastante evidente. A avalição do movimento sindical italiano em relação aos processos de reformas do sistema de bem-estar social parece ter privilegiado uma dimensão institucional, mais acentuada com os governos de centro-esquerda. Essa forma de atuação depende também, em boa parte, da afirmação de um modelo de tipo “neocorporativo” da década 1990. Esse padrão fez da concertação social um dos elementos característicos do modelo italiano de relações industriais, pelo menos até ao governo de centro-esquerda, liderado por Romano Prodi, terminado pouco antes da crise de 2008.

O modelo neocorporativo italiano possui especificidades em relação ao caso típico da experiência dos países do Norte da Europa. A esse respeito, Crouch (1993) fala, para o caso italiano, de um “neocorporativismo técnico”. Segundo ele, o modelo neocorporativo desse país é definido em seus primeiros experimentos nos anos 1970 como “instável” ( Crouch, 1993 ; Regini, 1983 ), e hoje essa caraterística parece confirmada, agora acrescida de novos elementos. Desde os anos 1990, existe uma alternância frequente de governos de centro-esquerda e centro-direita que, no entanto, não tem favorecido a formação de governos expressamente pro labour quando os partidos de centro-esquerda chegam ao governo. Além disso, persiste uma pluralidade sindical (hoje mais ampla em virtude de novas organizações chamadas de “sindicalismo de base” que permanecem, todavia, na forma de pequenas entidades) que expressa uma capacidade de síntese das reivindicações vindas de baixo superior à do passado.

As reformas econômicas e sociais que foram elaboradas na Itália nos últimos dez anos, algumas diretamente relacionadas aos efeitos da crise de 2008, fazem parte de um longo processo de reforma do mercado do trabalho (iniciado na década de 1980) e de redução da presença do Estado na economia. Isso acontece através do processo de privatização da indústria estatal, do sistema bancário e com o progressivo desmonte do sistema de bem-estar social, como evidenciado pelo crescimento nos últimos anos da parcela de despesas suportadas pelos usuários.

As reformas do mercado do trabalho e da previdência: menos proteção hoje e amanhã

De acordo com a classificação adotada de Esping-Andersen (1990) , o sistema de bem-estar social italiano se coloca, em âmbito europeu e entre os modelos existentes de welfare state , naquele chamado “meritocrático-corporativo”: um sistema baseado na natureza contributiva do financiamento e em uma elevada seletividade das medidas que penalizam os componentes mais fracos (desempregados, estrangeiros, trabalhadores precários). É um sistema baseado também na contribuição fundamental da família ( Paci, 2007 ; Ferrera, 1993 ) para fazer frente às carências de gastos sociais; esse sistema também prefere as transferências monetárias aos investimentos estruturais em serviços.

Nos últimos anos, importantes reformas têm contribuído para mudar, numa perspectiva ainda mais restritiva, o aporte do Estado em termos de gastos sociais – embora com algumas inovações, como a “renda de cidadania”, um programa de combate à pobreza introduzido em 2018. Essa ação, que inclui atividades de workfare , mesmo se referindo à experiência da renda universal, está distante de resultar em medidas similares já existentes em toda a Europa, sobretudo porque reúne atividades para combater a pobreza com práticas de política de emprego que não estão necessariamente relacionadas umas com as outras ( Mandrone e Marocco, 2019 ). Assim, como já explicitado, também no caso italiano, a globalização e a afirmação do neoliberalismo têm condicionado a dinâmica quantitativa e qualitativa da presença pública no campo social, onde se tornaram mais fortes as iniciativas privadas e a organização das políticas públicas de acordo com lógicas de mercado ( Pizzuti, 2019 ; Crouch, 2003 ). Ademais, mesmo no governo de centro-esquerda liderado por Matteo Renzi, a prevalência de uma abordagem mais neoliberal é evidente.

Apesar da prevalência neoliberal nas políticas sociais recentes, para a oposição sindical, o sistema de proteção social ainda permanece em boa parte público, como no caso do sistema de saúde e do sistema de educação. Igualmente, segundo alguns autores, em referência às reformas do mercado do trabalho, a crise econômica acelerou algumas mudanças, mas não levou a reformas inesperadas e verdadeiramente traumáticas na atual legislação trabalhista ( Colombo e Regalia, 2016 ). As reformas da legislação trabalhista ocorridas em 2012 e 2015, de fato, têm expandido consideravelmente a liberdade de demitir, bem como têm enfraquecido muitas restrições ao trabalho de curto prazo, intermitente, com duração determinada, o que foi revisto pelo governo Liga-5 Estrelas entre março de 2018 e setembro de 2019. Outras medidas, ao mesmo tempo, têm reduzido os recursos judiciais contra a eventualidade de demissões ilegítimas, gerando drástica redução de ações trabalhistas no sistema judiciário.

Hoje, 80% das contratações que se realizam anualmente na Itália são de curto prazo. O contrato a tempo indeterminado nas novas contratações não traz mais previsão da impossibilidade da demissão sem justa causa5 . Atualmente, as demissões são sempre possíveis, a exceção daquelas discriminatórias (por razões de sexo, raça, religião, políticos, etc.). A tutela contra a demissão sem justa causa é substituída por uma compensação econômica ligada ao tempo de relação de emprego. Já no campo da previdência, a reforma de 2012 modificou a idade mínima de acesso à aposentadoria, estabelecida em 67 anos, e aumentou o número de anos de contribuição necessários, juntamente com uma redução na perspectiva do valor da aposentadoria. Todavia, também nesse caso, a mais importante reforma foi introduzida em 1995, no primeiro governo de técnicos6 , quando foi adotado o sistema de capitalização previdenciária. O resultado desse conjunto de reformas é que futuramente as prestações previdenciárias para os trabalhadores de baixa renda e com histórico de relações de emprego descontínuas serão mais próximas do regime do benefício assistencial e, portanto, completamente insuficientes. Ainda é preciso acrescentar o risco de uma polarização entre os trabalhadores, tendo em vista a possibilidade de contratação coletiva de planos complementares no setor da saúde e da previdência. Esses planos não abrangem todos os setores e todos os trabalhadores e, de qualquer forma, sequer garantem serviços diversificados. Assim, o risco de um progressivo crescimento do welfare corporate , em detrimento do sistema nacional de saúde ou do modelo público de previdência, é muito forte.

De acordo com Pizzuti (2019) , a mudança na relação de poder contratual e as restrições impostas na lei orçamentária no que se refere a gastos sociais induziram o sindicalismo à coparticipação na gestão de fundos complementares da saúde e da previdência. A mudança de uma parte de aumento dos salários em forma de benefícios ou outras medidas de welfare corporate configura uma redução do valor da contribuição previdenciária, que terá consequências negativas sobre o valor das aposentadorias no futuro; e isso mesmo com todas as vantagens fiscais que as empresas obtiveram com as medidas previdenciárias neoliberais.

A longa crise italiana: os governos técnico-institucionais e a crise da concertação sindical

As reformas do sistema de bem-estar social italiano têm origem já na década de 1990, quando o país ingressou na União Europeia e adotou a nova moeda única, o Euro. No início dessa década, o modelo italiano de relações industriais conheceu uma mudança importante com a superação de seu caráter conflituoso, presente até aquele momento7 .

De fato, já na década de 1980, o número de greves na Itália tinha caído de maneira relevante em comparação com a década anterior. Tal período é caracterizado por um amplo processo de reforma do setor industrial e pelas primeiras medidas de mudança das relações trabalhistas, com a introdução do contrato de trabalho em tempo parcial e dos contratos de formação e trabalho8 , ambos a curto prazo. No mesmo sentido, a regulamentação dos centros públicos de empregos muda com a eliminação da chamada numérica – aquela que respeitava a ordem de necessidade na qual os desempregados eram colocados – e sua substituição pela chamada do desempregado de acordo com o critério do empregador. Nessa perspectiva, pode-se falar de um primeiro processo de desregulamentação do mercado do trabalho italiano ( Altieri, 2009 ; Pugliese e Rebeggiani, 2004 ) que continua até hoje com uma completa flexibilização das modalidades de contratação ( Fana, 2018 ; Bubbico, 2013 ).

A reforma das relações industriais significou, de certa forma, a adoção de algumas características do modelo neocorporativo ( Leonardi, 2013 ). Os acordos alcançados no início da década de 1990 tiveram dois objetivos principais: (1) uma redução do custo do trabalho através da eliminação definitiva de um mecanismo automático, chamado “escala móvel”, introduzido na metade dos anos 1970, que permitia um ajuste dos salários em relação à evolução da inflação; (2) a introdução de uma taxa de inflação programada que deve limitar o pedido de aumentos. Desta feita, o conjunto dessas decisões tem como consequência um resfriamento das greves em termos de reivindicações salariais. Trata-se de um mecanismo de prevenção do conflito sindical que faz do Estado um garantidor da negociação coletiva. A partir desse período, o crescimento do valor dos salários no setor privado ficou limitado, principalmente porque a inflação real é sempre maior do que aquela programada. Nesse contexto, somente os trabalhadores que são beneficiários da negociação coletiva de segundo nível9 podem ganhar efetivamente um salário maior. Em uma situação de baixa inflação, os trabalhadores das grandes firmas são, novamente, aqueles que podem aspirar a aumentos salariais maiores.

Desde o início dos anos 1990, após a Operação Mãos Limpas, o sistema político italiano conheceu uma transformação radical, com o desaparecimento dos principais partidos políticos, tais como a Democracia Cristã e o Partido Socialista Italiano. Também o Partido Comunista Italiano (PCI) sofreu parcialmente com o escândalo. Em seguida, uma vez que a União Soviética entrou em colapso, o PCI mudou também o seu perfil político até chegar àquele que é hoje o Partido Democrático. Ao longo do tempo, mesmo levando em consideração a possibilidade de ser governo, esse Partido tem incorporado de maneira permanente uma forma de liberalismo de esquerda ( Michelini, 2008 ). Essas mudanças na configuração partidária são importantes porque se tornaram funcionais para um processo de transformação do estado de bem-estar social e, especialmente, do mercado de trabalho em um sentido mais neoliberal. Ao mesmo tempo, a ligação entre os epígonos do PCI e a principal organização sindical de esquerda, a Confederação Geral Italiana do Trabalho ( Confederazione Generale Italiana del Lavoro, CGIL ), aparece cada vez mais frágil e divergente ao longo do tempo. Essa divergência se explica pela dificuldade da promoção de políticas públicas em vários âmbitos que antes encontravam no PCI o instrumento legislativo. Também as outras principais confederações, CISL, Confederazione Italiana Sindacati Lavoratori e UIL, Unione Italiana del Lavoro – a primeira ligada à antiga Democracia Cristã, a segunda ao extinto Partido Socialista –, encontram dificuldades nos avanços das próprias propostas.

A ausência de um forte partido de esquerda depois do fim do PCI (com exceção do partido da Rifondazione Comunista , pelo menos até meados da primeira década dos anos 2000) e a prevalência de coalizões de centro-esquerda são umas das caraterísticas da cena política italiana desses anos. A chegada de um novo sujeito político e de governo em 1994, a Forza Italia , de Silvio Berlusconi, tem a responsabilidade de levar ao governo a primeira coalizão de centro-direita, com um partido herdeiro do partido fascista (Aliança Nacional) e de um partido separatista e xenófobo (Liga Norte). Ligadas à política de revisão das despesas públicas, as forças de centro-direita quase sempre tomam decisões destinadas a reduzir o peso do sistema público tanto no campo da educação quanto no campo da seguridade social. Tais políticas nem sempre encontram uma forte oposição das coalizões de centro-esquerda e mesmo do sindicalismo, isso em razão da crise econômica e de uma dificuldade de mobilização das bases – com algumas importantes exceções como em 2002, quando a CGIL bloqueou uma primeira tentativa de reforma das regras de demissão. Quando chegaram ao governo nos anos 1990 e na primeira década dos anos 2000, as forças de centro-esquerda introduziram apenas pequenas revisões voltadas a limitar o já alto endividamento da Itália e as disposições da União Europeia sobre o controle do orçamento público.

Mas por que isso acontece? Qual é o papel que o maior sindicato italiano joga no contexto político nacional? Nos últimos anos, a relação entre os governos de centro-esquerda e as principais confederações não está marcada pela conflitualidade, mas se desenvolve através de um compromisso constante que tem colocado as confederações sindicais em um campo prevalentemente defensivo, visto que preocupadas com a chegada dos governos de centro-direita.

Quando estourou 2008, ocorreu novamente uma coalizão de centro-direita no governo. Depois disso houve a crise do governo Berlusconi (outono de 2011) e a volta do governo técnico de Mario Monti (novembro de 2011-abril de 2013), apoiado por uma parte dos partidos de centro-esquerda e de centro-direita. Em seguida, de 2013 a outubro de 2018, três governos liderados pelo PD se alternam (apoiados por uma parte da direita), o último dos quais, o governo Renzi, é o que mais persegue um projeto de desintermediação nas relações industriais, ou seja, na exclusão do sindicalismo como ator social. Destarte, o governo Renzi aprovou uma enésima reforma do mercado de trabalho, o Jobs Act , que flexibilizou ainda mais as relações trabalhistas e que encontrou uma oposição muito fraca no movimento sindical, provavelmente ainda pela relação entre o PD e a CGIL. Deve-se lembrar que o governo técnico de Mario Monti tinha aprovado poucos anos antes uma drástica reforma da previdência (alongamento da idade mínima, aumento dos anos de contribuição e redução do coeficiente de cálculo) e uma reforma da legislação trabalhista que começara a liberar as demissões sem justa causa. É no governo de Monti que se assiste também à aprovação do fiscal compact 10 e à inserção do vínculo do equilíbrio orçamentário na Constituição, medidas tipicamente neoliberais que têm como consequência o controle rigoroso das contas públicas e a redução dos gastos sociais, portanto o desinvestimento nos serviços públicos.

Um movimento sindical que resiste, mas que sofre em termos de mobilização e representatividade

Excluídos os países do norte da Europa, a Itália é um dos países com a maior taxa de sindicalização: em 2013, 37,3%, contra 7,7% na França, e 17,7% na Alemanha ( Carrieri e Feltrin, 2016 ). As três principais confederações sindicais têm hoje cerca de 12 milhões de filiados, dos quais mais de 40% são aposentados. Em 2008, o número de filiados era aproximadamente o mesmo (11,7 contra 11,8 milhões atualmente), mas o peso dos aposentados no total de filiados era mais alto (47,9% contra 42,4% de hoje).

Em geral, os dados sobre o número de filiados apresentam mais de um problema. Os mesmos dados das principais confederações são fornecidos por elas mesmas, e isso pode incluir riscos de sobrevalorização, sobretudo se consideramos que nos últimos anos um dos argumentos de maior debate é aquele da desfiliação. Assim, entre 2008 e 2018, as duas das principais Confederações, CGIL e CISL, reduziram o número de filiados, respectivamente, em 2% e 10%. Mas essa diminuição atingiu apenas os aposentados, enquanto as adesões parecem aumentar entre os trabalhadores ativos ( tabela 1 )11 . Enquanto o primeiro dado pode depender, em parte, do fato de que a idade de aposentadoria é crescente em razão das últimas reformas, reduzindo, desse modo, o número potencial de novos filiados, o segundo se pode prestar a várias interpretações, incluindo o aumento dos trabalhadores precários ou do setor do comércio, no qual o emprego tem crescido mais nos últimos anos.

TABELA 1
Filiados da CGIL e da CISL em 2008 e Mais Recentes e Variações %; UIL só de 2018

Além das considerações anteriores, também no que se refere ao caso italiano, é preciso levar-se em conta pelo menos duas questões gerais que explicam a redução da taxa de sindicalização nos países mais desenvolvidos: a diminuição do emprego no setor mais tradicional, a indústria – que, todavia, é também o setor mais sindicalizado –, o aumento do trabalho precário, geralmente menos inclinado à sindicalização, bem como o aumento geral do emprego no setor dos serviços, em que a sindicalização tem sido tradicionalmente mais fraca. Ao mesmo tempo, no caso italiano, a taxa de sindicalização se mantém ainda alta no setor público e tem aumentado muito entre os trabalhadores imigrantes no setor privado.

A fraqueza da ação sindical na Itália é, todavia, anterior à crise de 2008. Como destacado por De Benedictis e Magatti (2006) , em uma pesquisa nacional sobre as características das classes populares no país realizada antes da crise, um dos aspectos mais relevantes é a crescente individualização das experiências de trabalho e a dificuldade do sindicato em oferecer respostas diferenciadas, mesmo que o sindicato continue a beneficiar-se de uma reputação boa para 60% dos entrevistados. Da mesma maneira, o enfraquecimento do sistema de proteção social parece ter favorecido a busca de soluções por dentro da família, mais gratificantes e confiáveis do que em outros âmbitos de natureza coletiva, como o sindicato. A esses elementos soma-se, de acordo com Gallino (2012) , uma luta ideológica marcada pela deslegitimação do sindicalismo.

Além do número de filiados ainda muito alto, o sindicato tem crescido bastante em termos de serviços oferecidos (e não apenas aos filiados), mantendo também uma presença capilar no território e uma boa capacidade de negociação a cada nível (empresarial, territorial, estadual). De certa forma, podemos dizer que, indiretamente, o sindicato se tornou uma organização fundamental para o acesso a uma série de benefícios de bem-estar social, bem como para o suporte oferecido nos campos de assistência fiscal, da previdência e da assistência em caso de acidentes e doenças professionais ( Feltrin e Maset, 2010 ). Assim, o conjunto dessas atividades contribui hoje para manter um número elevado de filiados no sindicalismo italiano.

O número alto de filiados não significa, entretanto, que o sindicalismo não tenha mostrado, até agora, um atraso em relação às novas formas de trabalho precário e, consequentemente, uma dificuldade no relacionamento com uma nova geração de trabalhadores. Não é por acaso que precisamente nesse contexto têm surgido formas auto-organizadas de luta sindical, especialmente entre os trabalhadores da chamada gig economy e entre aqueles que não têm uma relação de emprego bastante clara, com subordinação explícita à empresa, mas que são, formalmente, trabalhadores autônomos ( Betti, 2019 ; De Nicola e Quattrocchi, 2016 ). Apenas recentemente os sindicatos confederais mostram mais atenção ao problema de representatividade das novas formas de emprego, também porque as experiências construídas, há vinte anos, para representar os trabalhadores atípicos, dentro de uma categoria sindical específica, não têm dado até hoje muitos resultados ( Bubbico, 2018 ).

As greves: um instrumento enfraquecido da ação sindical?

Desde 2009, na Itália, não há dados sobre o andamento das greves, exceto as do setor de serviços públicos essenciais, que inclui transporte público local, limpeza, transporte aéreo, sistema de saúde, correio e telecomunicação, transporte marítimo, administração de governo local etc. Isso ocorre a partir dessa data porque a Itália não contribui mais para o conjunto de dados detectados pela Organização Internacional do Trabalho (OIT). Os únicos dados sobre o número de greves nos serviços públicos essenciais, para os quais também contribuem as empresas privadas, são fornecidos pela comissão de garantia das greves13 . Em média, nos últimos dez anos, as greves chegam a 1500 por ano, enquanto outras oitocentas foram revogadas depois da proclamação – geralmente, as greves são revogadas porque o sindicato chega a um acordo na negociação. Da mesma forma, as greves de relevância nacional efetivamente articuladas são pouco mais de duzentas, enquanto em média de 30% são anuladas ( tabela 2 ).

TABELA 2
Andamento das Greves na Itália no Setor dos Serviços Públicos Essenciais, 2009-2018 – Valores Absolutos

Analisando essa série14 , pode-se observar certa homogeneidade ao longo do tempo no número de greves, também para aquelas de relevância nacional, ainda que nos últimos três anos se evidencie um crescimento dessas últimas. Deve-se notar também que, geralmente, a probabilidade de realizar uma greve nacional é, em média, dez pontos percentuais maior que aquelas de relevância territorial ou a nível de empresa.

Um outro limite dos dados é a falta de conhecimento ou estimativa do número de trabalhadores participantes e, portanto, das taxas de adesão às greves. Diante da ausência de outros dados, as informações disponíveis permitem, pelo menos, compreender o nível de conflitualidade em setores que são partes integrantes do sistema de bem-estar social nacional (sistema de saúde, transporte público, educação etc.). Outro limite do banco de dados analisado é a falta de informações sobre os objetivos das greves, embora possamos supor que as motivações, sobretudo para as greves nacionais, estejam nas renovações da parte econômica dos contratos nacionais, enquanto aquelas de nível local compreendem a defesa dos níveis de emprego, a organização no local de trabalho ou a renovação da negociação coletiva de empresa, com reivindicações direcionadas a maior índice de participação nos planos de lucros de resultados. Mesmo limitado, esse banco de dados é importante porque possibilita conhecer o número de greves deflagradas por sindicatos autônomos ou de base em comparação com as principais confederações sindicais CGIL-CISL-UIL, considerando-se que nos últimos anos a presença dos sindicatos extraconfederais nos serviços públicos tem aumentado.

O único dado sobre as greves que o sistema estatístico nacional continua a relevar são aquelas que acontecem nas empresas privadas com mais de quinhentos empregados. Mas essas empresas empregam apenas 20% do trabalho assalariado na Itália. De acordo com os dados disponíveis, a redução da taxa de participação dos trabalhadores em greves é bastante evidente: de 36 horas não trabalhadas para cada mil horas trabalhadas no início dos anos 2000, passou-se a 23 horas no primeiro quadrimestre pós-crise (2008-2011) para chegar a 12 horas nos últimos dois anos (2018-2017). O número de horas não trabalhadas é sempre maior na indústria em comparação com as empresas de serviços, geralmente o dobro, com exceção dos últimos dois anos ( tabela 3 ).

TABELA 3
Andamento das Greves nas Empresas com mais de 500 Empregados: Número de Horas Não Trabalhadas para Cada Mil Horas Trabalhadas no Período 2000-2018

Em geral, a literatura sobre as greves na Itália diminuiu muito nas últimas décadas. Isso tem relação com a progressiva redução do tema do conflito no cenário público nacional e, indiretamente, na pesquisa acadêmica15 . Não significa, no entanto, que greves e outras forma de mobilização social na Itália tenham caído de maneira extrema. A inexistência de dados mais detalhados produzidos pelo Instituo Nacional de Estatística (ISTAT) e pelas principais confederações sindicais constitui um problema, assim como a carência de pesquisas em campo acadêmico. Todavia, quando essas estatísticas estão disponíveis, as informações que chegam são interessantes e ajudam a rever algumas conclusões erradas mais frequentes.

Como demonstra o estudo de Andretta (2017) , a greve é ainda a forma de protesto mais frequente na Itália nos anos de crise e austeridade16 . Massimo e Zamponi (2019) , de acordo com os resultados da pesquisa europeia Livewhat realizada em 2015, observam que quase 30% dos italianos tinham participado, nos últimos cinco anos, pelo menos uma vez de uma greve, mais do que em qualquer outro país objeto da investigação. E apenas na Itália, entre os países analisados, mais da metade dos entrevistados tinha aderido a uma greve pelo menos uma vez.

Nos últimos anos, as mobilizações das grandes confederações sindicais, sobretudo em termos de greves gerais, foram muito reduzidas. Esse comportamento do sindicalismo italiano foi condicionado por, pelo menos, quatro fatores: presença de um governo de centro-esquerda mais próximo das confederações; permanência da crise econômica e de elevado nível de desemprego; dificuldade crescente na capacidade de mobilização do movimento sindical; crescimento do trabalho precário e redução da sindicalização dos trabalhadores mais jovens. Ao mesmo tempo, a ausência de mobilização coletiva sob a forma de greves ou de outras formas de manifestação é resultado, também, de uma maior capacidade do sindicalismo de obter do governo a adoção de medidas de apoio aos desempregados. É o caso da extensão, de aplicação da lei em casos não previstos por ela, de um instrumento de suporte da renda, a Cassa Integrazione Guadagni (CIG)17 , para aqueles trabalhadores em firmas com menos de quinze funcionários, trabalhadores esses excluídos deste benefício até 2009. Ao mesmo tempo, as reformas recentes aprovadas pelo governo “técnico” de Mario Monti e depois pelo governo de centro-esquerda liderado por Matteo Renzi reduziram os recursos disponíveis do seguro-desemprego e a duração de alguns programas de proteção, abolindo a CIG extraordinária e aquela derrogatória, com a justificativa de estender, dessa maneira, o sistema de seguro-desemprego a um contingente mais amplo de trabalhadores. Esse último objetivo, como era previsível, foi apenas parcialmente alcançado pela seletividade dos critérios necessários para a concessão do benefício ( Bubbico, 2016 ). Essas reformas tiveram resultado funcional, acima de tudo, para legitimar a ideia de que tais benefícios não devem mais ser uma prerrogativa apenas dos trabalhadores mais beneficiados (aqueles de médias e grandes empresas industriais e de serviços), mas também dos trabalhadores de pequenas empresas e trabalhadores precários, até então pouco ou nunca beneficiários do bem-estar social em matéria de desemprego e de outros benefícios.

Para compreender o andamento das greves na Itália, precisamos também considerar o fator da pluralidade sindical na cúpula, que tem contribuído para enfraquecer a ação sindical. A divergência entre as principais confederações – de um lado a CGIL em uma posição mais crítica em relação aos governos de centro-direita, e de outro lado a UIL e a CISL, mais disponíveis para a negociação sobre algumas reformas – levou, nos anos anteriores, a um relacionamento diferente com o governo e, no geral, a um fracasso na renovação de uma série de importantes acordos coletivos setoriais.

Parece um tanto curioso que, ao final de 2018, a principal confederação sindical italiana, a CGIL, respondesse à acusação do movimento 5 Estrelas sobre a suposta falta de oposição aos governos antecedentes, de esquerda. A resposta foi a publicação, em sua página do facebook , de um elenco com todas as iniciativas (greves, manifestações e outras) promovidas entre 2010 e novembro de 2018. Isso porque o movimento 5 Estrelas teve início na primavera de 2018, em um governo do partido de direita, a Liga (ex-Liga Norte). Entre junho de 2010 e novembro de 2018, foram vinte e uma as inciativas de caráter nacional promovidas pela CGIL com nove greves gerais, das quais três com as outras duas confederações. Vale a pena observar que as três primeiras greves gerais foram promovidas somente pela CGIL contra o governo de centro-direita liderado por Berlusconi e no período imediatamente seguinte à crise econômica do ano de 2008. Da mesma forma aconteceu em 2012, durante o governo técnico liderado por Mario Monti ( tabela 4 ).

TABELA 4
Greves Gerais Promovidas pela Confederazione Generale Italiana del Lavoro (CGIL) e com as Outras Confederações entre Junho de 2010 e Novembro de 2018

Não há dados disponíveis sobre o nível de adesão às greves. De qualquer forma, os resultados no plano da política econômica são fundamentalmente defensivos e, em alguns casos, uma completa derrota, como demonstram as mobilizações contra a reforma da legislação trabalhista do governo Renzi e especificamente a liberalização de demissão sem justa causa pelas novas contratações desde março de 2015. Uma análise mais cuidadosa baseada no conjunto das iniciativas sindicais promovidas mostra que a mobilização, sobretudo da CGIL, se revelou muito fraca. Nesse contexto, é provável que o principal partido de centro-esquerda, o Partido Democrático, e a principal confederação sindical italiana mantenham ainda um poder de influência sobre uma parte do aparato sindical, historicamente mais reformista, aproveitando-se também da dificuldade de mobilização sindical contra as medidas do governo.

Conclusões

O sistema de bem-estar social italiano tem atenuado os efeitos sociais da crise, mas não completamente; as condições econômico-sociais da parte dos trabalhadores menos qualificada e mais exposta à crise, especificamente dos trabalhadores precários, estão visivelmente piores. A consequência é o crescimento da desigualdade e o risco da pobreza que tem alimentado a condição de insegurança dos trabalhadores. A redução da quota da riqueza redistribuída em forma de salário, seguindo uma tendência iniciada na década de 1980, vem sendo reforçada desde a crise de 2008 ( Bartirolo e Rampazzi, 2013 ). Isso se deve, em parte, ao menor poder contratual do sindicalismo na negociação coletiva e, portanto, à capacidade minorada de assegurar ganhos maiores em relação aos lucros e, em parte, aos benefícios fiscais garantidos pelo Estado às empresas.

Em um contexto de crise permanente, a capacidade de mobilização do sindicalismo tem sido baixa, sobretudo pela afirmação, também no principal partido de esquerda, da tendência de adoção de mais políticas econômicas neoliberais. Em relação às greves, não se observam na Itália, nos últimos anos, greves prolongadas ou situações de conflito social alimentadas pelo sindicalismo em relação às principais reformas do sistema de bem-estar social. Outra situação é a das greves de categoria pela renovação da negociação coletiva e aquelas dos serviços públicos. A falta de dados mais detalhados sobre as greves não contribui, enfim, para esclarecer um quadro complexo.

As três confederações sindicais permanecem sendo os principais atores do movimento sindical. A impressão, todavia, é que a sua influência na sociedade ( Carrieri e Feltrin, 2016 ) tem sido reduzida, assim como o poder de condicionamento nas decisões do governo sobre os temas de políticas econômicas, mesmo considerando a crise daquele modelo neocorporativo presente no início da década 1990. Até o ano de 2008, de acordo com Feltrin (2008) , o sindicalismo perdia força nas relações industriais, mas parecia que aumentava a sua capacidade de influência nas arenas políticas institucionais. Hoje, parece que também essa capacidade está comprometida. As greves continuam a ser um instrumento de conflito, mas não tanto sobre as questões gerais, e sim no âmbito da negociação coletiva específica ou, simplesmente, na defesa do emprego. O que parece claro é o uso de recursos ampliado de formas de mobilização como manifestações, propostas de lei, referendum de revogação, campanhas de sensibilização etc., em lugar das greves; pelo menos naquilo que respeita às decisões do governo sobre política econômica e na reforma do sistema de bem-estar.

Se uma crise do sindicato em termos de representatividade e capacidade de mobilização é bastante evidente na Itália como no resto da Europa, da qual as greves e a taxa de filiação são apenas um indicador, o sindicalismo italiano ainda mostra certa capacidade de compromisso no plano institucional. Isso acontece mesmo que sua atuação seja essencialmente defensiva e muito próxima ao modelo europeu de diálogo social; modelo esse que tradicionalmente está interessado em limitar os conflitos ( Guardianich e Molina, 2017 ).

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  • 1
    . No período 1992-2010, o PIB per capita italiano teve crescimento anual em média só de 0,5% ( Toniolo, 2014 ); entre 2001 e 2008, o emprego de 11%, mas a taxa de desemprego tem resultado mediamente de 8,1%, ligeiramente abaixo da média europeia de 8,5% ( Ricci e Tibaldi, 2011 ).
  • 2
    . Essas duas motivações são as mesmas que têm limitado a difusão da previdência complementar entre os trabalhadores que estão inseridos no mercado do trabalho mais recentemente.
  • 3
    . Os gastos sociais nos 28 países da União Europeia, por muitos anos em torno de 25% do PIB, aumentam constantemente entre 2 e 3 pontos percentuais desde o início da crise. Esse crescimento deve-se tanto à redução do PIB quanto ao aumento do desempenho e das medidas de contenção da crise. Em 2016 (o dado mais recente disponível), a despesa social na Itália totalizou 28,6% do PIB (1,5% a mais que a média europeia). Todavia, se excluirmos o valor do tratamento final de emprego e do encargo fiscal incluído na renda dos aposentados, a incidência da despesa social é significativamente menor, a ponto de ficar abaixo da média europeia. Mesmo se compararmos o dado da despesa per capita , algo igual a 100 (valor da média da União Europeia), o valor da Itália é de 89,5 [em 2016] ( Pizzuti, 2019 ).
  • 4
    . No entanto, de acordo com Hemerijck e Vandenbroucke (2012) , os sistemas de proteção social, ainda que diferentes, em particular no que concerne aos benefícios de seguro-desemprego e ao apoio mínimo à renda, têm diminuído significativamente o impacto da crise para milhões de indivíduos, inclusive os países do Sul da Europa.
  • 5
    . Essa norma tinha sido introduzida depois de uma década de forte mobilização do movimento operário italiano no final dos anos 1960, com a aprovação do Estatuo dos Trabalhadores (art. 18 da lei n. 300 de 1970).
  • 6
    . Os governos de técnicos apareceram pela primeira vez na Itália na década de 1990 e resultam de uma experiência tentada pelo ex-premiê Lamberto Dini (1995-1996). Trata-se de uma administração sem vínculos políticos que seria encarregada de realizar projetos indispensáveis ao país; eles se constituem diante de crises econômicas e institucionais, com a impossibilidade de formar coalizão de governo com base em um ou mais partidos da mesma orientação política.
  • 7
    . Sobre o andamento das greves na Itália entre a Segunda Guerra Mundial e a década de 1990 e as diferentes abordagens teóricas, ver Franzosi (1995) .
  • 8
    . Hoje inexistentes, esses contratos previam a necessidade de a empresa promover a formação profissional do trabalhador e, por isso, tinham alguma isenção fiscal. Tais contratos favoreciam o turnover e a contratação a custos rebaixados.
  • 9
    . Esse tipo de negociação cobre somente 20% da força-trabalho italiana, principalmente nas médias e grandes empresas do setor industrial que fazem previsão de planos de lucros de resultados ( D’Amuri e Nizzi, 2017 ).
  • 10
    . Foi um acordo aprovado por um tratado internacional em 2 de março de 2012 por 25 dos 28 Estados membros da União Europeia (não assinado pelo Reino Unido, Croácia e República Tcheca). Entrou em vigor em 1º de janeiro de 2013 e contém uma série de regras, chamadas “regras de ouro”, vinculativas na União Europeia com o princípio do equilíbrio orçamentário.
  • 11
    . Esse dado não está disponível para a confederação UIL, pois ela não tem publicado em rede os dados anteriores a 2015. Vale lembrar que antes da crise de 2008, entre 1986 e 2007, o número de filiados das três confederações cresceu em 31,5%, de 8,9 a 11,7 milhões de trabalhadores, embora com uma contribuição significativa dos aposentados, que subiu de 2,8 para 5,7 milhões ( Feltrin, 2008 ).
  • 12
    . O dado não leva em conta os filiados a outra confederação de direita, UGL (Unione Generale del Lavoro), e à confederação independente de esquerda, USB (Unione Sindacale di Base), porque, geralmente, eles não fornecem dados confiáveis; também devido à menor difusão delas.
  • 13
    . A Comissão de garantia das greves é uma autoridade administrativa independente, estabelecida pelo art. 12 da lei de 12 de junho de 1990, n. 146, com a tarefa de monitorar a correta aplicação do direito de greve nos chamados serviços públicos essenciais.
  • 14
    . Não estão disponíveis dados anteriores a 2009.
  • 15
    . É exceção nesse sentido a produção científica de Della Porta (2015 ; 2017), embora seu foco esteja mais na experiência dos movimentos sociais e das novas organizações políticas.
  • 16
    . O estudo é baseado na análise dos eventos de protesto (greves, manifestações, ocupações e outras formas de mobilização) que tem aparecido em La Repubblica , um dos jornais nacionais mais difundidos na Itália.
  • 17
    . Trata-se de uma medida introduzida na Itália em 1946 que permite à empresa suspender o empregado da atividade de trabalho em troca do pagamento de uma indenização de 80% da retribuição para um período limitado, gerenciada pelo Instituto Nacional da Previdência (INPS) e financiada pelo Estado, pelas empresas e, em pequena parte, pelos trabalhadores. No caso da CIG em derrogação, hoje abolida, esse percentual era, no entanto, muito menor ainda, porque esses trabalhadores e suas empresas não eram obrigados a contribuir com fundo.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Maio 2020
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2020

Histórico

  • Recebido
    26 Nov 2019
  • Aceito
    14 Jan 2020
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